Para entender o fascínio por Rubio

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Rubio enfia o dedo na bola para que ela o obedeça. Funciona.

Podemos criticar quando há expectativas demais sobre um jovem atleta, mas às vezes não há como evitar. Como ignorar o Neymar jogando tudo o que joga com menos de 20 anos? Sabemos que ele é jovem, que não tem cabeça e que ainda pode melhorar muito ou empacar, como já empacaram tantos talentos promissores e precoces. Mas gostamos de futebol, queremos ver o próximo gênio, é difícil controlar a excitação e a empolgação.

No basquete não é diferente. O assunto mais comentado desse começo de temporada no Bola Presa e qualquer outro site de NBA no mundo é o novato Ricky Rubio. O armador espanhol tem nos encantado e não poupamos elogios para as primeiras 10 partidas do espanhol no Minnesota Timberwolves. Mas por que tanta babação de ovo, né? O que ele faz de tão especial além de dar passes lindos, curar o câncer e ajudar velhinhas a atravessar a rua?

O mundo ficou boquiaberto quando o armador espanhol levou a seleção de seu país ao título Europeu Sub-16 em 2006 com os seguintes números na final contra a Rússia: 51 pontos, 24 rebotes, 12 assistências, 7 roubos e uma bola de 3 do meio da quadra que levou o jogo para a prorrogação. Sim, Ricky Rubio fez tudo isso. Liderou o torneio em todos esses quesitos, registrou 3 triple-doubles ao longo da competição e um quadruple-double. Nesse mesmo ano ele já jogava entre os profissionais e no ano seguinte era o líder da ACB Espanhola em roubos de bola. Dois anos depois foi titular da sua Seleção Adulta na final Olímpica contra os EUA. E pior, jogou bem aquela partida. Tem como não criar expectativas enormes?

A comparação com o Neymar que fiz no começo tem também outra razão. Os dois começaram chamando a atenção não só pelo talento, mas pelas jogadas de efeito. O Rubio adolescente adorava um passe diferente, um enfeite que rendeu comparações (exageradas e precoces, como sempre) com o lendário Pete Maravich, cara que foi grande jogador mas ficou mais famoso por dar os passes mais malucos da história da NBA. Porém, assim como cobraram que Neymar aprendesse a chutar, ser objetivo e amadurecer, pediram o mesmo de Rubio. E para sobreviver no basquete europeu isso era essencial. Assim, Rubio, com míseros 18, 19 anos, era um armador cauteloso, cerebral e eficiente. Bem mais chato do que a gente esperava, mas conquistava seu espaço.

Aí de repente ele empacou. Desde que foi draftado em 2009, quando decidiu ficar na Espanha por mais algum tempo, pareceu não evoluir mais. Virou, com razão, coadjuvante no Barcelona e na seleção espanhola. Era difícil explicar sem teorias inventadas como “Deve ser algo na vida pessoal” ou “Ele sentiu a pressão e a expectativa”. Sei lá, mas estava mal e burocrático demais nas suas últimas temporadas europeias.

Mas como uma boa palestra motivacional que é a vida, isso parece ter feito bem para o Rubio. Em entrevista ao Adrian Wojnarowski do Yahoo!, Rubio disse que foi uma temporada em que “o jogo me testou e eu precisava disso”. E, falando sobre seus vídeos na adolescência, o jovem adulto falou com certa nostalgia: “Eu vejo aquele jogador e ele não parece se incomodar com o que os outros dizem. Não se importa com o que vai acontecer caso cometa um erro. Naqueles jogos de quando eu era jovem pareço não me importar com nada”. 

E as coisas pareciam não melhorar com ele indo para a NBA. Ao contrário de Luis Scola, Pau Gasol, Dirk Nowitzki ou, indo mais para trás, Vlade Divac e até jogadores mais consagrados como Arvydas Sabonis, nenhum outro europeu chegou na NBA com tanta expectativa. Nem Andrew Bogut e Andrea Bargnani, que foram escolhas 1 de Draft, tiveram tanta mídia em cima quanto Rubio. O único gringo de atenção comparável antes de sua estreia foi Yao Ming, e sabemos como ele sofreu com a pressão no seu começo de vida nos EUA.

O curioso é que acabou sendo o oposto. Ricky Rubio também sentia muita pressão na Europa, até demais. E segundo ele na mesma entrevista já citada, o tempo que ele passou treinando na Califórnia durante o locaute foi essencial para que ele se transformasse. Lá ele pode treinar sozinho, sem outros assistindo e julgando, poderia errar, arriscar, relaxar e voltar a ser o Rubio adolescente. Também aproveitou o locaute para treinar com outros jogadores da NBA (a matéria cita Kevin Garnett, Paul Pierce, Derek Fisher e Chauncey Billups) e ganhar tranquilidade e confiança para essa nova fase da carreira.

O que vimos até agora nesses primeiros jogos é muito mais o Rubio de 17 anos do que o do ano passado. A apreciação que a NBA dá a quem joga bonito, o incentivo para que se arrisque, é justamente o que ele precisava. Na Europa (e no Brasil, diga-se de passagem) as jogadinhas bonitas recebem aplausos quando dão certo, claro, mas é uma frescura, não um recurso, e os técnicos pegam no pé de quem se arrisca demais. Claro que na NBA as coisas precisam dar resultado e os técnicos cobram vitória, mas uma enterrada ou ponte aérea que não dê certo não é motivo de bronca ou punição. E quando dá certo vira notícia, vídeo mais visto do YouTube e os companheiros de time te amam e te respeitam mais.

