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Constância, bom-humor e compromisso com o fã: coisas que você não encontrou aqui no Bola Presa nos últimos dias – mas que, em compensação, é possível encontrar no Cleveland Cavaliers a todo momento. A gente deu uma sumida vergonhosa porém necessária nos últimos dias, afinal somos humanos e de vez em quando precisamos usar o banheiro, assistir Big Brother e sair com supermodelos – como a nova namorada do Kidd, por exemplo – para distrair um pouco. Mas o Cavs não dá folga e agora já são dez vitórias seguidas, todas em grande estilo. Por mais que escrever no Bola Presa seja sensacional, que a gente dê autógrafo na rua e que modelos pulem no nosso colo a todo instante, jogar no Cavs é atualmente o melhor emprego do planeta. Não há nenhuma dúvida quanto a isso, os motivos são tantos que vou até fazer um Top, hã, sete, só porque posso.
1) Qualquer coisa vira história
O Cavs é um time que não tem exatamente uma grande tradição na NBA, apesar do sucesso considerável no começo dos anos 90 e no meio lá dos anos 70. O resultado é que há muito espaço para que história seja feita: LeBron James já é o líder da franquia em todos os tempos em arremessos feitos e tentados, lances livres feitos e tentados, pontos e roubos. Até o Ilgauskas, que é bom mas parece estar jogando debaixo d’água, é o líder da história da franquia em rebotes, rebotes ofensivos, tocos e até faltas cometidas. Basta passar um tempo na equipe e os recordes começam a aparecer, nem que seja pelo maior número de vezes que você gritou para o LeBron durante uma partida.
O elenco, como um todo, está escrevendo seu nome nos livros – e, ao contrário da década passada, não é nos livros do Ari Toledo. Cada partida é uma oportunidade para um feito histórico, seja o menor número de turnovers cometidos (foram dois!) até o maior número de vitórias de um time do Cavs em uma temporada (que já foi alcançado agora, mesmo faltando mais de 10 partidas para o início dos playoffs). Até o grosso do Varejão tem a sorte de estar num lugar assim, ele faz parte de recordes históricos e pode cravar seu nome em estatísticas individuais como “maior número de lances livres errados” ou “maior número de anões que podem ser escondidos dentro de uma cabeleira”.
2) Não há dúvida sobre quem é o dono do barco
Existem times sem estrela, em que não há uma figura capaz de chamar a responsabilidade quando a água bate na bunda, como era o caso do Chicago Bulls de uns anos atrás (lembra quando eles não fediam?). Por outro lado, existem times com grandes estrelas que são questionadas por seus companheiros: “como assim o Michael Redd vai receber a última bola, vou arremessar eu mesmo”, já diria o Mo Williams. Mesmo quando o cara é nitidamente o melhor do time, como Dwight Howard ou Chris Bosh, por exemplo, não quer dizer que ele possa chutar o traseiro de qualquer um e que, portanto, você sempre confiaria a bola para o sujeito quando o negócio aperta. Apenas alguns poucos casos, como Dwyane Wade, Kobe Bryant e (dã!) LeBron James, são respeitados dentro de suas equipes por serem os melhores do planeta, da galáxia, do Universo Conhecido! O time, portanto, joga para o LeBron, obedece a tudo que o LeBron mandar, mas não porque um técnico engravatado mandou na prancheta: é uma relação de admiração porque o cara é uma lenda vida. Jogar num lugar desses, além de te dar a chance de ver um dos melhores de todos os tempos em quadra todos os dias, tira dos ombros muita pressão e fornece tranquilidade nos momentos mais complicados: deixa que o LeBron arruma.
3) A estrela não engole a bola
O que nos leva ao terceiro motivo para o Cavs ser o melhor emprego do mundo: jogar com um dos maiores, poder contar com ele, mas saber que ele não vai querer colocar a bola no bolso e brincar sozinho o tempo todo. Poucos caras têm tanto tesão em compartilhar a bola como LeBron James, é praticamente patológico e às vezes até exagerado. Assim, todo mundo pode se divertir, todo mundo tem chance de participar, e até o Varejão que é sempre uma airball esperando para acontecer consegue dar seus 6 arremessos por jogo. Sem que, no entanto, ele seja obrigado a arremessar nos momentos decisivos, em que o LeBron passa a mão na cabeça de todo mundo e cuida do que for necessário.
