>Em busca de respostas

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Se você está ganhando, levanta a mão!

Estava evitando falar sobre o Miami Heat por dois motivos: primeiro porque falamos muito dele no começo da temporada e queria dar atenção para outros times, depois por ignorância, eu não sabia explicar o que eu queria explicar: o motivo que leva o Heat a ser tão bom contra equipes fracas e tão ruim contra os melhores times da NBA. E por que, mesmo quando não são tão ruins, perdem no final os jogos apertados. O que diabos acontece com essa equipe?

Os números são assustadores para um time que deveria ser tão bom. Apesar das 43 vitórias e 19 derrotas na temporada, são só 14 vitórias e 16 derrotas contra equipes com mais de 50% de aproveitamento, além de um patético número de 1 vitória e 8 derrotas contra o Top 3 de cada conferência: Bulls, Magic, Celtics, Spurs, Lakers e Mavs. O único triunfo foi no Natal contra o Lakers, o outro time da elite da NBA que sofre com o mesmo problema de perder jogos importantes. Nos últimos dois dias não foram só derrotas, mas humilhações, primeiro venciam o Orlando Magic por 24 pontos de vantagem e tomaram a virada, em casa. No dia seguinte tomaram uma sacolada de 125 a 95 do Spurs, sofrendo dessa vez os 24 pontos de desvantagem e só no primeiro período! Com o perdão da expressão, foi uma surra de pau mole. Do Kid Bengala. Isso sem esquecer que uma semana atrás desperdiçaram uma liderança de 10 pontos, em casa, contra o Knicks e que os próximos 8 jogos do time são contra times com 50% ou mais de aproveitamento, tá feia a coisa.

Outro número perturbador sobre o Heat: Em jogos decididos por 3 pontos ou menos eles tem 2 vitórias e 7 derrotas. São 2 vitórias e 12 derrotas em jogos decididos por 5 pontos. Não eram LeBron James e Dwyane Wade dois dos melhores jogadores da NBA em finais de jogos? Segundo os dados do 82games.com, que analisa a performance dos jogadores nos 5 minutos finais de jogos disputados (nenhum time liderando por mais de 5 pontos), o LeBron era o principal pontuador da NBA nessa situação no ano passado, com o Wade em 22º. No ano anterior o LeBron era o 2º, com Wade em 4º. Na atual temporada LeBron é o 13º, Wade nem aparece na lista. Mas mais do que os pontos marcados nessa situação, o que chama mais atenção é o aproveitamento dos arremessos do King James: Caíram de 55% e 48% nos dois últimos anos para 33% até agora.

Dados os números, vem o que eu estava evitando, a explicação. Por que eles não conseguem vencer os outros times da elite da NBA e por que perdem jogos apertados? Teve gente já tentando explicar isso por aí antes, mas coloco aqui o que eu pensei antes de analisar a resposta dos outros. Começo tentando responder a última questão.

O meu palpite depois de assistir a vários jogos do Heat é que o problema deles em finais de jogos é o mesmo do resto da partida, o ataque em meia quadra. Lembram aquele time do Suns do Mike D’Antoni que era o melhor ataque da NBA mas que tinha vários problemas em finais de jogos? O problema era que eles tinham a tendência de pegar rebotes defensivos, roubos de bola ou até resposições depois de cestas sofridas e correr para o ataque para arremessar o mais rápido possível, antes da defesa adversária se arrumar. Mas no final das partidas o instinto natural é querer acalmar as coisas e não tentar arremessos bestas que desperdicem uma valiosa posse de bola, e aí a única coisa que sobrava para eles era o pick-and-roll com Steve Nash e Amar’e Stoudemire, uma boa opção, claro, mas previsível e única. O Heat nem essa opção tem. Foi um time construído meio em cima da hora, sofreu com contusões no período de treinamentos e desde sempre tem um ataque irregular, passou a dar mais certo quando a defesa começou a funcionar e eles passaram a torturar outros times com imparáveis contra-ataques liderados por LeBron e Wade. Acontece que no fim dos jogos eles tentam atacar com menos velocidade e aí o time é empacado, se movimenta mal e acaba por decidir partidas com arremessos contestados de meia distância do LeBron e do Wade, a pior situação para eles.

