>Vultos da NBA – Don Nelson

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(insira aqui uma piada com o Rebolation)

Estatisticamente é fato consumado, Don Nelson é o técnico que mais venceu jogos na história da NBA. São 1.333 vitórias em 2.394 jogos. Mas o quanto é estranho ouvir que o Don Nelson, sempre chamado de maluco por nós e mais tantas pessoas, é o cara que mais venceu partidas na história de uma liga que já teve Red Auerbach, Phil Jackson, Pat Riley, Jerry Sloan e mais tantos técnicos fabulosos? Existem duas formas bem distintas de se avaliar a carreira do Don Nelson e só vendo esses dois lados conflitantes é que podemos chegar perto de um resultado final que faça algum sentido.

Primeiro vale dizer que vamos analisar a carreira do Don Nelson como técnico nesse post, não como jogador. Mas uma pequeno resumo da sua carreira não faz mal a ninguém:
Ele teve sua camisa de número 19 aposentada pelo Boston Celtics depois de vencer 5 títulos com a equipe nos anos 60, foi o sexto homem do time na maior parte do tempo e sempre conhecido por ser um contribuidor sólido vindo do banco de reservas, com mais de 10 pontos de média e alto aproveitamento de arremessos. Também vale lembrar que o Don Nelson foi o autor de um dos arremessos mais famosos da história dos playoffs. No jogo de despedida de Bill Russell da NBA, o jogo 7 entre Lakers e Celtics nas finais de 1969, o Celtics vencia por apenas um ponto o Lakers, em Los Angeles, a menos de um minuto do fim do jogo quando o Jerry West tirou a bola do armador do Celtics John Havlicek, mas ao invés de recuperar a posse de bola e ter um dos roubos mais famosos da história das finais, ele jogou a bola nas mãos de Nelson, que arremessou, viu a bola bater no aro, subir mais alto que a altura da tabela e então cair perfeitamente dentro da cesta. Título do Celtics.
Foi uma carreira tão sólida e correta que fica até estranho usar essas palavras na hora de descrever o que Don Nelson virou como técnico. No meio de inúmeras qualidades e defeitos contrastantes, podemos dizer que Nellie foi tudo, menos sólido e correto.
Comecemos com o lado positivo, sua criatividade sem limites. Sua carreira começou criativa quando assumiu o Milwaukee Bucks em 1976 como técnico e General Manager, ou seja, não só controlava o time na quadra como era o responsável pelas trocas e contratações da equipe. Uma série de trocas consideradas arriscadas na época fez do Bucks um time que no primeiro ano de Nelson vencia cerca de 30 jogos por temporada para um que ganhou 7 títulos de divisão seguidos e sempre chegou perto da marca de 60 vitórias. E para quem duvida de suas habilidades defensivas, vale dizer que em 7 dos 11 anos de Nelson no Bucks o time dos veadinhos teve uma das três melhores defesas da liga inteira! É, Don Nelson e defesa na mesma frase, é como dizer hoje que a Nana Gouvêa já foi freira.
Também foi em Milwaukee que o Don Nelson começou suas invenções malucas nos esquemas de jogo, foi ele o responsável pela primeira experiência com um point-forward na NBA. Pra quem perdeu a explicação do termo no nosso “Ma Engrish Two Bad“, explico rapidamente: É quando um ala, da posição 3 ou 4, é o responsável pela armação do jogo ao invés de deixar a responsabilidade para um armador natural. O mais próximo disso que vemos disso hoje são alguns momentos do Lamar Odom no Lakers, LeBron James no Cavs e Stephen Jackson no Bobcats.
Don Nelson começou isso nos anos 80 usando o ala Paul Pressey para armar o jogo enquanto o time ficava sem nenhum armador nato. Sem precisar de um baixinho na posição 1 ele tinha a liberdade de usar dois de seus melhores pontuadores, Sidney Moncrief e Craig Hodges, em quadra ao mesmo tempo sem maiores preocupações. Pela inovação e pela altura dos jogadores isso criava situações que os técnicos adversários não sabiam lidar.
Depois de sua passagem pelo Bucks foi a vez de Don Nelson assumir pela primeira vez o Golden State Warriors. Lá ele começou o que é sua marca registrada até hoje, o run-and-gun, o sistema de jogo mais veloz e ofensivo da NBA em que todos os jogadores precisam ter velocidade, arremesso e raciocínio rápido. Ele foi inovador ao pensar em um sistema tático em que ao invés de valorizar a posse de bola, transformasse ela em algo trivial, arremessa-se na primeira oportunidade e arrisca-se qualquer roubo de bola ou marcação dupla na defesa para fazer com que o adversário também entre nesse jogo de posses de bola curtas e gratuitas.
