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Iverson, forte como o Grizzlies
Tem coisas que a gente acha que nunca vai ver na vida mas acaba vendo. Ronaldo no Corinthians, Once Caldas campeão da Libertadores, o Dado Dolabella milionário porque o povo escolheu e até o Allen Iverson no Grizzlies.
Está finalmente confirmada a contratação do armador pelo time de Memphis. Contrato de apenas um ano no valor de 3,5 milhões de dólares, 17 milhões a menos do que recebeu no ano passado. Deve ser a única vez que um cara desse nível aceitou tamanho corte de salário para jogar em um time pior do que o que jogava antes! Geralmente as estrelas ganham menos pela chance de ganhar um título.
Há alguns anos o Iverson era jogador garantido no All-Star Game, um dos melhores jogadores do planeta e com vaga assegurada no Hall da Fama quando encerrasse a carreira. Para muitos foi o melhor jogador da história da NBA entre os com estatura comum para um ser humano. Foi o ídolo de uma geração por ser o mais humano entre os gigantes, qualquer um podia se identificar com ele.
Mas em um ano tudo desabou. A simples troca do Iverson de Denver para Detroit colocou em evidência todos os seus defeitos. O time que ele deixou melhorou absurdamente com a sua saída e o que ele chegou, que era sucesso há anos, foi um fracasso. Iverson então era um cara que estragava a química das equipes, era fominha, estava velho, não podia jogar como armador principal e prendia a bola demais para um ala-armador. Convencidos de tudo isso, nenhum time o quis.
Com o risco de ficar sem emprego, o quinto maior cestinha em média da história da NBA aceitou essa proposta mixuruca do pior e mais pobre time da NBA. Esse é o momento em que qualquer um que nunca gostou do Iverson dá aquela olhar de dó pra ele e pensa “Nem eu desejava isso pra você”.
Não vou repetir toda minha opinião sobre o Iverson, que já disse aqui. Mas para quem está com preguiça de clicar no link, o resumo é que o A.I. não desaprendeu a jogar, ainda tinha o mesmo talento na temporada passada, mas suas características de jogo são muito específicas, não se encaixam em qualquer time. Mas não importa que eu ache isso, o que importa é que os caras que mandam na NBA acham que ele estraga equipes, simples assim. E importa saber se ele, já com 34 anos, vai conseguir fazer estes caras mudarem de idéia.
Essa é, portanto, uma temporada decisiva para o Iverson.
Podemos compará-la a uma temporada de novato. Quando um jogador entra na NBA ele tem uma imagem que carrega de sua carreira internacional ou de faculdade e ela o faz ser draftado em certa posição do draft. Depois tudo se apaga e começa do zero. O que o cara fizer na sua primeira temporada entre os profissionais é o que vale. Se foi um sucesso mesmo sendo lixo em 4 anos de faculdade, então o cara é um achado de um olheiro genial, se é um fracasso depois de ter sido tetra-campeão universitário, então o cara é um lixo que tinha um bom técnico.
Iverson é o laranja podre da NBA e tem um ano para mudar isso. Se der errado como deu no Pistons, esta pode ser a sua última temporada como jogador da NBA. Se ele tiver sucesso, liderar o jovem Grizzlies a grandes vitórias, aí será um festival de matérias dizendo que Iverson deu uma resposta aos críticos e no ano que vem ele estará em algum time bom, recebendo um salário altíssimo de novo. O desafio até chegar nisso é gigantesco.
Iverson sempre foi criticado por não ser um bom líder e não comandar bem jovens companheiros, e ele agora é o cara mais experiente de um time horrível e cheio de pivetes. O jogador mais experiente depois dele é Zach Randolph, talvez o único cara na NBA com fama de ser mais fominha que o A.I.
Sei que o Iverson já jogou partidas históricas de playoff e até partidas de finais, mas talvez esse seja o maior desafio da sua carreira até agora. É uma luta contra si mesmo para mudar o seu estilo de jogo ou uma luta com os outros para provar que o antigo estilo ainda pode render bons frutos. Não sei o que ele vai escolher mas será dificílimo de qualquer jeito.
