[Resumo da Rodada] Sobrevida

Um time liderava as Finais do Oeste por 3 a 1, dominando por completo os jogos em casa e usando com enorme sucesso um quinteto baixo, sem pivô. O outro conseguiu sobreviver na série usando um time mais alto e dando mais participação para o seu pivô. O torcedor desavisado, ou que tenha hibernado ao fim da temporada regular e acordado só agora, certamente pensará que o time dominante é o Warriors e que o time apostando em seu pivô é o Thunder, mas é tudo ao contrário: se faltava alguma evidência de que estamos num daqueles filmes bregas de troca de corpo, o Warriors vencer o Jogo 5 usando mais Andrew Bogut, dominando os rebotes e correndo mesmo foi a prova final de que estamos assistindo a um filme da Linday Lohan.

[image style=”” name=”on” link=”” target=”off” caption=”Mãe e filha trocam de corpo, aprontando altas confusões”]http://bolapresa.com.br/wp-content/uploads/2016/05/Freaky.jpg[/image]

O “quinteto da morte” do Warriors, a famosa formação que a equipe põe em quadra para definir jogos sem usar nenhum pivô, apanhou de maneira implacável durante essa série após experimentar  de seu próprio remédio: usando uma formação igualmente baixa, o Thunder fez 35 pontos a mais a cada 100 posses de bola do que o Warriors quando o “quinteto da morte” esteve em quadra. Se desde que as Finais de Conferência começaram o Warriors parece visivelmente confuso com quão forte, rápido e atlético o elenco adversário é, deixar que o Thunder use uma escalação ainda mais rápida só tornou a superioridade física deles mais óbvia. Nos dois jogos em Oklahoma, o Thunder pegou TRINTA REBOTES A MAIS do que o Warriors, um domínio físico completo do garrafão que teve dois efeitos complementares: permitiu que o Thunder compensasse a quantidade de arremessos forçados, gerando novas oportunidades de cesta, e também evitou o contra-ataque do Warriors, que não consegue pegar a bola para correr para o ataque e precisa povoar o garrafão para tentar recuperar a bola ao invés de poder espaçar seus jogadores já a caminho do ataque enquanto Draymond Green leva a bola. Dominar os rebotes compensou, então, um dos principais defeitos do Thunder, tirando ao mesmo tempo uma das maiores qualidades do Warriors. Foi o elemento principal dentro de uma série de fatores que fizeram as equipes “trocarem de corpo” ao longo da série.

Ao fim do Jogo 4, Steve Kerr deu seus primeiros passos dentro de uma espécie de “jogo mental” que é comum na NBA mas ainda não tinha aparecido no leque de ferramentas do jovem técnico. Reclamar ou exigir coisas dos próprios jogadores na imprensa é uma arma para tentar motivar o elenco, e que eventualmente estraga o clima nos vestiários dependendo dos técnicos ou jogadores envolvidos. Com a melhor campanha da história da NBA, o Warriors ficou famoso pelo clima fantástico, técnico tranquilo, jogadores felizes, e só um ou outro chilique do Draymond Green nos vestiários. Steve Kerr não havia passado por nenhuma crise séria até agora. Finalmente vimos o Warriors com as costas na parede, e Steve Kerr resolveu ser mais assertivo, dizendo publicamente que Andrew Bogut precisava ser mais esperto, que ele estava cometendo faltas demais, limitando seus minutos, e que ele estar em quadra para pegar rebotes e passar a bola seria fundamental para o Warriors vencer o próximo jogo. Como o Bogut respondeu a esse CHAMADO ÀS ARMAS? Tendo provavelmente sua melhor partida de Playoffs da carreira e ajudando o Warriors a fazer o impensável: igualar a luta pelos rebotes, com 45 pra cada lado. Esse simples fato mudou o peso dos arremessos do Thunder e permitiu ao Warriors criar um ritmo ofensivo, inclusive recuperando seus contra-ataques. Mas o mais incrível é que o Bogut teve um papel fundamental NO ATAQUE, onde sua capacidade de passar a bola na cabeça do garrafão ou com as costas para a cesta mostrou-se muito útil ao longo da temporada e é absolutamente ESSENCIAL contra uma defesa tão física e pressionada no perímetro como a do Thunder. Para se ter uma ideia de quão impecável tem sido a defesa do Thunder, vale dar uma olhada nessa jogada da noite de ontem:

 

Pra começar temos os braços gigantes do Kevin Durant marcando Stephen Curry, o que limita a possibilidade do armador de arremessar por cima da marcação e torna os passes bastante contestados. Bogut aparece para receber a bola e devolver para Curry, mas Steven Adams marca a jogada muito bem e limita o espaço do armador. A bola vai pra Iguodala, uma ponte para Curry receber na zona morta do outro lado da quadra, mas Durant segue o MVP com maestria e a jogada quebra. Com Ibaka pressionando, Iguodala precisa desistir do arremesso e a bola volta para Bogut. Agora, ao invés de Curry é a vez de Klay Thompson receber a bola de Bogut, mas Steven Adams faz exatamente a mesma jogada defensiva e força o passe. Draymond Green sobra de costas para a cesta contra Russell Westbrook, que passa a bola quando é ameaçado por Dion Waiters chegando por trás, passa para Klay Thompson que precisa acelerar um arremesso e tem Waiters no seu cangote. Os CINCO jogadores do Warriors tocaram na bola, a movimentação ofensiva foi excelente, mas a defesa do Thunder não deu um centímetro para um bom arremesso. Vejam que Bogut estava lá, criando vários momentos dessa jogada, mas não foi suficiente.

Agora vamos ver uma outra jogada em que o Thunder também defendeu perfeitamente, mas o Warriors deu um jeito de pontuar, graças a Bogut:

 

Bogut faz uma jogada comum do Warriors e, de costas para a cesta, aciona Curry batendo para dentro do garrafão no que deveria ser uma bandeja simples. Mas como Curry está sendo marcado por Durant, que pode pegá-lo por trás, não há espaço para a cesta e o armador não tem pra onde ir. Acaba tendo que abrir a quadra com um passe exagerado para Iguodala no lado oposto da bola, que ao invés de forçar um arremesso pode recomeçar uma jogada – mesmo com apenas 7 segundos sobrando no relógio de arremesso – graças à capacidade de Bogut de distribuir a bola. O pivô aciona Iguodala numa infiltração parecida com aquela do Curry que deu errado, e ela dá errado também, mas como o garrafão se fecha para a finalização inevitável, Iguodala pode acionar Bogut para uma bandeja inteligente. É uma jogada que quebrou DUAS vezes, uma nas mãos de Curry e outra nas mãos de Iguodala, mas Bogut salvou as duas ocasiões: na primeira vez começou uma jogada nova, na segunda finalizou com habilidade.

Nesse Warriors, Draymond Green também arruma jogadas quebradas e está constantemente armando o jogo, mas contra o quinteto mais baixo do Thunder – aquele que tem chutado traseiros, com Serge Ibaka de pivô – Bogut pode ter essa função bem mais perto da cesta do que Draymond Green, conseguindo com sua altura uma vantagem para finalizar e garantindo que o garrafão esteja ocupado com os rebotes. Para contestá-lo, o Thunder até tentou colocar Steven Adams e Enes Kanter ao mesmo tempo em quadra, mas o experimento durou 1 minuto: Bogut armou jogadas para que os outros jogadores atacassem Kanter no perímetro. Aliás, essa foi uma constante para o Warriors: se algum dos jogadores de garrafão sobrassem na linha de três pontos, a ordem era contorná-los e atacar a cesta, algo que Stephen Curry teve dificuldades – táticas, físicas? – para fazer até aqui.