O problema que contra a maioria dos times é só no fim dos jogos, contra os bons times é no jogo inteiro. Além da motivação extra que eles tem de enfrentar o Heat, os melhores da NBA estão todos muito bem ranqueados (com exceção do Spurs) em pontos de contra-ataque sofridos por jogo, ou seja, são bons em impedir a melhor arma ofensiva do Heat. As três equipes do Leste, Bulls, Magic e Celtics estão entre as quatro melhores (junto com o Bucks) também em proteger o garrafão, o que no caso do Heat significa menos bandejas de Wade e LeBron e mais bolas de três de Mario Chalmers, James Jones, Mike Miller e agora Mike Bibby, todos esses que tem tido atuações patéticas nesses jogos contra as grandes equipes. Se fosse para explicar em uma resposta curta eu diria que o Heat é um time muito bom com alguns poucos defeitos, os piores que poderiam ter.

Agora, depois dessas contestações é preciso saber os motivos e as soluções. Se o Heat tem um ataque estagnado é culpa de quem? Muita gente por aí quer o Erik Spoelstra fora a qualquer custo, mas tenho minhas dúvidas se a culpa é dele. Queria muito ter acesso aos treinos e pedidos técnicos dele para saber se em algum momento ele vira para o LeBron James e diz “Bata a bola por 20 segundos e depois force um arremesso idiota” ou se diz para o resto dos jogadores “Só fiquem parados em um canto esperando que algo aconteça”. Na NBA é mais normal do que em outros esportes que os grandes jogadores assumam liberdades e ignorem o que o técnico diz, esses dias mesmo o Phil Jackson disse que o Ron Artest é melhor que o Kobe no sistema de triângulos que eles usam no ataque pelo simples fato de que o Kobe muitas vezes ignora a parte tática e faz o que quer. Nunca quis e nem quero entrar nessa modinha de transformar o LeBron James em um demônio que concentra nele todos os males da humanidade, mas alguém duvida de que ele confia mais no próprio taco do que nas instruções do técnico? E mesmo quando erra eu vejo mais o Wade e Bosh dando tapinha nas costas dele do que cobrando.

Outra coisa é importante aqui, precisamos nos livrar dessa mania futebolística de acreditar que se existem jogadores talentosos em quadra a derrota tem que ser culpa do técnico. Um exemplo magnífico disso foi feito nesse texto da ESPN americana em que eles analisam as últimas sete posses de bola do Heat contra o Knicks, quando eles tomaram a virada e foram derrotados. A coisa resumida é mais ou menos assim:

Posse de bola 1: O Heat tenta uma jogada para o Dwyane Wade, que se movimenta sem a bola, o Knicks defende bem e LeBron acaba errando um passe simples.

Posse de bola 2: Dessa vez é Bosh que lidera a jogada e acha Wade cortando em direção à cesta, mas o passe não sai perfeito e dá a chance da defesa se recuperar. Sem muito espaço, Wade força e erra um arremesso ao invés de passar a bola para Bosh ou Mike Miller.

Posse de bola 3: Eles tentam um pick-and-roll com Joel Anthony, que estava livre embaixo do aro, mas o passe é bloqueado. Joel consegue ainda pegar a bola para passar para Wade, que então passa para Bosh que corre em direção à cesta. Na hora de tentar arremessar ele se atrapalha e então passa de volta para Wade, que precisa forçar o arremesso e erra. 

Posse de bola 4: Como em outras vezes eles usam o Bosh na cabeça do garrafão para começar a jogada, mas ele recebe uma inesperada marcação dupla e salta antes de dar um passe, erro primário que resulta no roubo de bola de Chauncey Billups.

