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O Grizzlies agora é um time de verdade, um time de respeito. Digo isso porque existe uma coisa fundamental que deve ser feita por todo e qualquer time que tem pretensões de ser levado a sério: se livrar do Antoine Walker.
O pior é que eu gosto bastante do cabeça-de-Lego. Em seus melhores momentos, era um jogador inteligente capaz de armar o jogo, encontrar seus companheiros livres, pegar rebotes e acertar arremessos do meio da quadra. Em seus piores momentos, era um débil mental que arremessaria a própria mãe, uma espécie de JR Smith, do Nuggets, só que incapaz de sair do chão. Ele até poderia ser bem aproveitado, como foi naquele Heat campeão ou no Dallas, quando vinha do banco de reservas, mas a verdade é que quando a coisa fica feia em qualquer equipe, o primeiro sinal de reconstrução, novos tempos e um futuro promissor a frente é justamente dar um jeito de se livrar do Walker. Foi o que aconteceu no Celtics quando eles resolveram começar do zero e apostar na molecada, com o Wolves quando desistiu dos tempos de Garnett, e agora com o Grizzlies que tenta deixar para trás seus tempos de Pau Gasol e derrotas metódicas na primeira rodada dos playoffs. Antoine Walker sequer entrou em quadra nessa temporada, mas sua presença no time, aquele medo irracional de que ele invada a quadra para arremessar uma toalha na cesta pelo puro hábito da coisa, impedia o crescimento da equipe. Agora que o Grizzlies conseguiu quatro vitórias consecutivas pela primeira vez em quase 3 anos, era melhor que a aura de Walker virasse farofa para não comprometer a evolução. Encheram o bolso do rapaz de dinheiro, acabaram com seu contrato e, agora sim, podemos falar de verdade sobre o time de Memphis.
Apesar da sequência de vitórias e de estar, assustadoramente, em décimo lugar no Oeste – na frente de times supostamente muito superiores, como Clippers, Warriors e Kings – fica difícil levar o Grizzlies a sério. Em parte por causa da presença de azul-bebê no uniforme, mas também graças à lendária troca de Pau Gasol para o Lakers, que não só permitiu ao time de Los Angeles ganhar o Oeste como também afundou de vez a equipe de Memphis no fundo do poço. Mas agora que a poeira abaixou um pouco, talvez seja hora de dar uma nova olhada na troca tão polêmica e ver o que saiu dela, afinal.
Na época, Pau Gasol havia perdido com o Grizzlies todos os jogos de playoffs que havia disputado. Foi mandado então, junto com uma escolha de segundo round, em troca de uma escolha de primeiro round no draft (que após umas mutretas virou o Darrel Arthur e mais uma escolha de segundo round), o contrato expirante do Kwame Brown, uma escolha de primeira rodada em 2010 e mais o Javaris Crittenton (que recentemente virou, junto com uma escolha de segunda rodada, a escolha de primeira rodada que o Grizzlies tinha perdido para o Wizards). Bem, como eu sei que a Mari Alexandre não entendeu nada, e ela tem um lindo par de… olhos… vou resumir direitinho para ela entender.
Em troca de Pau Gasol, o Grizzlies recebeu os novatos Darrel Arthur, Marc Gasol, e escolhas de draft na primeira rodada em 2009 e 2010 – sem falar em espaço na folha salarial, com o fim do contrato do Kwame Brown, que foi bem economizado até aqui, ao invés de ser gasto às pressas com qualquer jogadorzinho disponivel.
Lembro de ter gargalhado quando o chefão do Grizzlies disse que, na prática, Pau Gasol tinha sido trocado por três escolhas de draft, todas de primeira rodada. Mas o pior é que é verdade: Crittenton virou a escolha de 2009 e o Marc Gasol teria sido escolhido facilmente na primeira rodada do draft passado, foi apenas sorte do Lakers ter agarrado o moço na segunda rodada um ano antes. Embora eu ainda ache o espanhol um troglodita que engoliria uma mesa antes de ser obrigado a utilizar essas frescuras conhecidas como “talheres”, não dá pra negar que sua produção em quadra vem sendo excelente. Do ponto de vista defensivo, ele é um bocado lento mas sem dúvidas é uma parede que se atira em todas as bolas, não tem medo do contato e possui um bom tempo de bola nos tocos. No ataque, é muito competente na hora de passar a bola, tem uma boa mira na linha de lances livres, mas é bastante grosso em todo o resto. No entanto, só digo isso porque não tenho medo de ser aloprado depois. É bem óbvio que Marc Gasol está pegando o jeito da coisa e em breve será uma força dos dois lados da quadra, embora sempre um pouco lento e largo demais – mas talvez seja só a impressão que ele dá porque comparo instintivamente com seu irmão Pau, magro, rápido e meio cagão. Por enquanto, Marc tem 11 pontos, 7 rebotes e 1 toco de médias por partida, o que é excelente para um novato tacado aos lobos e titular na maior parte dos jogos do Grizzlies até agora. Outro novato titular, Darrel Arthur, foi uma surpresa muito feliz (para não dizer que foi um “baita rabo”). Um boato sobre supostos problemas renais levaram Arthur a ser draftado apenas no final da primeira rodada, trocado para uns setenta times diferentes e caiu então no colo do Grizzlies. Mesmo com minutos limitados, tem mostrado um jogo refinadíssimo e um potencial infinito, maior cara de futura estrela.
Com Marc Gasol, Darrel Arthur e Rudy Gay, o núcleo da equipe é muito jovem e promissor. Mas é outra escolha de primeira rodada no draft passado que está fazendo barulho: OJ Mayo.
