Gordon Hayward escolhe o Boston Celtics

Como todos já devem saber a essa altura do campeonato, Gordon Hayward e seu lindo cabelo penteado para o lado está levando seus talentos para Boston, onde ele irá se reunir com seu antigo técnico Brad Stevens. A decisão foi anunciada na terça após o jogador conversar também com o Miami Heat e com o Utah Jazz, equipe que o draftou e que ele defendeu desde 2010. Não foi sem drama: Hayward foi o último grande Free Agent a anunciar seu novo time (vocês podem ver a lista inteira das contratações aqui) e teve até reviravolta no final, quando vazou a informação de sua decisão e ele correu para desmentir, dizendo que ainda estava indeciso. A internet pirou por umas horas, talvez com medo de mais uma crise de arrependimento à la DeAndre Jordan, mas parece que ele só queria finalizar o seu texto no Player’s Tribune e avisar o Jazz da sua decisão.

Cada um dos times tinha muito a oferecer a Hayward que, como todo bom jogador, costuma ter uma gama boa de times correndo atrás da chance de lhe pagar milhões de dólares. O papo de ter ficado em dúvida até o último minuto, neste caso, soa verdade. As opções eram ótimas:

O Miami Heat corria por fora, mas não era para ser desconsiderado. Já há algum tempo o time tem ficado famoso na NBA por ser o lugar que tira o melhor de todo jogador, que é lá que cada um deve ir para alcançar o seu auge técnico e físico. Na última temporada até escrevemos sobre como todos os jogadores do time tinham perdido peso e ficado mais fortes do que nunca na carreira. A equipe também tem nomes já consagrados como Pat Riley no comando, Erik Spoelstra como técnico e títulos no currículo, coisas que jogadores levam em consideração. Isso combina com Hayward, que é mais um daqueles jogadores bitolados por treino, que não se conforma em não fazer alguma coisa bem e que todo santo ano adiciona mais coisas ao seu arsenal basquetebolístico. O seu agora ex-técnico Quin Snyder já disse que era sempre um desafio ficar criando jogadas novas para tirar mais das coisas que Hayward, de repente, estava fazendo melhor.

O lado ruim da proposta do Heat é que ela não era lá muito diferente da do Utah Jazz. Os dois times tem boas peças para colocar em volta dele, mas nenhum mega super All-Star que muda a gravidade da NBA. De um lado tem Ricky Rubio, Rudy Gobert e Joe Johnson, do outro Goran Dragic e Hassan Whiteside. Os dois têm role players inteligentes e fáceis de jogar, seja Joe Ingles ou James Johnson, além de jovens talentos como Rodney Hood e Tyler Johnson. A favor do Jazz o fato do time estar junto há mais tempo e já ter conseguido resultados com esse grupo nos Playoffs, o Heat foi uma criação meio que às pressas, no improviso e no meio de turbulência nos últimos anos.

Sabemos, porém, que basquete não é tudo na vida. Uma coisa é morar na gelada e pacata Salt Lake City, outra é morar na sempre quente, badalada e linda Miami. A tentação de ter um casarão na beira da praia e aproveitar da rica gastronomia local é tentadora para qualquer um, mesmo que Hayward não seja um jovem atleta solteirão. Quem, mesmo casado e com dois filhos como o jogador, não quer morar numa mansão com o pé na areia e sair toda noite para alguns restaurantes premiados? Não vamos esquecer também que o estado da Flórida não cobra impostos sobre o seu salário, então Hayward receberia TODOS os milhões prometidos se fosse para o Heat.

O Jazz, por outro lado, tinha a seu favor o bom trabalho que fizeram ao longo da carreira de Hayward. Desde que o draftaram quando ele era só uma criança de 20 anos com cara de 11 até agora, que tem 27 e rostinho de 16. Na sua carta publicada no Player’s Tribune o jogador relembra com carinho como a cidade o viu se tornar adulto e como várias pessoas –para nós meros desconhecidos– cresceram ao lado dele no time. Caras secundários que ficavam lá pegando rebote pra ele e fazendo trabalhos pequenos hoje são parte importante da comissão técnica. De longe a gente pode se animar com a ideia de mudança e novos ares, mas quando é com a gente sempre dá aquele cagaço de dar o fora. Enfrentar o desconhecido é sempre motivo de medo, ainda mais quando o que você tinha em casa nunca foi ruim. Se o Jazz errou ao longo desses anos, foi em fazer sua reconstrução muito aos poucos. É difícil achar grandes erros em trocas ou contratações, mas o time nunca deu aquele salto vertiginoso de qualidade. Conseguiram tirar muito de Deron Williams com uma troca antes dele quebrar e aos poucos montaram um time bom de verdade. Mas ele chegou no seu objetivo só nessa temporada, a última de Hayward.