Na jogada abaixo, por exemplo, Stephen Curry começa a jogada com TRÊS defensores do Thunder no seu cangote, incluindo Steven Adams, que precisa bloquear o caminho do armador para a cesta. Curry mantém o drible vivo – uma das suas melhores habilidades, tantas vezes menosprezada – enquanto Harrison Barnes e Klay Thompson espaçam a quadra para ele, e aí simplesmente contorna Adams para a bandeja.

 

Outra resposta para Enes Kanter foi o fato de que, com os reservas, o Warriors optou por usar Marreese Speights, que arremessou do perímetro, atacou a cesta, criou contato e impôs seu jogo no ataque. Kanter ficou apenas 6 minutos em quadra, porque agora o Thunder está plenamente convencido de que sua melhor formação para defender, gerar desperdícios e contra-ataques e garantir rebotes de ataque tem apenas um pivô, Steven Adams, ou pivô nenhum. Justamente por isso, coube a Andrew Bogut punir essa nova zona de conforto do Thunder, não a Draymond Green, que se mostrou fraco fisicamente para lidar com o nível do Thunder e forçado para fora do garrafão, onde sua defesa é inferior e sua capacidade de pegar rebotes é reduzida a nada.

Com Bogut em quadra, sem cometer faltas e sem tentar jogar na correria, o Warriors também ganhou duas vantagens colaterais. Uma é que Bogut sequer chega na quadra de ataque durante os contra-ataques do Warriors, já que ele parece estar correndo debaixo da água, o que significa que quando o Warriors erra, Bogut já está na defesa para parar o contra-ataque de contra-ataque do Thunder. O fato de que ele fica pra trás, que pode parecer ruim, ajudou a parar Westbrook em várias infiltrações, e também liberou Draymond Green para se dedicar ao contra-ataque, sem ter que se preocupar no caso da jogada quebrar e ter que voltar para parar Westbrook na velocidade da luz. Um exemplo? Olha como o Bogut já está bem pra trás quando Russell Westbrook puxa o contra-ataque, acaba atrapalhando o armador e roubando a bola, e Draymond Green pode receber o passe de Bogut porque não estava desesperado voltando para o garrafão parar a infiltração:

A outra vantagem está no fato de que com Bogut sendo um jogador mais ativo na defesa, Draymond Green tem liberdade para se movimentar mais defensivamente e ajustar as marcações. Quando o Warriors, em dado momento, foi pego com um monte de marcações trocadas, o fato do Bogut estar bloqueando a infiltração do Westbrook, que tinha a bola nas mãos, permitiu que Curry e Draymond Green casualmente trocassem os jogadores que estavam marcando, como se estivessem passeando no parque. Quando só Green está em quadra cuidando do garrafão, se ele for arrumar alguma falha defensiva tomará uma bandeja instantânea na cabeça.

Isso explica bastante o motivo do Warriors ter melhorado defensivamente nessa partida, ter atrapalhado mais o jogo de garrafão do Thunder, ter conseguido seus rebotes defensivos e eventualmente ter conseguido mais contra-ataques. Jogar mais alto contra o Thunder, que encontrou uma nova identidade no jogo mais baixo, arrumou uma série de questões. Permitiu que o Warriors focasse a defesa no garrafão sem ter que segurar seus jogadores na quadra de defesa a cada arremesso errado do Thunder, liberando eles para o contra-ataque. Ficou bem óbvio que o Warriors não precisa de TODO MUNDO correndo para a frente o tempo todo. Com Bogut e Draymond Green lá atrás, o Warriors pode mandar só dois jogadores pro contra-ataque porque já é suficiente para acontecer ISSO AQUI:

 

