>Hora do lixo

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Fisher levanta halteres imaginários

Na gringolândia, os minutos finais de um jogo que já está decidido são chamados de “garbage time”, algo como “a hora do lixo”, porque sujeitos como DJ Mbenga entram em quadra. Em jogos muito fáceis, às vezes o garbage time dura o último quarto inteiro, o que é sempre uma chance de conhecer aquele jogador que mora no final do banco de reservas e que todo mundo acha que é o roupeiro. O problema é quando esse garbage time acontece no meio do primeiro período de uma Final de NBA e não porque esteja fácil demais, e sim porque não restou nenhum mamífero bípede na região que não tivesse acumulado trezentas faltas. Naquele ritmo, parecia que no quarto período os dois times só teriam dois jogadores sobrando, o que resultaria num “dois contra dois” tipo o falecido “NBA Jam”, mas sem a bola pegando fogo.

A preocupação maior do técnico cosplayer do Super Mario, Stan Van Gundy, tem sido em fazer com que o Magic corra o máximo que puder, puxando contra-ataques, jogando na velocidade e tentando, com isso, atacar mais a cesta e compensar os arremessos de 3 pontos em excesso. Dessa vez a correria esteve presente no jogo da equipe desde o primeiro segundo e mostrou-se uma faca de dois legumes, já diriam os Mamonas Assassinas: por um lado, levou o Magic a cometer uma tonelada de erros bobos e desperdícios de bola, mas por outro lado, tornou a equipe mais agressiva e obrigou o Lakers a cometer falta atrás de falta. Foi assim que, no primeiro quarto, o Magic já tinha cometido 7 turnovers enquanto o Lakers ainda não desperdiçara a bola, e também foi assim que tivemos um garbage time mais rápido do que ejaculação precoce. Bynum e Gasol sentaram rapidinho com duas faltas cada um, e o reserva Lamar Odom não demorou para seguir seus companheiros e colocar a bunda de volta no banco. Um Lakers composto por DJ Mbenga, Josh Powell e Luke Walton numa Final de NBA assistida pelo mundo inteiro é tipo ir pra escola vestido de pijamas. Sem dúvida nenhuma, metade do mundo acompanhando a partida de ontem jamais tinha visto Powell e Mbenga numa quadra de basquete, e a outra metade preferia certamente nunca ter visto. O resultado disso foi que outra instrução do pizzaiolo Stan Van Gundy foi executada: o domínio dos rebotes. Sem Bynum, Gasol e Odom em quadra, Dwight Howard ficou livre para dominar os rebotes ofensivos e terminar o primeiro período com 11 rebotes totais, números que o Yao Ming não teria num jogo inteiro e mais do que o Mbenga pegou em toda sua vida (tanto em rebotes quanto em mulheres, convenhamos).

A arbitragem não foi exagerada apenas contra o Lakers, no entanto. Courtney Lee começou dando os quatro primeiros arremessos do Magic, no que parecia uma tentativa deliberada do Kobe de não marcar ninguém, e estava dando certo porque o Lee não acertava porcaria nenhuma. Mas tudo que o Kobe poupou na defesa ele despejou no ataque e sua agressividade tirou Courtney Lee de quadra com duas faltas rapidinho, foi como se o Pietrus que entrou em seu lugar tivesse começado mesmo de titular. Turkoglu também teve que sentar logo com problemas de falta e o Magic foi obrigado a utilizar JJ Redick por tempo demais para tapar os buracos. Pietrus fez um bom trabalho defensivo em cima do Kobe mais uma vez, mas também cometeu sua terceira falta rapidinho, logo no começo do segundo quarto, e os dois times já estavam totalmente irreconhecíveis desfilando seus elencos de segundo escalão.

