As chances do Denver Nuggets

Na reta final da temporada, fora da zona de classificação para os Playoffs, o Denver Nuggets não apenas recebeu de volta Paul Millsap, após mais de três meses fora graças a uma cirurgia no pulso, como também iniciou uma sequência de 7 jogos fora de casa – incluindo uma longínqua passagem pelo Canadá. Incorporar Millsap já parecia desafio o suficiente, mas a sequência de duas semanas na estrada parecia ainda pior. E apesar de ser um dos melhores times da NBA jogando em casa (atrás apenas de Rockets, Raptors e Spurs), a volta ao lar não indicava qualquer promessa de alívio: o Nuggets tem o calendário final mais difícil da Conferência Oeste, enfrentando em suas 6 partidas finais apenas times na zona de classificação para os Playoffs (Bucks, Pacers, Blazers, Wolves duas vezes) ou então lutando diretamente por uma chance de classificação (caso do Clippers). O cenário inteiro era receita para fracasso, motivo mais do que legítimo para considerar o Nuggets fora da luta real por uma vaga na pós-temporada. Até o Clippers, oscilando boas e más fases, parecia ter uma chance maior de se classificar. Isso, claro, até que o impossível aconteceu.

Foram 4 derrotas e apenas 2 vitórias na viagem fora de casa do Nuggets, incluindo um jogo pesadíssimo contra o Raptors em Toronto depois de perder no dia anterior, menos de 24 antes, para o Sixers na Philadelphia. Para encerrar a sequência de 7 jogos na estrada, foram enfrentar, exaustos, o Thunder em Oklahoma. Não apenas o Thunder estava melhor classificado como era também um rival direto – mesma Divisão, poucos jogos à frente, e precisando vencer para garantir uma vantagem caso acabasse a temporada empatado em número de vitórias com o Nuggets.

É importante a gente lembrar que esse é o Oeste mais embolado das últimas décadas, com apenas 3 vitórias separando, NESSE SEGUNDO, o quarto e o nono colocado na Conferência. Nenhum time, nessa bagunça, está com uma sequência de mais do que duas vitórias seguidas, sinal de que ninguém está claramente num momento superior. Nos últimos 4 ou 5 jogos que restam, uma sequência de 3 ou 4 derrotas para alguém somadas a uma sequência de 3 vitórias para outro time podem significar que o quarto colocado pode não se classificar para a pós-temporada, por exemplo. É bem possível que alguns times – talvez MUITOS times – acabem a temporada com números idênticos de vitórias e derrotas. Nesses casos, entram em ação os CRITÉRIOS DE DESEMPATE: primeiro o confronto direto dos dois times ao longo da temporada, depois (caso os times estejam na mesma divisão) o time com mais vitórias dentro da divisão, e por fim o número de vitórias dentro da mesma Conferência. A partida do Nuggets contra o Thunder, portanto, era crucial para ambos: o Nuggets havia vencido duas das três partidas contra o rival de divisão, e se perdesse a quarta e última partida empataria no confronto direto, cedendo o desempate para o Thunder que tem mais vitórias na divisão.

E quando a partida contra o Thunder parecia oficialmente perdida, Paul George errou um lance livre, deixando a diferença no placar em apenas dois pontos, e então Will Barton fez isso aqui:

Na prorrogação, o Thunder ainda teve uma possibilidade de vitória, mas Carmelo Anthony foi completamente ignorado livre no perímetro em nome de uma tentativa de bandeja de Jerami Grant que virou um toco histórico de Mason Plumlee:

De volta a Denver, o Nuggets teve que enfrentar um Milwaukee Bucks igualmente desesperado por uma vitória para se manter na zona de classificação da Conferência Leste. Com 6 minutos para acabar o jogo, o Bucks dominava a partida com 16 pontos a frente no placar. Mas com pouco mais de 3 minutos restando, Giannis Antetokounmpo saiu com 6 faltas e ainda tomou uma falta técnica. Com um minuto para o fim do jogo, a diferença ainda era de 8 pontos. Mas a partir daí, o Bucks errou tudo que tentou, incluindo uma reposição simples de bola e uma falta em Jamal Murray assim que ele roubou a bola e tentou um arremesso de três pontos:

O mais engraçado é que o Nuggets forçou a prorrogação mesmo fazendo um monte de coisas imbecis: Paul Millsap perdeu a bola graças a mãos besuntadas de manteiga na posse de bola anterior, e – vamos ser sinceros aqui – Jamal Murray sequer acertou o arremesso decisivo que tentou. Foi o Bucks que entregou tudo para o adversário: teve gente pisando na linha lateral antes de dar um arremesso (convertido), teve a pior cobrança de lateral do mundo, e teve a falta mais estúpida dos últimos tempos, dando a Murray lances livres para compensar o arremesso errado. E, por fim, o Bucks entregou uma prorrogação inteira sem Antetokounmpo, com Jabari Parker errando um arremesso que forçaria uma segunda prorrogação. O Nuggets exausto, abatido, vindo de uma prorrogação na partida anterior depois de uma viagem desgastante e desmoralizante, sobreviveu enquanto o Bucks derreteu mais uma vez diante dos nossos olhos.

O resultado dessas duas vitórias na prorrogação é que o Nuggets está atualmente na nona colocação do Oeste, apenas uma vitória atrás do oitavo colocado (o Pelicans, que vem de QUATRO derrotas consecutivas, derretendo mais do que o Bucks em final de jogo). E embora o calendário dos próximos jogos, como vimos, assuste, ele também inclui uma série de adversários diretos – e a chance de conquistar vantagens nos valiosíssimos critérios de desempate.

O Nuggets perdeu as duas partidas que disputou contra o Wolves na temporada, por exemplo, mas enfrentará o time mais duas vezes nas próximas 5 partidas, podendo empatar o confronto direto. Nesse caso vale o recorde contra a própria divisão e o Nuggets conseguiria a vantagem caso vencesse o Blazers e o Wolves perdesse do Jazz. Nessas condições, o Nuggets também conseguiria a vantagem do desempate contra outro rival de divisão, o Utah Jazz – pode até se dar ao luxo de perder um dos três jogos acima e ainda assim manteria a vantagem. Contra outros times embolados, como o Pelicans e o Thunder, o Nuggets já garantiu a vantagem em caso de empate. Ou seja, o cenário que era tenebroso se tornou bastante promissor: o Nuggets, pelo menos, depende apenas de si mesmo. Vencer o Wolves nas duas partidas que restam (uma em Denver, outra em Minessota) já seria suficiente para passar os lobinhos na tabela e, supostamente, alcançar os Playoffs, especialmente se tiver vantagens diversas contra adversários que porventura empatem com eles em número de vitórias.

O problema é que depender de si mesmo nunca parece uma situação confortável quando o time é tão jovem, teve tantos altos e baixos e enfrentará apenas adversários com mais vitórias do que derrotas. Nikola Jokic, a base dessa equipe, tem apenas 23 anos e três temporadas de NBA nas costas. Jamal Murray, que salvou a temporada do Nuggets com aquele roubo contra o Bucks seguido de três lances livres convertidos, tem míseros 21 anos e está só em sua segunda temporada. Some a isso um reforço experiente, Paul Millsap, que jogou apenas 33 partidas na temporada até aqui graças a lesões, e aí qualquer oscilação torna-se imediatamente justificável. Mas talvez o que mais tenha prejudicado as chances do Nuggets até aqui seja o fato de que o time, em parte pelas lesões e pela juventude, mas em parte por conta do técnico Michael Malone, ainda não tem um estilo de jogo consistente.

