>O caminho de Brandon Jennings

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Aos dois anos de idade, Jennings enterrava na cabeça da mãe

Dia desses, li as primeiras notícias sobre como anda a vida do Brandon Jennings na terra de Mario e Luigi. Para quem não se lembra, o armador de 19 anos escolheu ir jogar na Itália ao invés de trilhar o tradicional caminho do basquete universitário. Com as informações chegando sobre sua estadia, a decisão de Jennings parece cada vez mais sensata, madura e – por que não – óbvia. Fica difícil imaginar uma estrela do basquete colegial nos Estados Unidos que não tenha vontade de copiar essa alternativa do basquete europeu.

O problema de se viver em sociedade é – além de não poder fazer xixi na rua, o que às vezes faz falta – a dificuldade de lidar com o indivíduo. Se cada caso é analizado individualmente, gasta-se muito tempo e todas as decisões podem ser questionadas, por serem baseadas em critérios subjetivos, tipo aquele tal de “bom senso”. Mas ao instituir uma regra que trata todos como iguais, então alguns casos especiais acabam tendo que sofrer pela maioria, criando uma injustiça. Eis o que acontece com o David Stern e sua regra de que, para entrar no draft da NBA, todos os jogadores devem esperar ao menos um ano após a formatura no colegial.

A intenção é até boa. Não é todo jogador que está pronto para sair da escola e ir direto para a NBA, mas alguns acabavam sendo escolhidos mesmo assim graças ao seu potencial e suas carreiras viravam farofa porque, sem minutos de quadra, não evoluiam e uma hora se tornavam descartáveis para a NBA. Lembram-se de Ndudi Ebi, draftado em 2003? Tinha muito potencial mas estava completamente cru para o basquete profissional, nunca teve a atenção necessária para evoluir seu jogo e hoje vende seguros de vida. Até mesmo grandes estrelas não estavam prontas para a NBA quando foram draftadas diretamente do colegial e sofreram para encontrar seu papel, como Kevin Garnett e Kobe Bryant. Se tivesse feito ao menos um ano de faculdade, estariam mais preparados para o jogo profissional. Mas fica difícil criticar suas atitudes porque, afinal, suas carreiras deram muito, muito certo.

Obrigar todos os jogadores a passar ao menos um ano na faculdade, no entanto, seria uma injustiça brutal com um sujeito como o LeBron James, por exemplo. Na sua primeira temporada na NBA, teve médias de 20 pontos, 6 assistências e 5,5 rebotes por jogo, números débeis mentais. Seu jogo certamente já estava pronto para o nível profissional e não tinha nada a ganhar enfrentando universitários. Muito se falou sobre seu jogo ter estagnado no último ano do colégio porque simplesmente não havia adversários à altura. Na NBA, cada falha sua foi explorada à exaustão e LeBron teve que aprender a se virar com isso. Apenas nesse tipo de competição foi obrigado a aprender a arremessar e a usar a mão esquerda nos dribles, coisas que no campeonato universitário ele poderia deixar de lado e continuar dominando as partidas apenas com o físico, enterrando em cima daquele bando de nanico branquelo.

Outro ponto que pesa, obviamente, é a grana, a bufunfa, as verdinhas. Muitos jogadores de basquete têm origem em famílias pobres na periferia. É essa família necessitada quem sustenta o jogador enquanto ele luta pelo seu sonho de ser um jogador profissional e, enfim, ganhar um salário. Quando um jogador decide ir para o basquete universitário, sabe que passará pelo menos mais um ano sem ganhar um centavo, sem poder aceitar adiantamentos de empresários ou presentes de patrocinadores. Se muitos acabam optando pelo streetball simplesmente porque precisam do dinheiro o mais depressa possível, fica difícil convencer um jogador que se acha pronto para jogar na NBA – e finalmente poder dar uma vida melhor a si mesmo e à sua família – a investir numa carreira no basquete universitário para cuidar dos seus fundamentos e ganhar um diploma que ele espera nunca ter que usar.

