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Quando teu time tá fedendo, a solução é ficar torcendo para os jogadores contundidos voltarem logo. Meu Houston sem T-Mac, Clippers sem Elton Brand, e até o lixo do Wolves pode dar a desculpa esfarrapada de que está tendo que jogar sem o Randy Foye. O Heat colocou por um tempo a culpa no Shaq contundido, mas tanto nós quanto eles sabíamos que era balela, já são duas partidas sólidas de Shaq e o Heat mesmo assim tem 13 derrotas seguidas. Da última vez que o Heat ganhou uma partida, a Roberta Close ainda era homem.
O Kings, que eu já alertei como sendo um dos times mais injustamente menosprezados da NBA, tava lá só tomando na cabeça torcendo para seus jogadores voltarem logo de contusão. Sem eles, seria impossível ganhar do Pistons ontem, por exemplo.
Ainda sem ritmo de jogo, Mike Bibby, Ron Artest e Kevin Martin começaram a partida no banco. O resultado? Foram 60 pontos feitos pelo banco de reservas do Kings, 58 deles vindos do trio outrora contundido. Numa comparação injustamente divertida, o banco do Pistons fez 5 pontos, todos do Maxiell. Se o Kings mantivesse o hábito de começar as partidas com as 3 estrelas sentadinhas, o prêmio de Melhor Sexto Homem do Ano viraria uma palhaçada muito engraçada.
Tudo deu certo para o time de Sacramento, o banco engoliu o Pistons vivo e, ainda assim, Billups se espreguiçava entre uma posse de bola e outra. O que era aquele ar de tédio, seriedade e orgulho no rosto do Billups? Era a certeza de que eles poderiam vencer o jogo a qualquer momento. Sabe como os heróis de séries japonesas pacientemente aguardam o monstro ficar gigante para, só então, usar a arma ultra-poderosa para fazer o bicho virar poeira? É exatamente o que o Pistons estava fazendo. Mas eis que o jogador mais vaiado em quadra resolveu mudar o script mais manjado do mundo oriental. O monstro venceu o robô gigante debaixo das vaias de toda a torcida. O monstrengo, vaiado, odiado, excomungado, punido, suspenso, ajudou a selar a vitória do Kings. E, bem humorado, mandou beijinhos para a torcida.
Tem mais gente por aí que odeia o Artest do que guria de 13 anos na comunidade “Eu odeio acordar cedo” no Orkut. É normal. Há um esforço brutal por parte da mídia e da própria NBA para acabar com a indisciplina, com o comportamento moralmente duvidoso, com a individualidade. Ron Artest foi usado como exemplo de que tipo de conduta a NBA não estava disposta a tolerar, recebendo pela famosa briga em Detroit a maior punição da história da NBA, ou seja, 73 jogos em casa comendo pipoca. Tudo para mostrar que os velhinhos que comandam a brincadeira têm mão firme, paciência curta e poder absoluto. Não dá pra entender a punição de Ron Artest como um fato isolado. Ela foi apenas um dos passos num processo que permitiu proibir os jogadores de vestirem as roupas que querem, usar linguagem inadequada, criticar as arbitragens ou a Liga abertamente e, pra finalizar, trocar a bola de jogo, de couro para sintética, sem questionar ninguém. Jogador não tem voz, jogador não pode escolher nem como se vestir, como então vai escolher a bola com a qual jogar? É tudo um plano para tornar os jogadores todos iguais: bons moços, dóceis, asseados, sem expressão, mecânicos. Tudo um bando de Tim Duncan. Até o LeBron, que estava acostumado a roer as unhas loucamente quando sentava no banco de reservas, foi informado de que constituia mal exemplo para as crianças. Agora, é obrigado a ficar cortando a unha com um alicate. Pra que se preocupar tanto com as crianças, elas nem estão vendo NBA mesmo, estão jogando Ragnarok ou baixando pornografia na internet.
O Ron Artest se expressa. Seja tacando monitores de televisão no chão, seja deitando na mesa dos juízes ou mandando beijinhos pra galera. Todo mundo iria querer mandar beijos para a torcida de Detroit depois de toda aquela polêmica e ganhando uma partida na casa deles, mas ninguém tem coragem. Hoje em dia, nem o dedinho do Mutombo é permitido. Ninguém quer ser multado ou, ainda pior, criar uma fama que fará todos os juízes marcarem faltas técnicas no sujeito a cada espirro. Aí fica todo mundo quieto, robotizado, medroso. Digam o que quiserem do Artest, pra mim ele é um sopro de paixão na NBA. Às vezes ele é um soco de paixão também, claro. Mas ele é também o pouco que resta de irreverência e de humor. E isso é algo que aqui no Bola Presa, por algum motivo esquisito, a gente valoriza bastante.