Não esqueçam que estamos falando do run-and-gun em uma época em que os grandes times da NBA pensavam em defesa antes de tudo. Nelson assumiu o Warriors logo depois do Pistons da era Bad Boy, de pura defesa, ganhar dois títulos, e na época em que o Bulls começava o seu reinado usando os triângulos do Phil Jackson, um sistema ofensivo que sempre prezou pelas boas e pensadas decisões no ataque. O run-and-gun era ir completamente contra o que se fazia com sucesso no começo e meio dos anos 90.
Mas como ainda acontece hoje, o run-and-gun encantou. Chamado de Run TMC, uma referência ao grupo de rap Run DMC, mas usando as iniciais de Tim Hardaway, Mitch Richmond e Chris Mullin, o trio era famosíssimo entre todos os fãs e estava sempre nas listinhas de jogadas do ano com seu jogo de contra-ataque alucinante. Esse vídeo mostra um pouco do que eram capazes os três jogadores, principalmente Tim Hardaway e seu maldoso crossover.
Após o Warriors, Nelson deu uma de Larry Brown e passou por uma desastrosa temporada no New York Knicks, indo logo depois para o Dallas Mavericks. No Mavs, Don Nelson repetiu o que fez no Warriors: Run-and-gun + small ball.
O primeiro termo já mostrei, o segundo explico agora: É quando o técnico enche o time de jogadores baixos, é o ideal para sistemas de jogo velozes como o run-and-gun. Se no Warriors ele usava três armadores (Hardaway, Richmond e Marciulionis) e dois alas baixos (Mullin e Higgins), no Mavs ele chegava a jogar períodos inteiros dos jogos com quatro armadores (Nash, Van Exel, Finley e Adrian Griffin) e só o Nowitzki, um cara que passa a maior parte do tempo longe do garrafão, como pivô. Era uma loucura que, como na época de Warriors, rendia momentos lindos, muitas bolas de três e um ritmo de jogo que cansava só de assistir ao primeiro quarto.
Don Nelson é considerado até hoje o cara que tirou a imagem do Mavericks do lixo. Se hoje eles completam 10 temporadas seguidas com pelo menos 50 vitórias por temporada, até ele chegar lá o time era motivo de piada, mais um Clippers fadado ao fracasso. E acrescente na sua época de Dallas a sua invenção tática mais controversa, o Hack-a-Shaq, a tática de fazer faltas de propósito no Shaquille O’Neal para que ele errasse os lances livres e a posse de bola voltasse para o adversário. Ele até extendeu o uso da técnica e a aplicou contra o Bruce Bowen em alguns jogos de playoff.
Ao sair do Mavs Don Nelson voltou para o Golden State Warriors, onde conseguiu o seu feito mais impressionante como técnico: Embalou vitórias consecutivas no fim da temporada regular de 2007, se classificou para os playoffs em oitavo lugar e lá bateu o seu ex-time, o Dallas Mavericks, que tinha tido a melhor campanha da temporada regular. Foi só o segundo time na história da NBA a se classificar em oitavo e bater o primeiro colocado. E o fez usando sua velha tática de correria e jogadores baixos contra uma equipe do Mavs que tentava fugir desse esquema tático do seu antigo técnico para conseguir ir mais longe nos playoffs.
Vendo a carreira de Don Nelson assim daria pra encerrar o post dizendo que foi um sucesso. Muitas idéias criativas, times que há 30 anos são os mais divertidos e criativos da NBA e, para coroar, o maior número de vitórias da NBA. Mas agora vem o outro lado, se Don Nelson é só um dos três técnicos com mais de 1.000 vitórias na NBA, é um dos dois com mais de 1.000 derrotas.
Se Don Nelson foi genial ao melhorar o time do Bucks e os levar a sete títulos de divisão, nunca conseguiu chegar nas finais da NBA com esse time. Perdeu 6 vezes na semi-final de conferência e 3 nas finais, sempre perdendo para o Celtics ou para o Sixers no caminho. A criatividade de Don Nelson nunca foi o bastante para bater os dois grandes times do Leste na década de 80.