O que mais me surpreendeu, no entanto, foi a incapacidade das duas equipes de explorar ao máximo a situação. Dwight Howard passou a ser ignorado no lado ofensivo apesar de estar sendo marcado por um par de manés, enquanto o Magic continuava correndo, desperdiçando bolas e se negando a jogar um basquete de meia quadra. É uma tremenda limitação na hora de ler o jogo, saber a hora de correr e a hora de respirar, tomar conta da bola e explorar o jogo de garrafão. É como se o Magic tivesse um interruptor nas costas que determinasse se eles vão correr ou não, e só dá pra ligar o interruptor no começo do jogo. Só que vou poupar o time dessa vez, parece que eles simplesmente estavam seguindo cegamente a orientação do técnico bigodudo, que não soube ajeitar a equipe quando era necessária uma mudança de jogo.

No Lakers, aconteceu algo similar. Kobe Bryant anda de TPM, agressivo demais, arremessando demais (31 arremessos ontem!), dando um par de cotoveladas e conseguindo até brigar com o Dwight Howard, que é o cara mais legal do mundo desde o Mussum. Como dá pra ficar bravo com o Dwight? (aliás, a transmissão do jogo de ontem mostrou uma foto com todos os titulares dos dois times em volta do troféu de campeão, e enquanto o Kobe estava com uma cara de “não vejo a hora de sair daqui e dar um arremesso”, o Dwight estava com uma cara de pateta se divertindo como se fosse a ideia mais legal do mundo). E, apesar dessa agressividade do Kobe, dessa vontade de assumir o jogo para si, a bola deixou de chegar nele no momento em que fazia mais sentido. Courtney Lee estava sentado com problema de faltas e Pietrus acabara de cometer sua terceira falta ainda no começo do segundo período. Por umas duas posses de bola, o Pietrus continuou em quadra marcando o Kobe, no que seria a oportunidade perfeita para o Lakers cavar mais uma falta e não ver mais a cara fedida do francês pelo resto do jogo. Mas não, Kobe não viu a cor da bola, Pietrus sentou e então JJ Redick veio marcá-lo, saindo do banco. Dá pra imaginar coisa mais engraçada do que o Redick marcando o Kobe? Já estava imaginando que a polícia teria que intervir, acusando o Kobe mais uma vez de estupro, mas eu estava enganado porque a bola praticamente não chegou nas mãos da estrela do Lakers. O técnico Phil Jackson provavelmente estava no banco de reservas lendo Aristóteles e não percebeu, impedindo que seu time tirasse proveito da situação. Foi como se as duas equipes tivessem um acordo silencioso, “você não apela e eu também não apelo”. Ainda assim, o Lakers acabou o primeiro tempo doze pontos atrás no placar. O machucado só não foi pior porque o Magic não parava de perder posses de bola imbecis graças à neura de sempre sair correndo e colocar a bola em jogo sempre o mais rápido possível. Mas tudo bem, pelo menos ainda estava dando certo.

O segundo tempo foi diferente, sem garbage time, porque os juízes começaram a apitar com menos rigor. O critério foi descarga abaixo, não dá pra entender. No começo do jogo foram trocentas faltas fora da bola, minuciosas, que geravam compensações, que geravam mais faltas, que geraram um jogo parecido com vôlei, que é de menina. Mas depois o contato começou a ser permitido com mais frequência e não dá pra ter a menor noção do que se está fazendo em quadra. A única certeza é que tudo que o Bynum fizer é falta, torço sinceramente para que ele não tenha filhos porque consigo ver nitidamente ele quebrando os ossos do bebê ao tentar lhe dar uma mamadeira. Com mais contato rolando, Gasol em quadra e Josh Powell sentadinho no banco, Dwight Howard não apenas teve mais problemas em dominar os rebotes como também sofreu para conseguir um ritmo ofensivo. O Magic continuou desperdiçando bolas numa clara imitação do Silvio Santos jogando aviõezinhos de dinheiro para a plateia e o Trevor Ariza se lembrou de que estava jogando basquete, acertando bolas de três e marcando os 9 primeiros pontos do Lakers no terceiro período.