Nikola Jokic teve ao longo da temporada momentos muito difíceis, fruto de defesas completamente dedicadas a pará-lo, algo que faz parte do processo de adaptação de qualquer jovem estrela. Quanto mais conhecemos Jokic e entendemos seus méritos e suas limitações, mais fácil se torna explorá-lo na defesa e atrapalhá-lo no ataque. Ao meu ver, existem duas respostas possíveis a esse processo: ou o treinador aguarda com paciência para que seu jogador se acostume com as novas defesas e encontre sozinho estratégias para superá-las, ou então o treinador faz mudanças táticas pontuais que facilitem a vida de seu jogador quando ele se torna visado demais pelos adversários. As duas abordagens possuem histórias de sucesso e de fracasso: Kevin Durant descobriu sozinho como enfrentar defesas focadas nele quando teve liberdade, enquanto Jeremy Lin foi consumido pelos adversários sem saber como reagir; o Raptors mudou seu modo de usar DeMar DeRozan a princípio complicando ainda mais a sua vida, e só nessa temporada encontrando, enfim, uma maneira de facilitar seu trabalho. O técnico Michael Malone, no entanto, não fez uma escolha definitiva: assim como seu próprio time, oscilou diversas vezes ao longo da temporada.

Primeiro, tentou resolver a dificuldade de Jokic colocando a bola menos tempo em suas mãos, o que tende a ser um enorme desastre. A visão de jogo e capacidade de passe de Jokic são justamente o que transformaram o Nuggets num time que sonha com a pós-temporada pela primeira vez em mais de 5 anos, então pedir para que ele toque menos na bola é boicotar sua maior vantagem. É graças a Jokic que o resto do elenco do Nuggets corta para a cesta com frequência, explora o fundo da quadra e as costas dos defensores e acelera no contra-ataque em busca de passes longos de quadra inteira. Se Jokic ter a bola nas mãos causa muitos turnovers, com defesas se amontoando em cima dele e interceptando seus passes, me parece um preço muito pequeno a se pagar pelo que ele acaba produzindo em quadra – já cansei de dizer por aqui que os desperdícios de bola de Russell Westbrook, por exemplo, tem pouco impacto perto do ganho que o Thunder tem com sua agressividade tanto nos passes quanto nas infiltrações. Michael Malone demorou para perceber isso, voltando a integrar Jokic ao ataque e deixando que ele aprendesse sozinho já quase na metade da temporada. Mas aí mudou de ideia, achando que a melhor saída para as defesas que cercam o pivô seria tirá-lo de dentro do garrafão, praticamente anulando o jogo de costas para a cesta de seu jogador. O resultado foi medonho: Jokic só tem espaço para os passes e para os arremessos porque as defesas temem seu jogo de costas para a cesta, seus ganchos, sua capacidade de pontuar sob contato. O Nuggets é melhor quando joga em altíssima velocidade, com Jokic dando passes rápidos, mas com a opção do pivô de costas para a cesta nos momentos em que a velocidade não dá conta da defesa adversária. Quando Jokic é agressivo e passa a bola rapidamente em caso de dobras de marcação, o perímetro do Nuggets se torna mortal.

Sem Millsap, Jokic recebeu mais carta branca para ser ele mesmo e o resultado foi bastante positivo: mais toques na bola, passes mais rápidos, e um dos melhores aproveitamentos coletivos em bolas de três pontos da NBA nesse período. O ataque do Nuggets é um dos melhores da Liga desde o All-Star Game, graças a um Jokic mais confortável, mais acostumado com ser alvo das defesas, e uma liberdade maior para que ele movimente a bola e seja agressivo rumo a cesta. Quando ele tenta finalizar pouco, as defesas se ajustam, param de temê-lo e consequentemente falta espaço no perímetro, algo que o Nuggets precisa demais por carecer de arremessadores capazes de criar o próprio arremesso. Com Millsap de volta, o técnico Malone voltou a tirar Jokic do garrafão e quem sofre são justamente os arremessadores.

