Domínio absoluto

Acaboooou! Não é só o Galvão gritando o último pênalti, vale para toda a Olimpíada. Os Jogos chegaram ao fim, com o basquete masculino fechando o último dia com mais uma medalha de ouro para a coleção dos EUA, que bateu facilmente a Sérvia. Antes, a Espanha sofreu, mas venceu a Austrália para dar a terceira medalha da ERA Pau Gasol. O time da Oceania, por sua vez, perde sua terceira disputa de medalha de bronze na história e segue sem medalha na versão masculina da modalidade.

Até hoje não vi uma Olimpíada que não tenha sido divertidíssima e cheia de ótimos momentos e histórias, a do Rio não foi diferente, cheia de emoção. Mas vamos mandar a RELA? O torneio de basquete ficou MUITO distante de ser um dos grandes momentos desses Jogos.

A seleção campeã, a dos EUA, foi uma versão piorada de si mesmo se a compararmos com as que nos acostumamos a ver desde que o Coach K assumiu o time em 2005. De cabeça, acho que só aquela campeã mundial em 2000 pareceu tão fraca coletivamente e tão irregular. Ambas, porém, foram campeãs de seus torneios e tiveram Kevin Durant resolvendo tudo o que lhe foi pedido quando era necessário um momento de respiro.

A Sérvia, vice, foi o time que cansou de perder jogos apertados na primeira fase, ganhou um jogo feio contra a rival Croácia nas quartas para, só na semifinal, finalmente, realizar uma grande apresentação. A Espanha também foi uma versão bem piorada do time bi-vice de 2008 e 2012. O Brasil e a Argentina, protagonistas da mais espetacular partida do torneio, aquela única que vai ficar marcada pra valer na nossa memória, são versões envelhecidas e pioradas de gerações em despedida. A França, coitada, não chegou perto de seus objetivos e apenas aquele arremesso de Tony Parker contra a Sérvia é o que pode ficar de bom na recordação. Se tem um único time que surpreendeu positivamente foi a Austrália, que superou algumas limitações técnicas com muita organização e movimentação incessante para algumas das melhores atuações do torneio, mas foi pouco para salvar o conjunto.

O basquete não vive crise por isso? Não sei. A princípio acho que não, já que tivemos outros bons torneios no passado recente, mas fica ao menos a curiosidade para ver quem vai ocupar o espaço deixado pelo fim de gerações fortes no Brasil, na Argentina, na França e na Espanha. As excelentes-gerações-belgas de Canadá e Croácia dão conta? Os jovens espanhóis estão no mesmo nível desse time? Dante Exum, Ben Simmons e Thon Maker podem fazer a Austrália dar o próximo passo?

Uma pessoa que não está muito otimista com o nível do basquete mundial é Jerry Colangelo, o manager do Philadelphia 76ers e também responsável por gerenciar e organizar as seleções dos EUA. Ele mandou a seguinte declaração após mais um ouro fácil do seu país:

“Eu torço totalmente pelo crescimento do basquete. Torço por mais interesse na modalidade em todos os níveis, a minha vida é o basquete. O esporte é o segundo mais praticado no mundo. Apenas precisamos que todos esses países façam alguma coisa e se tornem mais competitivos, eu não vou dar desculpas por eles.”

E ainda completou

“Um dos árbitros me disse que tínhamos que jogar com quatro jogadores só. Eu disse que não, os outros que devem ralar e competir. Nós temos ajudado o basquete no mundo há 50 anos, ensinamos o jogo ao mundo. Ensinamos seus técnicos, veja o número de jogadores estrangeiros na NBA. Veja o número de estrangeiros no basquete universitário dos EUA. Eu quero ver o nível do jogo crescer”.

