>Ó dúvida cruel

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Odeio quem é pidão

No texto anterior sobre o Draft 2008, o Danilo falou sobre o dilema da primeira escolha, da dúvida do Bulls em não saber se deve ir de Michael Beasley ou de Derrick Rose. Mas temos que concordar que é uma dúvida ainda boa. Será que escolho o que parece muito bom ou o outro que joga pra cacete? Será que pego a Mariana Ximenez ou a Deborah Secco? Viajo pra Paris ou Londres? Existem dilemas piores, podem ter certeza.

Alguns desses dilemas são cruéis e estão presentes em todas as escolhas do draft, desde as do Top 5 até o fim do segundo round. Um deles é básico: draftar o cara que parece ser o melhor disponível ou o cara da posição de mais carência da equipe?

Um exemplo clássico é do draft de 2003. O Cavs não teve dilema nenhum porque o time precisava de jogadores em todas as posições e o LeBron era unânimidade, mas depois vinha o Detroit Pistons. O Pistons tinha uma deficiência no garrafão, não havia um parceiro para ajudar o Ben Wallace, e enquanto isso eles tinham acabado de descobrir o Tayshaun Prince como um ótimo ala para a equipe. Fazer o que então, draftar o pivô de 17 anos Darko Milicic, que nunca provou nada em alto nível, ou draftar a superestrela que tinha acabado de vencer a NCAA, Carmelo Anthony?

O Melo não ia resolver nenhum problema do Detroit, embora fosse reconhecidamente mais talentoso, enquanto o Darko não tinha provado nada mas mostrava ser talentoso e podia ser o parceiro do Big Ben que todo mundo esperava. O Detroit apostou no sérvio, que não deu certo mas que forçou o time a ir atrás de Rasheed Wallace, o que acabou resultando em título. Como acabou em título o assunto ficou meio esquecido, mas será que o Pistons fez certo? Será que dava pra ter o Carmelo e depois trocar pelo Sheed e ter um time dos sonhos? Ou o Carmelo, que não defende nem uma velha sendo assaltada, não teria dado certo no esquema defensivo de Detroit e o time nunca teria sido campeão?

Pensando que o Pistons só ganhou o título porque ignorou o cara que parecia mais talentoso pra se manter fiel à sua filosofia de jogo e às suas necessidades de elenco, dá pra concluir que o draft é a hora de completar o time, não de ficar buscando estrelas, mas será que isso é verdade?

Em uma liga com tantas trocas, tanto movimento, em que um cara é herói um dia e amarelão em outro, será que vale a pena pegar um cara que não parece tão bom só pra completar seu elenco? E se o Prince não fosse tudo isso, eles teriam um buraco na posição de ala e se lamentariam de não ter o Carmelo até hoje. E se você deixa de draftar um armador bom só porque precisa de um pivô e depois seu armador acaba saindo do time porque tem oferta melhor de outro? Outro arrependido na praça por não pegar aquele armador espetacular. Isso se encaixa até no draft desse ano, onde tem gente que acha que o Rose não deve ser escolhido pelo Bulls porque eles já tem o Kirk Hinrich, mas o problema é se o Hinrich continua a ser só o Hinrich e o Rose vira um dos melhores armadores da NBA pelos próximos 10 anos.

No draft de 2006 aconteceu algo interessante. Os times com as primeiras escolhas tinham, todos, grandes deficiências no garrafão: Raptors, Bulls, Blazers e Hawks, enquanto o Bobcats procurava desesperadamente alguém para fazer pontos em um time que só tinha defensores. A solução dos times foi ir atrás de Bargnani, Tyrus Thomas, LaMarcus Aldridge, Shelden Williams e do então cestinha universitário Adam Morrison. O resultado foi que todo mundo perdeu a chance de ter Brandon Roy no time, sorte do Blazers que, com duas escolhas, saiu não só com o Roy como com o melhor dos grandões escolhidos antes. E fique com esse draft de 2006 em mente, ele mostra outros dilemas interessantes que mais a frente eu retomo.

A coisa fica ainda mais complicada quando se chega lá atrás no draft. Nas primeiras escolhas você está lidando com jogadores que tem tudo pra serem estrelas, então mesmo não pegando o cara ideal você tem mais chances de conseguir um cara que pelo menos contribui. Mas lá para o fim da primeira rodada a coisa fica mais complicada. O negócio é apostar no cara da posição que você precisa para completar o time e pronto, ou você faz aquela escolha arriscada só porque não acredita que todo mundo deixou passar um cara extremamente talentoso?

O Celtics, mesmo com Paul Pierce no elenco e precisando de jogadores em praticamente todas as outras posições do time, em 2005 usou sua 16° escolha para ter o Gerald Green, que na época era um novo Tracy McGrady que todas as previsões colocavam logo em uma das primeiras cinco escolhas. Foi um risco draftar um pivete que nunca tinha provado nada e ainda joagava na mesma posição da sua grande estrela, mas o Celtics arriscou, coisa que os times com escolhas melhores não tiveram coragem. No mesmo draft, o Sonics não foi pelo talento, foi pela posição. Eles precisavam de um pivô e pegaram o imaturo Johan Petro mesmo tendo a opção de pegar jogadores que já eram experimentados no basquete universitário, como Jason Maxiell e David Lee. Às vezes, indo tanto pelo talento quanto pela posição você pode se dar mal.

Uma conclusão simples que dá pra tirar disso tudo é que draft é imprevisível e que não tem fórmula certa. Toda escolha arriscada pode valer a pena e toda escolha conservadora pode parecer burra alguns anos depois. Mas mesmo assim, eu tenho uma teoria que é a que eu usaria se eu fosse responsável pelas escolhas de um time.

