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Quando o Boston Celtics trocou o Kendrick Perkins e todo o resto do seu banco de reservas, eu já na hora disse, “Pronto, agora o Chicago Bulls é mesmo o melhor time do Leste”. Não seria doido de já sair cravando que eles vão estar nas Finais da NBA, afinal o Boston ainda tem um timaço e mais de um mês para entrosar toda a nova gangue e seu novo estilo de jogo mais leve e baixo. E o Miami Heat em um dia bom pode vencer qualquer time do mundo por 20 pontos de vantagem só usando a mão esquerda, é saber quando vão conseguir ser mais regulares. Mas enquanto os dois adversários tem lição de casa para o fim da temporada regular, o Bulls já está em ponto de bala e prontinho para os playoffs.
Isso é impressionante, pra não dizer assustador e inexplicável, porque o Bulls era, antes da temporada, uma clara aposta para “time do ano que vem”. Primeiro pelos adversários, Celtics e Magic já pareciam prontos e o Heat parecia simplesmente bom demais, estavam bem a frente do Bulls, que tinha começado quase do zero. Boa parte do elenco, assim como o técnico, chegou apenas nesse ano. Com Tom Thibodeau vieram Carlos Boozer, Kyle Korver, Ronnie Brewer, CJ Watson, Omer Asik e Brian Scalabrine. E sem contar que eles queriam muito um armador da posição dois e não conseguiram os mais desejados, ficando com Korver, Bogans e Brewer, todos os três contratados para serem reservas. Na teoria era time pra fazer bonito nesse ano mas brilhar só no futuro.
O que a gente não contava era que o Tom Thibodeau se destacaria como um dos principais técnicos da temporada e colocaria o seu estilo de jogo logo nas primeiras semanas. O responsável pela espetacular defesa do Celtics nos últimos anos montou mais uma muralha: O Bulls é o time que menos toma pontos por posse de bola (0.99 por posse), a segunda em total de pontos por jogo (atrás do Celtics), a terceira que menos permite pontos no garrafão, a que menos permite bolas de três pontos e por aí vai em qualquer quesito que você imaginar! Nos últimos 12 jogos eles tomaram apenas 980 pontos, o menor número em qualquer sequência de 12 jogos na bem rica história da franquia. Thibodeau com seus 73% de aproveitamento tem o segundo melhor número em técnicos estreantes na história da NBA e o Bulls com 23% de melhora em relação ao ano passado é o time que mais evoluiu na temporada. Poderia passar o dia coletando números que mostram como esse time tem sido espetacular.
Boa parte do crédito para essa melhora é do treinador, que aproveitou a chance de ser o primeiro técnico do Bulls em 10 anos a ter um ala de força de verdade e além de montar a defesa forte fez um ataque simples e eficiente, ele é certamente um dos líderes para ganhar o prêmio de técnico do ano. Mas outra parte enorme pode ser dada para o Derrick Rose, que concorre a outro prêmio, o de MVP. Aqui já pegamos muito no pé do Rose, principalmente o Danilo, para fúria dos torcedores do Bulls, mas tudo o que você acha de defeito no moleque ele arruma em algumas semanas e você fica com a cara no chão. Agora que ele é um melhor arremessador e passador, o que podemos falar de mal dele? Da defesa? Talvez ele não seja um Rajon Rondo da vida, mas dificilmente você vê ele fazendo bobagens épicas e ele sabe o seu papel na defesa coletiva do Bulls. A minha crítica maior no começo da temporada era que ele segurava muito a bola, mas desde aquela época já admitia que também era por falta de opção. Todos os outros jogadores do time são mais finalizadores do que caras que podem tirar um pouco do peso das costas do armador, com exceção, por incrível que pareça, do Joakim Noah, que é excelente passador.
Por isso a maior crítica para o Rose não é exatamente para ele, mas para o time. O armador, aliás, só acaba parecendo ainda melhor por render tão bem nessas circunstâncias. Ele tem o segundo maior “usage rate” da liga, essa estatística é uma estimativa para saber em quantas posses de bola os times usam certo jogador, só o Kobe está à frente de Rose em toda a NBA. E sendo o jogador mais usado do time e um dos mais usados na NBA ele responde fazendo 42% dos pontos do Bulls, nenhum outro jogador na NBA domina tanto a pontuação de sua equipe. Ou seja, se o time precisa dele e quer que ele faça tudo, ele vai lá e faz. Precisa de bolas de três, infiltrações, lances livres, o moleque faz tudo! Só de pensar que ele já evoluiu tantos aspectos do seu jogo e ainda tem 22 anos é de dar arrepios, o time está pronto pra vencer agora, mas tem tanto futuro pela frente que nem tem porque esquentar com uma eventual derrota.
