Em 2010, LeBron James organizou um programa de televisão de meia hora, em formato de entrevista exclusiva, para anunciar qual seria o seu próximo time. Após o infame “The Decision” ele foi para Miami, onde o Heat organizou quase um festival de música para apresentar a sua grande contratação e prometer “não um, não dois, não três…” títulos. Em 2014, LeBron resolveu anunciar que estava “voltando para casa” em uma carta emocionante escrita a quatro mãos com o jornalista Lee Jenkins na Sports Illustrated. Desta vez, em 2018, um mero tweet da sua agência informa que ele irá para o Los Angeles Lakers em um contrato de 154 milhões por 4 anos:
— Klutch Sports Group (@KlutchSports) July 2, 2018
Depois disso, LeBron James embarcou para a Europa para tirar umas semanas de férias ao lado da família. Não houve nenhuma mensagem, nenhum vídeo, não teremos coletiva de imprensa imediata e a próxima aparição pública do jogador será só no fim do mês, em Cleveland, onde irá abrir mais uma escola da sua fundação “I promise“.
É curioso e simbólico que LeBron James esteja de mudança para Hollywood, o lugar mais midiático do planeta, onde as pessoas vão para aparecer para o mundo, e então tome a sua atitude mais tímida e discreta em toda a carreira. Segundo Lee Jenkins, aquele mesmo da carta de 2014, LeBron estava de férias no Caribe e no último sábado, véspera da data onde poderia negociar seu novo contrato, embarcou para Los Angeles. Ao chegar, ligou para Dan Gilbert, dono do Cleveland Cavaliers, para avisar que não iria voltar. Depois conversou com seu empresário, Rich Paul, que teve rápidas conversas com o Philadelphia 76ers e o Los Angeles Lakers, os dois times que LeBron cogitava ir. Por fim, o jogador ligou para Kobe Bryant e convidou Magic Johnson, atual presidente do Lakers, para ir a sua casa.
Segundo a imprensa americana, a conversa entre LeBron James e Magic Johnson mostrou um jogador bem diferente daquele afobado e faminto que voltou para o Cavs há alguns anos: ele teria dito que queria montar um time que pudesse brigar por títulos ao longo de muitos anos, que não ligava de ser o primeiro nome de peso a chegar e ficar à espera de outros. Também disse que acreditava que o Lakers tinha peças jovens e espaço salarial para desenvolver e transformar essa equipe nos próximos anos. Não é a típica estratégia de um atleta de 33 anos, mas foi a que ele adotou. No domingo à noite, antes de embarcar, mandou ligarem para o Lakers e soltarem a nota. O escolhido tinha o seu escolhido.
George Mikan,
Elgin Baylor,
Jerry West,
Wilt Chamberlain,
Kareem Abdul-Jabbar,
Magic Johnson,
Shaquille O’Neal,
Kobe Bryant,
& LeBron James. #Lakers pic.twitter.com/PxBnW7cZFv— Dan Duangdao (@DanDuangdao) July 2, 2018
Antes mesmo de entrar na NBA, LeBron James tatuou “The Chosen One” –“O Escolhido”– nas suas costas. Parecia um pouco precipitado na época, mas logo percebemos que estava bem próximo de ser verdade. Mas a vida de escolhido não é sempre fácil, você precisa ir lá e provar tudo: ganhar títulos, quebrar recordes, superar duelos individuais. Que outro tri-campeão, 4x MVP aparece nas discussões com tantos “poréns” quanto LeBron James? Ninguém questiona Dwyane Wade como fazem com LeBron porque Wade não deveria ser o melhor de todos os tempos, LeBron, sim. E ele nunca fugiu dessa corrida, não relaxou por um ano sequer. Ao sentir o tempo passando, partiu para o Miami Heat em busca de melhores condições para o título. Ganhou dois. Aí, então já pensando na História, no enfadonho LEGADO e nas suas promessas, voltou para casa para ganhar um título na amaldiçoada Cleveland. Ganhou também.
Dessa vez, pela primeira vez em muito tempo, LeBron James parece ter percebido que já ganhou a corrida. Boa parte de quem entende de basquete já o considera o melhor de todos os tempos, os que não acham isso não vão mudar de ideia nem se ele tiver média de 100 pontos e ganhar um título só com a mão esquerda. Ele tem seus anéis de campão, prêmios individuais para dar e vender e tantos recordes em tantas categorias diferentes, especialmente nos Playoffs, que fica impossível questionar qualquer coisa. O que as pessoas próximas a LeBron James dizem é que ele foi para Los Angeles por uma questão familiar e de negócios antes, só depois pelo basquete. É em LA lá que a família James quer viver, onde os filhos querem (e devem) jogar as categorias de base e onde ele queria finalmente se fixar a longo prazo. LeBron também nunca escondeu suas ambições de ter negócios além do basquete (já tem vários) e Los Angeles é um local mais adequado para isso. Não há exemplo de empreendedorismo pós-carreira maior do que Magic Johnson, aliás.
