>Desconhecido do Mês – Sundiata Gaines

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-Ele ali deve saber quem eu sou!

Em uma esquina do bairro de Jamaica na cidade de Nova York um garoto esperava o seu irmão mais velho sair de uma loja. Um homem ia saindo do estabelecimento e o garoto abriu a porta para esse homem, um policial, sair. Saía meio afobado, porém, e deixou sua arma, que estava sobre uma pasta que ele carregava, cair no chão. Um disparo veloz então atingiu o pescoço do menino de então 4 anos, Sundiata Gaines.
A bala atravessou seu pescoço de baixo para cima e saiu do outro lado, passando a poucos centímetros de pontos que, se atingidos, teriam matado o garoto. Foram duas semanas no hospital se recuperando do que o pai de Gaines chama de “o pior momento de nossas vidas”. O pai ainda elevou o momento a proporções maiores, disse saber que o filho tinha saído dessa situação por algum motivo especial, um motivo que ele percebeu quando Gaines tinha 10 anos de idade. “Pensei, olha o talento desse garoto jogando!”. Para seu pai, Sundiata Gaines havia sobrevivido para poder jogar basquete.
Jogando nas ruas de Nova York o menino começou a ganhar reconhecimento e quando chegou ao colegial entrou para o New York Gauchos, um time conhecido da AAU, a União Atlética Amadora, que anualmente reúne times de jogadores de colegial de todo os EUA. Por essa equipe de NY já passaram grandes nomes da NBA, como Stephon Marbury, mas é o time de 2003 de Gaines que é até hoje considerado um dos melhores da união em todos os tempos. Na época o jornal New York Daily News colocou Gaines na lista de “10 jogadores que você precisa assistir”. Diz o pai de Sundiata Gaines que naquele tempo o grande armador de Nova York era Sebastian Telfair, que acabou pulando a faculdade para ir para a NBA, e que até ele tinha receio de enfrentar Sundiata no mano a mano. Se é verdade ou papo de pai babão só Telfair sabe.
A Universidade da Georgia começava o período de recrutamento de 2004 com problemas. Uma grande polêmica depois da demissão de Jim Harrick, técnico que se envolveu em polêmicas ao descobrirem que ele deu notas altas para alunos que não foram às suas aulas e que seu filho estava envolvido com desvios de dinheiro, não só manchou a imagem da universidade como causou problemas para a montagem de um bom time. A universidade perdeu uma bolsa de estudos para atletas de basquete e estava sob observação, mais um vacilo e as punições seriam bem mais sérias.
Sem dúvidas não parecia o destino ideal para um jogador, mas Sundiata Gaines negou inúmeras outras propostas como Seton Hall, Pittsburgh e Florida State para ficar com a U. da Georgia. Dizem que a proposta da Georgia seduziu Sundiata porque era a que mais falava em tempo de quadra, enquanto umas falavam em 20 minutos por jogo, Georgia oferecia 35 minutos e a vaga de titular. Ele topou.
Foram quatro temporadas no basquete universitário. Mas ao contrário da estrela que era no mundo do basquete colegial, na NCAA ele nunca conseguiu passar da barreira do bom jogador. Liderava o seu time, é o segundo em assistências e o primeiro em roubos da história da universidade, tinha boas médias (cerca de 12 pontos, 5 rebotes e 4 assistências nesses quatro anos) mas nada que o fizesse saltar os olhos do pessoal da NBA. Suas atuações se destacavam dentro de sua divisão, a SEC, mas não nos rankings nacionais. Nos 4 anos de Gaines por lá, Georgia só alcançou o torneio da NCAA uma vez, no último ano. Não é preciso dizer que depois de tanto tempo o seu ótimo histórico colegial já não chamava a atenção de mais ninguém.
Em 2008 ele participou do Portsmouth Invitational Tournament, um dos vários torneios pré-draft em que jogadores que não estão garantidos no draft se enfrentam para tentar impressionar alguém e ganhar uma vaga no fim do segundo round. Gaines chamou a atenção do Knicks, que o chamou para um treino particular, mas não rendeu uma escolha. Sem ser draftado foi jogar na Itália, no NGC-Cantu, onde teve médias de 13 pontos por jogo. Mais uma vez apenas mais um na multidão, várias propostas de outros times maiores da Itália mas nenhuma de onde ele queria, a NBA.
Ao fim da temporada se arriscou de novo nos EUA. Fez testes para entrar no Atlanta Hawks. Atlanta, no estado da Georgia, era, afinal, um dos lugares onde ele ainda tinha algum reconhecimento e onde, um ano antes, Mario West, outro ilustre desconhecido do mundo do basquete, ganhou sua vaga na NBA depois de ter brilhado um pouco na Universidade da Georgia.
Mais uma vez não deu certo, mas ao invés de voltar para Itália preferiu participar do draft da D-League, a liga de desenvolvimento da NBA. Lá, pelo menos, teria mais visibilidade na liga. Apesar de ter sido considerado o melhor nome do draft pelo site DraftExpress, foi apenas a 15ª escolha e foi parar no Idaho Stampede. Em 14 jogos pela equipe nessa temporada ele foi titular em 8 e chamou muita atenção de todo mundo por ser um dos grandes armadores da liga, com médias de 23 pontos, 4 rebotes e quase 7 assistências.
Nessa mesma época o Utah Jazz fazia uma troca polêmica. Mandava o promissor armador Eric Maynor, junto com o quase aposentado Matt Harpring, para o Oklahoma City Thunder em troca de um jogador alemão que ainda está jogando na Europa. O Jazz explica que mesmo jogando muito bem, Maynor teve que sair porque o time estava com problemas financeiros e precisava economizar. Logo depois Deron Williams sofreu uma leve contusão no pulso esquerdo e virou dúvida para uma das partidas da equipe. Tendo apenas Ronnie Price no elenco para a reserva de Deron, Jerry Sloan foi buscar na D-League um reforço.
Para a sorte do Sundiata Gaines, o escolhido foi ele. E para a nossa sorte, a NBA resolveu filmar o episódio. O vídeo abaixo mostra o momento em que um representante da liga avisa o jogador que ele vai para a NBA e logo depois mostram ele ligando para a sua mãe para contar as boas novas, só dá para ouvir, de longe, um grito pelo telefone e ele dizendo que ela chorou um pouquinho.

