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O jogo 1 entre Lakers e Spurs, para mim pelo menos, mais que um jogo, foi uma experiência de vida.
Tudo começa pela forma em que eu assisti ao jogo. Estava assistindo normalmente pelos canais online que disponibilzamos os links no nosso chat quando um leitor nosso, o Tiveron, um dos poucos torcedores do Suns que não desistiu de ver NBA, me disse que a TNT, a emissora americana que está transmitindo as finais do Oeste, estava disponibilizando um site com o jogo ao vivo. Mas ao invés do jogo com sua transmissão normal, esse site tem 4 câmeras para você poder escolher e assistir ao jogo sem comerciais, replays ou narração. Era quase como estar na quadra. As câmeras eram duas, uma sobre cada tabela vendo o time atacante por inteiro, de costas. As outras duas acompanhavam um jogador de cada time. A câmera do Spurs acompanhava tudo o que Parker fazia (infelizmente não ele no quarto com a Eva Longoria) e a do Lakers acompanhou o Kobe até amarrando o tênis antes do terceiro período.
Ver o jogo assim foi legal demais. Primeiro, não havia a influência dos narradores, comentaristas, entrevistados, estatísticas que aparecem na tela nem nada assim. Tudo o que eu sentia ou sabia é o que eu via nas câmeras. O placar aparecia de vez em quando em uma das câmeras e o tempo eu via em cima do relógio de 24 segundos mesmo. Outra coisa legal dessa transmissão são os microfones, deu pra ouvir o Gasol reclamando depois de errar uma enterrada, o Fisher pedindo uma andada de um jogador do Spurs e até o ânimo da torcida. Em um momento, o Lakers estava destruindo e o som da torcida estava altíssimo, realmente dava pra sentir a vibração da torcida, e logo depois o Bowen, sempre ele, meteu uma de três e o silêncio foi imediato. A torcida do Lakers precisa aprender com a do Corinthians a gritar ainda mais quando o time está se dando mal.
Mas vamos e convenhamos, o jogo não teria sido uma grande experiência só pelas câmeras. Ver basquete feminino com garotas de 9 anos dando air ball o tempo inteiro não é lá muito legal nem em com as melhores câmeras e nem ao vivo. E eu sei do que estou falando, esse texto só está saindo agora ao invés de sair mais cedo porque eu me meti em uma em que passei o dia vendo jogos de vôlei e basquete de pivetes.
Então chegamos no mais importante, o jogo. O jogo 1 na verdade foi dois, um no primeiro tempo e outro no segundo. No primeiro tempo o Lakers estava meio estranho e o Spurs jogando bem como sempre, se fosse a série anterior do Hornets já ia estar todo mundo falando que era questão de experiência, de nervosismo, porque o Lakers parecia meio submisso ao jogo do Spurs. Para marcar Kobe, o Spurs resolveu colocar o Bowen em cima dele, o que era óbvio, mas tentou, além disso, fazer “traps“, que é uma expressão que significa nada mais do que uma armadilha, ou seja, dobrar a marcação no Kobe somente em momentos oportunos, nos momentos em que ele ficaria com os ângulos fechados para a infiltração, forçando ele ao passe.
Isso atrapalhou muito o Lakers e, no fim do primeiro tempo, o Kobe só tinha 2 pontos, em uma bandeja, e o Spurs tinha 10 pontos de vantagem. E a diferença só não foi maior porque os coadjuvantes do Kobe foram muito bem. E com coadjuvantes não estou falando do Gasol, Fisher e Odom, estou falando dos coadjuvtantes dos coadjuvantes, foram Vlad Radmanovic, Jordan Farmar e Sasha Vujacic que deixaram o Lakers na partida.
No segundo tempo eu achei que a diferença de uns 10 pontos estava boa, que o jogo ainda estava aberto e que dava pro Kobe acordar e pro Lakers jogar. Mas não foi bem assim, o Spurs voltou ainda melhor e estava dando um baile (um baile chato com música dos anos 40, claro, é o Spurs) e a diferença chegou a exatos 20 pontos com 5 minutos para o fim do terceiro período.
Nesse momento eu já estava em depressão profunda, já tinha dito “Mas se o Bynum estivesse jogando…” mais de 16 vezes, estava falando que o Duncan é um cara sujo só por usar a tabela pra fazer cestas e estava pensando se seria possível o Lakers roubar um jogo do Spurs em San Antonio pra poder salvar tudo, porque na minha cabeça uma derrota em casa no jogo 1 era o fim da temporada.
Mas de repente tudo mudou. Acho que o placar chegar na marca simbólica de 20 pontos de diferença fez o Kobe pensar “é, agora é melhor não confiar tanto assim nos meus companheiros” e ele resolveu tomar conta do jogo. A partir daquele momento, o Lakers fez 14 pontos seguidos e de repente lá tinhámos um jogo de novo. E engraçado ver como funciona a confiança dos jogadores, foi só o Kobe tomar conta do jogo por uns minutos que rapidinho já começamos a ver o Gasol, Odom e cia. jogando bem também. E acho que foi isso que o Kobe mais evoluiu no jogo dele nesse ano, agora ele sabe quando ele deve ser fominha, quando o time dele precisa que ele mostre que está lá para decidir.
