>O feitiço contra o feiticeiro

>

Em terra de cego, quem tem 2,11 é pivô

É oficial: o Suns acabou. Está morto, terminado, podre e enterrado, embora ainda esteja passeando por aí, tipo o Silvio Santos. Um elenco cheio de estrelas, de possibilidades, de potencial, mas pode pegar tudo fora e tacar na privada. Se alguém ainda tinha qualquer resto de esperança de que esse Suns poderia dar certo, a derrota para o Knicks destruiu.

Na pré-temporada, escrevi como o Knicks não passava de uma cópia paraguaia do antigo Suns. Agora, as coisas mudaram. O Knicks ainda fede, porque algumas coisas são sempre as mesmas, mas todo o elenco absorveu bem o esquema tático do técnico D’Antoni e, mais assustador ainda, parece se sentir inteiramente à vontade na correria. Não existe mais afobação, embora os jogadores ainda não sejam gênios da física e o Quentin Richardson não saiba diferenciar uma bola de uma batata, e dá pra ver o time jogando com inteligência apesar de todas as evidentes limitações.

Lembro-me bem de que, quando o Mike D’Antoni foi contratado pelo Knicks, se apaixonou perdidamente pelo Jered Jeffries, que quinze minutos depois se contundiu sério e ficou meses de fora. O Jeffries era um ala que jogava na posição 3 no Wizards, ou seja, um “ala pequeno”, capaz de fazer um pouco de tudo – o que também significa que ele não sabe fazer nada realmente direito. A campanha em Washington até que tinha sido promissora, ele tinha tamanho (2,11m) e volta e meia mostrava sinais de talento. Poderia ser um bom reserva em alguma equipe, quem sabe, mas o débil mental do Isiah Thomas foi lá e ofereceu um contrato de 6 gordos milhões para o rapaz, que deve ter pensado que era véspera de Natal. Desde então o Jeffries não tinha jogado nada, sempre contundido ou fedendo, e me assustei um pouco com o D’Antoni se impressionando com ele. Agora que ele está saudável, tudo faz um pouco mais de sentido: Jared Jeffries está jogando de pivô, apesar de ter o físico da Olivia Palito, correndo como um retardado em quadra, e marcando os armadores adversários na defesa.

Na partida contra o Suns, o pivô Jeffries era o responsável por marcar justamente o Steve Nash. Foi aí que eu percebi que o D’Antoni é completamente maluco e, talvez por isso, completamente genial. Ele está disposto a qualquer coisa para aproveitar da melhor forma possível a porcaria do elenco que tem em mãos, abraça uma filosofia de jogo e vai com ela até o final, custe o que custar. Mesmo não dando muitos resultados, o Knicks sabe qual é a proposta, quais são as regras da brincadeira, e leva isso a sério. Todo mundo no elenco sabe o seu papel, sabe como deve correr e em que situações deve arremessar. As loucuras, como colocar o Jeffries no Nash, são consistentes e fazem parte da imagem que o time tenta abraçar para si. Ou seja, fedendo ou vencendo, o time tem uma identidade e acredita nela – o elenco parece confiar no plano e no D’Antoni, que é seu mentor. Quando está dando tudo errado e as bolas não caem, o Knicks continua jogando da mesma maneira, numa estranha confiança de que, cedo ou tarde, as bolas vão cair, tudo vai dar certo e a Alinne Moraes vai chover dos céus em seus colos. Em geral sequer dá certo, mas eles continuam, assim com o Suns mantinha o estilo de jogo e atropelava todos os times mais-ou-menos, que não sabiam exatamente o que estavam fazendo em quadra.

Pois bem, na noite de ontem o Knicks manteve o estilo e o Suns foi o time mais-ou-menos que não sabia exatamente o que estava fazendo em quadra. Foi até vergonhoso ver como Duhon e David Lee fizeram à exaustão a mesma jogada que Nash e Amaré tanto aperfeiçoaram nos últimos anos, como se fosse algo simples que qualquer um pode fazer se tiver o esquema tático certo. Creio que a derrota para o Knicks deve ter abalado o ego de todos os jogadores do Suns, porque foi como demonstrar que seus feitos não eram méritos pessoais, mas sim ação de D’Antoni. Sabe aquele pick-and-roll, aquela ponte-aérea, a corrida por baixo da cesta, os arremessos livres de três pontos, as enterradas na cabeça? Deixam de ser mérito de Nash e Amaré se um zé ninguém como o Duhon consegue simulá-las com perfeição. Como será que o Amaré se sentiu vendo David Lee exercer perfeitamente a função que o próprio Amaré deveria estar exercendo? Foram 25 pontos e 16 rebotes para o Lee, o suficiente para que o Stoudemire sentisse que não é nem um pouco especial, que era apenas uma parte de uma engrenagem. Atores diferentes na mesma peça, e talvez o sucesso de todos fosse culpa apenas da peça, afinal de contas.