Ainda assim, com o Warriors descobrindo as maravilhas de se jogar alto, recuperando seu ritmo ofensivo, tendo excelente ajuda do banco de reservas – que DESTRUÍRAM o Thunder durante o bizarro momento no segundo quarto em que Kevin Durant virou armador do segundo escalão de jogadores – o Thunder conseguiu a liderança do jogo em alguns momentos do terceiro período. A defesa do Thunder é tão boa e Durant e Westbrook são tão impossíveis de marcar em alguns momentos, que o atual campeão, mesmo encontrando a solução para o jogo e tendo uma ajuda de Bogut que nunca viu antes, parecia assustado com as chances de derrota. O time super confiante da temporada regular, que achava que tudo estava sob controle mesmo perdendo por uma dúzia de pontos, está oficialmente morto: o Warriors agora está na frente do placar e joga EM PÂNICO, olhando pelo retrovisor esperando o acidente de trem que é o Thunder vindo logo atrás. Ninguém no ginásio respirou aliviado até a jogada decisiva a 1 minuto e 20 segundos do fim:

 

Stephen Curry roubou a bola do Durant, correu para o contra-ataque e, marcado por Steven Adams, finalmente conseguiu tocar a vitória e BATEU NO PEITO, no meio da jogada, como alguém que SE BELISCA para garantir que está vivo. Quando Adams apertou Curry para tentar se aproveitar do momento de AUTOMUTILAÇÃO, Curry só repetiu a tônica do jogo: contornou o pivô para uma infiltração. A alegria dos fãs, do Curry e do resto do elenco não era tanto uma comemoração de vitória quanto era um grito de alívio. Nesse momento, o Warriors comemora o simples fato de ESTAR VIVO para contar a história. Uma história bizarra, em que a peça tática central foi o Bogut, em que o Thunder foi o time que insistiu em jogar baixo, em que ninguém está fazendo aquilo que se acostumou a fazer na temporada regular. Aos trancos e barrancos, o Warriors conquistou uma sobrevida e jogará um Jogo 6. Mas o Thunder esteve tão perto o tempo inteiro – e dominou tanto os outros jogos – que não cabe nada ao Warriors a não ser comemorar um jogo a mais. Comemorar a vitória em Oklahoma, essencial para levar a série a um Jogo 7, continua um esforço distante.


RODADA DO DIA

Cleveland Cavaliers @ Toronto Raptors (21h30, ESPN)


VOADORA DO DIA

Draymond Green é um trem descarrilhado: segundo ele mesmo, sua intensidade é sua bênção e maldição. Ele consegue vencer as regras da física na pura força de vontade, e aí essa mesma força de vontade faz ele tomar mil faltas técnicas porque ele acha que consegue explodir a cabeça dos árbitros só com o olhar. Essa intensidade louca, associada com um CORPO ESTABANADO, gera uma série de jogadas bizarras em que Green tromba com companheiros e adversários. Mas ultimamente Green tem levado isso a um novo nível: ou ele é estabanado ao ponto de ter pernas de pano da Emília que sobem loucamente por inércia, ou então ele está incarnando o espírito do Bruce “Lee” Bowen e distribuindo chutes aleatórios. Todo jogo a perna dele sobe mais do que deveria e encontra ora os bagos do Steven Adams, ora o rosto de algum desavisado.

Na velocidade normal do jogo, de fato parece um simples desequilíbrio, algo digno de um fantoche ou marionete de programa infantil. Mas em câmera lenta, não pra negar que é UM CHUTE NA CABELA. Entendo os árbitros não marcarem, parece só um trem descarrilhado. Mas a NBA, vendo depois e percebendo que ACONTECE TODO JOGO, precisa dar um tapinha na mão do Draymond Green. Uma coisa é – como eu – derrubar os talheres no chão em toda refeição, outra é CHUTAR BAGOS E CABEÇAS. Green precisa aprender a controlar seus membros, antes que alguém se machuque, ou ele seja suspenso no momento mais crucial dos Playoffs.

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

Como funcionam as assinaturas do Bola Presa?

Como são os planos?

São dois tipos de planos MENSAIS para você assinar o Bola Presa:

R$ 14

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

R$ 20

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Como funciona o pagamento?

As assinaturas são feitas no Sparkle, da Hotmart, e todo o conteúdo fica disponível imediatamente lá mesmo na plataforma.