>O começo

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Carmelo Anthony curte uma derrota

Começa amanhã a série de amistosos que a seleção de basquete dos Estados Unidos fará para aquecer os motores para as Olimpíadas. Após enfrentarem amanhã o Canadá (jogo que acompanharemos aqui no nosso chat às 21h, tentando arrumar alguns links para a transmissão), nos próximos dias os Estados Unidos enfrentarão Turquia, Lituânia, Rússia e Austrália, tudo televisionado, aliás. Para quem está com crise de abstinência de basquete e louco pra dar uma olhada em como será esse começo da seleção americana, será um prato cheio. Mas tem uma coisa que não se deve perder de vista: a consciência de que esse não é um começo porcaria nenhuma. Trata-se de um trabalho de 3 anos com apenas um objetivo: levar a medalha de ouro em 2008.

Esse é o tipo de coisa para deixar todos nós brasileiros chorando na sarjeta. Quanto tempo nossa seleção brasileira de basquete teve de treinamentos? Quando foi escolhido o time que participaria da competição? Quando foi decidido quem seria o novo técnico? No quesito preparação, o Brasil parece aluno de ginásio que deixa o trabalho sempre pra última hora, com a única diferença que aluno hoje em dia pode fazer trabalho em 5 minutos com ajuda do Google e da Wikipedia. No basquete, isso obviamente não funciona.

O projeto estadounidense para retomar o posto de melhor time do planeta é até, se a gente pensar bem, completamente desnecessário. A NBA continua sendo a liga de basquete mais forte, divertida e assistida do planeta, ninguém tem dúvidas de que os melhores jogadores vivos são americanos, e aquela coisa de ficar escolhendo gangues de estrangeiros na noite do draft praticamente acabou. Eles poderiam sentar seus traseiros multimilionários no sofá, alegar que “NBA e FIBA são muito diferentes” e lavar as mãos dessa responsabilidade idiota de ganhar tudo. Mas não, eles querem recuperar sua honra e levam milhões de vezes mais a sério do que outros países que precisam de vitórias para salvar o esporte da aniquilação total. Engraçado, não?

É claro que alguns jogadores não dão a mínima para esse negócio de honra, que parece coisa de filme de máfia japonesa e é bem brega mesmo, então várias estrelas nem cogitaram defender a seleção dos Estados Unidos (e ninguém com um mínimo de bom senso está chamando eles de “antipatriotas”). Ainda assim, inúmeras estrelas aceitaram os convites e o mais legal foi que os dirigentes não foram simplesmente aceitando todo mundo. A idéia era montar um time completo, real, profundo, ao invés de um apanhado de jogadores de elite. Como focos principais, arremessadores capazes de se aproveitar de defesas por zona, e defensores capazes de parar as estrelas internacionais. Vários foram selecionados, testados, treinaram, jogaram, se dedicaram, e agora apenas 12 foram escolhidos para representar seu país.

Ao todo, foram 90 dias de treinamento nos últimos 3 anos. Pode parecer pouco, mas na verdade é um número muito alto. É preciso compreender que os jogadores treinam pela seleção durante suas férias da NBA e esses 90 dias não incluem os jogos de verdade, como a participação no Mundial de Basquete em 2006. “E o que eles fizeram nesses 90 dias“, você pergunta. Pois bem: adequaram seu jogo ao padrão internacional, aprendendo defesas por zona (tanto utilizá-las quanto atacá-las), analisando as grandes equipes internacionais e aprendendo a agir como conjunto. O ápice da brincadeira – e que pra mim é um tapa na cara da preparação brazuca – foi a escolha de um time “para treinos” contra a seleção americana, composto por jovens estrelas (Kevin Durant, Andre iguodala, Kevin Martin), recém draftados (Jarryd Bayless, Kevin Love, OJ Mayo) e alguns jogadores aleatórios (Luther Head e JR Smith? Por que diabos?). Nos últimos dias, esse time inusitado passou horas e horas a fio executando as mesmas jogadas sem parar, de modo que a seleção dos Estados Unidos compreenda com perfeição como defendê-las. Trata-se de uma dedicação e uma atenção com os detalhes que ganharia nota 10 até do carrancudo jurado Pedro de Lara.