Jokic nos mostra a importância que podem ter os NOVOS PIVÔS, aqueles capazes de passar a bola rapidamente para fora e que punem os adversários embaixo da cesta. O Rockets funciona sob o mote de fazer os adversários temerem as bandejas para abrir espaço para as bolas de três, e então fazer os adversários temerem as bolas de três pontos para abrir espaço para as bandejas. Por ser ágil, bom arremessador e passar a bola melhor do que qualquer jogador de sua posição, Nikola Jokic faz os adversários não temerem bandejas, mas sim seu jogo embaixo da cesta, mantendo ainda o princípio fundamental das bandejas do Rockets que é acionar outros jogadores no perímetro sempre que a defesa se comprometer com a proteção do aro.

E embora Michael Malone tenha mudado muitas vezes de ideia em sua abordagem do papel de Jokic no ataque, na defesa ele ainda insiste em usar o pivô como uma âncora, um protetor de aro que trabalha como centro do trabalho defensivo, surgindo na cobertura ou tendo os adversários afunilados na sua direção – algo que, claramente, Jokic não consegue fazer. Ele é ágil, mas não o suficiente para fechar o caminho para a cesta, e lhe falta muita explosão e tempo de bola para se transformar num bloqueador de arremessos considerável. Esse excesso de responsabilidade defensiva faz com que Jokic passe muito tempo preocupado em não cometer faltas, tira toda sua agressividade, e com sorte só vemos seus melhores momentos na defesa no final dos jogos – isso quando ele não está no banco, sendo poupado para o ataque ou para que não cometa suas faltas finais.

Nikola Jokic é tão único – e tão jovem – que Malone ainda não sabe muito bem o que fazer com ele, nem como integrá-lo com Paul Millsap dados os poucos jogos que tiveram juntos. É triste ver tantas jogadas chamadas para que Millsap finalize sozinho quando ele, supostamente, deveria ser um jogador que não demanda a bola nas mãos, liberando Jokic para continuar um dos líderes em toques na bola por partida – momentos em que o Nuggets é mais eficiente e mais perigoso. Por outro lado, na defesa é que Millsap deveria ser mais acionado, especialmente na cobertura, dando ao Jokic um papel mais tímido. Nas últimas partidas ficou evidente que o trabalho defensivo ainda precisa de muito estudo e experimentação, mas que aos poucos Malone está compreendendo como Jokic precisa ser o foco principal do ataque, mesmo quando sofre marcação dupla – talvez ESPECIALMENTE quando sofre marcação dupla, dada sua capacidade de passe sob pressão – ou quando comete desperdícios de bola em excesso.

Por um lado, fazer experimentos e ajustes com 5 jogos faltando no calendário – e 5 jogos, como vimos, absolutamente cruciais contra adversários fortíssimos – parece bastante desesperador. Mas não consigo ter outra postura que não seja de ânimo com esse time: parece que a cada partida eles entendem mais sua própria identidade, adquirem mais confiança e consolidam Nikola Jokic como um dos grandes jogadores da NBA atual. Possuem a capacidade de se tornar mais e mais fortes a cada jogo que disputam, um potencial praticamente ilimitado, o que deveria encher de pavor seus próximos adversários – e algo que pode ser decisivo se chegarem de fato aos Playoffs, contra adversários que não são claramente superiores, e que podem até mesmo ter perdido para o Nuggets apenas algumas semanas antes nessa sequência que acompanharemos nos próximos dias. Admito que o time talvez nem se classifique, mas se for para a pós-temporada terá mais tempo para experimentar e fazer ajustes, algo que pode ser suficiente para vermos talvez o melhor Nuggets da temporada – justamente enquanto alguns adversários, baleados com lesões, estarão apresentando as piores versões de si mesmos. Nessas circunstâncias, quem é capaz de cravar que o Nuggets não possa surpreender e ir parar mais longe do que até mesmo eles imaginavam? Tudo que eles precisam é de um pouco mais de tempo – basta que sobrevivam até lá.

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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