O Cleveland Cavaliers é um dos times com mais clima de molecada na NBA. O Grizzlies pode ser mais jovem, o Glen Davis pode ser mais infantil, mas nada parece mais um filme de Sessão da Tarde sobre acampamento de verão do que a pivetada do Cavs. Desde os tempos de Damon Jones (que dizia ser o melhor arremessador do mundo mas ninguém acreditou), o que não falta na equipe são apertos de mão esquisitos, que aliás o LeBron levou – com grande sucesso – para a seleção americana nas Olimpíadas. Agora, outra piada interna do Damon Jones tomou grandes proporções: a simulação das fotos de família. O que era antes um simples cumprimento virou encenação em todos os jogos, reunindo todo o elenco. O próprio Ben Wallace, que é meio carrancudo, disse que, nesse grupo de jogadores, todo mundo ri das coisas juntos, eles se entendem perfeitamente dentro e fora da quadra. Por mais que as lendárias noites de pôquer com o Duncan e o pessoal do Spurs pareçam tentadoras, desconfio que iria me divertir muito mais com as palhaçadas em Cleveland:
5) Levanta defunto
O bom humor do Cavs faz milagres e salva jogadores, tanto na vida pessoal quanto na carreira no basquete. Alguém se lembra dos problemas do armador Delonte West com sua depressão no começo da temporada? Algumas idas ao analista deram uma mão, é verdade, mas fica difícil imaginá-lo recuperando o tesão por jogar numa equipe chata, sem graça, em que tudo é milimetricamente planejado ou que, simplesmente, fedesse e estivesse perdendo pra burro. Se estivesse no Wizards ou no Kings, o Delonte West nesse segundo estaria balançando com o pescoço pendurado numa forca. No Cavs ele pôde jogar em sua posição favorita, não tem muita responsabilidade, é uma peça fundamental da equipe, vence pra burro, coloca o nome na história e se diverte. Não há nem sinal de depressão nesse Delonte West que, nas rotinas pré-jogo simulando as fotografias, pula no colo de todo mundo. Talvez, isso lá é verdade, haja um pouco de carência afetiva.
6) Tática Fresh Prince
Com tantas peças importantes na equipe, não há problema nenhum em feder um pouquinho, principalmente se for na parte ofensiva. Afinal, o ataque se baseia na criatividade, nos jogadores se entendendo entre eles, na movimentação de bola, e na famosa tática Fresh Prince: bola pro LeBron e sai da frente. No fundo, tudo isso são apenas modos diferentes de dizer que o Cavs não tem jogadas planejadas. O Mike Brown mantém seu posto de técnico mais picareta da NBA, mas sua experiência defensiva certamente deu ao Cavs a defesa espetacular que eles têm hoje. Na parte ofensiva, ele arrumou um assistente técnico melhorzinho mas não faz idéia do que está fazendo, o que significa menos jogadas para decorar, menos coisas para treinar, e mais tempo para sair com a namorada do Kidd. Ou seja, é o emprego perfeito.
7) Em grande fase
Até relacionamento ruim fica bom quando um dos dois ganha na loteria. Mesmo se o elenco do Cavs fosse uma merda, o time parece que está em transe: entraram numa fase tão boa, mas tão boa, que nem o Mo Williams consegue desperdiçar a bola. Tudo parece que dá certo, o clima no vestiário mantém todo mundo jogando em alto nível, e o LeBron James está vivendo o que é provavelmente a melhor fase da sua carreira. Os números são absurdos: nos últimos 10 jogos (10 vitórias), as médias de LeBron são de 29.2 pontos, 9.2 rebotes, 9.1 assistências, 2.2 roubos e 1.6 tocos. Foram 4 triple-doubles nas últimas 10 partidas, 3 deles em jogos seguidos, sem contar os 4 jogos em que LeBron ficou a apenas duas assistências ou dois rebotes de um triple. Como diria a Dercy com toda elegância, “puta merda, caralho!”. Atuações assim, dele e de todo o elenco, tornam o trabalho cada vez mais e mais fácil. Jogar no Cavs é quase como ser funcionário público, mamar nas tetas do estado e não ter que se esforçar muito. Quase tão bom quanto ser blogueiro e não ganhar um centavo.