>Decisivos

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– Não acredito, eles me pagam mais de 10 milhões e eu fedo!
– Não esquenta, pelo menos você tem cabelo!
Nos playoffs passados, Ben Gordon fez a humanidade valer a pena. Erros grotescos como a Playboy da Mara Maravilha ou a invenção da uva passa foram perdoados pela possibilidade de assistir à série entre Bulls e Celtics ir até o decisivo Jogo 7, ter quatro partidas com prorrogações e um total de sete prorrogações ao longo da série, tudo recorde absoluto. O Ben Gordon foi um dos grandes responsáveis por fazer o Bulls segurar tão firme nas pequenas chances de eliminar o Boston Celtics, e simplesmente colocou alguns dos jogos da série no bolso sozinho, acertando um punhado de arremessos sem sentido. Na primeira partida que ele comandou, já avisei que o rapaz estava garantindo um salário gordo na temporada que vem de algum time tolo o bastante para morder a isca. Depois, ainda teve o arremesso mais fantástico de sua carreira. Mas no jogo decisivo, o sétimo, nada deu certo, os arremessos não caíram e o Celtics venceu uma partida fácil, fácil.
Assim que reclamei do contrato obeso mórbido que o Ben Gordon assinou com o Pistons, muita gente não entendia o motivo para eu odiar tanto assim o talentoso armador. Do mesmo modo, tem gente que até hoje quer saber o porquê do meu ódio pelo Rafer Alston, mesmo ele estando há tanto tempo longe do meu Houston Rockets e minha frequência cardíaca tendo diminuído bastante por causa disso. A resposta é bastante simples: no basquete, as vitórias e as derrotas são causadas por uma infinidade de fatores. Às vezes, perde-se por culpa de um trabalho ruim nos rebotes, de uma marcação fraca, da falta de movimentação de bola. São todos motivos aceitáveis e que podem ser arrumados de um jogo para o outro, ou até mesmo no decorrer das partidas. Um fator que você não quer ter para uma derrota, no entanto, é o jogo de um dos seus jogadores secundários.
Quando Kobe Bryant joga bem, por exemplo, as chances do Lakers vencer sobem muito. Quando ele joga mal, no entanto, não existe uma derrota praticamente certa. O jogo do Lakers é bastante equilibrado, depende da atuação de vários jogadores e todos eles contribuem para a vitória. Isso retira um pouco da responsabilidade de um jogador único – mesmo que ele seja, como no caso do Kobe, o jogador mais importante da equipe. Imaginem então o caso do Houston, em que há uma tentativa de espalhar por todo o elenco as responsabilidades ao longo das partidas. Se um jogador não está bem, todos os outros seguram as pontas, fazem o seu trabalho, seguem com o plano de jogo. As vitórias e as derrotas ficam nas costas de todos os jogadores.
Ben Gordon e Rafer Alston são jogadores decisivos. Ao tê-los na equipe, na maioria das vezes são eles que decidirão se seu time vencerá ou perderá. Acabam acertando arremessos absurdos, bolas de três pontos, salvando jogos no final e vencem partidas sozinhos. Mas também erram todos os arremessos, forçam no ataque, exageram no ritmo de jogo, e perdem jogos sozinhos. Quando o Rafer Alston começava a arremessar, não importava quão equilibrado fosse o ataque do Houston, toda a responsabilidade ficava nas mãos do armador. Isso porque o excesso de arremessos quebrava o ritmo da equipe, todo mundo era obrigado a ficar assistindo, o esquema de jogo ia pela janela e o Rafer Alston tirava do bolso a possibilidade de acertar 8 bolas de três seguidas e ser o herói do jogo. Ou errar todas as 8 bolas e fazer o time perder de vez. Qual das duas opções vocês acham que acontecia com mais frequência?
Algumas estrelas são jogadores decisivos nesse sentido, ou seja, que acabam decidindo se o time vencerá ou perderá. O exemplo mais claro era o Kevin Durant nas temporadas passadas. Mas que outra escolha o Thunder tinha, afinal? O time era jovem demais, fedia demais, e sua futura estrela precisava de experiência. Além do mais, é melhor colocar a responsabilidade nas mãos do jogador mais talentoso do que nas mãos de todo um elenco que, cheirando a bumbum de nenê, vai desapontar constantemente. Mas não dá para ter um jogador decisivo desses que seja seu segundo, terceiro ou até quarto melhor jogador. Você tem outros dois ou três caras melhores do que ele, e no fundo quem decide o andamento do jogo é o maluco que arremessa mais? Não me parece uma decisão muito inteligente.
Já vi o Ben Gordon ganhar muitas partidas, levar jogos para a prorrogação, acertar arremessos finais. Mas também já vi o Gordon perder jogos sozinho porque ele não tem seleção de arremessos, critério ou inteligência: apenas arremessa, às vezes cai, às vezes não cai, não há muito mais em seu jogo que ele possa fazer. Peguemos um fominha clássico, como o Gilbert Arenas, e fica fácil de ver como dificilmente as derrotas acabam sendo por sua culpa. Já vi ele estragar tudo, mas em geral sabe parar quando a merda está muito grande e dar responsabilidades para outros jogadores, envolver o time, passar a bola. Ben Gordon não pode fazer isso por uma limitação de talento, ele não sabe armar, não sabe defender, é limitado em seu jogo. Já no caso do Rafer Alston, é apenas uma limitação de cérebro: ele não tem nenhum.
