O que esperar de Devin Booker

O Phoenix Suns tinha, até a última semana, uma temporada completamente esquecível. O time é muito ruim, mas não é O pior da NBA. Tem alguns bons jogadores, mas nenhum All-Star vivendo o seu auge. Coleciona alguns bons jovens, mas nenhum deles parece especialmente revolucionário.

O time é apenas o 23º melhor ataque da temporada e faz os olhos dos seus torcedores sangrarem com a 27ª marca defensivamente. O único quesito em que o time se destaca é na velocidade: SEGUNDO em toda a NBA em total de posses de bola por jogo. Herdaram do passado a velocidade dos velhos Suns de Steve Nash, mas sem o passe, a qualidade, os arremessos…

O ano já estava desinteressante, aí depois que o time mandou Eric Bledsoe e Tyson Chandler para as férias mais cedo para que a franquia pudesse “desenvolver os jogadores jovens” (*cof* TANKING *cof*), achei que eles já não eram capazes de oferecer nenhuma boa história. Ou ao menos nada que superasse o dia em que o GORILA mergulhou na quadra:

Mas eis que surgiu ELE, o homem que não tem o branco do olho, Devin Booker, para colocar o Phoenix Suns de volta no centro do mundo do basquete com uma das maiores atuações ofensivas da HISTÓRIA da NBA. Em partida contra o Boston Celtics, o ala marcou 70 PONTOS, apenas o sexto jogador a alcançar tamanha pontuação na história da liga.

Não vou listar todos os recordes que ele quebrou porque é chato e vocês já devem ter lido por aí, mas ficam aqui alguns dos mais curiosos:

  • Além de Booker, apenas Wilt Chamberlain, Kobe Bryant, David Robinson, David Thompson e Elgin Baylor já tinham alcançado 70 pontos em uma partida
  • Destes, só Chamberlain, Thompson e agora Booker o fizeram numa DERROTA
  • Com apenas 20 anos e 145 dias, Booker é o jogador mais jovem a chegar nos SESSENTA pontos, nos 70 então, nem se fala
  • E ele é o terceiro mais jovem a alcançar os 50 pontos, atrás só de LeBron James e… Brandon Jennings (?!)
  • Foi apenas o 11º jogo de 70+ pontos da história da liga

O quanto é bizarro que Michael Jordan nunca fez 70 pontos mas DEVIN BOOKER fez?! Muito, e acho que por isso, por essa ofensa ao divino, que muita gente já começou a achar defeito no feito do pirralho. O Twitter transbordou com gente dizendo que o jogo foi uma pelada, que o Celtics relaxou depois que abriu 20 pontos de vantagem (e isso foi, acreditem, no PRIMEIRO QUARTO) e que ninguém levou muito defesa a sério. Também destacaram, negativamente, que o Suns meio que “apelou” no final, dando a bola só para Booker, pedindo tempos e fazendo faltas para conseguir mais posses de bola.

Tudo isso aconteceu mesmo, mas não deveria tirar o mérito do cara capaz de colocar tantas vezes a bola na cesta. Falaram coisas parecidas quando Kobe Bryant marcou 81 pontos, acusando a defesa do Raptors de ser uma porcaria (foi a segunda pior do ano mesmo) e de que Kobe só fez isso porque era um fominha sem coração.

É aí que temos que pensar: sim, Kobe é fominha, assim como vários outros jogadores. TODOS eles enfrentaram o Raptors naquele ano. Quantos chegaram perto de marcar 81 pontos? Nenhum. O mesmo vale aqui. Quantos jogadores não chamaram todo o jogo para si neste ano? Quantos não fizeram parte de partidas corridas, velozes, sem defesa e com sinal verde para chutar? Quanto garbage time de quarto período não é jogado, todos os dias, sem nenhum esforço dos dois lados? É preciso uma situação ideal para uma aberração dessa acontecer, mas não é só ela que define o resultado. E mesmo quando todo o necessário ocorre, nem sempre é o bastante. E vamos ser sinceros, fazer 70 pontos em 48 minutos é difícil até se você estiver jogando contra crianças. É difícil ver que Devin Booker entrou para a história antes da gente decidir se queremos ele entrando para a história, mas aconteceu.

