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Como diz o ditado, o diabo mora nos detalhes. Ou seria “como diz o diabo, o ditado mora nos detalhes”? Boa pergunta, deveria perguntar para o Chapolin. Em todo caso, seja como for, são os jogadores secundários, as peças menores, que acabam decidindo quem será o time campeão ao fim da temporada. É normal gente pensar que só existem dois tipos de jogadores: os que chutam traseiros e os que fedem. Mas são justamente os jogadores medianos, aqueles que não-sobem-nem-descem, não-fedem-nem-cheiram, que trazem identidade para os elencos. Os jogadores “especialistas” (ou, se você é mais cruel, “aqueles caras que só conseguem fazer uma coisa em quadra e são uma merda em todo o resto”) desempenham papéis que ditam a cara do time, o ritmo de jogo, a importância do banco, a atenção no ataque e na defesa e todas as outras coisas que diferenciam um time do outro, que levam a vitórias e a derrotas.
O Warriors, por exemplo, perdeu o Baron Davis para o Clippers. Com isso, toda a velocidade e o foco ofensivo da equipe sofreram um forte baque. A resposta foi trazer Corey Maggette, que já ouviu falar nesse lance de defesa mas sempre achou algo um tanto exótico, e passar Monta Ellis para o cargo de armador principal. No entanto, não ter um armador nato nem no time titular nem no banco de reservas era exagero demais até para o amalucado técnico Don Nelson. Assim, a solução foi trazer o armador Marcus Williams, do New Jersey Nets.
Taí uma aquisição pequena que tem tudo pra ser mais importante do que se imagina. Sei que tem gente que discorda (tem gente que discorda até de que devemos comer, sugerindo alimentação a base de luz) mas o Marcus Williams chuta uns traseiros, no duro. Quando chegou na NBA, tinha tudo para contribuir imediatamente e inclusive teria sido titular em alguns times horrorosos, precisando de alguém urgente para a função. O Williams, no entanto, foi parar justamente no Nets, para ser reserva vitalício do Jason Kidd. Essas situações têm seus aspectos positivos e os negativos: por um lado, você aprende com um dos melhores armadores a terem pisado numa quadra de basquete; por outro, você sabe que só vai ter minutos de jogo quando o titular morrer num acidente de carro. Imagino que o Marcus Williams tenha vibrado durante 3 segundos quando ficou sabendo que o Kidd tinha sido trocado. A alegria durou pouco porque, como sabemos, a troca foi pelo também armador Devin Harris, que tem tudo para ser uma tremenda estrela no futuro e virou titular assim que pisou em New Jersey. Ou seja, lá estava Marcus Williams como reserva de novo. Não é irônico que um cara desses não saia do banco enquanto sujeitos como o Tyronn Lue, que certa vez assumiu que deveria ser um reserva na NBA e odiava a pressão de ser titular, fiquem no elenco inicial de tantos times na Liga mesmo contra suas vontades?
O Nets preferiu arranjar um armador veterano para apoiar Devin Harris – no caso, o vovôzinho Keyon Dooling – e o Marcus Williams se tornou descartável. O Warriors não perdeu a oportunidade e mandou uma futura escolha de draft de primeira rodada em troca do armador. Acho que após anos atrás de Kidd, o Williams deve no mínimo saber correr, ou seja, tem tudo para se dar bem como reserva no Warriors, podendo até um dia, quem sabe, permitir ao Monta Ellis voltar à sua posição original. Nenhum dos dois sabe arremessar e não podem substituir Baron Davis, mas foi um belo tapa-buraco.
Aliás, o que o Warriors não parou de fazer por enquanto foi tapar buracos. Além do Baron Davis, perderam Matt Barnes, Patrick O’Bryant e Kelenna Azubuike. Para remediar, parecem estar prestes a contratar Maurice Evans e já assinaram Ronny Turiaf. O francês pode correr, defender e demonstrar raça, e talvez até dê certo no Warriors, mas ainda assim me nego a considerá-lo uma peça importante em qualquer coisa que não seja fazer biquinho falando francês.
Dentre os jogadores que o Warriors perdeu, destaco arbitrariamente (porque o blog é meu, ué) o Matt Barnes. Realmente gosto de seu jogo e fico muito intrigado com a falta de ofertas para ele. Trata-se de um jogador veloz, bom defensor, capaz de jogar em múltiplas posições e que compensa a falta de altura com muita garra e posicionamento nos rebotes. Fora isso, é um bom arremessador de 3 pontos, enterra pra burro e parece que enfiou o dedo numa tomada o tempo inteiro, tamanha sua intensidade. Ele parecia feito sob medida para o Warriors mas acabou afundando misteriosamente no banco do Don Nelson, provavelmente por não gostar de sorvete de flocos ou algum outro motivo assim, sempre muito pertinente. Sua saída do Warriors era, portanto, muito provável, mas parece que o único time interessado nele foi o Phoenix Suns. Faz muito sentido, ele se encaixa perfeitamente no estilo antigo da equipe – “corra como um maluco e arremesse de três” – e também tem a intensidade defensiva que supostamente deve ser a nova filosofia por aquelas bandas. O que me intriga, no entanto, foi o contrato que assinou: apenas 1 ano, por menos de 1 milhão de doletas, o mínimo para veteranos.
Espera, deixa eu ver se entendi: o Boston assinou o Patrick O’Bryant, que nunca fez porcaria nenhuma na NBA e admitiu “não ser tão bom assim” na época do draft. O Nets pagou uma grana para o Eduardo Najera, o mexicano rei do “garbage time” (aquele final dos jogos que já estão muito ganhos ou muito perdidos), o Warriors deu um contrato escandaloso para o medíocre Ronny Turiaf, o Nets assinou o Malik Allen (que sempre tem time, mas nunca sequer entra em quadra). Mas o Matt Barnes, melhor do que todos eles, com experiência em playoffs, uma peça que pode ser essencial em toda e qualquer equipe, assina um contrato mínimo de apenas um ano?
Só posso acreditar que alguns times menosprezam a oportunidade de conseguir um jogador desses, considerado de “segundo escalão”. Enquanto isso, o reserva-de-luxo James Posey foi disputado a tapa por todos os times que acreditavam estar a apenas uma peça de distância de um anel de campeão. Ele acabou escolhendo ir para o Hornets e agora, vejam só, eles têm um banco de reservas. Enquanto isso, meu Houston Rockets repelava Brent Barry, conseguindo finalmente um especialista nas bolas de 3 pontos, capaz de aproveitar os espaços criados pela constante marcação dupla em Yao Ming, e além de tudo capaz de armar o jogo, coisa que ninguém em Houston é muito chegado. O Spurs, que perdeu o Barry, fez questão de manter Kurt Thomas, provavelmente com medo de que a média de idade da equipe caísse para menos de 62 anos. São todas aquisições importantes, peças finais em grandes elencos, mas em meio a tudo isso, Matt Barnes passou batido e Ronny Turiaf ficou milionário.
Enquanto acompanhamos os grandes times da NBA dando os toques finais em seus elencos, com os espaços nas folhas salariais se tornando cada vez mais escassos, é impossível deixar de tentar adivinhar quem é que está gastando bem suas doletas. Pra mim, por enquanto, o Suns conseguiu uma bela pechincha.