As duas oportunidades, portanto, eram ótimas, mas mesmo assim não foram o bastante para superar o Boston Celtics. E é aqui que devemos lembrar como ser um time bom, mesmo que sem chance de título, tem o seu valor. Na internet a gente sempre vê gente gritando um “DESMONTA TUDO” ou “IMPLODE E RECONSTRÓI” quando um time não está na beira de uma conquista, mas existem outros caminhos para o topo. Se uma equipe consegue ser boa ao mesmo tempo que se mantém flexível dentro das regras do teto salarial, ele vira um imã de jogadores. Muito se fala sobre a habilidade de reconstrução do General Manager Danny Ainge, que transformou as trocas de Rajon Rondo, Paul Pierce e Kevin Garnett em múltiplos ativos que impulsionaram essa reestruturação, mas dois dos maiores nomes do time só foram para lá porque o time ganhou jogos lá dentro da quadra. Não foram futuras escolhas de Draft e jovens promessas que convenceram Al Horford a assinar com o time como Free Agent há um ano, assim como não foi isso o usado para conseguir Hayward agora. Ambos foram para lá porque admiram o técnico Brad Stevens, porque viam que o time era bom e porque sentiam que a adição deles seria parte fundamental para lutar por coisas grandes nos Playoffs.

Muito tem se falado da relação entre Hayward e o técnico Brad Stevens, e com razão. O jogador não era tão famoso quando deixou o colegial e foi para uma universidade sem lá muitos grandes resultados, Butler. Os dois, juntos, fizeram dessa equipe uma força que ficou a centímetros de um título sobre Duke em 2010. E quando eu digo centímetros, é disso que estou falando:

A sensação de QUASE é algo que acho que nenhum atleta consegue superar. Hayward conta que pensou muito em continuar lá para tentar de novo, mas que eventualmente, após várias conversas com o próprio Stevens, decidiu não arriscar e ir para a NBA. No ano seguinte, por crueldade do destino, Butler voltou para a decisão e perdeu novamente. Será que seria diferente com Hayward por lá?

Em sua carta, Hayward diz que isso teve um peso. Ele quer se juntar com o seu técnico querido e tentar ganhar um campeonato junto dele, dessa vez na NBA, para deixar aquilo para trás e fazer o ciclo se fechar. As histórias que contamos para nós mesmos são decisivas para darmos direção e conduzirmos nossas vidas, sempre tão caóticas, e tenho certeza que aquela final de gosto amargo ainda tem peso na bússola que Hayward usa para criar seu caminho.

Tudo lindo e IMPORTANTE. Mas o que não podemos esquecer, porém, é que isso só é possível porque o Celtics já é um TIMAÇO. O grande ponto disso tudo é que a combinação do Celtics é muito tentadora para qualquer Free Agent: time com tradição, técnico espetacular, identidade dentro e fora da quadra, já tem bons resultados, a torcida é apaixonada, existe potencial para brigar lá topo por muitos anos, pode oferecer salários altos e, apesar de tudo isso, até outro dia tinha espaço em várias posições, garantindo o protagonismo de qualquer All-Star que chegasse. A cereja no topo é o citado apelo emocional, muito importante mas muitas vezes completamente fora do alcance do time. Todos ficamos com dúvidas nas últimas semanas, mas sempre que parávamos para pensar não fazia sentido não ir pra Boston. Aliás, depois das trocas de Jimmy Butler e Paul George e da ida de Paul Millsap para Denver, quem não quer ir passar férias na Conferência Leste né?

Dentro da quadra é difícil começar a descrever como o encaixe é perfeito para o Boston Celtics. Quer dizer, em algum time Hayward não seria um encaixe perfeito? O cara faz um pouco de tudo e faz tudo bem! De qualquer forma, grande vitória dos verdinhos. O time, apesar de vários jogadores bons em várias posições, não tinha um grande nome para executar a jogada mais básica da NBA atual, o pick-and-roll. O melhor do time na função era Isaiah Thomas, mas quase todos os times, especialmente nos Playoffs, já tinham suas armas para dobrar a marcação sobre ele após o bloqueio inicial e tirá-lo um pouco do jogo. Thomas é muito melhor com bloqueios mais longe do garrafão, quando ele já vêm em velocidade da defesa, ou recebendo a bola em movimento, em handoffs. Eu acho essa a sua jogada mais mortal, porque ele começa sem um defensor na sua frente:

Por essa característica de Thomas, pela ausência de um especialista em pick-and-roll e pela própria filosofia de jogo de Brad Stevens, o Celtics joga muito nesse estilo de muitos passes, handoffs e cortes sem a bola. Sabe quem é bom até demais nisso? Gordon Hayward. Na última temporada, como bem mostrou o The Ringer, Hayward fez um estrago com um mix de pick-and-roll, pindown e handoff que ele fazia regularmente com o Rudy Gobert. Isso entra FÁCIL no playbook do Brad Stevens:

Se o Celtics não mudar em nada o seu estilo de jogo, Hayward já se encaixa perfeitamente pelo bom passe, por ser inteligente ao se mexer e pelo bom arremesso de média e longa distância. Mas Stevens, esperto que é, disse que vai mudar algumas coisas. Agora ele tem no elenco um cara que pode pegar a bola na mão e marcar pontos no mano-a-mano contra qualquer defensor, pode criar jogadas no pick-and-roll e, o mais importante de tudo, CAVAR FALTAS! O Celtics nem sempre tinha facilidade para ir para a linha do lance-livre, que é um jeito bem fácil de marcar pontos e que conta com o bônus de causar problemas de falta para o adversário. Hayward é ótimo nisso, para dar um alívio no ataque.