Muita gente criticou o Grizzlies, na época do draft, por ter se livrado do Mike Miller só para poder trocar a quinta escolha (Kevin Love) pela terceira (OJ Mayo). Pois parece que as trocas da equipe não são tão ruins quanto parecem à primeira vista, são como um vinho que precisa de um tempo para pegar sabor. Tá bom, as trocas têm mais cara de vinho barato, comprado no supermarcado, que precisam de um tempo para não feder tanto, mas ainda assim são melhores do que se pensava. O Kevin Love está tendo uma boa temporada lá no Wolves até, trazendo energia do banco de reservas, mas Mayo está colocando seu nome na briga pelo título de Calouro do Ano. Por enquanto, já é o cestinha entre os novatos, com 20.8 pontos por jogo. Para se fazer uma comparação, Derrick Rose está com 18 pontos, Carmelo Anthony teve 21 e LeBron James teve 20.9 em suas temporadas de estréia. Mesmo que não seja nem de longe tão completo quanto todos os nomes dessa lista, como pontuador OJ Mayo está entre os melhores. Passar a bola não é muito a praia dele e diz a lenda que quando a estrela do time, Rudy Gay, faz uma ou duas cagadas num jogo, Mayo simplesmente desiste de lhe passar a bola. Mesmo assim, ter um pontuador com essa habilidade é algo inestimável para qualquer equipe. Com o tempo, ele pode aprender a envolver mais seus companheiros, armar o jogo (ficar longe do Antoine Walker sempre ajuda nesse sentido). Há potencial, ali, para vermos uma espécie de Allen Iverson. Para alguns isso significa que ele fará seu time perder para sempre, mas essas são apenas pessoas amargas que deveriam ir lamber sabão.
A sequência de 4 vitórias do Grizzlies foi contra uns times capengas, tipo o Houston sem Artest nem T-Mac, e o time-outrora-conhecido-como-Sonics. Mas contra os times em condições mais respeitáveis, OJ Mayo foi fundamental: primeiro no duelo contra Derrick Rose e seu Bulls, depois na vitória mamata-iá-iá em cima do Miami Heat de Dwyane Wade. Nos melhores momentos da partida, que você pode ver aqui, dá pra perceber como o Mayo é simplesmente retardado e arremessa bolas que, em sã consciência, ninguém ousaria arremessar. Mas acontece que ele converte esses arremessos e esmaga os bagos do Dwyane Wade no processo.
Justiça seja feita, o Wade devolveu com um drible tão, tão seco, que o OJ Mayo caiu como um pino de boliche.
Sempre que um cara desafia os maiorais logo no primeiro ano e figura entre os cestinhas de toda a NBA, dá pra saber que ele vai ser especial (não no sentido Telethon, por favor). O único problema é a inexperiência, mas isso percorre o Grizzlies inteiro, com dois novatos titulares, uma estrela que está em seu terceiro ano, um banco recheado de pirralhos e um técnico que fez sua estréia na temporada passada. Justamente por isso não há qualquer sinal de regularidade, nem nas atuações e nem nas escalações da equipe. Para começar, há a armação: tem hora em que o Mike Conley é titular, tem hora em que ele é reserva e Kyle Lowry assume as rédeas. Na prática, o Conley tem mais potencial mas está demorando para produzir em quadra, e o Lowry tem reserva tatuado na testa mas produz muito mais quando começa o jogo em quadra. No garrafão a bagunça consegue ser ainda maior: o técnico Iavaroni tentou todas as combinações possíveis entre Marc Gasol, Darko Milicic e Darrel Arthur. Na maior parte das vezes, Gasol é o pivô e Arthur é o ala, mas as vitórias têm vindo com Darko e Arthur titulares e Gasol no banco. Aliás, como curiosidade, todas as vezes em que Darko e Lowry foram titulares juntos, o Grizzlies perdeu apenas uma vez e ganhou outras cinco. E eu que pensava que o Darko tinha sido amaldiçoado.
Nada mais natural num time jovem com vários jogadores inconsistentes do que um bilhão de formações diferentes, apenas com Rudy Gay e OJ Mayo como titulares absolutos. Mas em breve esse time terá que decidir qual será o garrafão titular e abraçar essa idéia. Pessoalmente, torço pro Darko. Acho o rapaz competente na defesa, veloz em quadra e, quando não fica brincando de arremessar do meio da quadra, pode ser bem útil no ataque. É hora de pararem de exigir dele a produção de uma segunda escolha de draft. Ele próprio deve parar de exigir isso de si mesmo e começar a compreender que ele pode ser apenas uma peça de apoio, importante para um time em reformulação, se ele controlar sua agressividade, intensidade e vontade de provar que pode dominar o jogo. Não são apenas camisetas rasgadas como se ele fosse virar o Hulk ou palavrões mais do que cabeludos, ele também acaba cometendo milhões de faltas em poucos minutos de jogo, segurando a bola demais no ataque e querendo mostrar seu talento de forma exagerada. Sou um otário, do tipo que acredita que o Richarlyson saía mesmo com aquela guria capa da Playboy, mas eu ainda acredito no Darko. Ele e Marc Gasol podem fazer um garrafão defensivamente impressionante num futuro próximo se ele souber contornar seus problemas. E o Grizzlies, com tanto talento e galgando posições no Oeste na miúda, sem ninguém perceber, pode ser a última chance dele antes que retorne inevitavelmente para a Europa, onde poderá dominar como deseja.
Com um punhado de trocas questionáveis, juventude, um técnico novo, dinheiro no cofre e potencial, o Grizzlies é um calderão cheio de ingredientes estranhos e só resta torcer para que o resultado seja bom daqui alguns anos. Talvez, se alguém tacar uma pitada de “tudo que há de bom” nessa mistura, saiam até as Meninas Superpoderosas. O Darko vai ser a Lindinha.