>A batalha no garrafão

>

Quando Robin Lopez está indo pro banco, seu cabelo
impede toda a torcida de enxergar o jogo

Todo mundo sabe que a série entre Celtics e Magic desceu privada abaixo. O tal “melhor time dos playoffs” deve perder novamente essa noite e ir embora com um 4 a 0 enfiado na orelha nessa pós-temporada que será conhecida pela História como “os playoffs das varridas” (ou como “os playoffs mais ‘bleh’ de todos os tempos”). Por sorte, a série entre Lakers e Suns ao menos não vai ser outra varrida, o que deve diminuir um pouco a taxa de suicídios nos próximos dias (se bem que o fim de “Lost” deve ajudar a alavancar a taxa, muita gente estava só esperando a série terminar).
Mas antes de falar sobre a série que ainda resiste e nos dá alguma esperança na humanidade, vou praticar um pouco do meu esporte favorito: falar mal do Dwight Howard. Já comentei em um post detalhado sobre como recebemos o Dwight com alegria na NBA pela falta de pivôs que assolava a liga, sobre ele ser carismático, dominante na defesa, forte pra burro, aberração da natureza, mas que seu time joga pior quando se foca nele no ataque. Só que nessa série contra o Celtics, isso tem ficado mais óbvio do que nunca e gera um paradoxo terrível: o Magic só vai vencer o Celtics se tiver um jogo de garrafão, mas o time é tremendamente pior quando o jogo é focado no Dwight embaixo da cesta. Ou seja, funhé!
O engraçado é que o mesmo problema que assola Dwight Howard nessa série assolou também Shaquille O’Neal quando o Cavs enfrentou o Celtics pouco tempo atrás. No caso do Cavs, o Celtics se saiu bem melhor em quadra nas partidas em que Shaq foi deixado livre para receber a bola no garrafão. Isso tirava a bola das mãos de LeBron, limitava o jogo de perímetro do Cavs (que é um dos pontos fortes da equipe), permitia que a defesa amontoasse embaixo do aro, se aproveitava da força bruta de Kendrick Perkins e, principalmente, diminuía o ritmo do jogo. O Shaq ficava de costas para a cesta, batendo bola, tentando achar um espaço, interrompendo a movimentação ofensiva do resto da equipe, e aí sofria uma falta. O jogo fica paralizado, Shaq erra a maioria dos lances livres, o Cavs não deslancha no placar, mas na posse de bola seguinte lá está o Shaq acessível de novo e aí tentam acioná-lo. Mesmo que o pivô acerte algumas cestas, o Celtics sempre saiu no lucro tornando o jogo ofensivo do Cavs lento e estagnado, sem dar ritmo a nenhum dos pontuadores que poderiam fazer a diferença na série. Foi-se o tempo em que, se Shaq recebesse todas as bolas do jogo, pontuaria em todas as ocasiões e ainda tiraria todo o garrafão adversário com excesso de faltas. Agora cada posse de bola dele no ataque é um esforço, uma incógnita, algo que ao invés de ser uma bola de segurança passa a ser uma jogada arriscada.
Em parte, isso é culpa das novas regras da NBA. Faltas de ataque são marcadas com maior frequência, o contato no garrafão é cada vez mais restrito e as jogadas se iniciam mais longe do aro. Mas o maior mérito é da defesa do Celtics e de Perkins, que sabe complicar as coisas no garrafão e se beneficiar desse jogo lento e indeciso do adversário. O Dwight Howard passa pelo mesmo sufoco. Já vimos que o rapaz tem bons movimentos no garrafão, repertório de ganchos e até arremessos usando a tabela, mas nenhum deles é confiável e dá pra ver na cara do Dwight que ele odeia ter que usá-los. O pivô simplesmente não se sente à vontade, seu jogo não é esse. Se dominasse ofensivamente e atacasse Perkins com naturalidade, o Magic já teria destruído o Celtics. Mas, ao contrário, quando recebe a bola um pouco longe do garrafão (coisa que o Perkins e Glen Davis sempre garantem que aconteça), Dwight tem receio de atacar a cesta, seus movimentos ofensivos costumam ser na direção contrária ao aro, fugindo do contato. Às vezes os arremessos caem, mas como no caso do Shaq, vale a aposta para o Celtics: o ritmo de jogo cai, o Magic deixa de jogar em velocidade no contra-ataque, os arremessadores de três deixam de ser acionados, e quando é preciso cometer faltas o Dwight não converte os lances livres. Num mundo ideal para o Celtics, a bola até mesmo ficaria nas mãos do Dwight em todas as posses de bola.
