>Nos vemos em 2017, locaute

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 Billy Hunter e David Stern em 1999. Ou será 2011? Talvez 1995…

Em 22 de junho os jogadores da NBA e os donos de equipes sentaram em uma sala para uma reunião que iria discutir o futuro CBA, o acordo que une as duas partes e deixa a NBA funcionar. Mas depois de apenas 30 minutos os jogadores deixaram a reunião e disseram que se recusariam a escutar qualquer proposta que envolvesse o termo “hard cap”, o teto salarial fixo e sem restrições sonhado pelos donos. Em 1º de julho os donos impuseram um locaute já que os jogadores se recusaram a votar em uma nova proposta de CBA. Em 12 de setembro os jogadores se reuniram para votar a decertificação do seu sindicato. Em 4 de dezembro os jogadores e os donos fizeram mais uma longa reunião e ao fim dela o comissário da NBA David Stern disse que provavelmente a próxima temporada seria cancelada.

Você deve estar achando que eu estou louco, desatentou ou confuso. E deve ter percebido que algumas informações não batem com as datas ou umas com as outras. Eu explico: elas são de anos diferentes e nenhuma é de 2011. A reunião de 30 minutos aconteceu em junho de 1998. O locaute de 1º de julho após a recusa dos votos dos jogadores aconteceu em 1995, mesmo ano que, meses depois os jogadores votaram e preferiram assinar um novo CBA ao invés de acabar com o sindicato, ao contrário do que aconteceu algumas semanas atrás. A reunião desastrosa de 4 de dezembro foi um dos pontos mais baixos e desesperadores do locaute da temporada 1998-99. O que vimos nos últimes meses foi um saco, um porre, uma confusão desnecessária com muitos prejuízos, tudo isso, mas não foi nada de novo.

Confesso que se eu tivesse acompanhado de perto todas as batalhas trabalhistas já travadas entre donos e jogadores eu não teria dado tanta importância para esse locaute. Claro que foi apenas a segunda vez que chegamos ao ponto de termos jogos cancelados, mas é que são sempre as mesmas discussões, os mesmos temas e tudo não passa de desculpa esfarrapada para conseguir a maior fatia de bolo.

Em 1994 os jogadores toparam disputar a temporada 94-95 dentro de um “acordo de não-greve”. Ao invés de entrar em uma briga que parecia sangrenta, decidiram manter o mesmo CBA por um ano extra e discutir só ao fim daquele campeonato. Até chegaram a acertar um acordo antes que o contrato em vigor expirasse em 1º de julho, mas ele veio abaixo com a recusa dos jogadores em votar e aí começou um locaute. A discussão era, surpresa!, sobre a divisão do BRI e também sobre punições a times que ultrapassassem o luxury tax, ponto em que os times precisam pagar multas à liga por estarem gastando demais. Em setembro daquele ano os jogadores resolveram aceitar a proposta de BRI em 51% a seu favor, não decertificar do sindicato e então acabar com o locaute antes que jogos fossem perdidos.

Um ano depois, em 1996, aconteceu um episódio esquisitíssimo. Em 1º de julho os donos declararam moratória aos jogadores até que detalhes do acordo do ano anterior fossem resolvidos. O impasse durou até o dia 10 de julho, quando surgiu a discussão sobre 50 milhões de dólares oriundos de um contrato com a TV. Sem saber como dividir essa grana foi declarado um locaute que durou, acreditem, duas horas.

A coisa pegou pra valer na temporada 1998-99. Sério, se você achou que esse locaute foi brabo é porque não vivenciou aquele. Começou com os donos votando para reabrir as negociações sobre o CBA, eles não estavam satisfeitos com o vigente e não queriam nem chegar perto de uma renovação. Afinal, não tinha crise econômica nos EUA, não tinha terrorismo, as crianças ainda brincavam de pião na rua mas os donos estão sempre perdendo dinheiro e assumindo todos os riscos. Está sempre ruim. A liga dizia que naquele ano quase todos os times tiveram prejuízo, números que foram contestados pelos jogadores. Já viram isso em algum lugar? Depois da citada reunião de 30 minutos, o locaute então começou para valer em julho de 1998.

O sindicato dos jogadores respondeu entrando na Justiça para que os times continuassem pagando os atletas mesmo durante a paralisação da liga. Depois disso passou-se mais de um mês sem qualquer tipo de reunião ou movimentação, só no meio de agosto aconteceu um encontro em que os donos ouviram uma proposta do sindicato e foram embora depois de recusá-la. Poucas reuniões aconteceram até outubro, sempre sem nenhum resultado (nem o otimismo do “pequenos progressos” tinha naquela época), a coisa só começou a andar um pouco depois, quando ficou oficialmente decidido, em 20 de outubro de 1998, que os donos não eram obrigados a pagar os salários dos jogadores durante o locaute.

