>
nem que aparecer no próximo jogo
Para resumir os jogos de sábado, quem tinha mando de quadra se lascou: só deu zebra. A não ser o LeBron James, aquele débil mental, que simplesmente não vale. O Cavs nem percebeu que o Pistons entrou em quadra, se deu ao luxo de tirar uns cochilos esporádicos, e mesmo assim venceu quase sem querer. Foi o maior emblema, para mim, da era pós-Billups na equipe de Detroit: lembra quando o Pistons ficava sempre 10 pontos atrás do adversário, parecendo não se importar, com toda a empolgação de um Duncan assistindo “Manhattan Connection”, e aí quando o jogo se aproximava do seu final, de repente, o time inteiro acordava e virava a partida como se fosse a coisa mais natural do mundo, entre bocejos e risos debochados? Pois é, ontem foi justamente o contrário: 10 pontos atrás no placar por todo o jogo, quando chegou a hora de uma reação o time ficou mais de 20 pontos atrás. É o Mundo Bizarro, em que o Billups não joga em Detroit, o Pistons perde no final dos jogos e a Maísa tira a peruca do Sílvio na tevê. Cheguei a ficar com vergonha do Pistons em alguns momentos, principalmente ao lembrar do fiasco do Iverson, que poderia ter dado tão certo. Desesperados com a defesa intensa do Cavs, por diversas vezes o Pistons teve que confiar a bola nas mãos de Will Bynum para criar seu próprio arremesso, e não importa quão bom ele possa ser um dia, o cara acabou de vir da Liga de Desenvolvimento e não dá pra achar que um cara que era estrela no Ipatinga pode fazer um trabalho tão bom quanto o Allen Iverson. A diferença? O Iverson é uma estrela e o elenco do Pistons jamais poderia suportar que ele criasse seu próprio arremesso enquanto o resto do time, com dor no cotovelo, assiste impotente. O resultado é que o time inteiro assistiu impotente ao Cavs distribuindo a bola, envolvendo todos os companheiros de equipe, mas confiando em jogadas de isolação de LeBron James toda vez que o esquema ofensivo dava errado. Com 38 pontos em tudo que der pra imaginar, de enterradas, arremessos girando o corpo a bolas de três pontos do meio da quadra, LeBron não apenas cala seus críticos (“ele não sabe arremessar”, “ele só se baseia na força física”, “ele não achou a cura para o câncer”) mas também prova que um basquete coletivo e uma estrela capaz de jogadas individuais podem coexistir. Iverson apenas foi mal recebido e mal utilizado.
O que imediatamente me lembra do Dallas Mavericks. Alguns dias atrás tentei compreender o que diabos acontece com a equipe, que supostamente fede mas mesmo assim acaba vencendo, acabou bem a temporada e garantiu uma boa posição nos playoffs. Ontem, contra o Spurs, pudemos ver mais de perto e confesso que fiquei indignado. Troque o Jason Kidd pela minha avó, ao menos nos dias em que ela se lembra do caminho para o banheiro, e não haverá qualquer diferença tática. Tudo que o Kidd sabe fazer de melhor é ignorado pelo esquema planejado pelo técnico, nem contra-ataque ele consegue puxar: o Dampier e o Nowitzki não acompanham, enquanto Josh Howard, Jason Terry e quem mais estiver em quadra sempre segue a tendência de abrir, rumo à linha de três pontos. Toda vez que o Kidd pega um rebote e corre para o ataque, o garrafão está sempre vazio, com jogadores do Mavs esperando a oportunidade de arremessar de três. Bons tempos em que sempre havia alguém capaz de encerrar seus contra-ataques com uma enterrada, de Kenyon Martin a Mikki Moore, de Kerry Kittles a Richard Jefferson. Nem é questão de talento (vários desses nomes fedem), mas de saber criar um elenco que usa as qualidades de cada um. No Mavs todo mundo tem alergia de garrafão, até o Brandon Bass que supostamente deveria jogar debaixo da cesta se baseia em arremessos de média distância. Parece que todo mundo na equipe acha que está no campeonato de 3 pontos do All-Star Game, só que com um pouco mais de animação. Se o Kidd consegue alguma coisa é porque tira água de pedra, mas passar para o lado para jogadas de isolação de Josh Howard, Nowitzki e Jason Terry não pode fazer bem para o fim de carreira de ninguém. Para piorar, é claro que o Kidd não pode defender Tony Parker (não é demérito nenhum, quase ninguém na NBA pode, mas o Kidd poderia pelo menos tentar cheirar o Parker de vez em quando para ver se tem um resto perfume da Eva Longoria) e por vezes, ao invés de se tornar um trunfo, ele vira