Posse de bola 5: Pick-and-Roll com LeBron James que ataca a cesta, sofre falta e converte os lances livres. Mais simples do que isso, impossível. Únicos pontos da equipe no fim do jogo.

Posse de bola 6: Dessa vez LeBron ataca a cesta de novo, mas sem um corta-luz. Carmelo Anthony defende bem e Amar’e Stoudemire completa o serviço com um lindo toco. Como o cara da ESPN disse, uma jogada defensiva tão boa de Carmelo e Amar’e é tão incrível quanto improvável.

Posse de bola 7:  Precisando de 3 pontos com apenas 6 segundos no relógio, LeBron James recebe a bola e ao invés de chutar quando tem espaço prefere esperar para procurar um passe. Nenhuma oportunidade aparece e ele dribla para o lado para conseguir espaço e arremessa sem sucesso.  

Erros do Erik Spoelstra nesse fim de jogo eu só diria um, que é o de não confiar em seus arremessadores de três para o fim dos jogos, mas é algo até que compreensível e discutível já que Eddie House e James Jones não fizeram o bastante para merecer essa confiança. As outras jogadas já haviam dado certo em outros momentos do jogo e não funcionaram aí por erros de LeBron, Bosh, Wade e competência da defesa do Knicks (primeira vez que escrevo essa frase). Será que se fosse outro cara no banco comandando o time algo teria sido diferente? Será que o erro do Spoelstra é estar pedindo muitas jogadas diferentes quando as mais eficientes são as do estilo Mike Brown de só isolar o LeBron? Prefiro acreditar que não.

Embora sempre seja um assunto subjetivo e meio GalvãoBuenístico, podemos tentar entrar na cabeça dos jogadores e interpretar que eles simplesmente não estão conseguindo se focar no final dos jogos. Essa pressão por precisar vencer as partidas apertadas e/ou contra adversários importantes pode incomodar, ou essa história de ter um time dividido em três não faz bem para a confiança deles. Eu consigo visualizar (o que não quer dizer nada) o Wade não ligando se acertava ou errava um arremesso no ano passado porque o time era dele, mas nesse ano pode sentir aquela responsa de não deixar Bosh e LeBron decepcionados. São só suposições, vocês podem ignorar, mas como disse antes é difícil saber a explicação exata e eu já tô atirando pra todo lado. Hora de buscar explicação de gente mais qualificada do que eu.

Nesse fim de semana aconteceu no MIT (Massachusetts Institute of Technology) o quinto MIT Sloan Sports Analytics Conference, um encontro para discutir e analisar o mundo esportivo atual profundamente. O organizador foi o atual General Manager do Houston Rockets, Daryl Morey, e teve como convidados caras como RC Buford (manager do Spurs), Bill Simmon (colunista, dos bons, da ESPN), Jeff Van Gundy (ex-técnico e atual comentarista de TV), Mark Cuban (dono do Dallas Mavericks), Kevin Pritchard (ex-manager do Blazers) e muito mais gente que manja demais de basquete. Entre muitas coisas que eles trataram lá (vou tentar fazer um post sobre isso na segunda, vamos ver se dá tempo), falaram sobre esses problemas do Miami Heat.

Para o Mark Cuban o Heat fracassa no fim dos jogos porque são previsíveis. Segundo ele ninguém do elenco de apoio tem se destacado durante a temporada e assim as defesas conseguem se focar mais no Big 3. Faz sentido, nas jogadas que vimos contra o Knicks podemos citar a dobra na marcação do Bosh que forçou um turnover e a ajuda do Amar’e Stoudemire sobre o LeBron James. Por outro lado o Dallas é bom no fim dos jogos e todo mundo sabe das jogadinhas com Jason Terry e Dirk Nowitzki que eles fazem há anos. Talvez o Heat só precise de tempo para pegar o jeito? É o que o Kevin Pritchard acha. Para ele o Heat não passou por situações o bastante para poder ser analisado como um todo, que eles precisam de mais jogos decididos por poucos pontos no final para se ter uma amostragem suficiente. Ele também diz que eles ainda são uma equipe muito nova, junta há pouco tempo e que compará-la em momentos de fim de jogo com times como o Lakers e Celtics não é justo.

