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Imagine a cena, direto das telas do seu videogame: Link, uma criança muda mas que de alguma forma consegue se comunicar com outras pessoas, adentra uma jornada épica em que será acompanhado por uma fada barulhenta e intrometida, consegue armas, escudos, um gancho arremessável e irreal, bombas, viaja através do tempo, de dimensões, fica adulto, volta a ser criança, ganha magias poderosíssimas, uma fortuna em dinheiro por cortar grama aleatoriamente, e aí com todo o poder adquirido finalmente enfrentará o grande vilão Ganondorf. A luta entre eles é equilibrada, mas então Ganondorf assume “sua verdadeira forma” (nenhum vilão que se prese anda pelas ruas na sua forma real enquanto está comprando pão ou pagando as contas) e numa única bifa faz o Link virar poeira. E é isso. É o fim, “game over”.
Isso nunca aconteceria num Zelda porque a Nintendo jamais faria o jogo ser minimamente difícil, mas convenhamos que essa situação seria frustrante e não apareceria em videogame algum. Lutar bravamente, evoluir, brigar de igual para igual com o chefão e de repente morrer sem dó nem piedade, sem pompa, sem clímax e sem “continue”? No mundo real isso acontece, no entanto. Senhoras e senhores, é hora de se despedir do Sixers.
O Pistons até bobeou, deixou o jovem Sixers pegar gosto pela coisa. Mas então o Pistons invocou seus robôs, juntou todos num imenso robô gigante e deu seu golpe especial, aquele que só é dado uma vez por combate porque gasta muita grana do departamento de efeitos especiais – e também porque é sempre o suficiente para liquidar o inimigo. Na noite de ontem, o Sixers virou poeira junto com um pedaço da maquete da cidade de Tóquio. Quando a coisa foi pra valer, quando seguir para a próxima rodada virou algo imediatamente sério, o Pistons não deu a menor chance para brincadeira. Jogando sério, a equipe de Detroit é tão imbatível quanto os Changemen.
Minha única preocupação, na verdade, era a reação da torcida da Philadelphia. Talvez eles não compreendessem que tomar um coro depois de uma jornada épica não anula a jornada épica. Que ser derrotado pelo “golpe especial” de um robô gigante é muito mais digno do que ser apenas aqueles monstrinhos bucha-de-canhão que ficam gritando e pulando e perdem para os heróis sem sequer haver a necessidade de robôs. Só respirei aliviado no minuto final da partida, quando a torcida aplaudiu de pé a equipe que perdia por mais de 20 pontos. A homenagem era mais do que merecida e selou de modo honrado uma partida que acabou nos primeiros 5 minutos, com uma dominância quase desleal do Pistons. Tudo bem, isso não importa. O pessoal na Philadelphia tem a noção de que o time deveria estar nas últimas colocações do Leste, pensando no draft, mas que ao invés disso foi dar uns tapas bem dados na cara do Detroit. Jovens e veteranos, com nem-tanto talento e um absurdo de vontade, problemas graves na parte ofensiva mas fluência nos contra-ataques, sem Allen Iverson mas com um basquete coletivo que hoje em dia é ítem de colecionador.
A maioria dos torcedores, assim como a gente aqui no Bola Presa, pegou a temporada do Sixers pela metade, tentando entender o que estava acontecendo só quando eles já estavam ganhando partidas improváveis e chutando traseiros. E embora todas as nossas questões sobre eles não tenham sido ainda respondidas, ficou a certeza de que um elenco limitado pode brigar com os grandes – basta encontrar uma identidade. Vários times simplesmente não sabem quem são. “Jogo um jogo de meia-quadra com um pivô lento e gordo ou corro como um louco com meus armadores porra-loucas?” É isso que o Knicks se pergunta o tempo inteiro, além de outras trocentas dúvidas táticas, sem jamas saber como proceder. Às vezes sentam o Curry, às vezes o Randolph, tem hora que os dois jogam juntos, tem hora que o Nate Robinson é banco, tem hora que não sai nem de quadra. É claro que o Knicks tem mais talento do que o Sixers, mas isso de nada importa. Ainda ontem, quando o time da Philadelphia tomava um pau histórico, encontrou por alguns minutos sua identidade novamente (defesa pressionando, contra-ataques fulminantes) e chegou a diminuir a diferença no placar para apenas 8. O jogo não engrenou, o Pistons foi grande demais na partida, mas o Sixers se agarrou àquilo que faz de melhor.
O Celtics tem três futuros membros do Hall da Fama e o Hawks, segundo alguns, sequer tem UM grande jogador, já que o Joe Johnson é questionado (principalmente porque os jogos do Atlanta não costumam passar em rede nacional nem pros Estados Unidos). Mas se agarrando a uma identidade, o Atlanta Hawks já levou duas partidas para casa. Pode levar uma terceira hoje, em breve, ou pode ser eliminado pelo golpe do robô gigante do Celtics. De um modo ou de outro, eles estarão correndo, forçando turnovers e isolando Joe Johnson. Funciona? Nem sempre. Mas o Atlanta e o Sixers, jovens e inexperientes, ao menos são times que sabem quem são. Fica a lição para os times talentosos e experientes que sequer estão nos playoffs. Fica a dica para o próximo técnico do Knicks – seja o coitado quem for.