>O meu personagem favorito

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Piada pronta
– Com licença, senhorita, eu poderia falar com o John, por favor?
– Quem é?
– Ron.
– Que Ron?
– Ron Artest.
– Não pode ser verdade…
Respondendo ao ala do Lakers estava no telefone uma mulher que vive com John Green, um morador de Detroit que ficou famoso internacionalmente por ter sido o cara que atirou um copo de cerveja no próprio Artest na maior briga da história da NBA, entre Pistons e Pacers em dezembro de 2004. Começava mais uma história surpreendente para o folclore de Ron Artest.
Artest disse que a idéia de entrar em contato com John Green já havia surgido há algum tempo, mas que todos à sua volta achavam que essa seria uma péssima idéia, uma polêmica desnecessária para um cara que já tem uma imagem manchada por polêmicas.
Mais alguns anos passaram e Artest resolveu colocar seu plano em prática. Ignorou os conselhos e postou no seu Twitter um pedido de ajuda. Gostaria de saber onde vivia John Green e qual era o seu número de telefone.
“Não será uma loucura, será histórico, será algo para as pessoas verem que você pode brigar com uma pessoa e pode se tornar amiga dela depois, não precisa carregar o rancor para o resto da vida.”
Um conhecido de Green leu o tweet e ajudou a juntar os dois. Artest disse que assim que John pegou o telefone houve uma sintonia imediata. Ambos perguntaram como iam as coisas, deram umas risadas e Artest logo o convidou para participar de um programa de rádio onde eles iriam conversar publicamente sobre tudo o que aconteceu e, provavelmente, fazer as pazes. Possivelmente a maneira mais bizarra de se fazer uma amizade, mas ainda uma amizade.
Claro que o fato do Artest querer levar o cara num programa de rádio mostra que ele tem uma preocupação em fazer com que os outros saibam o que ele está fazendo. Ele quer mostrar que aquele episódio ficou pra trás. Mas pela sua entrevista na rádio é possível ver que ele quer mais do que limpar sua imagem publicamente (até porque isso é uma tarefa quase impossível).
Ron Ron fez isso para ele mesmo. Se aquele episódio está fresco na nossa memória, imagina para ele. Aquilo foi exibido no mundo todo e até quem não acompanha o basquete assistiu. Rendeu uma suspensão de 73 jogos e o fez sair do Pacers, onde teve sua melhor fase na NBA. Difícil tentar entender o que se passa na mente pouco comum do Artest, mas imagino que para ele esse encontro seja bastante simbólico e importante também.
Você pode discordar das coisas que ele faz ou de como ele faz, mas ele é tão original, tão diferente de todo o resto que você tem que dar algum crédito pro rapaz. Um jogador comum no máximo teria dado uma coletiva pedindo desculpas, não iria ligar na casa do cara. Artest é um personagem fascinante por isso, não cai no lugar comum. E outras histórias dele confirmam isso.
Também via Twitter, o Artest fez uma promoção onde uma família ganharia uma noite com ele em casa, um jantar com Ron Artest.
Uma idéia insana que teve como vencedora uma família de origem filipina. Artest foi até a casa da família, comeu comida típica filipina e passou a noite com eles, brincando no karaokê. O resultado foi desastroso: o jantar rendeu, segundo o próprio Artest, muitos gases, barulhentos e fedidos, e o karaokê, paixão da família que o acolheu, rendeu uma versão horripilante de “My heart will go on” da Celine Dion
Outra história: esse eu demorei mais de um ano para acreditar, tive que ler em dezenas de lugares confiáveis até me sentir à vontade o bastante para postar aqui.
No dia do jogo 6 das finais da NBA de 2008 entre Lakers e Celtics, o Artest estava lá em Boston assistindo a partida. Como vocês se lembram bem o Celtics venceu por 39 pontos de vantagem e levou o caneco. O Kobe, emputecido com a chance desperdiçada, foi para o vestiário tomar seu último banho da temporada e lá, pelado, se ensaboando, encontrou Ron Artest.
O ala que então ainda estava no Sacramento Kings tinha invadido o vestiário do Lakers para encontrar o Kobe. Olhou-o nos olhos e disse: “Eu quero te ajudar. Se eu puder vou dar um jeito de ir para Los Angeles e te dar a ajuda necessária para um título”. Primeiro Artest passou uma temporada no Rockets, mas agora, como Free Agent, foi lá cumprir o que tinha prometido a um Kobe nu e perplexo.
Alguns devem estar confusos por lembrarem dos confrontos entre Kobe e Artest na temporada passada, recheados de provocações, empurrões e faltas técnicas. Mas acreditem, o Artest estava só se divertindo, já falamos sobre isso nesse post aqui, ele gosta do desafio de enfrentar o Kobe, de provocá-lo, de tentar levá-lo ao limite. Aqui tem um relato de um jogo entre Kings e Jazz feito pelo Danilo que o fará entender completamente como o Artest se relaciona com o basquete e com esses desafios dentro da quadra: sua paixão pelo basquete e sua diversão ao jogar são mascaradas como loucura, como falta de educação. Na verdade ele só não é comum.
Mais coisas que o tornam único? Ao invés de posts clichês no Twitter ou aparições em shownerais, quando o Michael Jackson morreu o Ron Ron resolveu homenageá-lo com um rap que foi terrivelmente criticado e para alguns “a pior música já feita”. E ainda usará número 37 no Lakers, o número de semanas que a música “Thriller” ficou no topo das paradas norte-americanas.
E isso não é de agora, suas histórias são desde o seus tempos de Indiana. Uma vez ele apareceu só de roupão num treino do Pacers só para mostrar que estava pegando leve nos treinos ao voltar de uma contusão. E ainda já chegou a pedir um mês de férias, no meio da temporada, para sair em turnê para promover seu disco de rap. Sua justificativa é que o time era bom, poderia ir aos playoffs sem ele e que para o mata-mata, que era o que realmente interessava, ele estaria pronto.
E vocês já viram ele cantando? Sente o drama:

