Depois de muitos jogos, muitas séries e muitas reviravoltas chegamos no ponto que todos previam no começo da temporada, uma repetição da final da NBA do ano passado. De um lado o Golden State Warriors, atual campeão e vindo da melhor temporada regular de todos os tempos; do outro o Cleveland Cavaliers, vindo dessa vez com força total, sem nenhuma de suas super estrelas machucadas, prontos para dar o primeiro título profissional para a cidade desde 1964. Não existe final sem boas histórias por trás.
O protagonista do Cavaliers é LeBron James, que já esteve numa situação parecida com a desse ano, mas do outro lado: ele, pelo Miami Heat, venceu o título da NBA em 2013 contra o San Antonio Spurs e, em 2014, encarou a fúria de um time machucado e sedento pela chance do troféu que escorregou pelos dedos. Agora é vez de LeBron mostrar sangue nos olhos para conseguir a esperada revanche. Será que ela é comum?
A história da NBA apresenta 13 situações de anos consecutivos com finais repetidas, mas só apenas uma nesse século, o citado confronto Heat/Spurs. Nos anos 90, apenas nas famosas finais de 1996/97 e 1997/98, quando o Chicago Bulls de Michael Jordan venceu o Utah Jazz de Karl Malone duas vezes seguidas. Nas cinco vezes anteriores, entre os anos 70 e 80, sempre houve uma divisão, quem ganhou o primeiro título, perdeu o segundo.
Mas esse confronto tem uma diferença básica em comparação com a maioria dos outros da história da liga: poucas vezes um time que repetiu a final estava tão diferente. O Cavs do ano passado era treinado por David Blatt e chegou na decisão como uma equipe lenta, pesada e baseada totalmente na sua defesa. Foi uma identidade assumida às pressas, após as lesões de Kyrie Irving e Kevin Love, e que determinou o novo estilo do time e a rotação de jogadores que dava destaque para Matthew Dellavedova, Iman Shumpert e Timofey Mozgov. Um ano depois e os três têm papeis muito reduzidos (Mozgov sequer pisa em quadra!) e o time é uma potência ofensiva, que adora correr e arremessar de 3 pontos, um ataque agora conduzido por outro técnico, Tyronn Lue.
Até mesmo os dois duelos desta temporada, ambos vencidos pelo Warriors, não sei se podem ser levados muito em consideração. Não só o Cavs ainda era treinado por Blatt, mas até o Warriors estava com Luke Walton no banco e com Brandon Rush em quadra no lugar do contundido Harrison Barnes. Lembram quando Rush estava na rotação antes de surgir o ~fenômeno~ Ian Clark? As coisas mudam em todo lugar.
Mas mesmo com essas mudanças é possível brincar de BASQUETE TEÓRICO e até arrancar alguns pedaços desses duelos dessa temporada para tentar imaginar o que cada time vai fazer. Separei 4 pontos que eu acho que podem decidir essa série:
1- Para onde irá correr Tyronn Lue?
Nós sabemos que quando a coisa aperta para o Golden State Warriors eles costumam correr para o seu QUINTETO DA MORTE, sem pivô, baixo, com ultra velocidade e todos trocando de marcação a cada bloqueio. São feitos ajustes dependendo de cada duelo, como no Jogo 5 contra o OKC Thunder, mas, em geral, é como Steve Kerr gosta de fechar jogos e de se recuperar em casos extremos. Mas e Tyronn Lue e seu Cavs?
Como eles estão VOANDO nesses Playoffs, não foram muito exigidos e perdemos algumas chances de ver alternativas dessa equipe. Com o time na frente, a opção de Lue tem sido em geral pelo ataque, enchendo a quadra de arremessadores sempre que possível, dando mais espaço para Channing Frye e Richard Jefferson do que para alguns especialistas em defesa. O foco ofensivo para sufocar com recordes e mais recordes de bolas de 3 pontos tem dado resultado.
Porém, no mais próximo que eles tiveram de dor de cabeça, as duas derrotas em Toronto para o Raptors, Kevin Love não pisou em quadra nos quartos períodos e Tristan Thompson viu apenas alguns segundos de ação. O que isso quer dizer? Qual vai ser a rotação de garrafão do Cavs quando eles precisarem se recuperar numa partida? E num jogo apertado? LeBron na posição 4? Mais Frye? Mozgov volta do mundo dos mortos? Temos pouco material de Lue sob pressão para saber os jogadores e formações que ele mais confia.
2- O duelo Andre Iguodala x LeBron James
No final da série contra o Thunder, Steve Kerr resolveu parar de brincadeira, colocar Harrison Barnes no banco e começar o jogo com Iguodala. A ideia era simples: só ele e mais ninguém iria marcar Kevin Durant! Quando um estiver em quadra, o outro entra também. Ele fez a mesma coisa a partir do Jogo 4 da final do ano passado, então fica a questão: fará de novo agora?
Isso pode não parecer muito importante, já que todos sabemos que Igudoala é um baita defensor e também sabemos que, mesmo assim, LeBron James vai jogar muito, fazer muitos pontos e dar passes surreais para arremessadores. É um jeito de minimizar o estrago, não de pará-lo. De qualquer forma, quanto menos ajuda Iggy precisar, mais difícil será para LeBron encontrar jogadores livres para arremessos de 3 pontos.