Se vocês já viram um jogador de garrafão dominante ser marcado (Yao Ming, Brook Lopez), já viram a tática “sanduíche” de defesa: um jogador marca o pivô pelas costas, impedindo que se aproxime da cesta, e outro marca o pivô pela frente, tentando evitar passes para esse jogador. Sempre que essa tática é utilizada, o pivô marcado é anulado, mas o resto do time tem mutíssimo espaço para jogar. No caso do Magic, é justamente o contrário: Dwight recebe a marcação mais comum possível porque para o Celtics é melhor que ele receba a bola ao invés de ser anulado. Um pivô que passa bem a bola cria comoção no garrafão e então manda a bola para o perímetro, onde encontra um arremessador livre. Mas o Dwight não passa bem a bola, perde o controle dela muito mais do que completa um passe, então só abre espaço para os arremessos de fora quando domina o jogo no ataque. Contra o Perkins, tentando ganchos longe da cesta, ele nunca conseguirá fazer isso. E os arremessadores do Magic, desesperados com a marcação de perímetro do Celtics, acionam Howard em vão – até ver que só dá merda e pararem de colocar a bola em suas mãos. Por mais bizarro que possa parecer, Cavs teria se saído melhor sem Shaq e Magic se sairia melhor sem Dwight. Um simples jogador de garrafão que ataque a cesta faria mais estrago nessa defesa do Celtics. Tirando aquilo que o Dwight traz na quadra defensiva, Gortat é mais útil para o time.
O que nos leva à série minimamente interessante das Finais: Lakers e Suns. Depois de tomar duas surras, o Suns conseguiu resolver seus problemas de garrafão. No ataque, a solução foi justamente o que Shaq e Dwight não conseguem fazer: atacar o aro. Não adianta colocar a bola nas mãos do Amar’e Stoudemire já dentro do garrafão, embaixo da cesta, pra ele subir e converter. É burrada. O garrafão do Lakers é grande demais, Amar’e é muito menor, e o Suns fica tentando arremessar de fora. O truque foi deixar Amar’e receber a bola fora do garrafão, ou então em movimento em direção ao garrafão, e atacar a cesta. Ele é bom nisso, em jogar em movimento, sofrer o contato e tentar converter a cesta. Com 5 minutos de jogo e esse plano acontecendo, Amar’e já havia sofrido duas faltas de Bynum (que foi para o banco), uma de Gasol e uma de Odom. Ainda no primeiro quarto, tirou Odom com duas faltas. No resto da partida, continuou limitando os minutos do garrafão do Lakers ao cavar faltas a ponto do Bynum praticamente não ter participado do jogo.
Fora uns dois ou três leitores birutas do Bola Presa reclamando no nosso Twitter, não encontrei uma única alma viva capaz de reclamar da arbitragem no jogo de ontem. Tem que ser muito fanático pelo Lakers ou ter comido muito cocô pra achar que houve algo de bizarro com os juízes. O que aconteceu foi que o Suns entrou em quadra com um plano muito específico de atacar a cesta ao invés de estabelecer um jogo já dentro do garrafão. Até mesmo o Robin Lopez, que era ponto crucial para essa série do Suns na defesa, recebeu passes em movimento para terminar com ganchos na corrida ou com arremessos de meia distância. Em nenhum momento recebeu a bola para jogar de costas pra cesta, e é aí que o Suns resolveu o jogo.
Aliás, o Robin Lopez foi escolhido com a 15a escolha do draft pelo Suns, enquanto seu irmão gêmeo Brook Lopez foi a 10a escolha pelo Nets. Na época comentou-se que, pelas limitações ofensivas do Robin (nome de jogador secundário), ele havia sido escolhido cedo demais. No entanto, o Nets comentou pouco tempo depois que, em caso do Brook Lopez ter sido escolhido antes da décima escolha, a equipe teria draftado seu irmão Robin sem pensar duas vezes. E com razão: ainda na temporada regular deu pra perceber como seu jogo ofensivo pode não ter um arsenal enorme, mas é simples, eficiente e refinado. Eu sei que ensinaram 40 movimentos diferentes para o Dwight nos últimos anos, já vi ele usar vários, mas de que adianta se nenhum deles é natural para o pivô? Se houvesse apenas um único movimento em que ele tivesse segurança, seu jogo seria revolucionado.
Voltando ao Suns e Lakers, a batalha do garrafão foi vencida pelo time de Phoenix também na defesa, no que podemos chamar de “a versão reumatismo da defesa do Thunder”. Já comentamos como o Thunder deu uma aula sobre como defender o Lakers mesmo tendo um garrafão baixo, basicamente dobrando em todos os jogadores de garrafão, fechando o caminho para o aro, e marcando o perímetro apenas na correria, deixando a equipe de Los Angeles arremessar. Mas como repetir a fórmula num time velho demais pra ficar correndo para o perímetro ou pra ficar dobrando a marcação? A resposta favorita da terceira idade é a defesa por zona.
