>O jogo perfeito

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Se fossem Zach Randolph e Eddy Curry, engoliriam a medalha

São tantas as maneiras de abordar o jogo que definiu a medalha de ouro americana na Olimpíada que eu nem sei direito por onde começar. Desde as jogadas plásticas até o final emocionante, passando pela hilária narração do Ivan Zimermann no BandSports e pelas cheerleaders ucranianas, tudo na final olímpica foi praticamente perfeito. Um jogo histórico.

Antes de ver a partida pela BandSports com a narração do imortal Ivan Zimermann, estava assistindo pela ESPN Brasil para ouvir os comentários do Zé Boquinha, só tirei de lá quando eles começaram a insistir em mostrar entrevistas do vôlei derrotado ao invés do jogo. Mas já valeu pra ouvir um comentário do Zé Boquinha que é a explicação de porque eu tinha criticado esse basquete olímpico: só tiveram lavadas! Tirando os embates entre Lituânia e Espanha na semi-final, Grécia e Argentina nas quartas e os jogos da China contra Espanha e Alemanha na primeira fase, a maioria dos jogos havia sido entre um time claramente superior e outro pior que falhava em correr atrás do prejuízo. Mesmo alguns com placares mais próximos não tinham a emoção necessária.

Se fosse em Atenas 2004 eu faria agora um parágrafo idiota dizendo que “Os deuses do Olimpo guardaram o melhor jogo para o final”, mas por sorte estamos em Pequim e eu não consegui nada tão cliché e imbecil usando os termos “muralha”, “cultura milenar” e “sabedoria oriental”. Mas deixo claro que os deuses do Olimpo deixaram sim o melhor para o final.

Quer saber o motivo que fez essa final ser o melhor jogo não só dessa Olimpíada mas também um dos melhores jogos em Olimpíada de todos os tempos? Não te dou um, te dou 10 motivos.

1. A Epanha jogou como os Estados Unidos

Antes do jogo eu achava que a Espanha não ia ter a menor chance contra os EUA, até disse isso aqui no blog. Eu pensava que a Espanha não sabia jogar naquele ritmo lento que a Grécia joga, por exemplo, e que eles também não tinham uma defesa forte o bastante pra enfrentar os americanos, então teriam que vencê-los do jeito mais difícil: na correria, com pouca defesa, precisando fazer mais de 100 pontos, no improviso, no individualismo, ou seja, tudo o que os EUA pediam a deus.
Em parte eu acertei. A Espanha foi pra correria, foi para o individualismo, não marcou forte e tomou ponto pra cacete. A parte que eu errei foi em dizer que eles iam se dar mal por isso, surpreendentemente os espanhóis correram tanto quanto os americanos, se sentiram à vontade com isso e no fim das contas foram até os europeus que fizeram mais jogadas-show (saudade da NBA na RedeTV!) do que os ianques.

2. A Espanha nunca deixou de acreditar

Parece idiota dizer isso, parece frase de derrotado do tipo “Ele ficou em último, caiu de bunda no chão mas nunca deixou de acreditar”, o que é mesmo idiota, mas dessa vez é a mais pura verdade. A Espanha entrou em quadra achando que poderia vencer, jogou como quem achou que poderia vencer e sempre que os Estados Unidos abriram mais de 10 pontos de vantagem, os espanhóis lidaram como se quem estivesse na frente fosse o Irã ou Angola (desculpe, Manguxi!), ou seja, “vamos jogar nosso jogo que daqui a pouco a gente encosta de novo”.
Então assim eles arremessaram tranquilos as bolas de 3, não se desesperaram quando perderam bolas, quando tomaram contra-ataques, quando os EUA tentaram intimidar. Usando a lição ensinada pela Argentina na semi-final, a Espanha jogou sério e dentro de suas características em qualquer situação, sem perder a concentração.

3. Os Estados Unidos não entraram em desespero

Nos mundiais de 2002 e 2006, além de Atenas 2004, uma das coisas interessantes de ver era como a vantagem psicológica dos EUA se invertia com facilidade com o passar do jogo. Naquelas ocasiões, os Estados Unidos entravam no jogo com a vantagem psicológica porque tinham todas as super-estrelas no seu time e perdiam essa vantagem assim que chegavam no fim do jogo com a partida pau a pau. Mesmo com o jogo empatado era o adversário que tinha vantagem na motivação por estar perto de um feito histórico, sendo que os EUA estavam em desespero com medo de perder. E o medo de perder sempre perde pra vontade de ganhar, quem leu qualquer livro de auto-ajuda mequetrefe sabe disso.
Mas nesse caso foi diferente. Mesmo com esse jogo, justo a final, sendo diferente de qualquer outro dessa preparação, e lembrando os fracassos anteriores, o time americano não entrou em desespero e apenas se motivou ainda mais com a situação. Ao invés daquele semblante de medo que vimos nos outros campeonatos, vimos os jogadores vibrando, excitados em estar em um jogo disputado e jogado pau a pau.