É engraçado como o tempo inteiro tem gente se esquecendo ou se lembrando de como jogar basquete. Os Monstars do filme Space Jam estão sempre roubando o talento dos jogadores da NBA e o Jordan parece sempre devolver para os caras errados. Por exemplo, o Sasha Vujacic já foi o “The Machine”, porque não errava arremessos de três pontos nos treinos, e foi essencial nos playoffs passados para o Lakers mostrando ser um marcador confiável e um arremessador poderoso. Mas como diz a música, “estava o Vujacic em seu lugar, veio os Monstars lhe fazer mal” e o rapaz simplesmente não presta pra mais nada. Seu talento foi devolvido ontem, mas não para o coitado do Vujacic e sim para o Trevor Ariza, por engano. Com o garrafão cometendo menos faltas, pegando rebotes, o Ariza dando uma força no ataque e o Magic querendo correr e colecionando turnovers, o jogo mudou por completo e o Lakers passou à frente.

Hora do quarto decisivo, em que o Magic decidiria seu futuro nas Finais. O que aconteceu, então? Rafer Alston foi parar no banco e o Jameer Nelson assumiu a brincadeira, apesar do time estar nitidamente mais lento com ele e da tática da correria ter dado certo no começo do jogo sob o comando do pobre Alston. Eu alertei que a volta do Jameer Nelson era o fim pro Magic, uma baita cagada, e por enquanto isso está se confirmando. O armador foi inexpressivo, o time perdeu a velocidade que queria tanto impor (e que estava dando resultado apesar do excesso de desperdícios de bola) e sua presença não gerou as infiltrações e a critividade que tanto faltam à equipe, principalmente quando o Magic está atrás no placar. Acertar bolas de três pontos quando se está ganhando é sempre um golpe mortal que liquida imediatamente com o jogo, mas arremessar de três pontos precisando empatar um jogo é muitíssimo mais complicado, exige muita tranquilidade, psicológico e a capacidade de saber o que fazer quando as bolas não caírem. Não é e nem nunca foi o caso do Magic.

Mas existe um tal de Turkoglu. Com a marcação centrada no perímetro, ele passou o jogo inteiro batendo pra dentro do garrafão e dando arremessos de meia-distância no que foi uma das apresentações mais inteligentes que já vi dele. Só que, quando o negócio aperta e ninguém no time tem coragem de arremessar ou criatividade para gerar uma jogada individual, o turco é meio maluco e não tem muito critério. Em sua defesa, a maioria das bolas retardadas que ele tenta de trás da linha de três pontos em momentos importantes dos jogos costuma cair, e foi o que aconteceu na noite de ontem. Foi ele quem colocou o Magic cinco pontos na frente do placar no minuto final. Quando o Gasol cortou a diferença para três, o Dwight Howard sofreu falta e foi para a linha de lances livres.

Fica difícil saber o que falar do Dwight. Na série contra o Celtics ele já tinha exigido receber mais a bola nas mãos, ser um foco mais importante do ataque. Na noite de ontem, mostrou que está aprendendo e deu um par de ganchos bacanudos, bastante sólidos. Foi bem agressivo e cavou trocentas faltas em cima do Lakers inteiro. Mas não dá pra confiar a bola nas mãos de um jogador, nos momentos cruciais de um jogo, se ele não for capaz de cobrar seus lances livres. Já vimos Shaquille O’Neal, que era bem mais dominante no garrafão, sentar em jogadas decisivas porque fede nos lances livres. No caso do Dwight, a partir do momento em o Magic não soube explorar os jogadores com excesso de faltas no Lakers (em parte porque a arbitragem mudou de padrão, em parte porque o Lakers passou a tomar mais cuidado), sua presença ofensiva passou a atrapalhar o time. Não acertando seus lances livres e perdendo bolas demais (como disse nosso leitor Farid Tranjan em nosso último post, o Dwight mantém a bola sempre muito baixa quando parte para a cesta), ele torna-se um problema e a equipe não sente confiança em colocar a bola em suas mãos. Sua média de 47% de aproveitamento nos lances livres nessa Final é pior do que qualquer coisa que eu me lembre do Shaq fazendo por aí.

