>Para que serve o All-Star?

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“Vamos ficar de bem?”

A nova moda agora, depois de namorar pelado, é meter o pau no fim de semana das estrelas na NBA. Então vamos parar por um momento e nos perguntar: para que é que ele serve? Um intervalo, mais ou menos no meio da temporada, que permite que os jogadores parem de competir e relaxem um pouco. É uma chance que os jogadores ganham de poder interagir uns com os outros, bater uma pelada com amigos de quadra e, acima de tudo, entrar em contato com os fãs. Ainda que alguns desempenhem o papel meio obrigados, o All-Star entrega os jogadores à imprensa, dúzias de entrevistas de pessoas do mundo inteiro, fãs tirando fotos, recebendo autógrafos e participando de toneladas de eventos e brincadeiras relacionadas a basquete e à marca NBA. Alguns jogadores preferiam descansar (o Shaq usou o fim de semana várias vezes para descansar lesões, por exemplo) mas acabam tendo que comparecer para agradar os fãs que querem uma oportunidade de ver todos os seus jogadores favoritos juntos, no mesmo lugar.

Se fosse futebol e os melhores jogadores do mundo fossem bater uma bolinha numa quadra de areia, comer um churrasco e tomar umas biritas, milhares de pessoas compareceriam para presenciar. Diabos, quanta gente não aparece para assistir treino do Corinthians? Mas acontece que o David Stern é um empresário, um cara chegado nas verdinhas, e ele transforma uma simples confraternização em um espetáculo de luzes, sons e expectativas. Todas as competições do All-Star Game são uma brincadeira de fundo de quintal bem produzida, são um circo para agradar a galera. Não é sério, não pode ser. O problema está justamente ali: quais são as expectativas?

Tem gente, já faz um tempo, alegando que o All-Star Game deveria valer alguma coisa, tipo mando de quadra nas Finais (como acontece no baseball) para que seja competitivo e de alto nível técnico. Não compreendo: existem 82 jogos sérios de cada time na temporada, sem contar os playoffs. Não é o bastante? Os jogadores ganham uma folga para brincarem um pouco uns com os outros e interagir com o público e a gente quer que eles tenham mais uma partida competitiva? No baseball, não existe “jogar feio” ou “jogar bonito”, é um esporte em que você erra ou acerta, e se existe um jogo das estrelas ele precisa ser competitivo em algum grau. Já o All-Star Game da NBA não pode ser levado a sério, quem encara as festividades como algo que deveria mudar os rumos da história e causar sangramentos para todos os lados simplesmente não pegou o espírito da coisa.

Todos os eventos desse fim de semana devem ser acompanhados com bom humor, de preferência na presença de seus amigos fãs de NBA. Como comentou comigo o Denis, meu companheiro de All-Star há muitos anos, quem acha o All-Star chato deve estar assistindo sozinho com a televisão baixa para não acordar a vó. Um fim de semana por ano você pode encontrar seus amigos, assistir três dias de basquete descompromissado com suas estrelas favoritas, ver o Shaq fazendo alguma palhaçada, um punhado de nerds brincando com fantasias (e um nerd pulando o outro, às vezes), duzentas entrevistas com cada jogador e dar risada enfiando pipoca nos seus poros. O negócio é ver o Iverson ser entrevistado sobre ter cortado suas tradicionais trancinhas, ou o Granger falando como o treino do Leste foi divertido – a não ser pelo Garnett, que estava muito interessado em ganhar e ficou gritando durante o desenho das jogadas. Dá para ver um pouco dos bastidores e respirar NBA por uns dias numa cobertura monstruosa da imprensa sem o ar de competição ou discussões de que time é melhor. Basta olhar para os jogadores: alguns preferiam estar descansando, afinal a temporada é longa e cruel, mas a maioria está feliz de conversar com outros jogadores, contar piadas e ficar dando risada no banco de reservas, abraçando crianças ranhentas e fofocando sobre a demissão do Terry Porter, agora ex-técnico do Suns.

Não dá para esperar que o Carter revolucione o mundo das enterradas todo ano ou que o Jason Kapono acerte 25 dos seus arremessos no campeonato de 3 pontos, afinal são todos humanos e erram, ficam entediados, têm dor de barriga ou simplesmente não arrumam nenhuma idéia brilhante nova. O jogo das estrelas propriamente dito, no domingo, costuma ser até que bastante competitivo quando o placar fica apertado, mas não dá pra esperar que todo ano os times sejam similares em nível técnico e o jogo não termine de modo fácil demais. Dessa vez, o banco do Leste era uma piada e o jogo não deu nem pro cheiro, mandando pela janela qualquer chance de competição. Mas quem quer ver defesa e gente dando cotoveladas não precisa ver o All-Star Game, existem 82 jogos do Spurs por temporada. Esse fim de semana é uma oportunidade de ver algo diferente: não pode haver Shaquille O’Neal brincando de armador na temporada regular, nem Kobe e Shaq jogando novamente juntos e relembrando com certa nostalgia os tempos de vitória no Lakers, puxando jocosamente o troféu de MVP da partida (compartilhado) cada um para um lado. A graça é justamente ser tudo aquilo que não pode haver num jogo normal, é deixar o outro jogador enterrar e não dar a mínima para a vitória. É ver o Shaq dançando na apresentação dos times e ver todo mundo dançando também, entrando no clima (menos o Oeste que tinha Yao, Duncan, e a menor taxa de sorrisos por metro quadrado depois da casa do Diogo Mainardi).

