>Adaptação

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Nowitzki, que é um amarelão, erra a bandeja final que poderia dar a vitória para o Mavs. Opa. 
Espera. Notícia bombástica: ele não errou, venceu o jogo e amarelão é a senhora tua mãe

Então quer dizer que a moda nesses playoffs é conseguir uma vantagem gigante no placar e jogar na privada durante os minutos finais do quarto período? Seguindo o modelo do Thunder (que perdeu para o Mavs em 5 minutos) e do Bulls (que perdeu para o Heat em 3 minutos), o Miami Heat fez uma versão estendida na noite de ontem e perdeu uma vantagem de 15 pontos em 7 minutos. Nem é tão absurdo assim, 7 minutos é tempo pra burro – toda vez que o Heat tentava queimar tempo no relógio esperando aquele pesadelo acabar com algo restando da vantagem no placar, ficava claro que se o horror continuasse o cronômetro não lhes salvaria a pele. Absurdo mesmo foi a defesa que o Mavs colocou em prática para conseguir virar o jogo nesse tempo, e nem foi a famosa defesa por zona que idolatramos por aqui.

Aliás, a defesa por zona apareceu pouquíssimo na partida de ontem. No primeiro jogo, assim que o Mavs colocou a zona em prática tomou uma cesta livre de Bosh, encontrado no espaço vazio entre os defensores. É claro que a defesa causa estranhamento e levou um tempo para que o Heat atacasse a zona como manda o manual, mas isso acontece com qualquer variação defensiva que é colocada em prática no meio de um jogo. O Heat estranhou, ficou um pouco preso no perímetro, mas a cesta do Bosh era indício de que LeBron e Wade sabiam o que estavam fazendo – afinal, jogaram pela seleção americana e estão mais do que familiarizados com esse tipo de defesa. Rapidinho já estavam quebrando a zona na base do drible, acionando Bosh, e o técnico Rick Carlisle mandou a defesa voltar ao normal. A diferença ficou óbvia já no primeiro jogo: com a defesa por zona, o Heat tendia a bater para dentro do garrafão, enquanto na defesa individual o Heat preferiu arremessar de fora. Todos nós vimos que o LeBron jogou um absurdo no primeiro jogo, que os arremessos de três caíram, e que o Mavs perdeu a partida. Mas, diabos, eles estão enfrentando Wade e LeBron, não há muito o que fazer além de escolher como você prefere ser punido – e contra esse Heat o melhor é ser punido nos arremessos de longa distância. Essa foi a escolha que o Mavs fez ao enfrentar também Lakers e Thunder, permitindo que os dois times arremessassem o quanto quisessem e garantindo que as penetrações seriam limitadas ou então recebidas com agressividade por Tyson Chandler e Brendan Haywood.

Para garantir que as penetrações sejam limitadas, a defesa individual do Mavs não é lá tão individual assim. O pick-and-roll do Miami é defendido com algum jogador de garrafão impedindo o avanço do armador, e então a defesa precisa rodar para impedir que o jogador que fez o corta-luz saia livre. A defesa é individual, portanto, mas está sempre “fazendo a troca”, ou seja, ninguém tem um jogador específico em que deve ficar grudado o tempo inteiro. Isso exige uma disciplina que o Mavs possui graças ao costume com a defesa por zona, e limita as infiltrações e o jogo de pick-and-roll do Miami ao máximo. De certo modo, o fato de que o Mavs não consegue usar sua melhor defesa – que é a zona – contra o Heat nessa série é uma vitória para a equipe de Miami, mas a defesa individual do Mavs é tão boa que essa vitória moral não pode ser levada a sério.

O maior problema da defesa individual do Dallas é que quando a rotação defensiva atrasa ou coloca jogadores menores para marcar jogadores maiores, fica mais fácil para o Heat conseguir rebotes ofensivos. No primeiro jogo foram 16 e no fundo garantiram a vitória. Mas ontem o Dallas fez um trabalho bem melhor na rotação, tentando fazer com que o jogador que saiu para impedir uma infiltração receba a cobertura de alguém que empurra os jogadores do Heat para fora do garrafão. Não tem jeito, quando não se marca individual estilo casamento na igreja (“esse é o meu homem, fico com ele até que a morte nos separe”), é difícil evitar rebotes ofensivos com consistência, mas o Mavs limitou o bastante, é o melhor que dá pra fazer.