Não se vira um jogo só com ataque e a virada histórica do Lakers passou bastante pela sua defesa. Mais especificamente, na defesa sobre dois jogadores, Tim Duncan e Manu Ginobili. Sim, eu sei que o Duncan fez 30 pontos e pegou 18 rebotes, mas isso não quer dizer que a marcação nele foi ruim, muito pelo contrário, foi muito boa! No dilema entre dobrar ou não a marcação, o Lakers resolveu deixar na opção “random” e isso foi o que mais atrapalhou. Às vezes dobravam, às vezes não. Às vezes era o Turiaf no Duncan, às vezes o Gasol. Às vezes era o Fisher que vinha pra dobra, às vezes o Odom. Simplesmente variaram o máximo possível para o Duncan não se sentir confortável. Se ele fez 30 pontos é só porque é um dos melhores da história mesmo, porque a marcação foi ótima e forçou o Duncan a quatro turnovers.
A marcação sobre o Manu foi simplesmente perfeita. O responsável foi o grande Sasha “The Machine” Vujacic. Ele recebeu o apelido “The Machine” por ser uma máquina de bolas de 3, mas ontem foi uma máquina defensiva que simplesmente não deixou o Ginobili fazer o que mais gosta, que é a infiltração. O próprio Phil Jackson, técnico do Lakers, que não é lá muito de elogiar seus comandados, soltou a frase: “Ofensivamente ele já teve dias melhores, mas defensivamente foi um dos melhores jogos da carreira dele.” Tá bom, o Phil aproveitou pra falar mal do ataque do Sasha um pouco, mas é o Phil Jackson, ele não pode só elogiar.
A defesa do Sasha sobre o Manu foi mais importante do que parece. Nas estatísticas, aparece apenas que o Ginobili acertou somente 3 de seus 13 arremessos, mas as suas infiltrações mal-sucedidas acarretam em duas coisas, as duas que eu disse na previsão da série que seriam chaves nessa final: as bolas de 3 e os lances livres. Ginobili chutou apenas 2 lances livres no jogo inteiro, uma aberração, e com isso o Spurs como time chutou 17, um a menos que o Lakers. E são as infiltrações que abrem os espaços para as bolas de 3. Bem marcadas, o Spurs acertou apenas 5 das 20 tentadas, enquanto o Lakers acertou 4, uma a menos, mas chutando a metade, 10.
Outro dado interessante, talvez o número mais legal do jogo inteiro, do Sasha Vujacic, foi o seu +/-. Essa estatística, que chamam de “plus/minus” (algo como “mais/menos”) na terra do Bush, é um número que mede o placar do jogo quando certo jogador ou conjunto de jogadores está na quadra. O número pode ser encontrado em qualquer tabela de estátistica de um jogo da NBA e foi explicado por nós em um texto bem no começo da temporada.
No jogo de ontem, o +/- no Kobe Bryant foi de +2, ou seja, nos minutos em que o Kobe estava jogando, o Lakers fez 2 pontos a mais do que tomou, o número do Gasol foi +7 e o do Odom -10 . Com o Bowen em quadra, o Spurs fez +18, com o Duncan +4. O número do Sasha Vujacic foi um impressionante +25!! Nos minutos em que ele jogou, o Lakers simplesmente acabou com o Spurs! Quem viu o jogo e tem a sabedoria de não acreditar cegamente nos números sabe que isso não faz do Sasha melhor do que o Kobe no jogo de ontem, mas mostra pelo menos como o garoto entrou bem no jogo e fez a diferença.
Se antes eu achava que uma derrota em casa logo no Jogo 1 ia fazer com o que o Lakers ficasse com o espírito meio derrotista, achando que não dá pra ganhar do Spurs mesmo, acho que uma vitória desse jeito serve pra animar a garotada. Temos que lembrar que, tirando Fisher e Kobe, o time do Lakers não deixa de ser um time de pivetes inexperientes. Tirando os dois, poucos são os com mais de 25, 26 anos, e só o Radmanovic e o Odom tinham vitórias em séries de playoff, uma pra cada um (Odom no Heat, Radmanovic no Clippers). A vitória foi essencial e foi melhor ainda porque foi de virada, para mostrar para a garotada que eles podem vencer o Spurs sim.
Para o Spurs, a derrota deve ter sido doída, é aquela sensação de ver algo importante escapando pelos dedos, é saber que você tinha a garota loirinha firmeza que você conhece há anos nas mãos com ela doidinha por você e de repente alguma coisa impede você de consumir o ato do amor com a danada. Mas é nessas horas que a média de 78 anos de idade do elenco do Spurs tem que fazer alguma diferença. Se o Lakers sabe que pode virar um jogo, o Spurs tem que ter na cabeça que tem time o bastante pra abrir 20 pontos de diferença sobre o Lakers em Los Angeles e de segurar o Kobe a 2 pontos em um tempo inteiro.
Tudo questão de ponto de vista.
Vídeos
Para quem perdeu o show aqui tem um resumo do jogo:
Para quem quer ver o Kobe atirando uma toalha, sem querer, na cabeça de uma velha, tem esse vídeo aqui:
Para quem não quer perder o hábito de chamar o Bowen de sujo, tem o vídeo dele acertando o Sasha “The Machine” no jogo 1.