As notícias do que aconteceu depois disso são hilárias de tão iguais às de hoje. “Reunião de 11 horas de duração não dá resultado e locaute continua”, “Após 4 horas e meia de reunião jogadores não aceitam proposta”, “Depois de 13 horas de conversa os dois lados dizem ter feitos avanços significativos” e por aí vai a bobagem. A pauta das discussões daquela época envolvia o salário máximo permitido para os jogadores, a permanência ou não da “Larry Bird Exception” e a criação de salários fixos para novatos (o hoje consolidado Rookie Scale).

Uma grande diferença em relação ao locaute 2011 foi que nunca antes a NBA havia perdido jogos. Ela era, aliás, a única liga profissional dos EUA a não ter tido jogos cancelados por questões trabalhistas até então. E hoje, no fim de novembro, já temos uma solução para o problema, em 1998 isso não aconteceu e em dezembro ameaçava-se cancelar toda a temporada. Isso, lembremos, logo depois do Michael Jordan ter anunciado sua aposentadoria, que naturalmente já daria uma baixada de bola na popularidade da liga ao redor do mundo. A situação era caótica e preocupante.

Outra grande diferença foram algumas polêmicas que hoje, mesmo na era-Twitter, foram de certa forma evitadas. Em determinado momento, como já comentamos aqui, o Jordan, ainda envolvido nas negociações, disse para o dono do Wizards Abe Pollin que “se você não consegue ter lucros deveria vender seu time”. Conselho que Jordan não seguiu anos depois. Outro momento horrível foi uma conversa entre os jogadores Kenny Anderson e o Patrick Ewing, então presidente do Sindicato dos jogadores. Anderson disse “Acho que vou ter que vender um dos meus carros, acho que não preciso de todos eles. Vou vender a Mercedes”, e Ewing respondeu “Nós ganhamos muito dinheiro, mas gastamos muito também“. Isso culiminou em um jogo realizado por 16 jogadores, todos All-Stars, feito para arrecadar dinheiro para os jogadores. Após a polêmica formada com a opinião pública, eles resolveram pegar a grana e doar para a caridade.

Até o final daquele locaute foi de certa forma parecido com esse, de surpresa e sem alarde antecipado. O David Stern deu um ultimato (7 de janeiro) e poucos dias antes os dois lados se reuniram de maneira secreta resolvendo tudo em cima da hora. O acordo foi anunciado no dia 6, poucas horas antes do momento em que Stern tinha dito que era o momento limite antes da temporada ser cancelada. Os donos ganharam os salários menores dos novatos, os jogadores continuaram com o benefício de poder extrapolar o salary cap se fosse para se manterem nos times em que já estavam.

Contei essa história toda para mostrar que vivemos um momento de alívio, mas que é temporário. Em 2017 o cenário econômico mundial será outro, a realidade da NBA será diferente, teremos outros ídolos e possivelemente outras maneiras da liga ganhar dinheiro. Mas não mudará o fato dos jogadores se acharem donos do espetáculo e dos donos sempre pensarem que podem ganhar mais gastando menos. Eles podem dar as desculpas e argumentos que quiserem, mas no fim a disputa sempre ocorrerá e nunca os dois lados estão satisfeitos. E como até os personagens já se repetiram (Jordan, Ewing, Stern e Hunter e um mediador federal aparecem quase todas as vezes), não dá pra ser tão otimista a ponto de acreditar que irão aprender com o último locaute e fazer diferente.

Novas brigas virão, talvez mais chatas do que essas de 2011, então vamos aproveitar a curta temporada que temos a nossa frente.

Essa curta temporada, aliás, poderia ser menor ainda. Mas a NBA decidiu que não quer perder ainda mais dinheiro e escolheu por fazer um calendário com 66 jogosMatt Winick, o homem-calendário que teve seu trabalho explicado aqui no Bola Presa há um ano, vai ralar. Para acomodar tudo isso já se garantiu que muitos times terão vários dos temidos 4-in-5, com 4 jogos em 5 noites, e também uma novidade, os back-to-back-to-back, 3 jogos em 3 dias seguidos! Um doce para quem adivinhar a última vez que isso aconteceu. Sim, 1999.

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