Os outros eventos do fim de semana dependem mais de gente interessada em participar, ganhar e inovar, mas não podemos criticar os jogadores por não estarem muito interessados se eles já se dedicam tão absurdamente à temporada, que é o que de fato paga seus salários. Como já disse, o crescimento no interesse do público mais jovem e leigo ao redor do mundo está também recuperando o interesse dos próprios jogadores em participar da brincadeira. Mas nunca será, jamais, algo além da brincadeira. Basta estar disposto a abraçar a idéia. A audiência subiu, os torcedores estão mais interessados, há mais público e mais dinheiro entrando. Pode parecer horrível, mas isso é bom para o esporte. O pessoal pode resmungar o que quiser, dizer que os velhos tempos do All-Star estão mortos, mas como achar ruim algo descontraído, divertido, atraindo mais fãs para o basquete? Além disso, presenteados com anéis e homenagens, os jogadores americanos que acabaram de ganhar o ouro nas Olimpíadas de Beijing sentiram-se valorizados e renovam também o interesse em participar de eventos internacionais. Ou seja, o basquete sempre sai ganhando.

Não dá para querer assistir um filme cult francês expressionista mudo em preto e branco e acabar entrando numa sala que estiver passando “Jurassic Park”. Não dá pra querer ler notícias detalhadas, imparcias e não-opinativas sobre basquete e vir parar aqui no Bola Presa (ou então querer fotos da Sandy pelada e cair aqui pelo Google, coisa que sempre acontece). É com bastante alegria que vemos muita gente abraçar a nossa visão mais bem-humorada de uma cobertura sobre NBA, mas por que não fazer o mesmo com o fim de semana das estrelas? Dura apenas três dias, não é como se fossemos obrigados a engolir o clima de circo por toda a temporada regular. É uma exceção, uma piada em meio à seriedade muitas vezes excessiva da NBA. É uma pelada entre amigos, mas em versão gigante, tipo o Gyodai dos Changeman (obrigado ao Sbub que avisou nos comentários que o lendário personagem era da série do Esquadrão Relâmpago, e não do Jaspion, como eu tinha vergonhosamente dito) ou a Rita Repulsa dos Power Rangers transformando em gigantes aqueles monstros engraçados feitos de espuma.

Por isso mesmo é que a própria escolha dos jogadores pelo público acaba comprometendo um pouco a festa. Legal, o Rashard Lewis mete várias bolas de três (e quase 20 milhões de doletas por ano nas orelhas), mas quem diabos quer ver ele num jogo que deveria ser constituído por diversão e jogadas plásticas? O próprio Yao Ming sempre admitiu que o jogo muito rápido do All-Star Game não casa de modo algum com seu jogo, mas dá pra ir além: não casa com sua própria cultura ou mentalidade, com seu modo de ver o jogo. Tudo que ele pode fazer é dar um ganchinho, um arremesso por cima do marcador, não há nele nem a capacidade de um lance diferenciado, nem o espírito para ficar tirando sarro de tudo. Cabe a ele, portanto, a difícil tarefa de representar seu povo e sua cultura, que votam em massa para sua presença, sabendo que não há como ele se encaixar na festa. Às vezes, principalmente quando não teve férias graças às suas obrigações com a seleção chinesa, o Yao parece nitidamente mal-humorado por estar ali ao invés de poder descansar um pouco e dar uns amassos na namorada. O clima do All-Star não é para todos – nem para todos os torcedores, nem para todos os jogadores. Por isso é que os jogadores deveriam ter mais liberdade para recusar o convite, e mais liberdade para que outros aparecessem para brincar, poderia haver um rachão antes do jogo com qualquer jogador da NBA que quisesse comparecer. Essa liberdade, no entanto, já temos entre os telespectadores: dá para acompanhar de perto a cobertura e os eventos ou simplesmente deixar para lá. Mas refaço meu convite: com uma outra abordagem, amigos, risadas, quem sabe o All-Star não se torne aquilo que deveria, ou seja, uma celebração? Mas nada de música clássica ou azeitonas, por favor, tem que ser salgadinho com fedor de queijo, pipoca caindo no chão e uma tentativa deliberada de acordar todos os seus vizinhos. Pense nisso.

Até o próximo All-Star Game!

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