Um jeito mais fácil de aceitar é lembrar que cada jogo de 70 pontos ou mais já teve a sua grande história por trás, algumas com as suas forçações de barra, como a de Booker.

Os 73 pontos de David Thompson pelo Denver Nuggets contra o Detroit Pistons em 1978 aconteceram no último dia da temporada regular daquele ano. Thompson e seu time concentraram todos seus esforços para que o ala pudesse se tornar o cestinha da temporada, o que não aconteceu apenas porque George Gervin marcou SESSENTA E TRÊS algumas horas mais tarde. A mesmíssima situação aconteceu nos 71 pontos do pivô David Robinson, pelo San Antonio Spurs, em 1994. Em um duelo com Shaquille O’Neal pela marca de cestinha da temporada, ele esfomeou na última rodada para garantir o topo. Não é que qualquer um marca 70 pontos só porque ~hoje tô afim~, mas ajuda.

Wilt Chamberlain, como é conhecido de todos, viu seus companheiros cometerem faltas em sequência nos adversários para que ele pudesse ter mais posses de bola e mais chances de arremessar e alcançar os históricos 100 pontos que povoam o imaginário de todo mundo que começa a acompanhar a NBA.

Talvez a atuação de 70+ pontos com menos histórias sejam os 71 pontos de Elgin Baylor contra o New York Knicks no antigo Madison Square Garden, em novembro de 1960. Anos depois, Johnny Greer, que enfrentou Baylor naquela noite, disse o seguinte:

Elgin não fez nada de diferente naquele jogo. Foi um jogo típico dele. Ele vinha pela quadra, seus companheiros abriam espaço e ele ia lá arremessar –de longe ou uma bandeja, seguido de um rebote de ataque se ele errasse. Nenhum dos arremessos teve nada de espetacular, é só que ele era um grande jogador mesmo

Eu tive um pouco essa sensação também com os 81 pontos de Kobe Bryant. Impressiona a quantidade de arremessos que ele tenta, é óbvio, mas não é como se ele estivesse arremessando de costas, do meio da quadra e tudo caísse. Foram arremessos que o Kobe costumava dar e acertar, mas calhou que naquele dia TODOS caíram. Outro charme dessa partida de 2006 é que o Lakers estava perdendo o jogo até a metade do terceiro período, eles realmente PRECISAVAM que o Kobe aparecesse para tentar salvar a pátria. Seria bem mais legal se os 70 pontos do Booker tivessem sido o bastante para o Suns ao menos ameaçar o empate, mas não chegou nem perto.

Depois do choque, acho que é natural a gente se perguntar o que esperar de Devin Booker para o resto da sua carreira. Ele não chegou na NBA com status de futura estrela, mas foi o segundo melhor novato do ano passado, depois de Karl-Anthony Towns, chamou alguma atenção e agora vai ser pra sempre comparado aos outros nomes do clubinho dos 70 que ele ingressou. Pode ser o primeiro grande ato de uma futura mega estrela ou uma versão exagerada de outras aberrações como Terrence Ross e Corey Brewer marcando 50 pontos num jogo.

Quando Booker chegou na NBA, a principal comparação feita era com Klay Thompson, do Golden State Warriors. Os dois são excepcionais arremessadores, soltam a bola rápido no chute e não precisam de muito espaço para finalizar. Embora Booker precisasse ainda crescer muito defensivamente para merecer mais seriedade nessa comparação, ela fazia sentido.  Mas no fim da temporada passada, quando o Suns jogou tudo para o alto (como neste ano), Booker começou a receber mais liberdade para conduzir a bola, comandar pick-and-rolls e driblar à vontade. Era algo que nada tinha a ver com Klay e Booker mostrou que até levava jeito:

Confesso que no começo achei estranho e forçado, mas pela idade dele valia arriscar e a evolução foi rápida. Imaginá-lo como o principal criador de jogadas de um time ainda parece extremo, mas deu pra ver que ele estava confortável em criar arremessos driblando, infiltrando e, às vezes, até passando.