O que o Suns fez foi uma defesa 2-3, com dois jogadores marcando o perímetro e três jogadores marcando uma linha no garrafão. Como o Lakers joga em geral com três jogadores no perímetro (Fisher, Kobe e Artest, por exemplo) fica sempre alguém livre para arremessar. A defesa então fica girando, forçando a bola a ter que ser mandada para o lado oposto da quadra para o arremesso livre, enquanto o garrafão vai fazendo a cobertura. Essa defesa interrompe as linhas de passe para o garrafão, faz com que os pivôs sejam pouco acionados, mas é completamente destruída por bons arremessadores e por alguém que ataque o aro vindo do perímetro. O mais engraçado foi ver a defesa do Suns (que se confundiu trocentas vezes com essa marcação por zona na hora de defender a linha de três pontos) uma hora simplesmente parar de rodar para deixar o Artest continuamente livre. Se estamos confusos e somos uma merda nisso, então vamos simplificar e deixar o Artest arremessar da zona morta, tá, pessoal? Nem preciso dizer que funcionou perfeitamente.
Dentro do garrafão não deu sempre certo, o Amar’e é muito ruim defendendo e o Channing Frye é uma aberração da natureza, parece que ele até ajuda quem está atacando, só falta fazer pézinho para alguém enterrar. Mas a zona inibe os passes para dentro e comete pouquíssimas faltas perto do aro (motivo pelo qual o Lakers quase não cobrou lances livres, não uma conspiração bizarra dos juízes da NBA). Em geral, marcar zona 2-3 significa que o teu perímetro tem que correr bastante e acaba cometendo mais faltas, enquanto o garrafão praticamente não tem contato físico. Mas como o perímetro do Suns não sabe defender nada (Nash, Leandrinho, J-Rich), ninguém cometeu falta nenhuma e o Lakers não soube como lidar com isso. O Kobe atacou a zona de forma muito agressiva e inteligente (ele tem um cérebro!), mas quando passou pro lado viu merda acontecendo. A versão “tricô e bingo” da defesa do Thunder foi espetacular, e um time que havia sido engolido no garrafão nos jogos anteriores deu o troco. Ah, finalmente, uma série em que os times aprendem e se modificam ao longo dos jogos ao invés de uma varrida ridícula.
O único problema é que o Lakers vai ter tempo de estudar a partida e desenhar na prancheta como se livrar da zona. Os arremessos de fora precisam cair e Artest tem que voltar a treinar os arremessos, como fez contra o Jazz e acabou decidindo a série. O Fisher teve uma ótima partida ofensiva, especialmente nos arremessos, e tem que repetir a dose. Só que alguém tem que pegar o Nash, não dá pro Fisher ficar fazendo os dois trabalhos. Por enquanto o Fisher tá fazendo um trabalho impecável em cima do canadense, cheio de contatos físicos, tapinhas e muito estudo dos vídeos do Bowen marcando o armador do Suns. Ontem, teve até uma cabeçada do Fisher quando o jogo já estava decidido que acabou quebrando o nariz do armador. A cabeçada foi muito sem querer, mas vale a pena dar uma olhada no vídeo só pela cara do Grant Hill quando olhou o nariz torto do Nash, e depois tem o canadense arrumando o nariz com a mão a sangue frio, parecia aquela cena do “Máquina Mortífera” em que o maluco coloca o ombro de volta pro lugar batendo com ele numa parede.
Aí quando eu digo que num jogo já decidido ninguém tem que ficar cometendo falta, descendo o cacete ou dando cabeçada, que basta derrubar o rei tipo no xadrez, pessoal me acha emo. Seja como for, o Nash é o maior ímã de porrada do mundo. Será que odeiam tanto o coitado assim ou ele só é muito azarado? Mal sarou de um olho roxo no maior estilo “Rocky, o lutador” e agora tem um nariz arrebentado. O Nash precisa de uma carreira mais segura, como boxeador ou caçador de jacarés. Se a gente lembrar que o Leandrinho abriu a cabeça e sangrou pra burro um jogo atrás, e que o Amar’e joga com óculos depois de descolar a retina tomando dedadas no olho em dois jogos consecutivos e depois num treino do Suns, podemos sentir que o Universo pune muito quem não joga na defesa. Quem sabe essa marcação por zona migué que o Suns faz (a zona é boa, a defesa do Suns nunca é) deixa o Universo mais contente e pelo menos permite que essa série chegue a um Jogo 7. Quando, então, Nash terá um derrame cerebral depois de ser atingido por um meteoro.

Como funcionam as assinaturas do Bola Presa?

Como são os planos?

São dois tipos de planos MENSAIS para você assinar o Bola Presa:

R$ 14

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

R$ 20

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Como funciona o pagamento?

As assinaturas são feitas no Sparkle, da Hotmart, e todo o conteúdo fica disponível imediatamente lá mesmo na plataforma.