>O mistério de David West

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O enquadramento da foto não mostra, mas West está levantando a perna pra mijar num poste

Afinal de contas, qual o lance com David West? Ele é ou não uma estrela? Sabe ou não sabe defender? É ou não é um bom passador de bola? Tem ou não tem alergia a rebotes? Não consigo descobrir as respostas para as questões anteriores, porque cada vez que David West entra em quadra parece ser um jogador diferente. Não quero dizer com isso que ele seja inconstante, que domine um jogo apenas para desaparecer no próximo. Minha teoria a respeito é um pouco diferente: acho que David West nunca parece o mesmo em jogos diferentes porque é inteligente.

No primeiro jogo contra o Spurs, West parecia ser incapaz de errar seus arremessos de meia-distância, em que levanta a perna da frente comicamente como se fosse um cachorro prestes a esvaziar a bexiga. Enquanto o Spurs se preocupava em marcar o garrafão, David West se afastou da muvuca e disparou seus arremessos de modo certeiro. Quando finalmente perceberam o que estava acontecendo e a marcação resolveu seguí-lo, passou a arremessar de mais perto do aro e até a bater para dentro, eventualmente. Uma coisa sensacional a respeito do West é que ele é completamente invisível, e não do jeito Jessica Alba de ser. O ala do Hornets é tão ignorado, considerado tão secundário, que quando alguém lembra que ele está em quadra, o sujeito já fez 30 pontos.

No jogo seguinte, West perdeu a invisibilidade e a defesa do Spurs finalmente sabia seu nome e talvez até seu rosto, quem sabe. Bem marcado, não teve liberdade nos arremessos e por isso parecia um jogador completamente diferente em quadra. Não porque errava tudo, mas porque se focou em outras coisas. Fez um trabalho defensivo exemplar, pegou rebotes, exerceu o papel de facilitador no ataque. Saiu de quadra com 10 rebotes, 5 assistências e um diploma de Melhor Atuação Que Não Se Vê Nas Estatísticas. Nas entrevistas depois do jogo, escancarou a estratégia e alegou ter realmente se focado na defesa, porque no ataque as coisas são naturalmente mais fáceis para o Hornets.

O cara é mais ignorado do que ex-participante de reality show. Pensa bem, você reconheceria algum cara do primeiro Big Brother? Lembra de alguém do “No Limite” fora aquela gordinha que ganhou a parada? De todos os jogadores da NBA que foram para o All-Star Game, será que alguém passaria despercebido por você na padaria do seu bairro, fora o David West? Quantas dezenas de arremessos decisivos de último segundo David West acertou da cabeça do garrafão porque os outros times da NBA não fazem a menor idéia de quem é aquele sujeito levantando a perna enquanto arremessa e ganha o jogo? Os números não dizem nada, os olheiros não devem dar importância ao ala do Hornets, mas ali está o sujeito como parte fundamental de uma equipe que está chutando o traseiro fedido do Spurs.

O Byron Scott é gênio, faz até cruzadinhas no nível “É Foda” entre as refeições. E o que um técnico inteligente pode fazer com jogadores inteligentes em quadra é algo sem limites. Que me importa se David West é mais-ou-menos, não pega uns rebotes que lhe acertam em cheio o nariz ou se não consegue distinguir mulheres barangas de travestis? O que interessa é que ele é inteligente em quadra, sabe perfeitamente de seu papel, está disposto a obedecer integralmente as orientações táticas de seu técnico, e não teme fazer 30 pontos em um dia e apenas 2 pontos em outro. Dentro de suas limitações, faz aquilo de que seu time precisa: sendo um jogador secundário, sendo estrela, acertando o arremesso decisivo ou indo dobrar a marcação em Tim Duncan. É isso que faz a diferença no elenco – será que Carmelo Anthony toparia fazer apenas 2 pontos em nome da vitória?

Juntando os retalhos, vamos formando a equação do time que eliminará o Spurs nas semi-finais da Conferência Oeste: um técnico inteligente, jogadores taticamente espertos e conscientes, um candidato a MVP em Chris Paul, e também Melvin Ely.

“Espera, Melvin Ely?” É, Melvin Ely. Eu sei que parece nome de atriz pornô, mas trata-se de um jogador da NBA que, esse sim, não seria reconhecido na padaria nem mesmo nos Estados Unidos. Arrisco até que nem a mãe dele conseguiria reconhê-lo, tamanha é a sua insignificância. Eu achava que ele estava no Hornets porque daria mais trabalho burocrático tirar ele da folha de pagamento do que deixar ele por lá mesmo, afinal ninguém percebe sua presença e ele deve comer pouquinho nas refeições. Mas é claro que eu estava enganado. Melvin Ely era a arma secreta que toda a NBA procurava na última década: apenas ele tem o conhecimento para parar a mais destrutiva arma do planeta Terra. O que seria um roteiro brega de filmes de espionagem é na verdade um conceito bem simples: Melvin Ely treinou anos e anos com Duncan, apanhando dele treino após treino, e agora alega conhecer todas as suas tendências e saber como parar seus movimentos.

A princípio, duvidei inteiramente. É como se um cara aparecesse do nada e falasse “eu sei como tirar o Faustão do ar”. Mas se soubesse mesmo, será que não teria falado antes? Tinha que deixar a gente sofrendo por anos antes de liberar uma informação tão útil para a humanidade? Um cara me oferece a cura para a AIDS ou um modo de parar Duncan e eu fico com uma maneira de parar Tim Duncan. É um bem essencial e universal! Ou seja, se Melvin Ely tem mesmo esse conhecimento, deveria ser preso imediatamente por ter suprimido informação essencial ao bem comum!

Seja o conhecimento de Melvin Ely verdadeiro, seja apenas um modo de ser contratado pelo Suns na temporada que vem, o importante é que deu certo. Contra todo o bom senso, o Hornets está dobrando a marcação em Duncan e Tyson Chandler, que recebeu um treinamento diretamente de Ely, está fazendo um trabalho melhor do que nunca. Que tal o Melvin Ely abrir uma clínica de marcação no Duncan quando a temporada acabar? Aposto que será mais visitada do que a clínica de basquete do Matt Bonner.

É por essas e outras que o Hornets tem aquele cheiro de time campeão da NBA: as peças certas na hora certa. Até o Melvin Ely foi parar na brincadeira e soltar o ponto fraco de Duncan. (aliás, ter ponto fraco é muito coisa de vilão de videogame, e eu sempre desconfiei que o Tim Duncan era virtual mesmo, talvez saído do Resident Evil.) Com todas as circunstâncias apontando para uma eventual vitória do time de New Orleans, será que já cabe pensar em enfrentar Lakers ou Jazz? Algo me diz que o técnico Byron Scott deve estar tentando entrar em contato com o ex-jogador Ruben Patterson agora mesmo. Afinal, não era ele que, no maior estilo Melvin Ely, se auto-entitulava o melhor marcador de Kobe Bryant?

Será que se eu fizer uma fama como o único que sabe marcar LeBron James, vou parar na NBA? Aliás, hoje tem o primeiro jogo das semi-finais entre Cavs e Celtics. Vamos descobrir, em breve, se o Celtics precisará de meus serviços.

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