O John Hollinger, especialista em estatísticas da ESPN, não gosta nem dessa análise dos jogos decididos por 5 pontos ou menos, achando ela muito arbitrária. Ele diz que jogos decididos por 5 pontos são tão apertados quanto os decididos por 6 e que colocando eles na estatística a análise poderia mudar completamente, por exemplo. Outro cara da ESPN, o Marc Stein, tocou no assunto da disputa contra outros times da elite da NBA, lembrando que o Heat campeão de 2006 também tinha um recorde péssimo contra bons times, incluindo duas derrotas para o Mavs, equipe que derrotaram na final daquele ano.

Esse assunto me lembrou uma pesquisa do Basketball-Reference que eu postei no começo da temporada em um dos nossos Filtros. A pesquisa feita por eles queria saber se existe alguma relação entre vencer jogos contra times com bom aproveitamento na temporada regular e ir bem nos playoffs. Para isso eles se basearam em um estudo parecido feito no futebol americano e separaram as vitórias em diferentes tipos:

Guts: São as vitórias por 5 ou menos pontos contra boas equipes (mais de 50% de aproveitamento)
Stomps: Vitórias por mais de 9 pontos contra equipes ruins (menos de 50% de aproveitamento)
Skates: Vitórias por 5 ou menos pontos contra equipes ruins
Dominations: Vitórias por mais de 9 pontos contra equipes boas

Analisando os resultados em Finais e Finais de Conferência desde a fusão da ABA com a NBA em 1976 os resultados foram:

As melhores marcas são do Domination, ou seja, óbvio: nada é um indicador melhor do que simplesmente ir lá e vencer fácil contra boas equipes, como o Spurs fez contra o Heat. Mas o segundo melhor indicador são os Stomps, mais do que os Guts. Ou seja, historicamente os times que arrasam com os mais fracos se dão melhor nos playoffs do que os que vencem apertado os times bons. Talvez pelos jogos apertados serem decididos em detalhes e a amostragem deles durante a temporada não ser tão grande, o indicador não seja tão válido assim no fim das contas. Como foi citado no artigo do B-R e dito no estudo (que teve o mesmo resultado!) feito no futebol americano, “Times campeões são definidos pela sua habilidade de dominar equipes inferiores, não pela habilidade de vencer partidas apertadas”. É mais uma vez os números brigando com as nossas certezas mais antigas e profundas.

É triste ler tanta coisa para não chegar em conclusão alguma, mas é um assunto difícil. De todas essas opiniões e análises, incluindo até a que eu fiz antes de começar a minha pesquisa, eu concordo mais com Kevin Pritchard, que é a de que é cedo para ter qualquer conclusão. A marca do Heat até agora não é boa e isso claro que significa alguma coisinha, mas ainda é uma amostragem pequena feita sobre um time que começou do zero há pouco tempo. Um time baseado em estrelas que não estavam acostumados a jogar ao lado de outros como eles. É muita mudança, muita coisa nova e pouca temporada para sair declarando qualquer coisa absoluta.

Erik Spoelstra, LeBron James, Dwyane Wade, Chris Bosh e todo o resto do time ainda têm muita coisa para aprender e talvez não aprendam a tempo de vencer esse ano, mas enquanto eles tiverem consciência de que ainda não são os melhores e continuarem trabalhando para chegar lá eles tem muitas chances de sucesso. É fácil e uma tentação odiar o Miami Heat, o que não faltou ontem foi gente tendo orgasmos com o Spurs, símbolo de uma equipe coletiva e humilde, vencendo o Heat que é só um apanhado de talento e gente convencida. Mas se um já é um time hoje, temos que dar tempo para o outro pelo menos tentar ser. No meio do hype, dos egos inflados e do ódio que circula esse time, ainda existem jogadores fora de série e um bom técnico.

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