>Fazendo chover

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Maroto, Rashard Lewis pede um passe
do
LeBron, que não caiu na artimanha

Torcer contra o LeBron James é como protestar contra o tempo ruim: você pode gritar o quanto quiser para as nuvens, arrumar uns malucos para te acompanhar numa passeata, mas o céu vai continuar nublado e chovendo na sua cabeça.

Mas eu até entendo essa gente que critica o LeBron e gosta de diminuir seus feitos. Afinal, o sujeito nunca se deu mal na vida, nunca fedeu. Ainda no colegial, já dominava por completo as partidas e era nitidamente um gigante entre formiguinhas. Nunca houve dúvida sobre em que escolha ele seria chamado na noite do draft, com placas reais de “Percam por LeBron” tomando aos poucos o ginásio de Cleveland desde o meio da temporada de 2003. Sua primeira partida de pré-temporada foi espetacular, acima das expectativas, e saiu-se ainda melhor em sua primeira partida oficial na temporada regular. Na primeira partida dele em playoffs, saiu de quadra com um triple-double. Dois anos depois, foi campeão da Conferência Leste. Quando entrou na NBA, não tinha mão esquerda, mas hoje é ambidestro. Não decidia partidas no final, mas agora é fominha. Não tinha arremesso, e agora domina os arremessos de meia-distância, subindo no meio da passada. Não acertava lances livres, e agora tem uma mecânica confiável. Não arremessava de três pontos, e agora acerta com constância. Diabos, é como a garota linda que sai com o capitão do time de futebol americano, é eleita a rainha do baile de formatura, forma-se em Harvard, é milionária, poliglota e indicada ao Oscar. Ou seja, não adianta aquela gordinha passar a vida inteira torcendo contra, nada pode dar errado: o LeBron James é a Natalie Portman da NBA.

Fica até chato mesmo. LeBron James nunca teve que enfrentar as adversidades. Michael Jordan foi draftado com a terceira escolha, teve que provar que seus críticos estavam errados, e fedia no começo de sua carreira com o esporte. LeBron nunca passou por coisas assim – a não ser o fato de ser duramente criticado simplesmente por ser espetacular e não chamar Jordan, claro. Provavelmente dono do físico mais privilegiado para tomar parte de uma partida de basquete em toda a história da humanidade, ninguém teve tanta sorte quanto LeBron. É por isso que, desde o primeiro segundo, temos que lidar com propagandas, marcas de refrigerante com a sua cara, comerciais de camisinha, comentaristas babando sem parar, cobertura insana dos meios de comunicação. Se não é a Alinne Moraes, uma hora tanta exposição enche o saco mesmo, e muita gente odeia LeBron por isso, alegando que ele é fruto da mídia. É o tipo de gente que assiste o canal do tempo e acha que chuva não existe, mesmo quando a porcaria do telhado de casa tá com goteiras. Prefere achar que são duendes mijando lá do alto (a Xuxa, por exemplo, acredita).

Com tanta facilidade, tanto favoritismo, o melhor elenco que o Cavs já conseguiu entregar a LeBron James, uma campanha sensacional na temporada regular e invictos nos playoffs, era de se esperar um domínio total na Final de Conferência, ainda mais porque o Magic é um time um tanto limitado. Na prática, não foi o que ocorreu, com a equipe de Orlando vencendo o primeiro jogo da série. No jogo dois, mais ou menos a mesma história ocorreu: Cavs muito à frente, dominando a partida, abrindo uma larga vantagem e, então, mudando o modo de jogar e permitindo ao Magic passar à frente nos minutos finais. Foi uma das raras vezes em que pudemos ver, portanto, LeBron James lutando contra adversidades. Depois de passar pelos playoffs invicto, começar a final perdendo os dois primeiros jogos em casa seria catastrófico, inaceitável.

Graças a mais uma atuação decisiva de Hedo Turkoglu e, dessa vez, uma partida impecável de Mickael Pietrus dos dos lados da quadra (ele é “o Jordan francês”, já diziam as análise da época do seu draft), o Cavs viu-se 2 pontos atrás no placar com apenas um segundo para o fim do jogo. O resultado? O YouTube virou um lugar mais feliz.

Destaque, por favor, para a cara de “fiz cocô” que o Jeff Van Gundy, sósia do Mario, faz após o arremesso. Também vale a cara do Mo Williams de “salvaram meu emprego” depois dele ter passado o jogo inteiro arremessando sem critério.

O essencial dessa jogada é que existe uma regra silenciosa que funciona na NBA na miúda: perdendo por 2 pontos na jogada final, o time atrás no placar deve
a) dar um arremesso de dois pontos, para empatar o jogo, caso esteja jogando em casa; ou
b) dar um arremesso de três pontos, para vencer o jogo, caso esteja jogando fora de casa.