um fardo em quadra. Os melhores momentos da equipe foram com o “José João” Barea (já diria alguém no chat do Bola Presa) lá no quinteto titular, não porque ele seja o melhor marcador da raça humana, mas simplesmente porque ele consegue correr atrás do Parker e não dar a impressão de que o Mavs defende com apenas 4 jogadores. Já o Spurs jogou como sempre, o Parker dominou o garrafão, o Duncan acertou suas cestas usando a tabela (tm – “marca registrada, todos os diretos reservados”), e pra mim obviamente ganhou o jogo. A não ser pelo placar, que me desmente. Estou acostumado a ver o Spurs jogar sempre do mesmo jeito, o outro time feder, e a partida acabar com o Spurs muito na frente. Dessa vez foi tudo como de costume mas o Mavs venceu, em San Antonio, com o Kidd mal utilizado, os lapsos defensivos, a fobia de garrafão, uma partida com excesso de faltas do Nowitzki e o Mark Cuban com aquela cara de nerd fracassado na torcida. Não sei se o Spurs não é mais o mesmo ou se, diabos, eu é que não entendo esse Mavs de jeito nenhum!
Mas enquanto Jason Kidd e Iverson são brutalmente mal aproveitados em suas equipes, um armador foi usado à perfeição na maior zebra da noite. Derrick Rose, também conhecido como “o-homem-que-eu-achei-que-não-deveria-ter-sido-escolhido-pelo-Bulls”, mostrou que pode simplesmente fazer o que bem entender em quadra e todo mundo deixa. “Dá uma licencinha para eu fazer uma bandeja, por gentileza?”, “Pois não, senhor Rose, quer também um suquinho, uns amendoins e dormir com minha mulher?”. O abuso foi tão grande que não dava para não lembrar do Dwyane Wade, quando foi campeão da NBA, completamente imparável e cobrando quinhentos lances livres por jogo. Apanhou tanto, culpa do desespero das defesas, que a imagem ficou queimada na retina dos juízes: bastava alguém na torcida espirrar e, por reflexo, marcavam falta no Wade. Com o Derrick Rose foi igual, ele cobrou 12 lances livres e acertou todos, alguns foram pancadas, outros apenas força do hábito, mas mais importante do que isso foi a frieza com que metodicamente dava um drible seco, atacava a cesta e convertia cada um dos seus lances livres. Foi essa frieza que Paul Pierce, depois de ser atropelado pelo grosso do Joaquim Noah, não teve – poderia ter vencido o jogo mas, perdendo um de seus lances livres, levou o jogo para a prorrogação. Meu argumento para que o Bulls tivesse draftado Beasley remete a um problema tão óbvio que está em todos os livros de história (“problemas do século XXI: desigualdade social, AIDS e malária na África, conflitos na Faixa de Gaza, o garrafão ofensivo do Chicago Bulls”), que é a incapacidade da equipe em atacar a cesta, em ter uma força ofensiva debaixo do aro. Dar uma grana maluca para o Luol Deng não ajuda nada quando a gente lembra que ele tem uma paixão por arremessar, e o garrafão continua sendo composto por sutilizas como o Noah e o Tyrus Thomas (tem alguma alma viva, além da mãe dele, que não tenha certeza absoluta de que ele vai fazer merda toda vez que toca na bola?). Mas aí está uma resposta inusitada e que deu mais certo do que eu jamais poderia sonhar: Derrick Rose ataca a cesta, congestiona o garrafão, acerta suas bolas e com isso cria espaços para os seus companheiros que assistem tudo a 30 metros de distância. Além dos 36 pontos no jogo, foram 11 assistências. Vale dizer que o Bulls ainda fede, que o Tyrus Thomas acertou na sorte arremessos que nenhum ser humano deveria ter tentado converter, mas esse Celtics sem Garnett tem um garrafão de mentirinha, uma defesa esburacada e nem um pouco de confiança, principalmente quando as bolas do Ray Allen não estão caindo. Para mim, a ausência de Garnett apenas explicita a incapacidade do Doc Rivers, tão bom técnico quanto o Pedro Bial é poeta. Na verdade, é o Garnett quem coloca ordem na bagaça, tanto na defesa quanto no ataque, e ele deu muito mais intruções para o Allen e o resto do time na partida de ontem, mesmo de terno no banco de reservas, do que o Doc Rivers já falou em toda sua vida (“vamos lá, time!” não vale). Não vamos nos precipitar, o Hawks na temporada passada provou que qualquer um poderia ganhar do Celtics na primeira rodada dos playoffs mas, depois que o Celtics ganhou deles no jogo 7, ninguém nunca mais conseguiu parar os verdinhos. É cedo para achar que essa zebra significa que o Celtics está morto.
