Crise de identidade no Memphis Grizzlies

A temporada passada foi marcante e histórica para os técnicos na NBA. Um sonho para uma categoria que pede, em qualquer esporte, só uma coisa: tempo. Em toda a temporada 2016-17 NENHUM treinador foi mandado embora. Foi a primeira vez que isso aconteceu desde 1970-71.

Mas agora, com um quarto de temporada, 2017-18 já viu duas demissões. É a paciência indo para o ralo. Logo na primeira semana o Phoenix Suns chutou Earl Watson após um começo de temporada historicamente ruim, e agora o Memphis Grizzlies demitiu David Fizdale após uma sequência de oito derrotas seguidas. Era a segunda temporada de Fizdale, que antes disso fez carreira como assistente técnico de Erik Spoelstra no Miami Heat.  Você foi pego de surpresa com a notícia? Não se sinta mal, nós também, a maior parte da liga também e até ex-atletas de Fizdale, como LeBron James e Dwyane Wade, ficaram em busca de respostas:

E LeBron ainda fez questão de retuitar essa aqui:

A gente sabia que o clima não era dos melhores. As oito derrotas seguidas eram doloridas, a pressão por ir para os Playoffs é pesada em um time tão veterano, a lesão de Mike Conley é desanimadora e no jogo anterior –uma derrota para o terrível Brooklyn NetsMarc Gasol tinha sido deixado no banco pelo treinador nos últimos 15 minutos de jogo. O pivô reclamou após a partida, precisou se controlar para não soltar os cachorros nas entrevistas e Fizdale apenas respondeu que nada estava dando certo e resolveu arriscar com o único quinteto que tinha funcionado naquele jogo. Enquanto a gente achava que era só mais uma briga a ser resolvida internamente, o General Manager Chris Wallace achou que era a hora de uma mudança mais drástica.

Muita gente leu essa demissão como um sinal de que, finalmente, o Grizzlies iria recomeçar do zero, mas me parece justamente o contrário. Se o time estivesse arrependido de investir num elenco tão velho e se achasse que não dava mais pra tirar muita coisa dessa base de Gasol-Conley, o plano deveria ser trocar os jogadores enquanto eles ainda têm valor e manter o técnico, um cara ainda jovem, que criou apego com vários jogadores e com a cidade na temporada que teve por lá e que deu indícios de que sabe como montar um bom time, fazer ajustes durante jogos e, claro, dar as melhores entrevistas coletivas do planeta.

Se Wallace decidiu demitir Fizdale, provavelmente é porque ainda não cogita trocar Marc Gasol, principal nome da franquia e, ao que tudo indica, o que mais batia de frente com o treinador. No começo dessa sequência de fracassos o espanhol já havia dado uma bronca no time, dizendo que a equipe estava perdendo sua identidade e que era impossível defender bem quando nem todos os jogadores voltavam para a defesa com energia após erros no ataque. Parecia um ataque a seus companheiros, mas pelo jeito era mais que isso.

Sempre que falamos sobre o Memphis Grizzlies nos últimos anos nunca conseguimos evitar o assunto “Grit and Grind”, o mote da equipe que virou muito mais do que uma mera frase de efeito, se tornou a identidade de toda a franquia. Depois de mais de uma década de fracassos desde a sua fundação em Vancouver, foi com essa ideia do time “moedor de carne” que o Memphis alcançou sucesso dentro e fora de quadra. Tirando o inabalável San Antonio Spurs, o Grizzlies é o time há mais tempo sem ficar fora dos Playoffs no Oeste! E até fora da quadra eles alcançaram sucesso, ganhando finalmente a torcida, que se identificou com o time brigador –imagem parecida com a que a população tem de si mesma– e até lucrando. No nem tão longínquo ano de 2013, a ESPN  elegeu o Grizzlies como “a melhor franquia dos esportes americanos”. O ranking levava em consideração “o que a organização dá aos torcedores, à comunidade, dinheiro e emoção investida no produto”.

Nas quatro linhas, o “Grit and Grind” era traduzido como um jogo da velha guarda: dois jogadores pesados no garrafão, ritmo lento, poucas bolas de 3 pontos e foco total na defesa. Não dá pra dizer que deu errado, mas a NBA mudou e o time passou a viver um dilema: como se adaptar ao novo basquete sem perder a identidade que faz o time ser quem é? Fizdale era para ser a resposta, um cara que jurou não mexer nas fundações do time mas, ao mesmo tempo, trazer a modernidade que ele ajudou a implementar em Miami. Daria para somar o “Grit and Grind” com o “Pace and Space” que prega velocidade, leveza e criação de espaços na quadra? No ano passado isso gerou um time por vezes vezes confuso, significou dar mais minutos a JaMychal Green ao invés de Zach Randolph, às vezes favorecer Wayne Selden e Troy Daniels sobre Tony Allen, mas no fim das coisas o time funcionou e fez o Spurs suar nos Playoffs.