Com essa defesa bacanuda, estilo casamento aberto (“eu tenho meu homem, mas de vez em quando fico com outros e meu homem sabe disso”), forçando o Heat a arremessar cada vez mais do perímetro, como foi que mesmo assim o Mavs chegou a perder por 15 pontos no quarto período? A culpa é da defesa do outro lado da quadra, que também é espetacular. Enquanto Kidd e Nowitzki, por exemplo, são marcadores decentes mas lentos, com uns anos pesando nas costas, o Heat tem um arsenal de bons defensores individuais com toda aquela energia jovial que só espinhas na cara podem trazer a um homem – a começar por Wade e LeBron. Como o jogo de garrafão ofensivo do Mavs não é lá grandes merdas, e levando em conta que o Mavs trucidou seus adversários com a melhor rotação de bola no perímetro dos últimos anos (especialmente quando a bola sai de dentro do garrafão das mãos do Nowitzki, que sempre encontra um jogador livre na linha de 3 pontos para acionar), o Heat não tem medo de atacar todas as linhas de passe. Não há nenhum passe para o lado, por mais idiota que seja, que o Heat não tente contestar. Quando o defensor chega atrasado na tentativa de roubo de bola e fica batido na jogada, isso em geral obriga que Jason Terry, Shawn Marion e Jason Kidd tenham que infiltrar – algo que não é o ponto forte. Essa defesa do Heat no perímetro, agressiva e um tanto arriscada, dependente das pernas jovens da molecada, nem conseguiu tantos roubos assim a princípio. Mas quando cada passe que você dá é um risco, quando as rotações de bola que você sempre executa precisam ser questionadas porque alguém está tentando roubar cada passe, uma hora teu cérebro vaza pelas orelhas e a vontade é ir pra casa chorar. É muita pressão. O Kwame Brown teria sentado no chão e desistido. No segundo tempo o Mavs não aguentava mais e cometeu uma cagada no ataque atrás da outra, passes cada vez mais idiotas, jogadores tentando passes diferentes do que lhes seria a zona de conforto apenas para tentar evitar um possível roubo. Quando o Mavs quebrou mentalmente, errando passes sem parar, o Heat correu para o contra-ataque – em que é um dos melhores times da NBA – e puniu o adversário. O YouTube agradece.

A defesa fantástica do Mavs não dá conta de contra-ataques, especialmente levando em conta que Wade e LeBron correm na velocidade da luz. Já a defesa do Heat é uma das melhores da liga em defender contra-ataques, então quando o Mavs tenta acelerar o jogo para não ter que girar a bola contestadamente no perímetro, enfrenta também uma marcação sólida. Nesses playoffs o Mavs não tinha ainda suado desse jeito para colocar em prática seu estilo de jogo. Essa é a graça dessa série: calhou, diferente de outros anos, de ser justamente na Final o desafio mais duro para as duas equipes, o desafio que exige mais adaptação e superação.

E o Mavs se superou. Nos 7 minutos finais, colocou em prática a melhor defesa, em termos de execução, desses playoffs até agora. Dwyane Wade estava destruindo com o jogo até então, mas parou de receber a bola. Em parte porque estava bem marcado, porque Shawn Marion é genial (merece post só pra ele ao longo da série), porque o Mavs acalmou o ataque e parou de conceder contra-ataques, mas em parte também porque o Heat parou de procurar o Wade. A frustração do armador ficou clara quando em duas oportunidades tentou receber a bola próximo à linha de fundo e foi ignorado pela armação de LeBron e de Chalmers. É aqui que meu elogio ao Erik Spoelstra esbarra um pouco. Sou um fã do técnico, acho o que ele fez com esse Heat (e com o Heat dos anos anteriores, que fedia mas ganhava mesmo assim) sensacional, adoro o fato dele exigir que as jogadas sejam variadas e que todos os jogadores sejam envolvidos no ataque, mas às vezes ele parece ignorar o fato de que jogadores ficam “quentes”, pegam no tranco, se animam. A questão é complicada, vale a pena sair do esquema de jogo e forçar bolas para o Wade só porque ele está indo bem? Ou, se seu time tem tantas armas, o melhor é manter o plano e não permitir que o adversário saiba exatamente quem marcar? No jogo de ontem, polêmica à parte, o ataque do Heat estagnou frente à defesa impecável do Mavs e mesmo assim Wade não foi acionado até os minutos finais, quando já estava frio e não conseguia receber a bola graças à marcação do Mavs.