Na segunda metade desta temporada estamos vendo mais coisas ainda, com ele jogando de costas para a cesta, especialmente quando é marcado por alguém mais baixo, sempre em busca de um giro e um arremesso de média distância. É impressionante como ele conseguiu, em pouquíssimo tempo, enriquecer seu arsenal ofensivo.

Claro que ainda falta ele ter mais relevância na defesa e precisa aprender a transformar seu poder de fogo no ataque em oportunidades para os companheiros, mas o moleque tem só 20 anos e joga num time que, na atual formação, é mais jovem do que quase todos os times que estão disputando as finais do BASQUETE UNIVERSITÁRIO. Qualquer previsão ou julgamento é tanto um chute quanto perda de tempo.

Mas se formos tentar ler o futuro, é interessante ver em quem Booker se espelha na hora de moldar seu jogo. Ao invés de Klay Thompson ou Ray Allen, algumas das comparações mais óbvias pelo seu talento em arremessar de longe, Booker é fã mesmo de Kobe Bryant. Logo depois da partida dos 70 pontos ele disse que o Black Mamba foi sua inspiração para a partida:

Vi uma entrevista do Kobe onde ele disse que o que o separava da maioria das pessoas é que os outros pensavam que fazer 30 pontos era muita coisa. Ele disse que nunca colocou um limite para si, e isso ficou na minha cabeça. Ele disse que marcaria até 100 se pudesse, então nunca colocou um limite nele. Eu também não imponho limites para mim

Por coincidência, nesta mesma época do ano passado, Kobe enfrentou o Suns pela última vez na carreira e presenteou Booker com um par de tênis autografado onde disse para o jovem se tornar “lendário”.

O jogador do Suns parece ambicioso como era Kobe. Também parece adicionar jogadas novas a seu jogo a todo momento e não tem nenhuma vergonha de imitar o ídolo. Curiosamente isso o deixa mais parecido com Kobe, que nunca teve pudor em admitir que ele é o maior IMITÃO  de Micheal Jordan de que se tem notícia. Mas uma coisa aqui é importante: a grande sacada de Kobe não foi imitar Jordan –isso qualquer um que já pisou numa quadra de basquete fez –seu diferencial foi CONSEGUIR repetir o que aquele enviado dos céus fazia com a bola na mão.

Nesta última terça, CJ McCollum, outro fã declarado de Kobe, meteu 39 pontos na fuça do Denver Nuggets em um jogo decisivo na briga pela última vaga do Oeste nos Playoffs. Depois do jogo, o ala do Portland Trail Blazers postou uma foto com uma legenda que dizia que ele estava “liberando o seu Kobe interior”. Ou seja, assim como não faltaram caras para imitar Jordan, não faltam fãs de Kobe. A questão é quem vai fazer DIREITO?  Os primeiros passos de Devin Booker são muito animadores e empolgantes, mas até onde vai isso?

CJ

Ao contrário de Kobe, Booker está começando em um time jovem, sem jogadores consagrados e sem um técnico de renome no banco de reservas. Será um bom desafio para ver se ele tem o lado obsessivo, doentio, competitivo e perfeccionista que Kobe e Jordan consagraram. Não é o único jeito de fazer sucesso, mas parece ser o jeito que Booker escolheu seguir.

Outra coisa que ele está copiando? Arremessos decisivos:

Nessa temporada o pirralho já venceu em Dallas e Sacramento, e machucou corações em Nova York e New Orleans também. A grande mensagem é: ainda não dá pra saber nada, mas tá autorizado se EMPOLGAR com o futuro de Devin Booker. Tem mais coisa pra sair daí e vai ser legal assistir!

Torcedor do Lakers e defensor de 87,4% das estatísticas.

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