Toda essa seriedade tática e técnica até parece exagero quando se olha para o elenco. Engraçado é que na época em que o grupo foi originalmente montado, alguns jogadores eram jovens demais e motivos de dúvida. Hoje, ironicamente, todos eles desenvolveram-se e tornaram-se os melhores em suas posições. Chris Paul, por exemplo, era apenas um fedelho com talento. Agora, é simplesmente o melhor armador da NBA e seria escolha unânime para a seleção de seu país. O mesmo pode-se dizer de seu rival Deron Williams e, principalmente, de Dwight Howard. Não faz muito tempo, a preocupação da seleção era com o tamanho, com ter um pivô legítimo, afinal o Dwight era apenas uma criança – digamos que ele ainda era o Clark Kent. Agora o pivô é o Super-Homem e não haveria ninguém melhor para colocar no meio daquele garrafão. Além disso, Carlos Boozer e Chris Bosh podem jogar de pivô sem problemas em nível internacional.

Aliás, no basquete internacional esse lance de posição é besteira. O Carmelo Anthony, por exemplo, é mais rápido e mais forte do que qualquer ala de força do resto do planeta. Deve jogar mesmo dentro do garrafão, ali na posição 4, e certamente não terá problema nenhum. Pelo contrário, terá inúmeras facilidades por ser capaz de arremessar de fora e jogar de costas para a cesta, tornando um inferno a vida de qualquer marcador. Tudo bem, você pode odiar o Carmelo na NBA, pode dizer que ele não tem noção e até que ele cutuca o nariz, mas seu estilo de jogo se encaixa perfeitamente no basquete internacional. A seleção está cheia de estrelas: Kobe, LeBron, Wade, Kidd, Redd, Dwight, mas quem lidera essa budega na parte ofensiva é o Carmelo Anthony. Ele desestabiliza completamente o jogo enquanto seus companheiros podem usar o cérebro (coisa que o Carmelo não tem) e desempenhar outras funções. Kobe, por exemplo, pode se dedicar à defesa e provar que é um dos melhores do mundo no quesito; LeBron e Wade podem se preocupar em achar um jogador livre, jogar para a equipe. Não se assustem se o Carmelo Anthony for o cestinha da equipe em todos os jogos. Mas também não se assustem se ele não for: simplesmente há talento demais no time e Michael Redd pode vir do banco qualquer dia e fazer 60 pontos apenas em bolas de 3. O negócio é sério lá por aquelas bandas.

O Carmelo adora perder, ele realmente não é muito chegado nessa tal de “vitória”. Ele e LeBron James são os patéticos detentores de duas medalhas de bronze: nas Olimpíadas de 2004 e no Mundial de 2006. Mas com tanta evolução, dedicação, preocupação tática e talento, será que dá pra tirar o ouro dessa vez das mãos dos americanos?

Como os treinos com a “seleção de jovens estrelas” não são televisionados, a gente fica só imaginando como as coisas estão sendo por lá. Diz a lenda que Jerry Bayless deixou todo mundo – jogadores e técnicos – impressionados, e que está chutando uns traseiros. Mas amanhã finalmente poderemos parar de adivinhar e ver a seleção finalmente em ação, chutando cachorro morto (o adversário é o Canadá, uma seleção que deve ser formada apenas de ursos, guardas florestais e a Celine Dion). Não esqueça, amanhã às 21h vamos tentar assistir o jogo aqui no Bola Presa. Mesmo com LeBron ainda recuperando um tornozelo torcido, não vão faltar estrelas. Quer dizer, vão faltar sim, mas só pelo lado do Canadá, claro.

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