Vamos ver pelo outro lado agora, se foi difícil para o Iverson, será que foi também para o Grizzlies tomar essa decisão? Se nenhum time queria o risco de ter o Iverson, por que o Grizzlies topou? Até porque seu melhor jogador na temporada passada foi justamente o OJ Mayo, que joga na posição do A.I.
Ok, mas pensem bem, o que o Grizzlies tem a perder?
Eles são o pior time da NBA, o mais pobre. Não tem audiência na TV, as camisetas não vendem e o ginásio está sempre vazio. Todo ano na época do draft tem um monte de pirralho sem moral dizendo que querem ir pra qualquer lugar menos pro Grizzlies. Já existem boatos desde a apresentação de cada um deles que Marc Gasol, Mayo e Rudy Gay vão dar o fora do time assim que virarem Free Agents, tamanha a falta de atenção e de perspectiva de sucesso no Grizzlies.
Com esse pesadelo todo em vista, onde está o mal negócio em ter um dos maiores ídolos da última década no time? Ele vai fazer os ginásios encherem, vai ser a atração da cidade, vai vender camisetas e pode até atrair um ou outro joguinho na TV. Será até esquisito ver um jogo do Grizzlies no League Pass sem ouvir o eco da bola batendo no chão ou os gritos dos jogadores!
Além disso, tem toda essa situação do Iverson, que é muito delicada. Se ele tem alguma esperança de continuar com uma carreira na NBA não vai faltar dedicação e esforço para que tudo dê certo. Ele até já disse que pretende mostrar para a pirralhada que é importante treinar. Treinar! Practice! Isso não é garantia de resultado nenhum, mas é um bom começo.
Pensando na parte tática, a coisa fica menos bonita. Mike Conley, armador principal do time, finalmente começou a deslanchar na segunda metade da temporada passada e seria terrível interromper esse desenvolvimento jogando o garoto pro banco.
E difícil imaginar Mayo como um reserva depois de ser o melhor jogador do time na temporada passada e mais difícil ainda imaginar o Iverson chegando lá pra ser reserva depois de toda polêmica que o assunto deu na briga dele com o Rip Hamilton pela vaga de titular em Detroit.
Desses três que não vemos como reservas, um terá que ser. Se for o Conley o Iverson vira armador titular, posição onde ele não rendeu nada bem no Sixers e no Nuggets. Se for o Mayo é capaz do pivete começar a pedir pra ser trocado logo de cara. E finalmente tem a última opção que é a que eu faria, Iverson na reserva.
E faria sem pensar duas vezes. Em um texto um tempo atrás, já disse que a característica principal daquele Sixers em que o Iverson brilhou e foi até as finais era a boa defesa, o time equilibrado e o ataque todinho na mão do Iverson. No Grizzlies ele pode vir do banco junto com caras como o Darrell Arthur e o Hasheem Thabeet e concentrar o ataque todo em suas mãos.
Isso deixaria o Grizzlies desenvolver bem os seus jogadores mais jovens e eles ainda não ficariam completamente na mão na hora de usar o banco de reservas. Acho que é uma solução bem básica e que pode ser colocada em prática logo no começo da temporada. Ficaremos atento (olha o que o Iverson faz, nos deixa atentos ao Grizzlies!) em como o técnico Lionel Hollins arma o time desde a pré-temporada.
Com o Iverson por lá, o Grizzlies não fica devendo nada a ninguém no quesito talento. Tem muitos elencos melhores por aí, óbvio, mas olhando friamente são caras bons em todas as posições! Conley, Mayo, Gay, Randolph, Gasol. É talento o bastante pra engrossar contra qualquer equipe. Só que são caras bons que não conseguem transformar esse talento individual em um time e, logo, em vitórias.
É, pensando desse jeito, Iverson e Grizzlies foram feitos um para o outro.