Sua estréia no topo do basquete foi contra o Memphis Grizzlies. Uma vitória tranquila do Jazz em que ele jogou 20 minutos e fez três pontos. Pouco participou das outras partidas até que na quinta-feira dessa semana Jerry Sloan precisou dele de novo.

A partida era contra o Cleveland Cavaliers. Os três primeiros quartos foram sofríveis, com todos os times errando tudo até que o quarto período esquentou. O Jazz começou com um ataque furioso e LeBron James respondeu fazendo o que sabe, carregando o time sozinho nas costas e acertando arremessos de todos os cantos da quadra como se fosse um videogame. Fez 20 pontos só no último período e com uma cesta de três depois de um rebote de seu próprio lance livre parecia ter selado a vitória.
Até porque como o Jazz iria responder àquilo? Deron Williams, o homem dos momentos decisivos do time, estava fora. Depois de tomar uma dedada no olho do companheiro Boozer no primeiro quarto e uma trombada que estava mais para atropelamento por trem do LeBron James no segundo quarto, ele machucou de novo aquele mesmo pulso que fez Sloan chamar Gaines da D-League. Mas dessa vez ele estava mais perto e foi direto pra quadra. Nos momentos decisivos do jogo, enquanto o Cavs deixava LeBron James brilhar em rede nacional e o jogo era televisionado com grande audiência para todo os EUA na famosa rodada dupla de quinta-feira da TNT, o Jazz tinha em quadra Ronnie Price, Sundiata Gaines e Kyle Korver.
Este último fez boa parte da mágica da noite ao acertar um arremesso de trás da tabela a poucos segundos do fim do jogo. A diferença então baixou para um ponto e com o erro de um lance livre de Zydrunas Ilgauskas, o Jazz tinha alguns segundos para empatar o jogo com uma bola de 2 ou virar com uma de três. Jerry Sloan desenhou uma jogada para que o então herói da noite, Kyle Korver, que além da bola de trás da tabela já tinha dado um toco em LeBron James, arremessasse de 3. Mas com a marcação dobrada ele tocou para Price que, também sem saída, tocou para Gaines, que com Anthony Parker totalmente em cima dele, arremessou para a vitória.
O ginásio veio abaixo e do chão Gaines viu o momento em que entrou para a história da NBA. Quase não conseguiu levantar com todos os seus companheiros de time o abraçando para comemorar. Um pouco mais calmo deu uma entrevista para a TNT em que disse que “se a bola viesse para a minha mão eu ia para a vitória. Eu tenho muita confiança em mim e no meu jogo”. E só com essa confiança para transformar esse desconhecido do mês na história do ano da maior liga do mundo.
No vestiário a estrela do Jazz Carlos Boozer comentou sobre o novato, disse que tinham feito o primeiro treino com ele apenas um dia antes do jogo contra o Cavs, já que antes dos outros 4 jogos que Gaines participou eles não tiveram tempo, e disse que o garoto realmente tinha muita confiança nele mesmo, “mas que agora todo o resto do time também tem”.
No vídeo abaixo, tudo desse jogão: LeBron acertando bolas do meio da quadra antes do jogo, o toco do Korver, o Lebron dominando a partida, a contusão do Deron Williams, a bola milagrosa do Korver e o momento em que Sundiata Gaines escreveu seu nome em um cantinho da história da NBA.

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