Quando Lonzo Ball foi apresentado ao novíssimo centro de treinamento do Los Angeles Lakers, Magic Johnson, manda-chuva da equipe, fez questão de mostrar ao novo armador todas as camisetas aposentadas pela franquia e cravar: “queremos ver você lá um dia”. De um lado, um jogador sem um minuto sequer de quadra como profissional, do outro os números eternizados pela franquia mais exigente na hora de homenagear um ídolo. É preciso ser protagonista de múltiplos títulos para poder sonhar em entrar nesse panteão. No mesmo dia, Magic ainda cravou que Ball estava chegando e D’Angelo Russell saindo porque o time precisava não só de um All-Star, mas de um líder. “Apenas não quebre todos os meus recordes”, pediu Magic.
Mesmo fora do novo clube as coisas não eram menos megalomaníacas. Antes mesmo de Lonzo ser draftado, seu pai, Lavar Ball, tomou conta da mídia americana com suas frases absurdas e comportamento falastrão. Ele cravou que o filho já era melhor que Steph Curry e que levaria o seu time aos Playoffs logo em seu ano de estreia. O jovem jogador respondeu a tudo isso sempre do mesmo jeito: com o bico fechado.
Agora, depois de todo esse AUÊ, com meros 21 jogos na carreira e 20 aninhos ainda recém-completados, Lonzo Ball já provoca dúvidas sobre se pode ser tudo isso que pintaram. Dentro da quadra pesa o seu péssimo aproveitamento de arremessos, hoje com 31% no geral e PÍFIOS 22% da linha dos 3 pontos. Ambas marcas entre as piores da história para começos de carreira na NBA. No lado da liderança tão exaltado por Magic, ele toma algumas boas bordoadas virtuais por ser muito calado e especialmente por quando decidiu simplesmente IGNORAR uma briga entre seu companheiro Kentavious Caldwell-Pope e Tyler Ulis, abandonando uma regra universal da BROGDAGEM que manda ir lá para separar ou dar voadora.
Se fossem só esses os problemas já seria ruim, mas tem mais: o desempenho irregular do armador fez o técnico Luke Walton o deixar de fora de dois quartos períodos seguidos na última semana. E ele segue na mira de todos os rivais do Lakers: desde sofrer bullying de Patrick Beverley no jogo de estreia até ser alvo de piadas nas fotos de Joel Embiid no Instagram, passando por rivais que farejam sangue e o atacam no mano-a-mano só para provar um ponto, o filho do Lavar tem um alvo gigante no meio da testa. Como desgraça pouca é bobagem, até na vida pessoal existem distrações. Seu irmão LiAngelo Ball foi PRESO NA CHINA após ser pego furtando uma loja com colegas da UCLA e só pode voltar aos EUA após uma semana de detenção, tensão e interferência do governo americano.
Para compensar tantos problemas, Lonzão ao menos respondeu com alguns bons momentos. Já marcou 29 pontos em um jogo contra o Phoenix Suns e registrou dois triple-doubles na jovem carreira. Volta e meia ele mostra aquela precisão fantástica nos passes que o consagrou no basquete universitário e sua defesa tem sido até bem melhor do que o que era previsto há alguns meses. Entre muitos problemas e alguns sinais animadores, o que tirar desse começo de Lonzo Ball na NBA?
O mantra do jovem técnico Luke Walton desde o último ano segue sendo o de que a coisa mais importante no processo de montagem do time é a melhora constante. Tudo bem errar desde que eles sejam percebidos, assimilados e atacados. O caminho para ser um time realmente perigoso ainda é longo, mas ver o desenvolvimento de Brandon Ingram desde o ano passado tem sido animador, assim como a melhora da defesa da equipe, que foi a PIOR da NBA na última temporada e que neste ano acabou o primeiro mês de temporada com a QUARTA MELHOR marca da liga. Com Lonzo, portanto, não é diferente. Ele vai continuar jogando e tendo espaço desde que seus erros sejam vistos, discutidos e trabalhados. Após algumas partidas ruins do armador, Walton disse que ficou feliz de ver o armador puto, incomodado e treinando por horas a fio. Não é garantia de sucesso, mas é um começo.
Até aqui os dois grandes problemas de Lonzo Ball têm sido o aproveitamento de seus arremessos –de todos os tipos– e a sua falta de agressividade com a bola. As duas coisas estão, claro, relacionadas. As bolas não caem, Lonzo para de agredir, hesita nas decisões, é ignorado pela defesa e deixa de ser efetivo como pode, o ciclo vicioso precisa parar de alguma forma.