Mas também não pode haver exagero, claro, não há nem dúvidas de que o Nash é bilhões de vezes melhor do que o Duhon. Todo o elenco do Suns é superior em todos os aspectos que você quiser encontrar, a não ser no aspecto “peso corporal” porque o Eddy Curry e o Jerome James elevam demais a média da equipe e a tornam a de um planeta pequeno do Sistema Solar. Mas nem sempre o talento pode impor-se em quadra de modo a causar uma diferença. O que prevaleceu foi o elenco pior, utilizado de forma mais inteligente. Com o Jeffries marcando o Nash (que, portanto, não seria capaz de acertar um arremesso sequer) todo os jogadores do Knicks tiveram que “subir uma casa” na hora de defender. Ou seja, o Duhon marcava o Jason Richardson, e na outra ponta o David Lee marcava o Shaq. Bastaria saber utilizar essa desvantagem física e o Suns teria deitado e rolado, mas não foi o caso. O time pior impôs seu estilo de jogo, suas regras, e venceu.

Para ser justo com o Suns, confesso que eles pareciam mais confiantes nas propostas do Terry Porter do que de costume. No começo do jogo, em especial, tentaram um basquete mais focado no garrafão, deixando a bola nas mãos do Shaq – que é o velhinho mais ativo desde que o Hugh Hefner descobriu o Viagra. Quando abriram 13 pontos de vantagem, achei que finalmente aquele papo de jogo cadenciado e defesa tinha entrado na cabeça do pessoal de Phoenix. Mas rapidamente as bolas do Knicks começaram a cair, a defesa do Suns se desmantelou e dava para sentir o quanto eles desconfiam de que o Porter é um cego no meio de um tiroteio. O ritmo do jogo subiu demais, todo mundo no Suns começou a arremessar pra burro, e colocar a bola nas mãos do Shaq se tornou, repentinamente, uma tarefa mecânica, artificial. É como se tivesse dado saudade dos tempos de D’Antoni, como se eles achassem que era daquele jeito que iriam vencer o jogo.

Foi um duelo de confiança nos técnicos, e pelo jeito as duas equipes confiavam plenamente no D’Antoni, que acabou saindo como o grande vencedor da noite. O Suns tomou goela abaixo tudo aquilo que costumava fazer tão bem, e se negou a jogar pacientemente, com confiança, no estilo novo que deveria estar consolidado na equipe à essa altura do campeonato. O time de Phoenix é como uma adolescente em crise de identidade, não sabe se vira punk ou emo, se come soja ou bife, se beija meninos ou meninas. Ainda mantenho a opinião de que esse Knicks fede, de que o elenco é um circo de pulgas, e de que eles vão perder muito ainda nessa temporada. Mas temos que reconhecer não apenas o talento do D’Antoni, que agora surge cada vez mais como a alma daquilo que chamávamos de Phoenix Suns, mas também o comprometimento desse Knicks com sua filosofia. É com isso que eles vão ganhar de muitos times mais-ou-menos, e perder de muito time bom que conseguir impor seu próprio ritmo. Mas quem quiser correr contra a equipe de New York tem tudo para se dar muito mal, o que na prática significa a) vitórias contra os times que não interessam; b) derrotas para o Spurs, sempre, não importa o que aconteça.

O Suns tem um elenco incrível, o Shaq na melhor forma desde que foi campeão com o Heat, jogadores de perímetro e de garrafão, jovens e experientes. Mas pelo jeito não vai conseguir sequer ir para os playoffs se não aprender a utilizar todas as peças e dar qualquer tipo de identidade pra essa equipe. Se o Leandrinho jogar dois minutos num dia, vinte no outro, vai continuar sendo terrivelmente inconsistente e sem saber o que fazer em quadra. Afinal, ele deve armar e colocar a bola no garrafão, penetrar como um maluco ou arremessar de três pontos? Qual é, afinal, sua função? O Leandrinho deve sentir muita falta dos tempos de D’Antoni, em que antes de cada jogo ganhava uma série de anotações, em papel, delimitando apenas seu papel em quadra. Bons tempos aqueles, do basquete criativo, espontâneo, dava pra brincar de pião na rua e o Suns ia para os playoffs perder para o Spurs. Agora, Nash não será MVP e o Leandrinho não será o melhor Sexto Homem – afinal, não se premia equipes que acabem em nono lugar no Oeste.

O D’Antoni, por sua vez, também não levará o Knicks a lugar algum e não será Técnico do Ano. Mas sua visão ofensiva é poderosa, o time acredita nela, e talvez falte apenas uma grande estrela (não vai ser o LeBron, crianças, desculpe) para que o time deslanche de vez. Ainda quero, contra a lógica, acreditar que a loucura do Knicks pode chegar a algum lugar sem se preocupar com defesa e essas coisas de maricas. Talvez minha esperança seja simplesmente o fato de que o Spurs está na outra conferência – motivo mais do que suficiente para o D’Antoni respirar aliviado.

Como funcionam as assinaturas do Bola Presa?

Como são os planos?

São dois tipos de planos MENSAIS para você assinar o Bola Presa:

R$ 14

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

R$ 20

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo: Textos, Filtro Bola Presa, Podcast BTPH, Podcast Especial, Podcast Clube do Livro, FilmRoom e Prancheta.

Acesso ao nosso conteúdo exclusivo + Grupo no Facebook + Pelada mensal em SP + Sorteios e Bolões.

Como funciona o pagamento?

As assinaturas são feitas no Sparkle, da Hotmart, e todo o conteúdo fica disponível imediatamente lá mesmo na plataforma.