Nessa temporada quase perfeita do Bulls apenas duas coisas preocupam. Uma delas é essa falta de um jogador para dividir responsabilidades com o Rose na hora de segurar a bola, distribuir o jogo e criar o próprio arremesso, não é porque ele dá conta que o time não deveria procurar ajuda. Todo mundo estava esperando mudanças no movimentado último dia de trocas e o Bulls preferiu não fazer nada, não arriscar, mesmo com propostas por Omer Asik aparecendo aqui e ali. Será que valia a pena ter arriscado para tentar um título imediatamente ou se está dando certo do jeito que está não tem porque se livrar de bons jogadores e tentar de novo ano que vem? A explicação mais provável está nessa matéria do Henry Abbott no TrueHoop. Nela ele comenta como esse elenco do Chicago Bulls tem um senso de união difícil de encontrar na NBA.
Ele começa o texto citando o MIT Sloan Sports Analytics Conference, o encontro mais nerd de basquete que eu expliquei no fim desse post. Abbott diz que no meio de tanta análise estatística pesada, psicologia e comportamento, todo mundo concordou que não dá pra fazer nada disso sem gostar de basquete. Para chegar nesse nível e ter motivação de lutar tanto, se dedicar e se ferrar tanto, tem que amar esse negócio de colocar uma bola laranja em um cesto furado. E essa equipe do Bulls parece que é assim bem apaixonada, por basquete e uns pelos outros. “Você não acreditaria em quanto a gente manda mensagens de textos uns para os outros”, conta Taj Gibson. E a combinação que eles conseguiram é uma das mais difíceis de se encontrar: tem jogadores que gostam um do outro, que não saem se estranhando por aí e que se incentivam o tempo todo, mas ao mesmo tempo eles não são só festa e brincadeira, o técnico Thibodeau é conhecido pela postura quase militar que cobra disciplina, atenção, dedicação e até chama de surpresa alguns jogadores para treinar em dias de folga. Mas os mesmos admitem que ao mesmo tempo a relação é boa e de carinho. É quase um comercial de margarina mas com negões gigantes no lugar das criancinhas. O Joakim Noah, bem famoso por ser emotivo e meio maluco, deu uma declaração bem legal que diz bastante sobre como ele e o time estão encarando a temporada:
“Eu estou fazendo algo que sempre sonhei desde criança, estou jogando no Chicago Bulls. Jogando para um time que todos dizem que está na briga pelo título. Tenho um técnico que é apaixonado pelo que faz, um ótimo professor, e um MVP atuando no meu time. E eu valorizo isso, não estou preocupado com o futuro e nem com o que aconteceu no passado. Sou muito sortudo e abençoado, apenas aproveitando o basquete, o momento e focado em jogar basquete”.
Mas eu tinha falado de duas coisas que preocupavam, uma era essa falta de mudança, a segunda são as contusões. Todo mundo sabe que o garrafão titular do Bulls é Carlos Boozer e Joakim Noah, não há uma real disputa de posição, se ambos estão saudáveis a vaga é deles. E mesmo assim Taj Gibson tem 19 partidas como titular na temporada e Kurt Thomas tem 34. Significa. No começo da temporada foi Boozer machucado, depois Noah e recentemente até os dois ao mesmo tempo.
Ver como o Bulls consegue manter o alto nível mesmo com os dois de fora é pra meter medo nos adversários, mas não dá pra realmente acreditar que dê para ir muito longe nos playoffs sem ele. É como o Spurs agora que o Tim Duncan torceu bem feio o pé. Dá pra levar bem a temporada regular até o fim numa boa, mas é impensável ir longe nos playoffs sem ele. Todo time campeão precisa saber lidar com contusões durante a temporada regular, mas não lembro de nenhum que tenha conseguido seu anel sem um ou dois jogadores essenciais durante toda a pós-temporada. Sem Boozer, Noah ou sem os dois o Chicago vai meter medo, vai ver o Derrick Rose ganhar uns jogos sozinho, mas não dá pra imaginar eles batendo o Heat, Celtics ou até o Magic.
O equilíbrio é a definição do Bulls dessa temporada. O ataque é limitado e depende muito do Rose, mas a defesa é arrasadora. Eles tem disciplina rígida, mas em um ambiente leve de amizade. Tem as contusões, mas um bom banco de reserva e uma tática rígida que mantém o padrão da equipe. E tudo isso acontece com regularidade, sem os altos e baixos do Miami Heat e sem a mudança brusca de elenco de Magic e Celtics no meio da temporada. O time está tinindo, mais do que o MVP mais novo da história ou um técnico do ano estreante, estamos prestes a ver o Chicago Bulls indo longe nos playoffs pela primeira vez em mais de uma década.
Ah, não encontrei um lugar no post para colocar isso, mas desde quando um blog de basquete precisa de gancho pra postar vídeo de enterrada, né?