Sabe-se há tempos que o armador não é dessa classe de atletas fenomenais como Russell Westbrook, Kyrie Irving ou até o novato Dennis Smith Jr. Falta explosão para se livrar da defesa em uma infiltração, seu drible não é nada de mais e ele ainda é muito magricela para dar conta de absorver contato e ainda conseguir finalizar uma bandeja com equilíbrio e precisão. As vezes que tentou fazer isso na marra, só para mostrar agressividade, tomou tocos relativamente fáceis:
Sem conseguir infiltrar, Lonzo tem ficado bastante intimidado e por muitas vezes hesita demais quando tem espaço para atacar. Sem a tal explosão, hesitar é mais um tempo perdido que o faz ser engolido pelas defesas. Ele então toca a bola de lado, parece medroso e quase nunca recebe um passe de volta. Isso é fácil de notar porque Lonzo é um ponto fora da curva no elenco atual. O Lakers está carregado de jogadores quem têm até EXCESSO de confiança e, ao contrário de Lonzo, nenhum tesão em passar a bola. Vendo a passividade do armador, Brandon Ingram, Jordan Clarkson e especialmente Julius Randle e Brook Lopez não têm nenhum pudor em abaixar a cabeça e tentar o arremesso por conta própria.
O sonho de Luke Walton de ver seu time dar 300 passes por jogo está longe da realidade: o Lakers dá 279 passes por partida, 6º time que MENOS passa na liga. Para um jogador que gosta de rodar a bola de um lado para o outro, não é o cenário ideal para ele brilhar também. Nesse sistema de jogo, o arremesso que volta e meia sobra para Lonzo Ball é o de três pontos, consequência de seu marcador o deixar sozinho para cobrir algum ataque dos caras citados acima. O armador DEVERIA ser bom nesse chute, teve bom aproveitamento no passado, mas aquela mecânica horrível não tem dado resultado entre os profissionais.
Aqui a confiança pesa também, mas não tem segredo. Se as chances estão aí a cada jogo ele precisa treinar, treinar e seguir arremessando. Desistir dessa parte do jogo, sem ter a condição de atacar a cesta, seria quase como se retirar do ataque nas partidas. Impensável. Os melhores momentos de Lonzo Ball no ataque do Lakers tem sido quando ele consegue pegar a defesa em movimento e tirar proveito da sua visão de jogo. Isso acontece quando ele lança precisos passes de longa distância para acelerar e transformar um ataque comum em contra-ataque…
…ou quando ele consegue contornar suas falhas, entrar no garrafão, chamar a atenção da defesa e então dar o passe para quem fica livre:
Embora o Lakers não precisa que Ball seja um grande pontuador, desenvolver a sua agressividade é fundamental para que apareçam esses espaços que ele precisa para enfiar os passes. É um drama parecido com o que Rajon Rondo e Ricky Rubio enfrentaram ao longo de suas carreira e que até LeBron James teve que enfrentar no seu primeiro ano, quando ninguém respeitava seu arremesso e ele aprendia os atalhos para penetrar defesas muito fechadas no garrafão. Aliás, Ball, Rubio e LeBron estão presentes em uma lista curiosa: os jogadores que tiveram 7 ou mais jogos com aproveitamento pior do de 30% nos arremessos em seus primeiros 20 jogos. Acima deles está Jason Kidd, a eterna comparação de Lonzo desde os tempos de UCLA.
Lonzo Ball is the 5th player since 1983 to have 7+ games in his first 20 with a FG% under 30% (min. 30 MP). The good news is some of these guys turned out all right https://t.co/Jgj95sLfkM pic.twitter.com/5nbtaxftvL
— Basketball Reference (@bball_ref) November 22, 2017
De todos esses, se deram melhor aqueles que conseguiram aprender um jeito de machucar a defesa adversária de alguma forma. Pode ser aprendendo a arremessar, pode ser aproveitando esse espaço dado pela defesa para atacar a invadir o garrafão ou se focando em jogar no contra-ataque na maior parte do tempo. O que vale é obrigar a defesa a se mexer, não dá pra dar passe bonito se o adversário está bem postado e sem ser ameaçado.
Dentro do próprio Lakers vimos com Brandon Ingram como um ano de trabalho físico faz diferença. O ala, agora bem mais forte e não parecendo mais um gravetinho, consegue atacar a cesta e fazer seus pontinhos. É uma esperança para Lonzo, que certamente precisa aprender a entrar no garrafão sem ser jogado de um lado para o outro como se fosse uma criança. Ser lento não é um problema, Kyle “Slo-Mo” Anderson tá aí no Spurs pra provar, mas precisa aguentar o tranco. E será que a comissão técnica vai tentar mudar sua mecânica de arremesso se a bola não continuar caindo? Por enquanto parece mais psicológico do que qualquer coisa, mas é uma possibilidade.
A parte que eu acho que não vai mudar tanto assim ao longo do tempo é a personalidade de Lonzo. Ele é mesmo um cara quieto, discreto e que não se exalta. Quando isso vem junto de atuações ruins, as pessoas associam com apatia, quando isso acompanha um pai falastrão, soa como se ele gostasse do HYPE montado a sua volta. O que eu vejo, porém, é só um cara introvertido. O fato dele não ter entrado no meio daquela briga que mostramos acima pode parecer ruim, mas eu confesso que faria o mesmo. Primeiro que essas brigas da NBA nem são de verdade, depois que já era o terceiro jogo entre as duas equipes no ano, todos com esses empurrõezinhos tolos. É muita imaturidade à toa e seria até melhor que outros jogadores tivessem essa atitude de não hiper valorizar as peitadas de macho adolescente. Para dar certo na NBA –ou em qualquer esporte de alto rendimento– ele precisa ser competitivo, determinado e saber lidar com os altos e baixos. Não sabemos isso sobre ele ou qualquer outro moleque de 20 anos, mas sabemos que isso não tem nada a ver com gritar, esbravejar, separar briga, dar carrinho ou tapa em uruguaio.