Na sua primeira passagem pelo Warriors Don Nelson foi o gênio da correria e da velocidade mas mais uma vez falhou nos playoffs. Em 7 anos ele chegou duas vezes na semi-final do Oeste e foi só, nunca ameaçou uma aparição nas finais. Lá também conseguiu sua primeira grande crise pública com um jogador, Chris Webber. Don Nelson é um cara criativo e inventa coisas loucas para usar durante os jogos mas nem sempre explica para os seus pupilos, forçando-os a jogar em posições que não estão acostumados, que não se sentem a vontade e eles muitas vezes nem sabem porque aquilo está acontecendo. Com Webber foi assim, que não entendia porque jogava tantas vezes fora de posição e brigou com o técnico. A crise foi tamanha que o time começou a se desmontar e Don Nelson foi mandado embora.
Na sua passagem pelo New York Knicks mais uma vez ele teve boas idéias, uma visão inovadora mas foi completamente incompetente na hora de lidar com jogadores, dirigentes e torcida. Ele simplesmente, no meio dos anos 90, queria convencer a diretoria do Knicks a trocar o Patrick Ewing, um dos maiores ídolos da história de Nova York, para poder abrir espaço salarial para a contratação do Shaquille O’Neal, que estava prestes a sair do Orlando Magic. É mais ou menos um técnico chegar hoje em San Antonio e falar pra trocar o Tim Duncan e tentar o LeBron ou o Bosh no ano que vem. Além disso ele tentou forçar o seu esquema ofensivo e veloz em um time que tinha um elenco montado pelo Pat Riley no ano anterior para ser essencialmente defensivo, foi um desastre anunciado e monumental.
No Dallas Mavericks, como é história recente, acho que muitos ainda lembram. O time encantava, corria, fazia coisas malucas mas sempre caia nos mesmos vícios e defeitos quando enfrentava o San Antonio Spurs ou o Sacramento Kings. Foram 4 anos seguidos com campanhas geniais e depois derrotas para as duas potências do Oeste do começo da década. É uma reprise do que aconteceu no Bucks e no Warriors, os mesmos erros.
Para terminar, sua nova passagem pelo Warriors. A vitória sobre o Dallas foi histórica, mas depois mais uma derrota em semi-finais de conferência, dessa vez para o Jazz. E após essa campanha mágica, brigas com o Baron Davis, com o Stephen Jackson e crises com vários outros jogadores de menos nome, caras que, tentando ganhar seu espaço no time e na NBA, tinham que lidar com um técnico que um dia te deixa jogar 40 minutos, te vê marcar 25 pontos e no dia seguinte te deixa no fundo do banco de reservas sem pisar na quadra. Isso sem falar na aversão do Don Nelson a novatos (Steph Curry é uma grata exceção!), que costumam mofar no banco porque o técnico não os considera ainda aptos para o jogo profissional.
Criatividade, velocidade, ataque e encanto que morrem em suas teimosias, erros repetidos, mau relacionamento com seus jogadores, situações desagradáveis com dirigentes e torcidas. Essa mistura doida é o que consegue transformar um cara em recordista de vitórias na NBA, ganhador de três troféus de técnico do ano e, ao mesmo tempo, sem nenhuma aparição em finais da NBA.
Segundo o Tex Winter, o cara que criou o sistema de triângulos e que até pouco tempo atrás ainda era assistente técnico do Phil Jackson, o Don Nelson é o rei da “filosofia de um jogo”. Durante aquela única partida ele é capaz de criar tantas situações diferentes e inovadoras que o seu time sai com a vitória, mas não dá pra sustentar isso por uma série de 7 jogos. A explicação faz sentido, seus times, até seu Warriors “D-League All-Stars” de hoje em dia, é capaz de roubar vitórias de qualquer equipe de qualquer nível, mas sempre que ele enfrentou os playoffs, falhou.
Mas depois de 30 anos falhando nos playoffs, o que é o Don Nelson? Um gênio criativo que é persistente em seu sistema de jogo ofensivo ou um cabeça-dura que não admite mudar de filosofia? Ele é um nobre esportista por ser fiel ao espetáculo mesmo que isso não leve à vitória ou um técnico ruim que não sabe se adaptar para vencer?
A resposta para essa pergunta cai no quanto o Don Nelson quer vencer. Talvez esteja satisfeito com os seus cinco anéis de campeão como jogador e só queira se divertir como técnico, sua atitude de sair de férias assim que acaba a temporada e nem ligar para trocas ou draft durante toda a offseason indica isso, mas ficar se estressando e gritando à beira da quadra com 70 anos de idade nas costas indica outra.
Eu não vou ser idiota de arriscar uma resposta, prefiro encerrar com a dúvida e com uma genial frase do Roland Lazemby, colunista da ESPN, sobre o Don Nelson: “Ele é um monumento à mediocridade. Ou à experimentação ousada. Depende do quanto você comprou daquilo que ele está tentando vender”.

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