>Draftados em 2003 – parte 4

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Lampe teve que abaixar o braço logo para ninguém perceber que ele fedia

Finalmente chegamos à última parte de nossa série de artigos sobre os draftados em 2003. Até agora, acompanhamos uma a uma as escolhas da primeira rodada, analisando o passado e o futuro de cada jogador. Alguns compõe o seleto grupo dos melhores da Liga, outros fazem parte do enorme grupo de jogadores que desapareceram sem deixar rastros.

Na primeira parte, analisamos as primeiras escolhas, que incluiam aquele tal de LeBron James, que dizem que é bom. Depois, na segunda parte, David West salvou o grupo do ostracismo total. Na terceira parte, Leandrinho e Josh Howard, as duas últimas escolhas da primeira rodada, fizeram os outros times se arrependerem mais do que a mãe do Gilberto Barros.

Na ansiosamente aguardada (por mim, pelo menos) última parte do artigo, veremos algumas escolhas selecionadas do segundo round. E, para finalizar, farei um exercício de imaginação: como seria o draft se acontecesse nos dias de hoje?

30 – Maciej Lampe (New York Knicks)

O Lampe era um dos jogadores europeus mais promissores de todo o draft. Se falava absurdos dele e seu potencial deixava todo mundo boquiaberto. Começou sendo cotado como uma das primeiras 5 escolhas, depois como uma das primeiras 10 e enfim estacionou como uma das primeiras 15 escolhas. O que o fazia cada vez mais despencar nos “mock drafts” (ou seja, nos drafts de mentirinha em que os especialistas chutam, e chutam mal) era o valor da recisão de seu contrato com seu clube europeu, o Real Madrid. Ainda assim, Lampe aparecia em todas as fotos conjuntas das “estrelas do draft” e era um consenso o fato de que já teria sido escolhido antes da 16a escolha.

Não foi o que aconteceu. O Lampe ficou lá, sentadinho na sala, vendo um a um os jogadores sendo chamados para apertar a mão sebosa do David Stern. Ver Cabarkapa, Pavlovic e Planinic sendo escolhidos antes dele deve ter lhe causado uma síncope e ele nunca mais seria o mesmo. Quando o primeiro round (e a chance de um contrato garantido) acabou, Maciej Lampe ainda não havia sido escolhido. Seu nome só foi anunciado para iniciar o segundo round, e a torcida de New York foi ao delírio. Era um jogador que poderia ter sido uma das dez primeiras escolhas e havia escorregado até a trigésima, direto para as mãos do Knicks. Lampe foi aplaudido, ovacionado, adorado, amado e até gritaram “gostoso!”. Na platéia, um rapaz levantou uma placa com os dizeres “Light the Lampe”, um trocadilho até que muito bom, levando em conta que todos os trocadilhos fedem.

Na entrevista logo após ter sido escolhido, Lampe tinha sangue nos olhos e parecia que sua cabeça estava preparando chá. Suas palavras foram furiosas e diretas: iria fazer cada um dos times da NBA se arrepender profundamente por ter deixado ele passar no primeiro round. Era uma jornada pessoal, uma busca por vingança, um jogador telentoso querendo acabar com a raça daqueles times muquiranas.

O Knicks pagou a multa, o Lampe foi imediatamente para a NBA, mas obviamente havia algo errado: como assim Isiah Thomas havia draftado alguém de que a torcida gostava? Como assim os fãs estavam feliz com a escolha? Era preciso fazer alguma coisa. Lampe foi trocado, junto com McDyess e duas escolhas de draft, pelo Marbury e o Hardaway, que aliás se saiu muito bem em mamar nas tetas do Knicks sem jogar.

No Suns, Lampe foi pouco utilizado mas dava seus primeiros sinais de feder. Foi então trocado para o Hornets, onde até teve mais chances mas fedeu do mesmo jeito, e aí foi para o Houston, onde marcou um total de 4 pontos em 4 partidas e desapareceu para nunca mais voltar. Vingança frustrada, moral destruída. E a multa de seu contrato salvou um punhado de times de cometer o maior engano de suas vidas.