Mas as ramificações dessa mudança vão além só do duelo individual. Será que isso influencia a rotação do banco de reservas do Warriors? Iguodala age como armador do time reserva, dividindo funções com Shaun Livingston, e Barnes não tem essa característica. Iguodala também é um cara mais fácil para “esconder” Kyrie Irving na defesa, já que ele não gosta tanto de jogar de costas para a cesta como faz Barnes quando se vê marcado por armadores baixinhos. O Warriors também perde um arremessador mais confiável e ganha um jogador que precisa mais da bola na mão no ataque para ser eficiente, eles querem Steph Curry jogando sem a bola na mão como fizeram contra o Thunder? Imagino que não.
3- A defesa de Kevin Love
Lembra que comentei em um podcast que a defesa de pick-and-rolls que envolve Kyrie Irving e Kevin Love ao mesmo tempo era A PIOR de toda a temporada da NBA? Pois é, alguém me explica o que os dois estavam fazendo nesse lance?
É piada né? O mínimo que eu espero é o quádruplo de atenção em uma final, claro, mas não dá pra não ficar com receio. Irving é bem desligado, Love às vezes não sabe o que fazer e, quando sabe, não tem mobilidade lateral. Deixar Love como o cara responsável por defender Draymond Green é atrair esse pick-and-roll e ver Steph Curry brincando de arremessar de 3 pontos ou de achar Green livre para fazer o que quiser.
E às vezes nem é o pick-and-roll. Vejam como não há nenhuma resistência no passe de Curry para Green no garrafão, nenhuma leitura do passe que ele iria fazer para o armador e como Love nem reage quando seu homem aparece livre para um arremesso de longa distância:
E quando o Warriors acelerou UM POUCO o ataque (nem foi um contra-ataque de verdade) o Cavs é obrigado a se adaptar na velocidade e foi o bastante para que Love não percebesse que ele era o responsável por Klay Thompson. A sorte dele foi que ele errou um arremesso que costuma acabar na rede:
O problema é que Love está acertando tudo o que arremessa nesses Playoffs e é parte essencial para o Cavs estar liderando a pós-temporada em bolas de 3 pontos. Ele é capaz de se superar o bastante para não cometer esses erros e poder ficar mais tempo em quadra? Porque o Warriors, como fizeram contra Enes Kanter na série passada, não vão ter vergonha em procurá-lo no ataque o tempo todo. De todas as estrelas do duelo a que oferece mais dúvidas é Love, o quanto sua defesa irá ajudar ou comprometer o Cavs?
4- A disciplina e velocidade do Warriors
Não temos motivos para duvidar desse time, é claro, mas nem sempre é possível jogar no seu limite. E quando alguém cansa, é sempre mais fácil economizar energias na defesa. O grande desafio do Golden State Warriors nessa série é não ser ENGOLIDO pelas bolas de 3 pontos do Cavs, que sabe muito bem espaçar a quadra e forçar o adversário a correr de um lado para o outro tentando contestar chutes. E isso sempre com o medo de deixar o garrafão livre demais para infiltrações de LeBron James. Vão precisar de velocidade e leitura de jogo para contestar tudo isso!
O Cavs também tem tido muito sucesso nesses Playoffs com arremessos de 3 pontos em contra-ataques. Vimos como o Warriors sofreu com os ataques velozes do OKC Thunder, especialmente nos dias em que cometeram muitos turnovers, e aqui, ao invés de segurar o TRATOR Russell Westbrook, precisam segurar os passes rápidos para os arremessadores que o Cavs solta pela quadra:
Esses foram só alguns pontos. Ainda poderíamos falar sobre a divisão de minutos do banco do Warriors, que teve altos e baixos na série passada, ou do Draymond Green estar a duas faltas técnicas de uma suspensão, ou de Kyrie Irving conseguir ou não tirar proveito de quando o Warriors colocar jogadores mais altos o defendendo. Muita coisa pode decidir essa brincadeira!
Maldição Bola Presa
Eu imagino o Cavaliers partindo com tudo na jugular do Warriors, com LeBron James agressivo como quase-pivô, iniciando lances dentro do garrafão, e todos os arremessadores do time querendo manter o alto aproveitamento dos Playoffs. Mas não sei se na defesa eles conseguem superar as limitações individuais e coletivas para parar o também excelente ataque do Warriors. Estatisticamente, apesar da campanha ótima na pós-temporada, a defesa não tem sido mais que mediana. É pouco contra um dos melhores ataques que já vimos!
No duelo de puro ataque e trocas de pontos, minha tendência é acreditar que a forte defesa do Warriors pode fazer a diferença em algum momento da partida, segurando o poder de fogo adversário e impulsionando aquelas sequências de 20 pontos em 2 minutos que poucos times são capazes de sobreviver.
É possível que super estrelas elevem seu jogo quando mais se espera delas? Sim. O Cavs pode abrir uma liderança com seu poder de fogo e depois cozinhar o jogo com LeBron e seus muitos reboteiros de ataque? Sem dúvida. São dois times capazes de superação, mas o Warriors é mais versátil, mais equilibrado e mais capaz de deixar em quadra quintetos que não parecem tão cobertores curtos. O palpite é para bi-campeonato do Warriors!