Esses jogadores decisivos para o bem e para o mal acabam só se dando bem quando dois fatores muito importantes aparecem juntos: vir do banco de reservas, e estar num time muito forte, com tanto talento que seja mais difícil interferir no resultado de um jogo negativamente. Só consigo imaginar um jogador desse tipo que esteja nesse contexto: JR Smith. Levou muito, muito, muito tempo para o técnico George Karl aprender a usá-lo. A princípio o técnico apenas brigava com o JR, afundava ele no banco, dava multas, puxava a orelha. Depois entendeu que basta limitar os minutos para que, assim, limite-se sua influência na partida. A matemática é bem fácil: se o jogador arremessa todas as malditas bolas que chegam à sua mão, então basta limitar seus minutos em quadra para que ele arremesse menos bolas. O JR fica nas rédeas apenas no que se refere ao seu tempo de jogo, não adianta tentar domá-lo para arremessar menos ou ter cérebro, ele sempre enterrará como um maluco mesmo sem perceber que o jogo não está valendo ou arremessará de três mesmo sem perceber que está tentando na cesta errada. Gênio.
O momento correto de usar o JR, que o George Karl levou tempo para aprender, também deve muito ao elenco forte do Nuggets. É que esses jogadores decisivos acabam sendo muito mais efetivos quando seus times já estão na frente do placar. Não importa quão absurdo seja o Ben Gordon em finais de jogos disputados ou prorrogações. Se o Bulls tivesse elenco para abrir uma pequena vantagem no terceiro período e o Ben Gordon acertasse os arremessos retardados que às vezes caem, a diferença ficaria gigante e não seriam mais necessários arremessos impossíveis nos segundos finais. O Ben Gordon poderia voltar para o banco, com sua missão terminada, e a vitória estaria garantida. Caso seus arremessos idiotas não caíssem, o time não se afundaria num buraco sem saída porque antes estava na liderança e, no máximo, teria perdido os pontos de vantagem. Bastaria colocar o Gordon de volta no banco e começar de novo a tentar galgar outra vantagem, sem precisar de uma recuperação impossível.
Isso acontece com uma frequência absurda no Nuggets. Quando o time está na frente no segundo tempo, o JR Smith entra em quadra e começa seu festival de arremessos que fariam um orangotango corar com tamanha falta de bom senso. Se esses arremessos caem (e muitas vezes caem, ele é bom e tem uma mecânica de arremesso linda), a vantagem vai para a estratosfera e o Nuggets pode ir descansar. Se os arremessos não caem, o JR Smith respira no banco e o resto do elenco tenta segurar um pouco a vantagem. Depois, se houver tempo hábil, repete-se o experimento. Esse é um dos grandes motivos do Nuggets ser um time tão forte, com tantos recursos, e que de repente, sem aviso, abre enormes diferenças no placar. Cansei de ver times que, perdendo por 10, começam a esboçar uma reação – para então tomarem quatro bolas de 3 pontos do JR Smith e passarem a perder por 20 num intervalo muito pequeno de tempo. É um meio de arrancar o coração de times tentando se recuperar, fritá-lo na manteiga e comer com alecrim.
Esse é também um dos motivos para o Ben Gordon ter dado tão, tão errado no Pistons. Lá, que o elenco fede, as atuações do Gordon são ainda mais decisivas do que eram no Bulls, então seus jogos ruins viram estragos que não podem ser desfeitos. Como ele não defende necas, quando seus pontos não estão lá para compensar, a sua presença em quadra nem vale a pena. Para impedir o desastre, os minutos do Ben Gordon vão sendo mais e mais limitados, com jogadores menos decisivos como Hamilton e Will Bynum ganhando prioridade. O pior disso tudo foi uma entrevista recente do Gordon sobre essa que é a pior temporada da sua carreira, com apenas 13 pontos por jogo, menos de 2 rebotes e aproveitamento de 30% nas bolas de três, todas piores marcas desde que entrou na NBA. O armador colocou um pouco da culpa de suas atuações fracas nas contusões, mas admitiu que está com dores assim como muitos outros jogadores de muitos outros times nessa temporada imbecil de 82 jogos. O motivo real para seu desempenho seria então, para ele, a rotação do time, que não o favorece. Reclamou de minutos, de vir do banco, de ter poucas oportunidades. Ou seja, reclamou de não poder decidir os jogos – mesmo que, num time como o Pistons, não dê pra se dar ao luxo de deixar o terceiro melhor jogador do time (talvez quarto) decidir as partidas para o bem ou para o mal. Não era o Pistons que se gabava de ter um jogo totalmente coletivo?
Está aí justamente o que separa Rafer Alston e Ben Gordon do único que deu certo, JR Smith. O Gordon passou a carreira reclamando de começar os jogos no banco de reservas, exigia mais minutos e mais arremessos. Rafer Alston não se conformava de não ser titular, foi trocado trocentas vezes, e ao invés de perceber que seus serviços não eram muito bem aceitos, resolveu dar uma de estrelinha e ir pra casa quando o técnico do Heat, Erik Spoelstra, colocou ele no banco em uma partida e lhe tirou a vaga de titular na outra. Existem uns malucos que só arremessam, isso não é problema. Existem também uns malucos que só defendem, uns que só pegam rebote, uns que só passam a bola, uns que só enterram. O importante é entender as próprias limitações, saber até onde é possível ir, e encontrar uma situação adequada com um técnico que possa utilizá-lo bem. O JR Smith está na situação perfeita, mas o mais importante é que ele não acha que deve ser titular, jogar todos os minutos. Faz a única coisa que sabe quando decidem que ele pode fazê-lo. E é por isso que esse Nuggets, atualmente, parece ser o único capaz de retirar o Lakers de um possível título no Oeste. Muitas armas, forte garrafão, e alguém que vem do banco não para para salvar jogos, mas para esticar vantagens.

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