Para esta temporada, porém, era hora de decisões mais drásticas. Acabaram os contratos de Randolph, Allen e Vince Carter e o time decidiu que era a hora de mudar e não renovou com ninguém. Ao invés disso investiu o pouco espaço na folha salarial para tentar reviver as carreiras de Tyreke Evans e Mario Chalmers. Os dois até estão bem, mas nada esteja salvando o Grizzlies. O time vivia, nesta temporada, uma versão ainda mais extrema do que  já havíamos chamado no ano passado de “confuso meio termo: eles são mais moderninhos, mas nem tanto assim; são da velha guarda, mas nem tanto assim. Quando as coisas dão certo está tudo lindo, quando dão errado bate a vontade de voltar à zona de segurança do passado. É o que gerou as reclamações de Marc Gasol.

É curioso analisar esta temporada do Grizzlies. Eles começaram voando com 5 vitórias nos primeiros 6 jogos, chegaram a bater o Houston Rockets DUAS VEZES (o time de James Harden só perdeu 4 até aqui) e o Golden State Warriors, mas depois começaram a perder e, como dissemos, são OITO reveses seguidos –seis desde que Conley se machucou. Mas vale dizer que metade dessas derrotas foram por diferença de só oito pontos ou menos, indicação de que o time tem perdido jogos apertados, tipo de partida em que o time era ESPECIALISTA em vencer no passado recente. Uma cesta certa aqui e ali em momentos-chave e talvez nada disso estivesse acontecendo.

Talvez só o tempo diga qual era a real situação no vestiário da equipe. Talvez o comportamento passional de David Fizdale seja pior do que a gente imagina, é possível que seu relacionamento com jogadores em geral não seja o que o Grizzlies quer para si, mas se for só pelo o que aconteceu em quadra, parece uma decisão precipitada. E se Gasol exige uma mudança em direção ao estilo de jogo do passado, o time vai ter que fazer MUUUUITO mais do que só mandar embora o técnico. Eles precisam refazer boa parte do elenco, o que será praticamente impossível já que eles estão presos a contratos ruins, longos e poucas moedas de troca.

Aos que defendem a teoria do “IMPLODE TUDO”, com trocas de veteranos por jovens e escolhas de Draft, um alerta: poucos times fizeram tanta BOBAGEM na seleção de novatos na última década. É quase inexplicável como esse time conseguiu tanto sucesso apesar dos erros e de não conseguir atrair nenhum mega-ultra Free Agent de renome. Vejam só quem o Grizzlies selecionou na primeira rodada do Draft desde 2008, um ano depois de acertarem em cheio com Conley: Kevin Love, Donte Greene, Hasheem Thabeet, DeMarre Carroll, Xavier Henry, Dominique Jones, Greivis Vásquez, Tony Wroten, Jordan Adams, Jarrell Martin e Wade Baldwin. 

Conhece alguém? Poucos, imagino. E até quando eles acertaram, na verdade erraram. Trocaram Love por OJ Mayo logo após o Draft; trocaram DeMarre Carroll antes dele virar o bom ala que vimos no Hawks;Greivis Vásquez jogou só um ano em Memphis antes de ser trocado pelo inexpressivo Quincy Pondexter. O resto pouca diferença fez e vários nem duraram na NBA. Dá um certo medo pensar nesse time começando uma renovação via Draft.

O Memphis Grizzlies sofre, portanto, uma crise de identidade, uma crise de resultados recentes e a estabilidade foi para o ralo agora que o time é o responsável por duas das últimas três demissões de técnicos na NBA. Sua principal estrela está insatisfeita e os boatos sobre trocas rondam a cidade. Além disso, como reportado pela ESPN há alguns meses, a franquia sofreu terríveis prejuízos na última temporada e foi um dos times que mais teve que receber dinheiro dos colegas ricos para acertar as contas. A melhor franquia de todos os Estados Unidos em 2013 parece que precisa achar um novo rumo em 2017.

Torcedor do Lakers e defensor de 87,4% das estatísticas.

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