O Ricky Rubio estava com vontade de mudar e não foi só para um liga onde a mudança seria mais aceita, mas para o time que buscava isso. Contei esse causo no nosso último Podcast, mas repito aqui. O David Kahn, criticadíssimo General Manager do Wolves, disse que uma das coisas que ele busca é fazer da franquia um lugar onde os jogadores queiram ir. Ele sabe que o time não tem tradição, fama e nem fica em uma cidade onde todos querem viver. Então para compensar eles querem tratar bem os jogadores, ter um ambiente agradável de trabalho e ter um estilo de jogo que os atletas sintam prazer em atuar. Por isso que eles trocaram o Jonny Flynn, que ficaria sem espaço no time e precisava jogar. Por isso contrataram o Rick Adelman como técnico também. O experiente treinador sabe lidar com jovens e sempre dirigiu os times mais velozes, criativos e ofensivos da NBA.

A entrevista completa em que o David Kahn explica isso é justamente para um de seus maiores críticos, o Bill Simmons da ESPN, e vale a pena ser ouvida. Lá ele também comenta sobre o Rubio e de como não se assustava com ele jogando mal na Europa, que uma má fase era normal para um garoto tão jovem. A aposta deu muito certo. O Wolves voltou a aparecer positivamente na mídia, o time joga bonito, com velocidade e não é difícil imaginar Free Agents cogitando ir para lá para poder atuar sob o Rick Adelman, jogar ao lado do Kevin Love e parecer bom por receber passes de Ricky Rubio. Assim como Channing Frye e Jared Dudley devem seus contratos a Steve Nash, e Kenyon Martin e Richard Jefferson sua fama a Jason Kidd, Rubio vai fazer uns companheiros milionários também.

Entender como os três, Adelman, Love e Rubio, se encaixam é essencial para explicar esse sucesso. Rick Adelman incentiva seus times a correr. Logo após o rebote (do Love, claro) já é possível ver Rubio batendo palmas para receber logo a bola e partindo em velocidade para o ataque. Lá ele encontra jogadores que podem se posicionar em qualquer lugar da quadra: Wayne Ellington, Michael Beasley, Derrick Williams e até Anthony Tolliver, todos, são velozes, sabem infiltrar e tem um arremesso de longa distância. Eles podem se espalhar pela quadra e só esperar que a visão de jogo do Rubio faça o resto. Ou melhor, quase todo o resto. Depois de enxergar é preciso que o passe chegue na medida e nisso Rubio é excepcional. Poucos na NBA, só caras do nível de Steve Nash e Rajon Rondo, conseguem dar passes com uma só mão, na corrida, com a mesma precisão de Rubio. E falo isso sem exagero, por observação pura.

A habilidade de passar a bola assim deixa o time mais rápido. Ele só precisa ver para quem quer passar e um segundo depois a bola está lá, um armador mais comum precisa diminuir a velocidade, colocar as duas mãos na bola e se esforçar para fazer o passe chegar na altura certa.

Outros detalhes fazem Rubio chamar tanta atenção, e isso temos que creditar a seus anos de rigidez na Europa. Ele tem paciência. Quer correr, é incentivado a correr, mas para no meio do caminho se não existe boa oportunidade. Sua paciência também tem dado resultado na outra jogada essencial do Rick Adelman, os intermináveis pick-and-rolls. Por entender bem o jogo, sabe reconhecer quando não passar para o Darko Milicic se o garrafão está congestionado, ou passa a bola do outro lado da quadra se a defesa adversária se fechou toda para evitar a jogada. Também sabe usar bem o pick-and-pop com o Kevin Love e o espaço no garrafão que essa jogada abre. E, pasmem, até está fazendo a defesa pagar quando não o defendem na jogada, indo por baixo do bloqueio. Se o deixam livre ele chuta mesmo de 3 pontos e tem 50% de aproveitamento na temporada.

Outra coisa muito Steve Nash (um dos maiores elogios que um armador pode receber) do Rubio é que ele não desiste do drible por qualquer coisa. Isso, junto com a ótima visão de jogo, são essenciais para que os times sempre pensem mil vezes antes de tentar pressionar ou dobrar a marcação sobre ele. E aí acontece o mesmo que com Rajon Rondo: quanto mais espaço dão, mais passes incríveis ele acha.

Os arremessos, que todos achavam que ele não acertaria, já vimos que estão caindo. Outra coisa que achavam que ele não saberia fazer bem é defender, mas até agora ele tem se saído bem. Nada fora de série, não anula ninguém, mas já enfrentou gente de alto nível, mais forte e mais rápida, e ele se garantiu. Curioso que isso se explica porque ele entende o jogo e sabe se posicionar. E pensem bem, compensar deficiências técnicas ou físicas com entendimento de jogo não é o tipo de comentário que fazemos para caras com 35 anos e uma vida de experiência na NBA? O NBA Playbook fez uma análise tática completa dos primeiros jogos do Rubio e postou um vídeo rápido de jogadas em que ele defende o Russell Westbrook e o Brandon Jennings. Não se sai nada mal.

Ricky Rubio não é perfeito, mas merece todos os elogios que recebeu até agora e em breve deve curar o câncer.

Torcedor do Lakers e defensor de 87,4% das estatísticas.

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