31 – Jason Kapono (Cleveland Cavaliers)

Nada mal para uma escolha de segundo round. Trata-se de um jogador especialista que, aliás, tem a melhor média de aproveitamento em arremessos de 3 pontos de todos os tempos. Ele não chuta em grandes quantidades mas acerta o bastante para ser útil em qualquer equipe. O Bobcats arriscou, pegou o garoto no draft de expansão, e então o trocou para o Heat onde foi parte fundamental da equipe que foi campeã da NBA. O Pat Riley tentou de tudo para mantê-lo no time para essa temporada mas o Raptors desembolsou mais verdinhas e o Kapono resolveu ir para lá ser um homem rico no banco de reservas. Se bem que é melhor ser reserva no Raptors do que qualquer coisa no Heat, convenhamos. O Kapono foi perdendo seus minutos principalmente com a ascenção maluca do Jamario Moon, mas ele sempre vai ter seu espaço, sua função, e o Raptors tem potencial para acabar com o Leste assim que o Ray Allen estiver de cadeira de rodas e o Garnett só puder tomar purê de maçã no asilo.

32 – Luke Walton (Los Angeles Lakers)

Eu amo essa escolha. Vamos fazer uma pequena retrospectiva: Mike Sweetney foi a nona escolha, Reece Gaines a décima quinta, Troy Bell a décima sexta. O Lakers mesmo escolheu o Brian Cook na vigésima quarta posição. Quanto dinheiro indo pelo ralo, quantas escolhas desperdiçadas, quantos torcedores tendo que tomar anti-depressivos. E aí no segundo round, com a trigésima segunda escolha, o Lakers consegue draftar um jogador inteligente o bastante para ajudar qualquer equipe da NBA. Ele toma decisões espertas o tempo inteiro, passa a bola surrealmente bem, sempre sabe o que fazer e ainda pode cuidar das finanças da equipe sem nem usar uma calculadora. O cara é um gênio do ponto de vista do basquete cerebral. Se não tem a mão tão calibrada, se o físico é o de uma menina de pré-escola, isso nem vem ao caso. Sua mente, suas decisões, melhoram times inteiros.

Shaquille O’Neal ficou intrigado nos playoffs da temporada 2003-04 quando percebeu, e disse isso para a imprensa, que Luke Walton conseguia passar a bola para suas mãos como nenhum outro jogador jamais havia conseguido. Taí algo que eu colocaria no meu currículo. E já seria motivo o bastante para o Heat tentar uma troca, hoje em dia.

38 – Steve Blake (Washington Wizards)

Outro com um cérebro feito para o basquete. No Wizards, nunca teve muitas chances, mas assim que seu contrato acabou, foi para o Blazers jogar com seu amigo (de faculdade e também do Wizards) Juan Dixon. Lá começou a mostrar seu potencial como um armador cheio de fundamentos, habilidade em passar a bola e visão de jogo. Quando o Blazers o trocou por Jamaal Magloire, o Blake ficou revoltado. Por que diabos os times da NBA insistem em acreditar que o Magloire vai fazer alguma coisa em quadra? Blake então foi trocado para o Nuggets e fez miséria, mostrando-se ser a peça que faltava para o Nuggets de Iverson e Carmelo. Ele era o elo de ligação entre as estrelas, o general da equipe, e o time de Denver fez o possível para mantê-lo. Acontece que o Blake nunca queria ter saído de Portland, gostava da equipe, da cidade, dos amigos. Voltou para lá mesmo ganhando menos, mostrando-se um homem de princípios e também de visão: de alguma maneira estranha, sabia que a administração do Blazers estava ajeitando as coisas e que a equipe tinha futuro e poderia chegar aos playoffs ainda nessa temporada. Agora, o céu é o limite tanto para o Blake quanto para o Blazers. O que os outros times estavam pensando quando deixaram ele escorregar quase para a quadragésima escolha?

Aqui, acho que é hora de abrir um parênteses. Nosso amigo-leitor Sbubs escreveu em seu blog um post muito divertido sobre a “força nominal”. Com ele em mente, fica bem claro que os times que não fazem a menor idéia de quem draftar apelam para a força do nome dos novatos. No segundo round, isso é ainda mais óbvio. São nomes demais, jogadores internacionais aos montes, então na dúvida o nome é que faz a diferença. O Steve Blake, um armador talentosíssimo, por exemplo, foi escolhido atrás de nomes como Sofoklis Schortsanitis (o tal do Baby Shaq que nunca sequer chegou a jogar na NBA) e Szymon Szewczyk (que eu adoraria saber pronunciar). Força nominal? Com certeza.