Eu acho duas coisas ao mesmo tempo: (1) ele tem toda razão e (2) foi meio babaca. Ele disse as coisas certas, mas a maneira que disse deu à mensagem um tom paternalista demais, como se os EUA fossem os donos do esporte e tivessem sido eles exclusivamente os únicos a ensinarem o jogo para seus aluninhos do resto do mundo. Não é bem assim, a Europa criou seu próprio jeito de jogar, suas próprias inovações táticas e o intercâmbio que começou pra valer no fim dos anos 90 foi essencial para o desenvolvimento do jogo, como o conceito do ala de força arremessador, diversos usos e ataques contra a defesa por zona e até o desenvolvimento do pick-and-roll.  Exemplo prático foi o San Antonio Spurs campeão de 2014, que era ‘internacionalizado’ não só por ter muitos não-americanos no time, mas principalmente pelo foco nos passes e por fugir do jogo individualizado que tanto marcou o estilo americano.

Até lances de habilidade, normalmente associados com os americanos, podem vir de fora. Hoje vemos Dwyane Wade e Russell Westbrook consagrarem o euro-step, tão não-americano que tem o nome que tem. O lance, embora já tivesse sido usado por Elgin Baylor e Dr. J nos anos 70, só foi se popularizar e ser imitado pra valer na NBA depois que o lituano Sarunas Marciulionis começou a fazê-lo nos anos 90 e principalmente com Manu Ginóbili nos 2000.

Mas é possível que Colangelo saiba disso tudo e só tenha falado assim para provar um ponto, um do qual ele tem grande razão: o basquete se espalhou no mundo há MUITO tempo, a NBA abriu suas portas para os gringos há algumas décadas e mesmo assim o planeta parece não conseguir alcançar os EUA na formação de jogadores.

Parecia que o jogo ia virar no começo deste século, quando surgiram em diferentes países do mundo jogadores de altíssimo nível e que estavam levando suas seleções a ótimas posições, dando problemas para os EUA e virando All-Stars na própria NBA: era Pau Gasol na Espanha, Dirk Nowitzki na Alemanha, Nenê no Brasil, Andrei Kirilenko na Rússia, Manu Ginóbili na Argentina, Peja Stojakovic na então Iugoslávia, Tony Parker na França, Yao Ming na China, tudo ao mesmo tempo! Todos muito mais que protagonistas em seus times e que tinham parceiros de nível parecido na seleção nacional. Parecia mesmo que a NBA iria virar uma liga cada vez mais internacional (lembro de comentaristas americanos especulando se um dia o All-Star Game seria EUA x Resto do Mundo) e que os EUA, embora sempre favoritos e com muito mais opções, não iriam só passear dando risada nos torneios internacionais.

Doce ilusão. Qual desses países conseguiu revelar um jogador de nível parecido desses nos últimos 10 anos? Talvez só a Espanha, onde o novo Gasol é justamente o irmão mais novo dele. Hoje os “gringos” da NBA são em sua maioria jovens promessas que nunca estouram de vez (Enes Kanter, Danilo Gallinari, Jonas Valanciunas) ou bons role players (Nic Batum, Dennis Schroeder). Para usar o linguajar característico da NBA, o resto do mundo ainda gera bons jogadores, mas nenhuma estrela. E esse apanhado de “apenas” bons jogadores não faz nem cócegas nos times americanos. Veremos nessa temporada do Philadelphia 76ers se Ben Simmons e Dario Saric começam a mudar isso, e seguimos de olho em Andrew Wiggins para ver se o Canadá pode se tornar a segunda força do continente. E será que Kristaps Porzingis tem um futuro de All-Star? É cedo para todos eles, por enquanto Colangelo tem razão. Ele só não tem razão em sair por aí quebrando os troféuzinhos-brindes-mimos de seus jogadores! Toma cuidado, cara! O Carmelo ficou sem =(


Mas vamos falar dos jogos deste domingo: na decisão a Sérvia iria tentar repetir a atuação da primeira fase, quando jogaram bem, exploraram bem os pick-and-rolls e perderam por apenas três pontos dos EUA. Só que não rolou. A exemplo da final da Copa do Mundo de 2014, os EUA passearam na decisão e levaram o ouro mais sem graça dos últimos tempos.