O que não é o caso da última zebra da noite, a vitória do Houston em cima do Blazers. Tenho que ser sincero, por um lado estava muito feliz de finalmente não enfrentar o Jazz na primeira rodada dos playoffs, mas por outro lado fiquei desesperado com a idéia de pegar o Blazers. Empolgados, profundos, com mando de quadra e dois pivôs para dar trabalho para Yao: Przybilla, um dos pivôs mais pentelhos do mundo na defesa, e Greg Oden, com seus 62 anos de experiência no garrafão. Estava pessimista, o Blazers é um dos melhores times jogando dentro de casa e, com mando de quadra, apenas um milagre levaria meu time para a próxima rodada. Talvez uma vitória de surpresa, logo no primeiro jogo. Talvez. Camiseta do Yao em mãos, transmissão clandestina na internet, esperei o melhor – e recebi. Apesar do apoio da torcida em Portland, a equipe pareceu nervosa e inexperiente a princípio, e muito desinteressada depois, quando a diferença de pontos subiu demais. Foi um massacre de um time calejado, que aprendeu a jogar de trocentas formas diferentes por sempre sofrer com contusões, e um time novo que nunca esteve naquela situação, medroso e incapaz de barrar algumas armas ofensivas óbvias. Yao Ming sentou todo mundo e brincou de escolinha: “vamos aprender como marcar pontos de tudo quanto é jeito, vamos?” Foram ganchos, enterradas, arremessos de fora, giros em cima dos pivôs adversários. Apesar de não parecer (as rugas enganam), Oden é uma criança sem fundamentos suficientes para segurar a técnica de Yao. Przybilla, por sua vez, é apenas ruim demais para a tarefa. Acertando todos os seus 9 arremessos e todos os 6 lances livres, Yao marcou 24 pontos só no primeiro tempo. E poderia ter sido muito mais, porque apesar de estar dominando o jogo, foi continuamente ignorado pelo resto do elenco em posses de bola seguidas, quando alguém resolvia arremessar de três ou isolar o Artest em alguma jogada tola. Se tivessem apelado, Yao teria feito mais de 30 só para começar. No segundo tempo, chegou a colocar os pés em quadra mas sentou logo, o Houston não precisava dele porque o Blazers queria ir para casa ver o filme do Pelé. Foi um massacre sem T-Mac e sem Rafer Alston (obrigado, obrigado, Deus existe!), a partida mais fácil do Houston em playoffs nessa década. Torcedor maluco ou não, pra mim a série já era para o Blazers. Ficaram óbvias falhas grandes demais que não serão arrumadas a tempo. Quem sabe pelo menos façam uma marcação dupla no Yao Ming no próximo jogo, para dar uma graça.
Não tinha como pedir um primeiro dia de playoffs mais legal do que esse: três zebras, um LeBron James, prorrogação e vitória fácil do Houston. Eu pelo menos estou feliz, e convenhamos que em matéria de playoff, não é muito fácil ver um torcedor do Rockets sorrindo. Hoje tem mais, com Lakers e Jazz às 16h, Sixers e Magic às 18h30, Heat e Hawks às 21h e Hornets e Nuggets às 23h30. Nada de jogo na televisão dessa vez, abandonados que estamos na terra do futebol. Mas a internet está aí para isso, aqui no chat do Bola Presa sempre tem algum link pra assistir na hora do jogo. Não dá pra perder nenhuma partida hoje, será que talvez tenhamos de novo três zebras e um Kobe Bryant?