Mais importante que o valor financeiro do contrato (era o máximo permitido, claro), importante é notar os QUATRO ANOS de comprometimento de LeBron com o Los Angeles Lakers. Desde que deixou Miami, LeBron sempre fez micro contratos, em geral de dois anos com a opção de sair após o primeiro. É um jeito de manter a flexibilidade na carreira e pressionar o time atual: faça o que eu quero ou eu vou embora logo. O lado negativo é que isso faz o General Manager dar preferência ao sucesso imediato, o que geralmente causa problemas depois. Só ver o Cleveland Cavaliers, afogado em contratos ruins de jogadores veteranos só porque fizeram de tudo para dar a LeBron uma chance de título a cada ano. Essa mudança indica a Magic Johnson que ele tem tempo para agir. Se achar melhor esperar Kawhi Leonard virar Free Agent no ano que vem ao invés de dar meio time por ele agora, por exemplo, que seja assim.
Por que LeBron James iria confiar justo ao Los Angeles Lakers, uma franquia que tanto errou na última década, quatro longos anos no fim da sua carreira? Quero acreditar que foi o SORRISO de Magic Johnson, mas creio que não. Ao invés de agir como o Escolhido, como alguém que precisa salvar alguma coisa, alcançar um objetivo épico ou provar que é melhor, ele agiu como o escolhedor (sim, é uma palavra). LeBron James pediu que os times não fizessem grandes apresentações para convencê-lo, ele não queria ser seduzido, queria decidir. Vi nessa decisão alguém que queria, mais do que nunca, tomar as rédeas da vida e da carreira. Ele não queria necessariamente um time pronto, mas um lugar disposto e apto a abarcar todas as suas ambições pessoais e profissionais.
Se o Lakers teve um mérito nesse processo todo, foi o de ter se colocado como o quadro em branco perfeito para que LeBron pintasse seu futuro. O discurso da franquia era o velho e conhecido grito de grandeza, mas as atitudes foram de alguma humildade: o passado é glorioso, mas dizer que o time é maior que LeBron James não iria atrair o grande jogador da atualidade. Melhor era posar de pano de fundo ideal e deixar as coisas acontecerem. Não deu certo com Paul George, que foi seduzido por Russell Westbrook, Sam Presti e Oklahoma City, mas deu certo dentro da atual situação de vida e carreira de LeBron.
A presença de Magic Johnson, o trabalho de Luke Walton e os bons jovens criaram, finalmente, uma impressão de que o Lakers não era aquele tapete antiquado e caro da casa da sua avó. Há um ar de novidade para somar à camisa famosa. E são infinitos cenários possíveis quando se vê que o time tem Lonzo Ball, Brandon Ingram, Kyle Kuzma e Josh Hart, que podem crescer dentro do time no futuro próximo ou serem trocados por nomes de mais peso, além de espaço salarial e a chance de renovar Julius Randle. Até as contratações BIZARRAS que se seguiram logo depois da chegada de LeBron — Lance Stephenson (POIS É), JaVale McGee e a renovação de Kentavious Caldwell-Pope — foram todas em contratos de um ano, mantendo a flexibilidade para a próxima offseason, quando também finalmente vão poder se livrar do contrato de Luol Deng, que estará no último ano. O único perigo era LeBron ter medo de ser a primeira peça e pagar para ver os próximos passos; quando ele topou isso, o negócio foi fechado.
Para os ansiosos torcedores do Lakers (e eu estou nesse grupo), a hora é de ter a mesma paciência e frieza que LeBron James aparentemente teve na hora da sua decisão. Não é o momento para festas e paradas por Los Angeles porque o time está longe de estar pronto: boa parte do quadro ainda está em branco. Deve-se decidir se a equipe vai ou não gastar seus ativos para conseguir Kawhi Leonard, se vai esperar o próximo ano para tentar contratá-lo, quais dos jovens têm mais potencial, quais deles se encaixam melhor com LeBron e quais são os outros nomes que já estão na mira para 2019. É preciso até ver se (ou quando) a idade de LeBron vai finalmente começar a forçar ele a cair de produção.
É muita coisa e o caminho não é fácil, especialmente numa liga com Golden State Warriors, Houston Rockets, Boston Celitcs e Philadelphia 76ers babando pelo poder, mas o primeiro e mais difícil passo já foi dado: LeBron James usará o uniforme roxo e dourado pelos próximos quatro anos.