O ápice disso foi o final do quarto período, Magic ganhando por três pontos e o Dwight na linha de lances livres. Errou os dois (ao todo, acertou 6 em suas 14 tentativas durante a partida) e aí, como todo mundo sabe, é a hora do Derek Fisher. Ele pode feder, estar velho, ter gonorréia, mas essas bolas decisivas que caem em sua mão são batata. Ele é um Hobert Horry mais legal porque não jogou no Spurs e com menos anéis pra não parecer muito frutinha. Parou na linha de três, arremessou e empatou o jogo. O vídeo abaixo tem a cesta, seguida pela cesta crucial que ele também acertou na prorrogação:

Agora conte até três e me responda: quem é que estava marcando o Fisher mesmo no quarto período? Não me entendam errado, o Alston não é e nem nunca foi um gênio defensivo, mas o Jameer Nelson é mais baixo, mais lento e está completamente fora de forma. Quem em sã consciência colocaria seu armador titular no bando durante o quarto período inteiro e deixaria um Jameer Nelson tentando entrar em forma para marcar a última bola do jogo? Só se ele fosse o Ronaldo Fenômeno, e olhe lá.

O Magic ainda teve chance de vencer na jogada final, mas a bola sempre parece ir para alguém que não deveria decidir jogos (aliás, quem no Magic deveria decidir jogos, afinal?). A equipe de Orlando já perdeu o jogo 3 numa jogada armada para o Courtney Lee, e dessa vez a última bola acabou nas mãos do Mickael Pietrus, que se negou a passar para um Dwight Howard em boas condições de pontuar. Não dá pra culpar o francês, já que o Dwight iria tomar uma bordoada e errar os lances livres mesmo, mas ele podia ao menos ter tentado uma infiltração ao invés de um arremesso muito do vagabundo.

A prorrogação foi a punição que o Magic merecia. O Fisher acertou mais uma bola cagada de três só porque o momento era importante, o Turkoglu tentou uma daquelas bolas idiotas dele mas dessa vez não caiu, e o Dwight errou mais lances livres. Arremessos idiotas, aliás, levam a contra-ataques fulminantes e o Gasol deu duas enterradas seguidas em situações bem parecidas. A última, quando o jogo já estava praticamente acabado e não havia mais chance do Lakers perder o jogo, foi acompanhada por um golpe de luta-livre do Pietrus. O francês quis impedir a cesta, mas não havia ângulo, então ele tinha três escolhas: desistir e deixar o Gasol enterrar, dar um golpe nas costas do espanhol, ou então dar um tiro mortal na cabeça usando um sniper. Sorte nossa que ele apenas optou pela pancada nas costas, ainda que a enterrada tenha acontecido mesmo assim.

Não foi tão feio assim, só foi um pouquinho criminoso. Agora, para o próximo jogo, o Magic ainda corre o risco de estar sem o Pietrus se ele for suspenso. O Magic poderia, fácil-fácil, estar liderando essa série por 3 a 1 se tivesse convertido as chances que teve em bolas decisivas. Na pior das hipóteses, deveria estar com a série empatada em 2 a 2 se tivesse um tiquinho mais de inteligência ou o Dwight tivesse acertado um maldito lance livre a mais. Isso significa que a série é mais disputada e parelha do que se imaginava, o Magic não é tão zebra assim e o Lakers não apenas é falho como também tem um banco mequetrefe que ficou exposto na noite de ontem. Mas isso não muda o fato de que a equipe de Los Angeles só precisa ganhar mais um jogo e que Pietrus pode não estar presente para defender Kobe Bryant. Ou seja: funhé.

A série não deve ir sequer para Los Angeles (como o Luiz Fernando Paes nos lembrou nos comentários, as Finais são em formato 2-3-2), deve acabar na próxima partida mesmo, mas pelo menos o próximo jogo é em Orlando, o que é legal por causa da torcida. Nosso leitor Farid Tranjan também nos avisou da guria breaca tomando um capote, e fomos atrás do vídeo:

Ah, a raça humana: nada mais lindo e patético. Uma boa lembrança para termos desse Magic, que podia realmente ganhar um anel de campeão e no entanto vai nos dar uma Final curtinha e apressar nossas férias. Eles chegaram até aqui, poderiam ter vencido, poderiam liderar a série, mas ficaram breacos. É lindo, mas patético.

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