A ideia, claro, é o fato de sempre ser mais vantajoso para o time que está dentro de casa jogar uma prorrogação, enquanto o time que está fora de casa não tem mesmo muito a perder e, se sair com a vitória, está no lucro. Seguindo essa regra, o plano original era colocar a bola nas mãos do LeBron no garrafão, com um passe alto em direção à cesta para que houvesse um tapinha ou algo similar. Não deu certo, o Turkoglu se posicionou muito bem, e então LeBron correu como um maluco para receber a bola e acabou vencendo a partida. Se tivesse que apostar meu pé, diria que o técnico Mike Brown não desenhou essa jogada, foi apenas o desespero do LeBron de receber a bola que tornou essa vitória possível, porque teve a maior cara de improviso e por muito pouco o Mo Williams não levou 5 segundos para repor a bola causando, desse modo, uma violação que teria perdido o jogo.

O Instituto “8 ou 80” de Estatísticas do Bola Presa (também conhecido como “o Denis quando ele tem algum tempo livre”) me alertou que o arremesso certeiro de LeBron James foi a bola mais decisiva para uma série desde a bola do Horry em 2002, que empatou a série quando o Kings tinha mando de quadra e estava prestes a abrir 3 a 1. Outro dado coletado aponta que, das 6 derrotas que o Orlando Magic sofreu nesses playoffs, quatro delas foram em arremessos de último segundo: Iguodala, Thaddeous Young, Glen Davis e, agora, LeBron James.

Ou seja, o Magic é bom em perder grandes lideranças no quarto período mas é melhor ainda em perder no segundo final. Não é o tipo de coisa de que a gente se orgulha por aí, mas se o Magic chegou à Final do Leste é porque essas derrotas bizarras acontecem com menos frequência do que as vitórias. A fragilidade do time, na verdade, acaba mostrando as similaridades da equipe com o próprio Cavaliers: as duas equipes são limitadas, cercaram uma estrela com um grande conjunto de arremessadores de três pontos e gostam de jogar no contra-ataque. O Magic finaliza seus contra-ataques com bolas de três e não tem uma estrela capaz de monopolizar o jogo, o que por sua vez é ao mesmo tempo bom e ruim. O Cavs usa LeBron demais quando tudo está dando certo, mas usa em excesso quando tudo está dando errado. Ele é capaz de decidir o jogo sozinho quando marcado individualmente, mas com o colapso no garrafão e a ajuda defensiva no perímetro, LeBron é obrigado a passar a bola com frequência para os companheiros livres. A capacidade de Mickael Pietrus de segurar LeBron sozinho, cavando faltas de ataque cruciais no quarto período e incomodando com sua marcação, permitiu que a defesa do Magic se focasse mais no resto do elenco e LeBron teve que cada vez mais jogar sozinho – ao mesmo tempo em que era cada vez menos efetivo contra sua marcação. Foi uma grande surpresa para o Magic e quase trancou o Cavs numa situação impossível de sair. Quase: o LeBron, já percebemos faz tempo, não consegue perder.

O técnico Stan Van Gundy se arrependeu da marcação efetuada na última bola, provavelmente porque o homem que correu atrás de LeBron foi Turkoglu, não Pietrus. Além disso, não houve ajuda defensiva e, se bem executada, a defesa poderia ter impedido LeBron de chegar ao perímetro. Era melhor, para o Magic, correr o risco de tomar uma bola de 2 pontos ao invés de simplesmente perder o jogo. Mas o irmão do Luigi já garantiu que, caso a situação se repita ao longo da série, fará a defesa que deveria ter feito nessa partida. Ou seja, agora que ele avisou, nunca mais vai precisar usar.

LeBron James foi para os playoffs 4 vezes: na primeira, perdeu para o Pistons; na segunda, ganhou do Pistons com atuações históricas e foi campeão do Leste; na terceira, perdeu para o Celtics na Final, com momentos memoráveis. Agora, na sua quarta participação, já queimou na nossa retina esse arremesso que devolveu ao Cavs a chance de não ser uma porcaria. Trata-se de uma bela coleção de momentos decisivos para um moleque tão novo. Sem conhecer muitas adversidades, LeBron poderia ser tranquilo, desencanado ou até mesmo desencantado, ficar gordo como Eddy Curry ou ignorar os treinos como sempre fez Allen Iverson. Mas não, LeBron James é um biruta que não sossega um segundo sequer e quase teve um aneurisma cerebral de tanto comemorar o arremesso convertido.

O Magic, confesso, até pode ganhar essa série. Pode surpreender com uma defensa inteligente, a marcação de Pietrus, os arremessos certeiros contra o garrafão do Cavs que é lento e tem dificuldades de proteger a linha de três pontos. O Magic pode chutar o traseiro do Cavs se tiver um pouquinho de sorte jogando em casa e não desperdiçar as lideranças que, invariavelmente, vai conseguir. O Cavs pode até ser eliminado, voltar com as mãos abanando, e algumas pessoas poderão criticar duramente LeBron James por ser uma ilusão de óptica, exagero midiático. Mas ele, como tão bem nos mostrou, vai continuar chovendo.

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