41 – Willie Green (Seattle Supersonics)

Imediatamente depois de draftado, foi trocado para o Sixers pelo outro novato Paccelis Morlende, outro caso de força nominal. Green não fez nada até agora mas o caso dele é engraçado. Nos raros momentos em que o Iverson se machucava, Willie Green entrava como titular e fazia trocentos trilhões de pontos. Quando o Iverson voltava e o Green ia para o banco, não conseguia fazer coisa alguma. Ele é um Ben Gordon do Mundo Bizarro, que só produz quando titular. Pode ter certeza que ele estava na mente dos responsáveis pelo Sixers quando a troca do Iverson precisava ser feita, e Louis Williams e Green podem ser a base do Sixers daqui uns anos. É claro que vai ser a pior base da NBA, mas pelo menos é alguma coisa. Pergunta qual é a base do Miami Heat, pergunta.

45 – Matt Bonner (Chicago Bulls)

Todo mundo quer o próximo branquelo gigante que arremesse de 3 pontos e muitos europeus vesgos e mancos já foram draftados sem nunca sequer jogar, tudo em busca dessa promessa. O Bonner, quem diria, é algo bem perto disso. Foi trocado para o Raptors que gostou de seu potencial mas o mandou para a Europa por um ano enquanto eles arrumavam espaço no time. Quando voltou, teve boas atuações. Seu jumper é bom, ele pode ser bem físico, mas é muito engraçado quando tenta bater bola.

Em todo caso, chamou a atenção do pessoal no Spurs, que definitivamente sabe reconhecer um talento quando vê um, e foi trocado pelo Nesterovic. Ganhar minutos no Spurs não é fácil mas o Bonner conquistou seu espaço, jogando muito bem quando o Duncan estava machucado e saindo do posto de jogador-de-final-de-partida-ganha para assumir o papel que o Horry, agora embebido em formol, executava. Bom para o Bonner que, depois de ser obrigado a passar um ano de cão na Itália, tem chances de ganhar um anel de campeão.

47 – Mo Williams (Utah Jazz)

Como o Zach Randolph seria se fosse um armador baixinho e magro? A resposta: Mo Williams. Ele faz seus pontos, dá suas assistências (tá bom, tá bom, o Randolph não daria assistências) e deixa sua marca no jogo e nos boxscores, mas o sujeito é completamente psicótico, perdido, um buraco negro. A bola chega em suas mãos e só sai se for terrivelmente necessário, ele acha que pode decidir todos os jogos e arremessa mesmo se tiver os melhores companheiros de time livres do seu lado. Perdi a conta do número de vezes em que ele tentou dar o último arremesso de jogos importantes com o Michael Redd livre do seu lado.

Tem gente que gosta dele, diz que ele joga demais, e não deixa de ser verdade, ele é bom pra burro. Mas é o cara que dá vontade de pedir uma medida judicial para prendê-lo caso chegue a menos de 500 metros do seu time. Mesmo sendo bom, deixo claro.

Vale mencionar que ele foi draftado depois de sujeitos como Sani Becirovic, Malick Badiane e Derrick Zimmerman, obviamente porque o nome “Mo Williams” não vale nem 10 centavos.

49 – James Jones (Indiana Pacers)

Coisa de louco, mas sempre gostei do James Jones e nem é por causa do nome visivelmente poderoso (e falso). No Pacers, mal jogou. No Suns, chegou a ter um papel bem definido como o cara biruta que vem do banco para chutar como um louco e às vezes se saia muito bem, mostrando potencial atlético, chutes calibrados e rebotes acima da média. No entanto, foi só no Blazers que ele conseguiu minutos de verdade, já que o Suns não gosta muito de reservas. Em Portland, seu papel de atirador vindo do banco é bem específico e James Jones brilha desempenhando a função, acertando mais da metade de seus arremessos de 3. Ele tem talento, é parte importante dessa equipe cheia de futuro e pode ter um anel mais participativo do que aquele que o Darko ganhou no Pistons.

