>
Meu apelo por séries de sete partidas está indo para o ralo. Os jogos estão disputados, as séries interessantes e tem muita coisa para comentar, muitas decisões e atuações dignas de comentários, mas no fim das contas esses jogos apertados renderam duas séries em 3 a 1, um buraco difícil de sair em qualquer situação, ainda mais contra times embalados e visando uma vaga na final. Não vale nem a pena discutir se as séries já acabaram ou não, mas é óbvio que se algo mudar drasticamente será um milagre. O que vale muito a pena é discutir como essas coisas aconteceram, comentar o passado é muito mais produtivo do que futurologia barata.
Aliás, esse assunto de comentar passado ou futuro me faz criar aqui um parênteses para falar sobre como a imprensa esportiva em qualquer lugar do mundo comenta esportes. Quando estamos bem perto do assunto, lendo bastante e acompanhando de perto e sempre lendo tudo que é comentarista, vemos como esse lado do jornalismo é muitas vezes amador e patético, é tanta bobagem que dá até desgosto de fazer parte desse grupo às vezes. Vejamos o caso do Dirk Nowitzki que está fazendo chover nesses playoffs. Ele era um jogador limitado que não sabia defender quando jogava pelo Don Nelson no começo da última década, depois virou um amarelão quando perdeu a final para o Miami Heat em 2006, um jogador decadente quando o Dallas passou a ser eliminado no começo dos playoffs e agora, com seu time a uma vitória da final, um dos 30 maiores jogadores de todos os tempos, o mais próximo do estilo de Larry Bird desde os anos 80. Sim, o Dirk mudou um pouco do seu jogo com o passar dos anos, evoluiu em alguns aspectos, alterou estilo em outros, mas os rótulos, adjetivos e o reconhecimento de fãs e dos mais conceituados jornalistas esportivos são todos baseados nos resultados dos times. Ele era um mal defensor quando todo o Dallas não defendia nada, era amarelão quando todo Dallas perdeu e é um gênio agora que o time como um todo tem jogado demais. Essa memória curta e a desastrosa mania de querer fazer rankings criam absurdos que só olhando com uma certa distância dá pra reparar. Outro dia um cara no Twitter postou algo simples e que mostra o que estou dizendo, ele disse assim: Melhor ala de força da história – Costumava ser o Duncan, nos dois últimos anos foi o Gasol, no começo dos playoffs foi o Zach Randolph e agora é o Nowitzki. E detalhe, ele ainda esqueceu de dizer do Kevin Garnett em 2008!
Vocês realmente acham que o Pau Gasol mudou muito desde que foi do Memphis Grizzlies para o Los Angeles Lakers? O que mudou foi ter um time melhor em volta e ter gente assistindo aos seus jogos pela primeira vez na vida com alguma atenção. E o Garnett, idolatrado em 2008, não estava jogando metade do que fazia, sem nenhuma atenção da mídia, quando era mais jovem no Minnesota Timberwolves. A verdade é que a grande parte de quem comenta esportes só comenta uma coisa: resultados. E os resultados imediatos, o do mês passado, não querem dizer mais nada. Outro exemplo? A troca do Kendrick Perkins. Algumas semanas atrás estavam idolatrando o Perk, agora tem gente chamando de troca “Spy vs. Spy” em que os dois lados se envenenaram e se mataram simultaneamente. O que fez o pessoal mudar de opinião assim foi que nessa série contra o Mavs o Perkins tem sido inútil e os números do time são bem piores quando ele está em quadra. Mas quem assiste basquete com calma ou simplesmente só lê sobre o assunto deve saber quem é o Kendrick Perkins. Ele é um especialista. Assim como o Kyle Korver é um especialista em três pontos ou o Arron Afflalo um especialista em defesa, o Perkins é muito bom em só uma coisa, só uma, mas talvez o melhor da liga nisso; ele defende pivôs embaixo da cesta, lá na área pintada, contra caras pesados que jogam de costas para a cesta. Ele também é bom ocupando espaço no garrafão, fechando espaço para infiltrações com bom posicionamento, e é isso, nada mais.
Acontece que eles estão enfrentando o Dallas Mavericks. O garrafão deles é formado pelo Dirk Nowitzki, que apesar do tamanho joga longe da cesta e tem muita mobilidade, e pelo Tyson Chandler, que só recebe a bola no ataque em algumas ponte aéreas, uma jogada que pode passar um jogo inteiro sem acontecer. O reserva é o Brendan Haywood, também nulo no ataque. O Mavs é também um estranho time que só tem um jogador com a característica de infiltrar, ele é um armador porto-riquenho de um metro e dez de altura, o resto vive e morre de seus arremessos. Sem um jogador de post-up ou infiltrações para proteger, o Kendrick Perkins é tão útil quanto uma nota de 100 reais na Lua. Isso não quer dizer que a troca foi péssima, que ele é horrível ou qualquer bobagem do tipo, apenas não é o cara certo para esse matchup. Eu imagino se essas pessoas lembram do começo da temporada quando qualquer timinho mais ou menos que tivesse um armador rápido estava costurando a defesa do Thunder e fazendo bandejas sem contestação no meio do garrafão, ou se lembram como o Scott Brooks estava quebrando a cabeça para conseguir dar minutos merecidos para Serge Ibaka e James Harden, que elevaram demais o seu jogo desde a saída de Jeff Green. A troca foi um sucesso para o Thunder mesmo que não funcione em uma série de playoff.