O negócio é que na NBA se dá valor demais à violência dentro das regras, aquela cotovelada que ninguém está vendo, deixar o pé embaixo do jogador que arremessa (no maior estilo Bruce Bowen), fazer falta intencional para impedir uma cesta. Essa violência fria, meticulosa, programada, é incentivada e admirada. O Bowen todo ano está lá, na lista dos melhores defensores da NBA. Já a violência emocional, aquela do descontrole, do calor do jogo, aquela que está ali pra todo mundo ver e não pode ser escondida, essa é punida de todas as formas possíveis. Pra mim, não são violências tão diferentes assim. Mas pergunte para o David Stern qual das duas ele prefere. Pergunte para o Bowen com qual das duas é possível escapar sem ser penalizado.
O Artest, até quando é pra ser um maldito safado e sacanear alguém dentro das regras, consegue ser engraçado. Vale a pena dar uma olhada no vídeo abaixo pra ver o que ele fez para tentar parar o Paul Pierce.
Para quem ficou baixando pornografia ao invés de estudar inglês, a musiquinha do Artest é algo mais ou menos assim: “Paaaul, eu sinto muitíssimo por te humilhar na TV baixando os seus shorts, eu não vou fazer outra vez.” E termina dizendo que não adiantou nada, que foi em vão, porque o Pierce meteu uma bola de 3 na cara dele de qualquer jeito. Da próxima vez, segundo o Artest, ele vai ter que tirar até o tênis para conseguir parar o homem. Acho que até o Paul Pierce deve ter rido dessa, vai.
Por falar em piada, o Leandrinho foi alvo de uma digna do mestre João Kléber, mas deve ter levado menos na esportiva do que o Pierce. Ligaram para o quarto de hotel do Barbosa pedindo para ele descer e falar com o GM do Suns porque ele havia acabado de ser trocado para o Knicks. Hoje em dia, ser trocado para o Knicks é o pior pesadelo de qualquer jogador profissional: além de jogar em um dos piores times da Liga e ter que aturar o Isiah Thomas, você ainda acaba ficando sem comida porque Curry e Randolph acabam com a despensa. O Leandrinho ficou arrasado, desesperado e desceu na hora para conseguir informações. Todo mundo morreu de rir da cara dele e o Dan D’Antoni, irmão do técnico Mike D’Antoni, ficou indignado que o brasileiro acreditasse num troço desses, que achasse possível ser trocado sem sequer terem ido falar com ele antes sobre a possibilidade. Acho que o Leandrinho realmente anda lendo muito sobre o Isiah Thomas por aí. Ele disse que só de ouvir a palavra “troca” ele já fica meio maluco e que foi uma sensação terrível. Tadinho!
Engraçado é que se fosse ao contrário e fizessem a piada com alguém do Knicks dizendo que ele havia sido trocado para o Suns, o cara desceria com uma garrafa de champagne aberta comemorando sem parar. Descobrir que era mentiria seria mais devastador do que a piada de mal gosto foi para nosso pobre brazuca…
O Artest, por sua vez, já disse um bocado de vezes que gostaria de jogar no Knicks, que ele curte um desafio e que ele acha que pode concertar qualquer problema. No entanto, o Kings com vitórias seguidas fora de casa, contra Pistons e Pacers, parece mais promissor do que se esperava. Mike Bibby ainda está completamente fora de forma e o técnico disse que ele ainda nem aprendeu todas as jogadas, mas em breve será titular com o Udrih trazendo sua baita estabilidade do banco, num belo combo de armadores. K-Mart vai continuar figurando na lista de cestinhas. E até o Brad Miller se lembrou agora que esse jogo esquisito consiste em colocar aquela esfera laranja dentro desse tal de aro. Acho que essa equipe vai ficar junta por mais algum tempo, sem Bibby no Cavs e nem Artest no Knicks. É só um palpite, mas como gosto do Artest, torço para ele ficar o mais longe possível de New York. Pior que ir pra lá, só se for pra Miami.