O negócio é assim, se o time está pronto para o título, se eu tenho todas as peças montadas e só preciso dos detalhes, eu faria a escolha por um jogador que cobre essa necessidade, esse detalhe. Se eu preciso de um defensor para ganhar o título eu escolho o Bruce Bowen antes de escolher o Tracy McGrady e que se foda o que falem depois. Foi até o que eu acho que o Rockets fez ao trocar o recém escolhido Rudy Gay pelo Shane Battier, não importava o talento do Gay, eles precisavam é do Battier pra ser o defensor deles.

Agora, se o time está em fase de reconstrução e não existe um plano para título nos próximos anos, aí você pega o melhor cara disponível e pronto. Isso vai significar que você vai ter 4 armadores principais? Dane-se. Faça todos se matarem nos treinos e depois você troca os que você não quiser por outros jogadores. Em um time fracassado, não adianta ficar tentando juntar caras medianos em todas as posições, isso só vai acabar em um time mediano.

Voltando ao draft de 2006 que eu mencionei antes, de lá podem ser achados outros dilemas enfrentados pelos times. Um deles é o rendimento universitário, e não estou falando das notas dos coitados. Desde que o mundo é mundo tem jogador que é dominante em nível universitário e que não rende bosta nenhuma na NBA, enquanto tem cara que é secundário na NCAA e acaba virando estrela na NBA. Como prever isso? Mais uma vez, não existe uma fórmula, mas pelo menos tem uns casos mais previsíveis, você só precisa assistir aos jogos e ignorar completamente os números.

Antes do draft de 2006 a NCAA acompanhou uma batalha épica para ver quem era o melhor pontuador do basquete universitário, Adam Morrison ou JJ Redick. Porém, nenhum deles vingou na NBA. O principal motivo que os técnicos dão para colocar os dois pouco em quadra é que ambos são fracos fisicamente e não conseguem marcar com a força e velocidade necessárias para a NBA. Com isso eles jogam pouco tempo e quando jogam entram para ser simples arremessadores. De repente, ter um dos dois melhores jogadores universitários dos EUA é a mesma coisa, ou pior, do que ter Sasha Vujacic, Eddie House ou o Jason Kapono em quadra.

Então deve-se ter em mente que o jogo universitário é diferente do jogo da NBA e tem caras que podem não se encaixar. Pode ter gente que joga de armador na NCAA em um esquema em que ele não precisa ficar muito tempo com a bola na mão e precisa ser um bom arremessador, então não adianta esperar que o cara seja o novo Steve Nash, tem cara que dá errado na NBA depois de dar certo na NCAA porque não cai no time certo, nem todo mundo é versátil e dá certo em todo lugar. Tem também o caso dos pivôs, que às vezes dominam a NCAA com sua força mas que na NBA são só mais um, mais baixos e menos fortes do que o resto dos pivôs da liga, aí fica de como cada um faz para ajustar seu jogo, uns aprendem a arremessar, outros vencem pela energia e pela técnica, outros não dão certo de jeito nenhum. O que não falta é pivô draftado nas 10 primeiras posições e que não deram em nada depois, como Robert Swift, Shawn Bradley, Oliver Miller, Saer Sene, Patrick O’Bryant, Ike Diogu e até nosso Baby Araujo.

Por último, mas ainda problemático, está o dilema do potencial. Já aviso desde já que “potencial” é a palavra mais ouvida e mais perigosa em tempos de draft. Nessa época, todo mundo tem muito potencial pra ser muita coisa, mas a realidade depois nem sempre é tão bonita. Se você pensar por um lado, todo mundo tem potencial. Arremessadores como o Ray Allen e até nosso Oscar sempre disseram que arremessam bem pra cacete porque treinaram até não poderem mais e que qualquer um com tamanha dedicação pode chegar onde eles chegaram. Se é assim mesmo, todos nós temos algum potencial então. Eu sei que não é bem isso que os caras dizem quando falam de “potencial” mas é só pra mostrar como a palavra é perigosa.

No draft de 2006 tem um exemplo clássico desse tal potencial logo na primeira escolha. O Toronto disse na época que o Andrea Bargnani poderia não ser o melhor jogador naquele momento mas que tinha tudo pra ser dentro de uns anos. E apostou então suas fichas no seu novo Nowitzki, que até hoje não mostrou ser nada melhor que uma versão piorada do Mehmet Okur. Mas nem sempre dá errado. No draft de 2004 todos tinham o discurso na ponta da língua de que o Okafor era melhor naquela época mas que o Dwight Howard tinha tudo pra ser mais dominante nos anos seguintes, previsão mais correta impossível. O Okafor fez uma primeira temporada ótima, foi novato do ano e depois ficou no mesmo nível, enquanto o Dwight Howard evolui para ser um dos melhores pivôs de toda a NBA.

Como ficou bem fácil de perceber, todos os problemas, dilemas, têm exemplos que favorecem qualquer um dos argumentos, fazendo a gente chegar na conclusão digna de prêmio Nobel de que o draft e o futuro de jogadores jovens não é uma ciência exata. Pensando nisso, a gente poderia até começar a pegar mais leve com os managers quando eles escolherem o cara errado, eles não estão em uma posição nada fácil. Ou a gente pode continuar tirando sarro já que a gente tá aqui trabalhando duro e sendo pobre enquanto os caras ganham toneladas de verdinhas só pra tentar adivinhar que pivete vai jogar mais bola daqui uns anos.

Mundo injusto.

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