51 – Kyle Korver (New Jersey Nets)

Se você precisa de um cara ultra-religioso que saiba arremessar de trás da linha de 3 pontos, esse é seu homem. Tanto pela pontaria de fora quanto pela religião, ele é perfeito para o Utah Jazz.

O segundo round costuma ter vários jogadores que são mais especialistas em alguma coisa ao invés de serem cheios de potencial e bons em tudo quanto é aspecto do jogo. Depois do Korver, os escolhidos foram Xue Yuyang, Rick Rickert e Andreas Glyniadakis, forças nominais sem nenhum talento. Então o Korver foi uma barganha porque tem talento, é muito competente naquilo que faz e, após a recente troca para o Jazz, até mostrou que sabe defender. O time de Utah precisa dele e Korver vai ter chances de se mostrar, adquirir a carga tática necessária para se jogar para o Jerry Sloan e pode florecer por lá tendo um papel importante para o resto do time, talvez até titular, quem sabe. O futuro, pelo menos, é melhor do que o passado.

Agora, a hora da verdade: minha lista com o draft refeito. Como os times teriam escolhido se pudessem olhar numa bola de cristal rumo ao futuro, sabendo como os jogadores se sairiam? Como o Isiah Thomas teria feito se soubesse o futuro e, além disso, tivesse um cérebro?

Caso você não concorde com minha lista, coloque a sua própria na caixa de comentários para todo mundo ver e opinar. Só não vale não colocar o LeBron em primeiro lugar, porque a polêmica resultante de tal ação iria sobrecarregar os servidores e tirar o blog do ar. Não queremos isso, queremos? Então lá vai minha lista:

1 – LeBron James (Cleveland Cavaliers)

2 – Carmelo Anthony (Detroit Pistons)

3 – Dwyane Wade (Denver Nuggets)

4 – Chris Bosh (Toronto Raptors)

5 – Chris Kaman (Miami Heat)

6 – Josh Howard (Los Angeles Clippers)

7 – David West (Chicago Bulls)

8 – Leandro Barbosa (Milwaukee Bucks)

9 – Nick Collison (New York Knicks)

10 – TJ Ford (Washington Wizards)

11 – Mo Williams (Golden State Warriors)

12 – Kirk Hinrich (Seattle Supersonics)

13 – Boris Diaw (Memphis Grizzlies)

14 – Luke Walton (Seattle Supersonics)

15 – Steve Blake (Orlando Magic)

16 – Jason Kapono (Boston Celtics)

17 – Darko Milicic (Phoenix Suns)

18 – Jarvis Hayes (New Orleans Hornets)

19 – Travis Outlaw (Utah Jazz)

20 – Luke Ridnour (Boston Celtics)

21 – Willie Green (Atlanta Hawks)

22 – Kendrick Perkins (New Jersey Nets)

23 – Mickael Pietrus (Portland Trail Blazers)

24 – James Jones (Los Angeles Lakers)

25 – Matt Bonner (Detroit Pistons)

26 – Carlos Delfino (Minessota Timberwolves)

27 – Kyle Korver (Memphis Grizzlies)

28 – Marcus Banks (San Antonio Spurs)

29 – Aleksandar Pavlovic (Dallas Mavericks)

Alguns times ficariam bastante interessantes. Que tal o Bulls, que tem até hoje problemas em fazer pontos no garrafão, com David West mostrando seu arsenal ofensivo? Que tal o Denver de Wade e Iverson, cobrando uns 3 milhões de lances livres por jogo? E o Boston Celtics com Ridnour como reserva do Rajon Rondo? Tudo isso sem falar, claro, no Pistons de Carmelo Anthony. Teria o experimento fracassado por duelo de egos ou seria o Pistons, agora, o time mais vencedor dos últimos anos?

Sem bolas de cristal que funcionem, continuaremos vendo drafts com as escolhas mais estapafúrdias que sumirão em poucos minutos. Que outras escolhas será que assombram para sempre os drafts de outros anos? Nossa série continua num próximo post, analisando outra turma de novatos. Deixe aí, na caixa de comentários, qual ano do draft você gostaria que fosse o tema de nossa próxima série de textos. Enquanto isso, vou colocar o Carmelo no Pistons do meu videogame e dar uma olhada no tipo de estrago que dá pra fazer…

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