Com isso meio que fechei o meu parênteses-desabafo sobre essa cobertura esportiva idiota que a NBA recebe em todo lugar. E já embalei falando da série Thunder/Mavs. Na última partida o Thunder foi o primeiro time nos últimos 10 anos (dez malditos anos! 5.016 jogos) a estar liderando por 15 ou mais pontos a menos de 5 minutos para o fim do tempo regular e perder a partida. É algo único e difícil de explicar, até porque até esses minutos finais dava pra fazer um post dizendo tudo o que o time tinha arrumado em relação ao jogo anterior e que tinha rendido essa vantagem confortável.
A primeira coisa foi que eles acharam o seu quinteto ideal. O Perkins começa o jogo mas teve seus minutos reduzidos devido a todas as razões que explicamos acima, no lugar dele entra o Nick Collison, que foi um monstro marcando Zach Randolph e agora faz um trabalho espetacular contra Nowitzki, se o alemão acerta arremessos de costas, com a mão esquerda enquanto morde uma maçã e recita um poema de Goethe isso já está fora da alçada do Collison, melhor do que ele faz é impossível. Além dele, no lugar do Thabo Sefolosha entrou o James Harden, e essa foi a grande sacada do técnico Scott Brooks. Ao invés de deixar Harden apenas atuando com os reservas, deixou ele em quadra ao mesmo tempo que Kevin Durant e Russell Westbrook (além de Serge Ibaka, que fecha o quinteto) para dar mais uma opção ofensiva.
O Thunder estava sofrendo porque não conseguia deixar os seus dois principais pontuadores, KD e Westbrook, em condições de fazer cestas. Como em quase todos os jogos dessa série, estavam penando contra Jason Kidd e Shawn Marion. Westbrook não tem lá tanta dificuldade de passar pelo Kidd em velocidade, mas não sabe o que fazer depois disso quando lida com a cobertura do resto da equipe, especialmente Tyson Chandler. É muita velocidade e pouco cérebro ainda para o Westbrook que, não custa lembrar, não era armador principal antes de chegar na NBA. Já o Durant tem tido dificuldades para receber a bola quando marcado pelo Shawn Marion e fica meio de lado no ataque, ele só consegue receber com tranquilidade quando recebe um corta-luz de Westbrook, quando o Dallas tem trocado a marcação. Veja as imagens (clique para ampliar):
Isso parece bom na teoria para o Thunder. O Westbrook é marcado por um cara mais alto, Marion, e o Durant por um anão de jardim, Kidd, mas na prática tem sido um desastre. O Kevin Durant não tem a velocidade e o controle de bola para passar pelo Kidd no drible, além de ainda não ter desenvolvido um jogo de costas para a cesta (próximo passo óbvio na evolução dele como jogador) prefere usar o tamanho para arremessar por cima do Kidd, mas como recebe a bola longe da cesta são sempre arremessos longos e complicados. Já o Westbrook não tem trabalho fácil contra a velocidade impressionante do Shawn Marion, que é capaz de marcar qualquer jogador adversário. Pela habilidade defensiva dos dois, o Mavs fica bem à vontade em trocar a marcação, não dar espaço e fazer o Thunder continuar bem longe da cesta.
E é aí que o James Harden entra em ação, ele tem sido o único capaz de criar mais ataque em jogadas individuais. Seu arremesso vindo do drible, a infiltração e os passes vindos dessas infiltrações têm sido a inspiração que Westbrook não foi capaz de produzir, é ele que envolve Ibaka no ataque e são suas infiltrações que fazem Tyson Chandler sair da sua zona de conforto e deixam o Nick Collison fazer a festa nos rebotes ofensivos (foram mais de 20 no último jogo!).
O James Harden é meio que um Nowitzki do Thunder. Não que seja o melhor jogador ou algo assim, o que eles têm em comum é o fato de suas características obrigarem a defesa adversária a se adaptar de uma maneira que cria espaços e assim eles são responsáveis por jogadas em que tocam pouco na bola ou só se movimentam do jeito certo. Quando o barbudo-mor da NBA foi eliminado com 6 faltas faltando 5 minutos para o fim do jogo 4 é que tudo desmoronou. Veja o box score da partida a partir do momento que ele saiu eliminado:
Em 5 minutos de tempo normal mais 5 de prorrogação, eles acertaram 3 arremessos em 15 tentados! O Durant errou todos e o Westbrook fez só um, foi horrível. E a defesa não foi ruim, eles mantiveram um bom trabalho. O Dirk fez 4 arremessos mas pelo menos 3 foram de um nível de dificuldade Ninja Gaiden, o que é aceitável para uma defesa, enquanto os arremessos do Kidd e do Jason Terry foram resultado de jogadas envolvendo o alemão que podem e sempre acontecem normalmente em um intervalo de 10 minutos. O que machucou de verdade foram os 12 lances livres cobrados pelo Mavs. Acho que pelo menos seis deles vieram de faltas bobas cometidas ainda no campo de ataque do Thunder quando eles já tinham ultrapassado o limite de faltas e se arriscaram tentando pegar bolas perdidas.
Então o Thunder jogou melhor que o Mavs por 43 minutos, achou soluções boas para atacar a zona do adversário e para segurar o ataque e mesmo assim perdeu o jogo por causa de 10 minutos horripilantes em que tudo veio abaixo de uma vez só, o Nowitzki acertou arremesos impossíveis e eles fizeram todas as faltas que não poderiam. Não sei se chamo de injusto ou só de cruel, talvez um meio termo sobre o qual o Thunder não quer nem parar para pensar. O ruim é pra gente que não torce pra ninguém, uma série tão boa e disputada, com tantas alternativas táticas, agora está mais perto de um fim precoce.
E antes de ir embora, um vídeo com tudo o que o Nowitzki fez nesse jogo 4. Simplesmente perfeito.
Gastei mais tempo e espaço do que eu imaginava com esse post. A análise da prorrogação entre Heat e Bulls fica para amanhã. E você sabe, no Bola Presa promessa é… é promessa.