O Brandon Jennings estava preparado para a NBA, mas faz parte de uma minoria que sofre graças à regra que tenta proteger a maioria. Como não restava escolha, ele até tentou – muito a contragosto – jogar por uma boa universidade, mas não conseguiu a pontuação mínima necessária no vestibular. Não posso deixar de achar essa história um tanto bizarra, tem alguma coisa que não se encaixa, tipo o Sérgio Mallandro sendo candidato a vereador. Tá bom que o Jennings admite nunca ter dado a mínima para a escola, preocupado com outras coisas (seja o basquete, seja sobreviver e manter sua família após o suicídio do pai) e com isso sempre foi um péssimo aluno. Mas eu não posso acreditar que todos os jogadores de basquete dos Estados Unidos sejam bons alunos, não tinha nenhum jogador de elite que não conseguiu as notas necessárias? Ou todo mundo é gênio e só o Jennings é burro, ou ele não sabe escrever nem o próprio nome no formulário de inscrição, ou então alguém não quis dar uma “forcinha” para ele por motivos que eu não consigo nem imaginar. Em todo caso, ao não ser aprovado pela faculdade para a qual ele queria jogar, Jennings decidiu ir para o basquete europeu. Quando fiquei sabendo, a princípio, achei que a decisão era puramente financeira. Ele poderia passar um ano sem ganhar um centavo, só esperando o draft, ou poderia ir para a Itália e ficar rico.

De fato, seu contrato é financeiramente espetacular. Está recebendo mais de 1 milhão de dólares, sem impostos e sem contar o patrocínio, já que por lá ele fechou com uma marca de tênis de basquete. Fora isso, recebeu um carro (que sua mãe dirige para ele, já que o Jennings não tem carteira de motorista) e um apartamento de luxo com três quartos para ele, sua mãe e seu irmão, além de não precisar pagar a mensalidade anual de 20 mil dólares da escola internacional que seu irmão está cursando por lá. Nas entrevistas, não dá pra negar a felicidade de Brandon Jennings em, enfim, dar uma condição melhor para sua família, poder sustentar sua mãe, dar-lhe presentes, devolver o apoio recebido. Mas há algo mais nos discursos de Jennings que eu não esperava: motivos que vão muito além do dinheiro.

Seu empresário já alerta o idiota do David Stern que 12 estrelas do basquete colegial o procuraram para jogar na Europa nos próximos anos ao invés de ir para uma universidade. Mas Jennings avisa que, se estiverem fazendo isso pelo dinheiro, será um erro terrível. Segundo ele, ir jogar no basquete europeu é o caminho mais difícil, é o caminho para aprender e tornar-se um jogador melhor. É o nível de competição necessário para testar os limites de jogadores que não aprenderiam muito no nível universitário. Do outro lado do mundo, é preciso jogar contra profissionais experientes de todo o planeta, sofrer em treinamentos duros e ganhar uma visão diferente do jogo de basquete. Jennings enfrenta jogadores muito mais velhos, muito mais calejados, e recebe conselhos de jogadores americanos que, por uma motivo ou por outro, não têm mais lugar na NBA. Trata-se, portanto, de uma experiência de aprendizado que gira ao redor da bola. Quando chegar na NBA, será um jogador diferente, mais completo e vivido – tanto nas quadras quanto na vida pessoal. E tudo isso sem sentar a bunda numa sala de aulas e assistir a uma aula de Química.

Ir para a faculdade era algo que eu não queria fazer“, admite Brandon Jennings. Tudo bem, rapaz, você escolheu sua prioridade na vida. Sem diplomas e professores, sem abaixar a cabeça para o David Stern, você foi crescer a aprender de outra maneira. Um monte de pirralhos vai querer fazer igual e simplesmente não vai ter os bagos, o talento e todo o pacote necessário. Cada caso é particular, único, mas é bom saber que há a liberdade para que cada um escolha o seu futuro. Jennings escolheu o dele: o caminho mais duro e mais difícil, mas o mais rápido para o estrelato. Cestinha de seu time com 20 pontos por jogo durante a pré-temporada, tudo parece estar indo bem para o rapaz. Em breve ele estará na NBA e então veremos como foi, de fato, seu aprendizado. Por enquanto, nos resta babar no seu talento ainda no colegial. Aliás, sou só eu ou ele lembra um Steve Francis, só que jovem, passando a bola e com talento?

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