Os pivôs armadores de Denver

As últimas duas semanas foram movimentadas para a família Plumlee, com dois dos três irmãos sendo trocados para diferentes equipes. Primeiro foi a vez de Miles Plumlee, que estava recebendo poucos minutos no Bucks apesar do contrato robusto, ser enviado para o Hornets em troca de Spencer Hawes e Roy Hibbert, dois outros pivôs que também não possuem muito espaço na NBA atual. E agora foi a vez de seu irmão mais novo, Mason Plumlee, ser trocado para o Denver Nuggets após uma última temporada surpreendente em Portland.

O Denis comentou recentemente por aqui sobre como o Blazers foi pego de surpresa pela melhora do elenco na temporada passada e gastou uma fortuna para manter jogadores que não necessariamente melhoraram na temporada atual. Já acima do teto salarial, a equipe teria que gastar ainda mais na temporada que vem para manter Mason Plumlee, que recusou uma simples extensão de contrato por achar que merece muito mais. De fato, nos Playoffs passados Plumlee se mostrou uma das peças mais importantes da equipe, e não foi naquilo que costumamos esperar de um pivô tradicional: sua contribuição aconteceu na cabeça do garrafão através de passes precisos para seus companheiros.

Com a marcação dobrando frequentemente em cima de Damian Lillard e CJ McCollum, demais marcadores apertando no perímetro e a ausência de um pivô que pudesse estabelecer posição embaixo da cesta para receber passes em profundidade, restava aos armadores do Blazers se livrar da bola em direção ao pivô que havia feito o corta-luz, em geral Mason Plumlee. Recebendo a bola geralmente no perímetro ou na cabeça do garrafão, o pivô do Blazers tinha duas opções básicas: arremessar dali, o que certamente é uma vitória para o adversário pois sua mira de longa distância é obviamente inferior aos dois grandes arremessadores da equipe; ou tentar devolver a bola para a mão de suas estrelas para que a jogada recomece, correndo o risco de que a defesa repita a operação e a mesma jogada se repita em looping infinito, até o final dos tempos ou alguém sensato implodir essa equipe. Se o Blazers se tornou um time acima da média foi porque Mason Plumlee não fazia o básico, preferindo ao invés disso usar sua incrível visão de jogo para criar linhas de passe para os companheiros e girar a bola em busca de espaços. Quanto mais agressiva a marcação adversária era contra Lillard e McCollum, mais Mason Plumlee se tornava o armador da equipe.

Vejam no vídeo acima um dia típico na vida de Mason Plumlee. Ao invés de se tornar um “plano B” de emergência para quando a marcação dobra nos armadores, o pivô agora sai constantemente do garrafão para receber a bola e, longe da cesta, encontra seus armadores cortando para a cesta ou solta a bola bloqueando os defensores para que outros jogadores arremessem de média ou longa distância. Geralmente marcado pelos outros pivôs, Plumlee pode acionar seus companheiros que partem em direção a um garrafão menos protegido, sem o defensor de aro principal, e força um ou mais adversários a estarem sempre lhe marcando diretamente ou posicionados em suas linhas de passe. Mesmo sem pontuar, já que não tem um grande arremesso, nem ser uma presença realmente imponente no garrafão, Plumlee precisa ser respeitado no ataque e cria situações simples de arremesso para os companheiros.