Após um primeiro quarto disputado, os EUA mataram o jogo com duas armas: melhor comunicação defensiva para evitar o pivô sobrando livre sob a cesta nos pick-and-rolls, forçando a Sérvia a passar a bola múltiplas vezes no mesmo ataque até alguma merda acontecer; e, lá na frente, botando a bola na mão de Kevin Durant, que sozinho transformou o jogo em um PASSEIO. Ele marcou 24 pontos só no primeiro tempo e foi uma sequência sua que tirou a Sérvia do jogo. Bastaram essas duas coisas para destrancar o cadeado e correr para o abraço.

Frustrados e sem achar solução tática, o time europeu ainda perdeu a cabeça, passou a defender mal, fazer faltas e cometer erros bobos. Tinham capacidade para perder de menos, mas não tiveram cabeça para manter o jogo honroso. O segundo tempo foi uma mera formalidade arrastada que nos fazia lembrar que nossa querida Olimpíada estava no fim.

Mas o torneio de basquete teve pelo menos um bom jogo para alegrar esse chato mata-mata. A disputa do bronze entre Espanha e Austrália foi empolgante e o segundo tempo muitíssimo bem jogado. Como nem tudo pode ser elogios, uma série de faltas questionáveis marcadas para os dois lados prejudicou um bocado o jogo: Andrew Bogut saiu eliminado da partida ainda no terceiro período, e os minutos finais de jogo viram seguidas trocas de liderança só na linha de lance-livre. Um time fazia dois lances, passava na frente, o outro atacava, sofria falta e revirava no lance. Foi arrastado e polêmico, com o auge sendo essa falta fantasma que rendeu os últimos pontos da partida:

A Espanha já encantou mais, mas ainda é um timaço quando enfiam a bola na mão do Pau Gasol e ele está em um dia inspirado. O pivô marcou 31 pontos, pegou 11 rebotes e fez o ataque rodar a partir dos ajustes que obrigava os australianos a fazer. Sem Bogut para a defesa nele ou para a cobertura de seus ataques, o pivô conseguiu fazer ainda mais a diferença. Para o bem do legado de Gasol, os lances-livres marcados para Sergio Rodriguez no último ataque espanhol o salvaram de entrar para a história como o cara que perdeu uma medalha porque tomou um gancho do Aron Baynes nos últimos segundos.

Nesse jogo a Austrália sofreu um pouco do que tinha sofrido contra a Sérvia: os outros times fizeram um scout bem feito e aquela movimentação toda deles foi muito bem marcada, exigindo muita corrida e muitos passes até um arremesso sair. Geralmente não há scout que segure o talento individual somado à tática, mas nesse caso faltava uma das partes. Patty Mills é talentosíssimo nos chutes de longa distância, mas não quebra defesas sozinho.

Mas ao contrário da semi final, eles tiveram mais paciência de superar o começo fraco e tiveram a sorte de enfrentar um time mais amigável. Pau Gasol é cada vez mais lento, Juan Carlos Navarro nunca foi excelente defensor e Nikola Mirotic é um desastre tentando acompanhar qualquer jogada minimamente complexa. Eventualmente a Espanha começou a ceder os espaços que os backdoors e múltiplos corta-luzes da Austrália tentavam criar, e o jogo se igualou.

O problema deles é só talento bruto. É achar arremessos e boas jogadas quando os lances scriptados não rolam, e foi num lance ensaiado, mas bem lido pela defesa espanhola, que o jogo acabou. Precisando de um arremesso na última posse de bola de jogo, David Andersen deixou a bola exposta e Ricky Rubio forçou o turnover decisivo. Uma última grande jogada para o nosso querido armador que fez uma Olimpíada muitíssimo abaixo da média. Falando em Rubio, já falei pra vocês das grandes promessa de estrelas europeias que não viraram estrelas na NBA?

Torcedor do Lakers e defensor de 87,4% das estatísticas.

Como funcionam as assinaturas do Bola Presa?

Como são os planos?

São dois tipos de planos MENSAIS para você assinar o Bola Presa:

R$ 14

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

R$ 20

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Como funciona o pagamento?

As assinaturas são feitas no Sparkle, da Hotmart, e todo o conteúdo fica disponível imediatamente lá mesmo na plataforma.