Se Lonzo precisa de mais atitude é só com a bola em jogo mesmo. No jogo em que ele foi eliminado do NCAA Tournament em UCLA, Lonzo recebeu marcação pressão de De’Aaron Fox em todos os centímetros da quadra , o jogo inteiro, e ao invés de abraçar o desafio e bater de frente, preferiu tentar rodar a bola e envolver os companheiros. Legal e altruísta na teoria, bate com os papos que ouvimos no Spurs e no Warriors, mas na prática ele era importante DEMAIS para o seu time para ficar tão fora do jogo. Talvez quando ele tiver mais confiança na sua capacidade de pontuar ele consiga adicionar esse fogo de botar a bola embaixo do braço e assumir as rédeas do que vai acontecer. Eu acho que é possível porque vemos essa ânsia e determinação dele na DEFESA, especialmente quando ele está correndo para cobrir um erro seu ou de um companheiro:
Tem um vídeo só com bons momentos de Ball marcando John Wall, Damian Lillard e Kyrie Irving. Ele não tem nem físico para ANULAR esses caras, às vezes ele erra, mas tem uma disciplina exemplar para alguém tão novo. É uma área do jogo dele que esperávamos que fosse sofrer mais nesse começo de carreira e que está ajudando bastante o Lakers a ser, ao menos por um mês, uma das melhores defesas da liga:
O resumo disso tudo é que Lonzo Ball é um novato NORMAL. Sim, é broxante para quem esperava revolução imediata, mas não é o fim do mundo que o Twitter pinta também. Dá vontade de já querer saber tudo sobre o cara, mas é simplesmente muito cedo. Gosto de lembrar dos candidatos a MVP dos últimos anos: Kawhi Leonard demorou uns três anos para realmente começar a mostrar que era mais que um cara que defende bem e chuta bolas de 3 da zona morta; James Harden foi discretíssimo quando novato e só fomos ver sua habilidade nos passes lá pra frente; Russell Westbrook passou dois anos tentando convencer nós, seu técnico e ele mesmo de que poderia se adaptar à posição de armador na NBA. Lonzo pode ser qualquer um deles ou pode ser o novo Anthony Bennett ou Kwame Brown, ambos ENGOLIDOS pela pressão de jogar na NBA. Ou pode ser –essa é para quem ouviu o podcast– um mero Evan Turner.
Em uma situação normal dava pra ter otimismo. Existe a perspectiva dele ser bom e alguns talentos nível ELITE DA NBA, especialmente o passe e visão de jogo. Mas Lonzo não está num vácuo. Ele está num mundo onde todo mundo fala dele, em que seu pai fez o mundo pegar birra do seu sobrenome, em que Magic Johnson prometeu um líder salvador do mundo e tudo isso numa franquia acostumada a vencer e com PRESSA de voltar ao topo. Responder “daqui uns anos ele vai ser ótimo” não alivia a pressão de um time que já está na espera há uns bons anos. Além do desenvolvimento físico e técnico, Lonzo Ball vai precisar descobrir como deve lidar com esse entorno. Segue quieto e só treina? Tenta ser menos surfista-tranquilão-Califórnia? Dá piti e manda todo mundo parar de encher a porra do saco dele?
A comparação que eu sempre gostei do Lonzo Ball e que TODO MUNDO fazia antes do Draft era a com Jason Kidd. E acho que está na hora de lembrarmos dela. O atual técnico do Milwaukee Bucks, um dos grandes armadores da história, acabou sua temporada de novato com médias de 11,7 pontos, 5,4 rebotes e 7,7 assistências. Conseguiu diversos triple-doubles, mas acertou só 38% de seus arremessos (27% de 3 pontos) e viu sua aura de liderança ir para o ralo quando se desentendeu com seu parceiro Jim Jackson por causa da cantora Toni Braxton (!!!). O Dallas Mavericks do futuro viu o seu trio, que ainda contava com o terceiro “J”, Jamal Mashburn, nunca acontecer de verdade. Kidd acabou trocado e só no Phoenix Suns passou a ser o cara que lembramos hoje e que depois atingiu o auge quando foi para o New Jersey Nets. Demorou para ele aprender a liderar, para conseguir virar um pontuador, para virar o rei dos contra-ataques e ainda mais para desenvolver um bom arremesso. Se o exemplo mais próximo de Lonzo Ball passou por tudo isso, não deveríamos entrar em pânico porque os primeiros jogos foram complicados. Vale a análise próxima, vale apontar os dedos para os erros e dar palpites sobre o que TEM QUE melhorar, mas é cedo demais para cravar sucesso ou fracasso.