O problema está no fato de que Mason tem muita dificuldade de colocar a bola no chão, algo que ele é obrigado a fazer para puxar alguns contra-ataques e se reposicionar contra algumas defesas; o pivô acaba ficando muito estático e o resto do elenco precisa todo se movimentar em função dele. Num time que decidiu que todo o seu potencial ofensivo passará nas mãos de dois armadores pontuadores que produzem melhor com a bola nas mãos e que custam fortunas incríveis aos cofres da franquia, o pivô acaba prejudicando o esquema tático planejado ou, pior, acaba sendo pouco e mal utilizado. Defensivamente a situação de Mason Plumlee é ainda pior, pois o pivô não é um grande defensor e nem consegue ser uma figura fisicamente incômoda para os adversários no garrafão, e embora a defesa da equipe seja razoável próxima à cesta, é justamente na defesa geral que o elenco mais sofre, estando entre as piores da NBA. Talvez com um grande defensor embaixo do aro, daqueles que alteram arremessos simplesmente por deixar seus adversários com medo do toco, os demais jogadores do Blazers pudessem ser mais agressivos na marcação do perímetro sem temer serem superados por um corte em direção à cesta. Conforme a equipe via a classificação para os Playoffs ficar mais longe com algumas sequências de derrotas cruciais, ficava mais evidente que Plumlee não era a direção que a diretoria queria ir com esse time.

O Denver Nuggets, no entanto, parece estar no caminho inverso. Alcançou a oitava vaga e parece mais e mais próximo dos Playoffs conforme tira a bola das mãos dos seus armadores e aposta num esquema tático que funcione ao redor de Nikola Jokic, o pivô sérvio que está chocando a NBA com sua impressionante visão de jogo e capacidade de armar o jogo. No começo da temporada o Nuggets ainda apostava em um garrafão fisicamente dominante, dando mais espaço para Jusuf Nurkic e Kenneth Faried e usando Jokic como reserva basicamente para lutar pelos rebotes ofensivos. Mas rapidamente Jokic mostrou, assim como Plumlee, uma capacidade de passar a bola que não se espera de um pivô – e que, portanto, muitos técnicos simplesmente não sabem como aproveitar. Historicamente, pivôs que passam bem a bola usam essa característica em momentos pontuais, através de sua própria criatividade, como uma solução individual para um problema que tenha surgido em quadra. Mas o técnico Michael Malone percebeu a pérola mal utilizada que tinha em mãos e começou a usar Jokic como engrenagem central para o funcionamento do ataque – na prática, assumindo a maior parte da armação da equipe. Vale assistir aos melhores momentos do pivô na vitória em cima do Bucks, quando marcou seu primeiro triple-double:

Percebam que, ao contrário do vídeo do Plumlee que vimos anteriormente, Jokic praticamente não coloca a bola no chão. Não é preciso que ele se mova, bata a bola, se reposicione ou puxe contra-ataques, porque todo o resto da equipe está se movimentando para que a jogada aconteça – estão jogando EM FUNÇÃO dele, maximizando seu potencial. Ele não precisa encontrar soluções sozinho ou inventar linhas de passe, podendo usar sua visão de jogo apenas para encontrar o MELHOR ÂNGULO para que a bola chegue onde deveria mesmo chegar, em geral nos armadores cortando para a cesta rumo a bandejas simples. O fato de Jokic ser um excelente arremessador faz com que os marcadores adversários tenham que defendê-lo ainda mais de perto, o que abre muito espaço para infiltrações dos companheiros desde que ele encontre os caminhos corretos para os passes. Enorme, inteligente e com movimentos rápidos, completamente avesso às mecânicas desnecessárias, Jokic é justamente o homem certo para garantir que a bola chegue onde deveria. Reparem que ao pegar rebotes ofensivos, em geral fruto de puro posicionamento, Jokic sequer segura a bola com as duas mãos, usando a mesma mão que tomou controle da bola para colocá-la em direção à cesta. Não há receio ou firula, apenas uma técnica limpa que retira tudo que é desnecessário. Enquanto um braço e o corpo protegem seu espaço pessoal para garantir os rebotes, o outro braço faz o mínimo esforço para pontuar; quando está marcado de perto, com o centro de gravidade pressionado, apenas um braço cria o espaço necessário, recuando para trás da linha do corpo e conseguindo passar a bola em ângulos improváveis.