Com dois minutos para acabar o jogo, Heat vencendo por 2 pontos, LeBron tentou infiltrar duas vezes mas o pick-and-roll à sua direita e à sua esquerda foram defendidos com perfeição. LeBron se viu na linha de três pontos, sem ter pra onde correr, cronômetro acabando, e teve que forçar uma bola de três bem marcada. Wade garantiu o rebote ofensivo, e aí na hora soube que o Heat tinha ganhado o jogo. Um minuto e meio pro fim, o Heat ia gastar mais tempo do relógio e conseguir alguma boa jogada, provavelmente cavar uma falta. Spoelstra gritou uma jogada para o LeBron, que então mandou a bola para o Bosh e fez o corta-luz para o Wade receber a bola. O Mavs percebeu a jogada e bloqueou o Wade, restando que Bosh devolvesse para o LeBron, apertado no canto. A bola foi então para o Mario Chalmers, que tentou infiltrar mas foi bloqueado pelo Nowitzki. Ele então passou para o Haslem, marcado, que devolveu para o LeBron na linha de três. Ou seja, lembra da posse de bola anterior em que o LeBron não conseguiu fazer merda nenhuma e teve que forçar uma bola de 3 impossível? A segunda posse de bola seguida foi igual: passou por LeBron, Bosh, Chalmers e Haslem, mas voltou para o LeBron a tempo apenas de outro arremesso de três idiota e contestado. O resultado foi um contra-ataque perfeito finalizado por Nowitzki para empatar o jogo.

Em alguns momentos a defesa do Mavs quebrou, a rotação não foi sempre perfeita e LeBron soube achar seus companheiros em situações em que a troca defensiva lhes favorecia. Mas nas posses de bola mais importantes do jogo, a defesa do Mavs foi perfeita, nível Alinne Moraes de qualidade. LeBron poderia ter acertado dois arremessos de três espíritas e teria ganhado o jogo – algo que meio que aconteceu no Jogo 1 – mas o Dallas não pode esperar nada melhor do que isso. E nem precisa. É o bastante. Desde que, claro, o ataque do Mavs não perca bolas o tempo inteiro com a mesma frequência que a Mari Alexandre sai na Playboy. Em parte a defesa do Heat cansou um pouco, depois de atacar as linhas de passe o jogo todo, mas o Mavs soube girar menos a bola no perímetro e tirar seus pivôs do garrafão, garantindo passes mais seguros e protegidos nos minutos finais. Vale dar uma olhada na bola de 3 pontos do Nowitzki que virou o jogo a 30 segundos do fim:

No Twitter, sugeri que esses 3 pontos fossem dados para o Tyson Chandler. Olha que absurdo o que o pivô fez para garantir esse arremesso! Assim que o vídeo começa, o Mario Chalmers já está tropeçando feito bêbado por ter recebido um corta-luz do Chandler (é bem no comecinho, tem que prestar atenção para o capote estilo video-cassetada). Isso abre o Kidd na direita. Imediatamente depois o Chandler faz um corta-luz no LeBron, que abre o Jason Terry de frente para a cesta para arremessar ou passar a bola com espaço. Depois o Chandler faz um terceiro corta-luz, em estilo futebol americano, para impedir que o Udonis Haslem chegue no Nowitzki e o alemão possa arremessar completamente livre. Foram TRÊS cortas, deixando três jogadores livres, e impedindo que o Mavs voltasse a ficar girando uma bola contestada no perímetro.

A jogada final, em que o Nowitzki fez uma bandeja de esquerda para virar o jogo, também foi diferente do que o Mavs vinha chamando.

O Nowitzki recebeu a bola no perímetro, ao invés de perto do garrafão, e o Jason Terry na zona morta obrigou o LeBron a não poder ajudar na defesa. O alemão é fantástico, bateu o Bosh na corrida e finalizou com classe sem ter que pular por cima de oito homens com uma enterrada de costas. A grande cagada da jogada foi do Haslem, que não foi cobrir o Bosh na defesa do Dirk, mas no fundo é engraçado: durante o jogo todo, o Heat não quis criar um padrão para dobrar a marcação no alemão, às vezes dobrava e às vezes não, para confundir o jogador do Mavs – mas aí quem ficou confuso foi o Haslem, que só dobrava quando mandavam e nem pensou em dobrar por conta própria quando o alemão bateu pra cima do Bosh. Funhé.

Dobrar no Dirk o jogo inteiro costuma ser cagada, porque ele consegue parar sua jogada quando quiser e passa muito bem a bola para fora (é um ótimo passador, mesmo que não receba o crédito devido nas estatísticas), mas se o Heat ataca tão bem as linhas de passe talvez seja o melhor a fazer. O Mavs precisa se adaptar à defesa do Heat como fez no final do jogo, porque se perder de novo por 15 pontos graças a contra-ataques talvez não consiga correr atrás outra vez. O Heat, por sua vez, precisa também se adaptar à defesa do Mavs – e a defesa individual, não a por zona – ou então vai depender apenas de estar com os arremessadores calibrados (ou das cagadas ofensivas do Mavs), o que é bastante arriscado numa série tão parelha. Como disse, esse é o teste derradeiro e o essencial aqui é se adaptar o mais rápido possível. Por enquanto, a vantagem adaptativa é do Dallas – ao menos até domingo, quando teremos outro duelo desses.

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