4. Vimos os Estados Unidos no quarto período

Finalmente vimos os americanos sendo desafiados e assim pudemos ver como eles executaram seu basquete em um quarto período, numa situação de risco. E foi lindo demais. Basicamente os jogadores de confiança que jogaram no quarto período foram Deron, Chris Paul, Kobe, LeBron, Wade e Dwight Howard. Primeiro, Deron pelo seu arremesso de fora e depois Paul pela sua marcação. Já no ataque, foi legal ver o LeBron reconhecendo que não era o melhor jogador em quadra e apenas criando espaços para que a definição dos lances caísse nas mãos dos melhores jogadores do time ontem, Kobe e Wade. O Shaq estaria orgulhoso.
Pareceu que o time americano estava treinado para uma situação de definição de jogo e executou com calma e tranquilidade o seu ataque mesmo contra as defesas individuais, pressionadas e por zona que os espanhóis tentaram durante o quarto decisivo.

5. O desafio foi na melhor hora

Eu ia dizer que o “timing” foi ótimo, mas esse é um estrangeirismo que eu não uso. Prefiro usar só coisas básicas como “target”, “budget” e “holding”. Mas se você prefere, o timing do desafio foi perfeito. Nada melhor do que ver os EUA sendo desafiados bem na final olímpica contra o atual campeão mundial. Nada de ser testado em amistoso contra a Rússia ou jogo da primeira fase contra a Grécia, os dois jogos mais difíceis e desafiadores foram a semi-final contra a então campeã olímpica e a finalíssima contra o campeão mundial. Melhor impossível.

6. Kobe Bryant

Depois de aparecer em todos os eventos olímpicos possíveis e imagináveis, incluindo a final do futebol feminino em que ele disse ter ido pra ver a Marta jogar, Kobe viu que era a sua hora de dar show em Pequim. Durante todo o campeonato ele mesclou boa defesa, jogadas bonitas e arremessos terríveis e forçados. Mas no quarto período da grande final ele acertou três bolas decisivas. Uma bola de dois pontos que levou a diferença a 8 pontos de vantagem no fim do jogo e duas bolas de 3 pontos espetaculares, sendo uma delas sofrendo falta – a quinta falta de Rudy Fernandez. Kobe foi o cestinha do período decisivo e mostrou porque ele era o cara procurado pelo time americano na hora de decidir os jogos. Como ele já fez várias vezes na carreira, não foi uma atuação perfeita, mas foi decisiva.

7. Dwyane Wade

Se Kobe foi o cara que fechou o jogo, quem o abriu foi Dwyane Wade. No primeiro quarto Kobe e LeBron sairam com problemas de falta, o Kidd estava tomando dribles do Ricky Rubio e o Gasol estava melhor no jogo que o Dwight. Ou seja, os EUA estavam com problemas. Mas com 13 pontos, dribles humilhantes, arremessos de todos os cantos da quadra e muitos e muitos roubos, Wade colocou o time americano nas costas e venceu o período sozinho. No quarto período ele também apareceu com uma bola de 3 decisiva no fim do jogo. E se somarmos essa bola de 3 pontos às duas do Kobe e mais uma do Deron Williams, podemos contar 4 bolas de 3 pontos dos americanos no quarto decisivo, todas em momentos de muita pressão.
Vendo o Wade jogar ontem e em toda Olimpíada, me sinto à vontade pra dizer que ele está totalmente recuperado de sua contusão e que basta o Miami ter uma boa campanha que ele é o MVP da NBA. Fácil.

8. Ricky Rubio

Por que todo mundo duvidava que a chinesinha da ginástica tinha 16 anos mas ninguém nunca questionou a idade do Ricky Rubio? Como assim ele tem 17 anos? Ele precisou de autorização da mãe pra poder jogar? Mentira. Como alguém com essa idade não sente pressão nenhuma, como alguém de 17 anos rouba bolas do Chris Paul, dribla Deron Williams e Jason Kidd como se fossem seus colegas de colegial e como diabos ele faz uma partida espetacular mesmo sendo titular em uma final olímpica, aliás sendo titular meio de última hora no lugar do grande Jose Calderon? O moleque é um fenômeno. F-E-N-Ô-M-E-N-O.

9. Rudy Fernandez

A enterrada do Vince Carter sobre o francês está para a Olimpíada de Sydney assim como a enterrada do Rudy Fernandez sobre o Dwight Howard está para a Olimpíada de Pequim. Ou seja, a melhor jogada de todo o evento, contando todos os esportes. Aquilo foi espetacular! E o cara é branco, enterrando sobre o Superman Dwight Howard. Insano.
Se fosse só isso, o Rudy já merecia menção nesse texto, mas além disso ele foi o cestinha da Espanha, mandou uma ponte-aérea para o Gasol que deixou até o Chris Paul com inveja e meteu bolas de três a torto e a direito, incluindo uma que veio com o seguinte recado atrelado: “Querido Coach K, não adianta colocar o Prince em quadra só para me marcar, ele não vai conseguir. Abraços e Feliz Natal, são os votos de Rudy e família.”

10. O pódio feliz

Parecia conto de fadas, todo mundo no pódio estava feliz. Os americanos felizes por terem recuperado a hegemonia mundial. Os espanhóis felizes por terem sido o maior desafio para os Estados Unidos e por terem feito um jogo espetacular. E os argentinos felizes por terem coroado uma geração vitoriosa com mais uma medalha olímpica mesmo sem o gênio Manu Ginóbili nos jogos decisivos. Todos sorridentes, medalhas brilhando, um jogo espetacular, um monte de princesa (era só ver as cheerleaders que, segundo o Ivan Zimermann, eram de um grupo de animadoras de torcidas da Ucrânia) e temos uma história para contar para os nossos netos.

A melhor final olímpica de todos os tempos. Pelo menos a melhor em que o vice-campeão recebeu a medalha de prata.

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