Um fio de esperança em Chicago

São sempre fascinantes as histórias de reconstrução na NBA. Para quem não está muito familiarizado com os esportes americanos, é alienígena pensar que grandes times trocam bons jogadores por caras piores, às vezes pirralhos, só para poder PERDER DE PROPÓSITO e assim dar início a um processo de remodelagem que deverá dar resultado só em alguns anos. Alguém imagina os presidentes de Corinthians ou Palmeiras dando uma entrevista coletiva avisando que o plano é ser bom lá em 2021? A paz acobaria lá mesmo.

Não na NBA. O que vimos nas últimas semanas é uma série de pessoas preocupadas que a sequência de SETE VITÓRIAS do Chicago Bulls poderia arruinar o plano deles de ter DeAndre Ayton, Luka Doncic ou Michael Porter no próximo ano. Afinal, vencer assim é boa ou má notícia? Apesar do PROCESSO estar aí prestes a dominar o mundo com Joel Embiid e Ben Simmons após anos de estratégicas derrotas propositais, vou tentar defender aqui de que não tem problema se eles não forem tão ruins quanto o planejado.

O Chicago Bulls começou o ano como o time mais difícil de se assistir na NBA. Embora fosse legal ver que o novato finlandês Lauri Markkanen era muito melhor do que o alertado na época do Draft, o resto do time era um desastre completo de falta de talento ou entrosamento. No League Pass, era aquele time que você pega o começo do jogo, assiste até o adversário abrir 10 pontos de frente no meio do segundo quarto já era, hora de trocar de jogo.

As coisas começaram a mudar nos últimos dias de Novembro. O Bulls perdeu QUATRO mais jogos em sequência, mas em três destes chegou a abrir uma vantagem de ao menos DEZESSETE PONTOS! Alguma coisa eles estavam fazendo certo, faltava um detalhe para não jogar tudo no lixo logo depois. Foi então que Nikola Mirotic estreou na temporada após se recuperar do SOCO NA CARA tomado pelo companheiro Bobby Portis num treino e o time embalou todas essas vitórias. Ajudou que eles enfrentaram times fracos (Hornets e Magic), alguns desfalcados de seus melhores jogadores (Celtics sem Kyrie Irving e Sixers em Joel Embiid) e outros que simplesmente não sabem vencer fora de casa (NY Knicks e Utah Jazz). De qualquer forma, todos tem calendários favoráveis de vez em quando, poucos tiram proveito com tanto gosto.

Dentro de quadra foi MÁGICO ver todas as jovens peças do Bulls funcionando ao mesmo tempo. Depois de uma temporada de novato animadora em 2014-15, nos acostumamos mais a ver as coisas ruins do jogo de Nikola Mirotic do que as suas qualidades. Sua defesa não evoluiu em anos e seu arremesso de longa distância era mais imprevisível que o humor do Bobby Portis. Especulou-se que ele seria trocado, especialmente após a briga, mas a real é que nem sei que times estavam dispostos a mandar algo relevante por Niko. De repente ele voltou, começou a acertar 48% dos seus chutes de longa distância e assumiu controle dos rebotes defensivos lá atrás. Não sei se tudo isso é sustentável, mas é impressionante ver como ele está indo além dos chutes de 3 e pontuando também em infiltrações e jogadas de costas para a cesta:

A confiança também chegou no armador Kris Dunn, que de cotado a novato do ano na temporada passada passou a dispensável pelo Minnesota Timberwolves. Sem Tom Thibodeau do lado e sem a obrigação de render de imediato, Dunn teve minutos para errar em quadra, ganhou confiança e agora mostra o que prometia: liderança, infiltrações e ótima defesa. Este roubo de bola contra Kristaps Porzingis impressiona pela velocidade em que ele chega no letão e pela precisão na ação, sem falta:

A agressividade de Dunn combina com um time que aprende aos poucos a criar espaços. Na jogada abaixo vemos o Bulls usar uma formação sem pivô tradicional —Robin Lopez estava no banco e o brasileiro Cristiano Felício tem cada vez menos espaço — e usar isso para deixar o garrafão completamente livre para a infiltração do armador. Quem deveria estar defendendo a cesta está ocupado marcando Portis e Markkanen na linha dos 3 pontos:

A ascensão desses jogadores mostra evolução individual, o que é essencial para qualquer time que quer se reconstruir. É só lembrar do Orlando Magic, um caso desesperador de boas promessas que parecem nunca dar o próximo passo na carreira. O Bulls apostou em jovens jogadores como Dunn, Mirotic, Markkanen e Zach LaVine, que deve estrear logo no começo de 2018, e mesmo que nenhum deles vire o rosto da franquia na próxima década, é importante que evoluam. Pode ser para compor o time, pode ser para render como moeda de troca.