Ao longo da carreira, e especialmente no último ano, Hayward foi refinando seu arsenal ofensivo. Neste ano acabou como o 7º melhor da NBA em eficiência ofensiva (pontos por posse de bola) entre os chamados “high volume players”, aqueles jogadores que finalizam ao menos 20 posses de bola por partida. O segundo da lista, aliás, foi Isaiah Thomas.

Mas apesar de entrar na lista desses jogadores que participam bastante da partida (é um All-Star, afinal!), Hayward é, por outro lado, uma das estrelas que menos concentra o jogo na NBA. Entre todos os jogadores que tiveram média de 20 pontos ou mais na última temporada, foi o que teve o menor usage rate, número que mede quantas posses de bola são finalizadas por um atleta. Em outras palavras: ele é o anti-Westbrook, não concentra tudo nele e combina com o ataque democrático do Celtics. Deverá fazer os 20 pontos dele todo jogo sem precisar que Isaiah Thomas, Al Horford, Avery Bradley ou até o novato Jayson Tatum façam grandes sacrifícios.

Mas se na quadra ele não exige isso, fora vai ser necessário. Para acomodar os seus 30 milhões de dólares anuais, o Celtics vai ter que abrir mão de algum jogador importante. Mesmo não renovando com Jonas Jerebko, Kelly Olynyk e outros, o time ainda não abre o espaço necessário. Provavelmente terão que trocar um jogador de salário maior e, logo, mais importante. A mídia dos EUA especula que deve ser alguém entre Avery Bradley, Marcus Smart e Jae Crowder. Todos são bons, ainda jovens e com salários relativamente baixos. Em teoria o Celtics deve receber boas propostas por eles, mas qual irão aceitar? Não podem pegar muito salário em troca (senão o problema continua) e não querem entregar esses bons atletas por nada. Até o próprio Jazz já entrou nos boatos para receber Crowder.

De qualquer forma, é uma perda que o Celtics está bem de fazer. O trio citado é parte importante da identidade que o time criou, mas ninguém ganha títulos na NBA sem pegar as estrelas. O Celtics, aliás, já juntou três e nem sabemos se isso será o bastante para superar LeBron James! Se Hayward tem um defeito é só esse, aliás. Ele é um bom defensor (muito bom, aliás), mas não está na categoria de Kahwi Leonard ou Andre Iguodala, esses caras que conseguem fazer LeBron não parecer um monstro gigante esmagando cidades em seriados japoneses. O cara para fazer isso no time era Paul George, mas o Celtics não está tendo a mesma sorte nas trocas que tem com os Free Agents.

Será que é o bastante para um título? Talvez não seja, mas esse não é sempre o ponto. O Celtics tem talento e JUVENTUDE o bastante para ao menos RONDAR o título nas próximas temporadas, e quando se monta um time isso já é uma grande vitória. O próximo passo tem a ver com a evolução tática do time, como cada jogador cresce de um ano para o outro, como os rivais estão se saindo e, claro, com uma boa dose de sorte. Na pior das hipóteses o Celtics se coloca no grupo dos times que, com um golpe de sorte (troca inesperada, lesão, jogo maluco nos Playoffs) pode ir para a Final da NBA ou vencer o campeonato. Tem umas 25 equipes que sonhariam em estar nessa situação.

Pelo lado do Jazz, o time já deixou claro que perder a sua estrela maior não é razão para implodir tudo. Eles confiam muito em montar um time ao redor de Rudy Gobert, já um dos melhores defensores da NBA, e o time tem um elenco talentoso e que sabe jogar bem em equipe, como até vimos contra o LA Clippers, quando o time segurou a onda durante alguns maus momentos de Hayward. Eles também perderam meu AMADO George Hill, mas ficaram mais novos trocando por outro queridinho do blog, Ricky Rubio, também ótimo defensor, para manter a identidade da equipe.

Se Rodney Hood e Derrick Favors conseguirem um ano sem lesões para tentar mostrar a melhora que ameaçavam há dois anos e Dante Exum dar o passo pra frente que se espera dele (começou bem na Summer League!), o time vai se manter competitivo. O bastante para lutar nesse Oeste onde parece que todo mundo rouba um All-Star do Leste? Aí é complicado, mas o técnico Quin Snyder sabe tirar o melhor desses caras medianos e a defesa deles tem tudo para continuar lá no topo da liga. É possível ser o Memphis dos próximos anos até surgir a próxima oportunidade de fazer um upgrade. Eles tiveram paciência nos últimos anos, não é hora de jogar tudo fora por causa de uma derrota.

Torcedor do Lakers e defensor de 87,4% das estatísticas.

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