É impressionante como o foco em Jokic tem melhorado algumas questões que assolam o Nuggets há tempos: os armadores, que não tem um grande aproveitamento nos arremessos de fora, estão conseguindo infiltrar mais e pontuar de outras maneiras; os contra-ataques estão mais velozes com os passes diretos do pivô para a quadra de ataque; os arremessadores estão sendo mais acionados, já que a quadra está mais espaçada com a marcação tão focada em cima de um pivô que não precisa se situar no garrafão. Jokic traz o melhor de dois mundos: consegue lutar por rebotes ofensivos e garantir os defensivos porque é um pivô grande que sabe como usar seu tamanho, seu peso e garantir posicionamento; mas sabe também jogar no ataque praticamente sempre longe da cesta, atraindo a marcação especialista em tocos para fora do garrafão e espaçando a quadra como se fosse um arremessador de três, com a vantagem de saber também acionar os companheiros para arremessos ainda mais simples, os de dois pontos embaixo da cesta. O Nuggets parece ter acordado para MAIS UMA solução para a questão dos pivôs sem espaço na NBA atual: focar o jogo em pivôs arremessadores e/ou passadores sem abrir mão de espaço e posicionamento dentro do garrafão quando necessário. É possível que vários pivôs se encaixassem nesse modelo, mas é difícil que as oportunidades surjam para que possam mostrar esse lado de suas habilidades. Plumlee mostrou em Portland quase que por acaso, mas não se encaixou tão bem dentro da proposta da franquia; Jokic simplesmente saiu muito melhor do que se esperava, e o Nuggets não teve medo nenhum de adequar seus objetivos, propostas e sonhos ao redor dele.

A dedicação ao Jokic é tão grande por parte do Nuggets que não apenas Jusuf Nurkic foi trocado, abrindo mais minutos no garrafão, mas também Mason Plumlee chega agora à equipe. Como a chegada de um jogador semelhante mostra dedicação ao pivô sérvio? É simples: atualmente, o Nuggets é obrigado a jogar com dois esquemas táticos completamente distintos, um quando Jokic está em quadra e pode espaçar a quadra e passar a bola, e outro quando ele está descansando e o time precisa de outras soluções para girar a bola. Estar comprometido com um ataque que passa por Jokic é encontrar maneiras de que esse esquema tático funcione o tempo inteiro, melhorando o entrosamento da equipe e tornando as respostas e soluções dos jogadores automáticas. Para isso, portanto, é preciso de alguém que, como Jokic, possa manter o esquema tático intacto, só que vindo do banco. Mason Plumlee, pouco reconhecido e aproveitado em Portland, agora será fundamental como rede de segurança para o Nuggets poder apostar integralmente em Jokic. É até possível que os dois joguem juntos em momentos específicos de algumas partidas, mas o mais importante é que o Denver Nuggets está agora oficialmente pulando de cabeça em uma nova e promissora identidade, uma que reconstrói os pivôs para o jogo moderno – algo com o qual eu não poderia estar mais feliz. Com pivôs espaçando a quadra com pontes aéreas, pivôs chutando de três pontos, pivôs dominando defensivamente e pivôs assumindo a armação de suas equipes, o ano não está nada fácil para aqueles que achavam que os pivôs eram uma raça em extinção.

Já o Blazers recebe algo que interessa mais aos seus planos atuais – um pivô mais físico e levemente superior na defesa do garrafão – e, principalmente, aos planos futuros: não precisa passar ainda mais do teto salarial ao não renovar com Plumlee e ainda ganha uma escolha de draft na troca, a do ano que vem pertencente ao Grizzlies. Com ela, o Blazers agora tem três escolhas de draft para a próxima temporada, incluindo a escolha deles próprios e a escolha do Cavs, que veio na antiga troca do Anderson Varejão. Com isso o Blazers pode optar por três novatos com micro salários e talvez se livrar de alguns veteranos caros demais para a próxima temporada, ajudando um pouco as finanças. É um alento para o futuro, mas talvez o presente cobre seu preço: com Blazers e Nuggets lutando diretamente pela oitava vaga dos Playoffs, ter dado ao adversário aquilo que ele mais queria para construir uma identidade coerente em quadra pode ser um preço simplesmente caro demais.

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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