Também estava na hora deles acertarem nesses caras secundários que ficam rodando pela NBA. O David Nwaba, que já tinha tido bons momentos pelo LA Lakers, se encaixou perfeitamente por lá:

Mas mais animador que a parte individual é ver o time com uma identidade na quadra. Quando Fred Hoiberg chegou no Bulls há duas temporadas ele prometeu um time mais atlético com um sistema ofensivo mais dinâmico para compensar anos de ataque sofrido dos anos anteriores. O problema é que nunca deram um elenco para que isso fosse possível. O grupo que sobrou lá ainda era fã do técnico anterior e faltavam especialistas de 3 pontos e até caras dispostos a mudar sua maneira de jogar em geral. Depois de um ano sofrível, a direção do Bulls ainda torceu a faca ao dar para Hoiberg a dupla Rajon Rondo e Dwyane Wade, os caras que menos tinham a ver com a sua proposta inicial. Após mais um fracasso, agora finalmente Hoiberg tem em mãos um grupo do jeito que ele quer: jovem, veloz, com vários arremessadores de longa distância e nenhum jogador que se torna um buraco negro quando recebe a bola.

Após a vitória do Bulls sobre o Boston Celtics, o técnico Brad Stevens, um dos melhores da atualidade, não poupou elogios ao rival. Disse que o time já tinha uma das melhores movimentações de bola da atualidade, finalmente fazendo Hoiberg merecer a fama que ganhou quando era técnico da Universidade de Iowa State. O elogio de Stevens diz bastante porque ele próprio foi um exemplo de reconstrução bem feita: eleito para criar o Celtics pós-Big 3, o treinador fez um trabalho bom até demais e fez o time ter resultados antes mesmo de atrair nomes de peso. Fez caras médios parecerem espetaculares, ajudou Isaiah Thomas a chegar ao seu auge e como prêmio o Celtics se tornou o destino desejado de estrelas como Al Horford, Gordon Hayward e Kyrie Irving. A camisa e a história até são um complemento legal, mas hoje as pessoas querem jogar em Boston porque querem vencer e acham que Brad Stevens é o caminho para isso.

O Chicago Bulls está ainda longe desse sonho, mas é um primeiro passo GIGANTE ver Hoiberg criar um ataque empolgante que já faz seus bons jovens jogadores atuarem no melhor nível de suas carreiras. Depois de um mês sofrível, o salto foi impressionante. O porém dessa história a gente não vê na quadra, mas acha nos bastidores: tanto em Boston como na Philadelphia, onde outra reconstrução tem dado certo, existia um plano por trás. A estratégia do PROCESSO no Sixers foi mais polêmico e custou a cabeça de Sam Hinkie, mas o plano não foi interrompido. No Celtics, a evolução foi resultado de uma sequência de excelentes trocas e apostas inteligentes. Já o Bulls… bom, esse é o time que deveria estar em reconstrução e que mesmo assim VENDEU uma escolha de Draft para o Golden State Warriors. É uma ótima punição DIVINA que Jordan Bell esteja jogando tão bem, ele poderia ser o pivô do futuro em Chicago, mas eles preferiram ganhar uns trocados.

E quem dera se fosse só esse o problema, há anos que a dupla Gar Forman e John Paxson toma decisões questionáveis. Os dois tiveram brigas pessoais com os técnicos Vinny Del Negro (com quem Paxson até saiu NO TAPA), Tom Thibodeau e com o assistente Ron Adams, hoje braço direito de Steve Kerr no Warriors. Fizeram trocas ruins envolvendo Doug McDermott, Taj Gibson, Tony Snell e Jimmy Butler (embora Kris Dunn esteja se esforçando para esse parecer melhor!) e ainda teve toda a tragédia citada acima de contratar Hoiberg e ficar mudando de plano a cada lua nova. Não sei se alguma estrela na NBA hoje se sentaria na mesa com a dupla e se animaria em jogar para eles.

O Bulls, portanto, ainda não tem o ambiente perfeito. Fred Hoiberg ainda não é o novo Brad Stevens e Nikola Mirotic, Lauri Markkanen e Kris Dunn ainda não são o futuro da NBA. O que eles têm hoje, portanto, é só esse excelente mês nas costas. Pouco, mas se conseguirem evoluir a partir disso, podemos estar daqui a alguns meses falando de um time jovem e promissor sob o comando de um técnico em ascensão. O medo de que isso custe uma posição ou outra no Draft é exagerado: nada garante que as bolinhas de pingue-pongue estarão do seu lado, e você precisa criar o ambiente para que esse jovem jogador cresça. Aqui vale a comparação com o Phoenix Suns, um outro time que também tem as derrotas e o ambiente desgastado, mas que jogam com técnico interino e só ganham partidas com os espasmos de talento de Devin Booker, Dragan Bender e Josh Jackson. Lá não há sequer perspectiva de futuro, só um histórico de ex-jogadores que deixam o time falando mal de todo mundo. Se você souber com quem comparar, um mês de basquete bem jogado é MUITA coisa.

Torcedor do Lakers e defensor de 87,4% das estatísticas.

Como funcionam as assinaturas do Bola Presa?

Como são os planos?

São dois tipos de planos MENSAIS para você assinar o Bola Presa:

R$ 14

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

R$ 20

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Como funciona o pagamento?

As assinaturas são feitas no Sparkle, da Hotmart, e todo o conteúdo fica disponível imediatamente lá mesmo na plataforma.