Até um tempo atrás eu só tinha visto o Artest cantar uma vez, quando fez um pedido de desculpas em forma de música após ter abaixado as calças do Paul Pierce no meio de um jogo. Segundo o Artest, o Pierce estava acabando com ele e então tinha que fazer alguma coisa para pará-lo. Simples assim.

Um personagem é uma representação de um ser humano numa obra de arte, num livro por exemplo. Para nós que acompanhamos a NBA de longe, sem ter contato com ninguém de lá, ela se torna uma obra de arte, um produto com preocupações estéticas e que conta uma história.
Essa história tem vários tipos de personagens que a própria NBA, a mídia e nós mesmos vamos moldando para que eles pareçam mais caricatos e menos humanos. O Kobe não tem a mesma graça se parecer menos obstinado a vencer, o Arenas não tem a mesma graça se aparece um dia mal humorado.
Na distribuição de papéis coube ao Ron Artest ser o outsider, o que não se encaixa. O cara excêntrico de temperamento imprevisível que pode estragar a química de um time.
Mas olhe de novo todas essas histórias singulares que acabei de contar e perceba que, na verdade, ele é só um cara real. Alguém que briga num momento tenso, que se diverte quando faz o que gosta, que se motiva dentro de uma competição e que tenta se divertir. Falando assim dá até pra se identificar, não é?
As histórias pouco convencionais do Artest são divertidíssimas e animam o folclore da NBA, alimentam o personagem exótico que querem que ele seja e que abraçamos pela necessidade que temos de ver a NBA como algo mágico, inalcansável. Mas ele se torna meu personagem favorito porque parece estranhamente real. No fim das contas nós, pessoas comuns, nos vemos em Ron Artest. E isso também fascina.

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