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Lembram no ano passado quando o Utah Jazz trocou uma figurinha repetida pelo Kyle Korver? A troca passou despercebida no meio de uma temporada em que figurões como Gasol, Kidd, Devin Harris e Shaquille O’Neal foram trocados, mas no fim das contas se mostrou uma das trocas mais eficazes. Para o Sixers, serviu como peça fundamental para liberar o espaço salarial necessário para assinar Elton Brand e manter Andre Iguodala; para o Jazz era a peça que faltava para o time deslanchar.
Se não me engano, não tenho os números certos aqui, o Jazz teve o segundo melhor recorde do Oeste na temporada passada contando desde o momento da chegada do Korver. O time estava feito e só precisava de um retoque para se tornar uma potência.
O caso mais parecido que aconteceu nesse ano é o do Bobcats. A troca em questão é a do Jason Richardson por Boris Diaw e Raja Bell. A princípio não tem muito a ver com a do Jazz, já que o Bobcats se livrou de seu principal cestinha, mas tem muito a ver porque era um time que precisava corrigir pequenos defeitos para entrar nos eixos e fez isso com jogadores medianos.
O Bobcats começou a temporada com esperanças, afinal tinha um elenco com bons jogadores, como Richardson, Gerald Wallace, Felton e Okafor, e que agora teriam como tutor o renomado técnico Larry Brown. Como todo começo de trabalho, a coisa foi difícil, principalmente porque o foco de todos os times do Larry Brown é defesa e muita gente no Bobcats achou que “defesa” era alguma gíria velha que o Larry Brown dizia querendo dizer “percam jogos!”.
Com o tempo o time foi criando identidade e começou a figurar entre as melhores defesas da NBA, mas ainda faltava alguma coisa e começaram os boatos de troca. No começo se falava muito em mandar o Felton, que o Larry Brown não parecia gostar muito, por um pivô, pra deixar o Okafor jogando na posição quatro. Mas tempo vai, tempo vem, e o Larry Brown se tocou que pivô não aparece tão fácil e que não ia ser fácil trocar o Felton sendo que seu próprio técnico não dava muito valor pra ele.
A solução foi trocar quem tinha nome no time, o J-Rich. A troca rendeu o especialista em defesa Raja Bell, além do Boris Diaw, grande passador, mas que cravava com a sua chegada o Okafor na posição cinco, de pivô, para o resto da temporada.
Eu achei estranha a troca na hora, achei que o Bobcats ia virar um daqueles times que só defende e acaba perdendo jogos de 70 a 60. Também achei que o Diaw nunca iria se dar bem em um time focado na defesa e que ia acabar virando reserva rapidinho. Errei.
O Boris Diaw está jogando demais, o Raja Bell está jogando muito bem e os dois juntos estão ajudando mais o ataque do Bobcats do que o Jason Richardson jamais ajudou.
Assim como o Joe Johnson era no seus tempos de Suns, o J-Rich no Bobcats era um cara de talento extraordinário mas que na prática servia apenas como arremessador. E arremessador por arremessador, por que não o Raja Bell que ainda defende e ganha menos? E com mais qualidade defensiva e aproveitamento de bolas de 3 quase igual. Em 14 jogos pelo Bobcats nessa temporada, o Richardson acertou 27 bolas de 3, em 13 jogos o Bell acertou 20. Considerando a quantidade de chutes que cada um tenta, a diferença é mínima.
Já o Boris Diaw renasceu ao chegar em Charlotte. Ao invés de ser aquele cara emburrado e preguiçoso que víamos em Phoenix, vemos um cara que participa ativamente do ataque e que defende com gosto, formando uma improvável boa dupla de garrafão com o Okafor.
Em Phoenix, o Diaw estava com médias de 8,3 pontos, 3,8 rebotes e 2,1 assistências. No Bobcats os números pularam para 14 pontos, 7, 1 rebotes e 5,1 assistências, números quase iguais àqueles que o fizeram o jogador que mais evoluiu na temporada 2005-06. Além disso, o Diaw trouxe um arremesso de três que eu nunca vi ele ter! Seus 42% de aproveitamento são o melhor dele na carreira e quase 10% superior ao que ele tinha no Suns!
Temos então no Bobcats o Felton, que agora não só se dá melhor com o Larry Brown como é o cara de confiança para acertar as bolas decisivas (vale ver a bola dele contra o Pistons); o Raja Bell, que é quem marca o melhor jogador adversário e chuta as bolas de 3 que eram do Richardson; e o Gerald Wallace, que não precisa mais gastar suas faltas marcando o melhor adversário e participa mais da defesa nas coberturas, o que ele melhor sabe fazer.
Já no garrafão tem Diaw e Okafor. O francês tem um talento excepcional para passes e faz todo mundo participar mais do ataque, até o próprio Okafor, que recebe muitos passes naquele esquema high-low, que é quando um dos pivôs recebe a bola na cabeça do garrafão e passa para o outro que está embaixo da cesta, jogada que o Lakers faz bastante com Odom, Gasol e Bynum.
No banco ainda tem o novato DJ Augustin, que tem jogado demais da conta e que, por incrível que pareça, se dá muito bem quando joga ao lado do Felton, sem precisar ser necessariamente só reserva dele.
Com isso, o Bobcats é um time perfeito? Não. Provavelmente nunca vai ser, mas se você tiver a chance de ver eles jogarem, veja, é bem divertido ver como o time funciona muito bem. E temos que dar os parabéns porque eu nunca na minha vida iria imaginar que trocar o cestinha da equipe por Bell e Diaw, que pareciam em decadência, pudesse ser a melhor coisa para um time.
Antes da troca o Bobcats estava com um uma campanha de 6 vitórias e 14 derrotas. Desde a troca são 9 vitórias e 11 derrotas, mas se você considerar que 4 dessas derrotas foram num espaço de 6 dias logo depois da troca, sem a chance de um treino sequer, dá pra dar um desconto. Nos últimos 10 jogos são 5 vitórias e 5 derrotas. Entre as vitórias, times grandes como Celtics e Blazers. Entre as derrotas, uma sofrida por dois pontos contra o Spurs.
Nesse Leste em que todo mundo menos o Wizards tem chance de playoff, não me surpreenderia se o Bobcats arrancasse uma oitava vaga. Entre eles e o Nets, Bucks, Bulls, Knicks e Raptors, são os Cats o melhor time atualmente. Acho que essa troca nem foi idéia dele, foi do Larry Brown, mas finalmente o Jordan acertou uma na sua carreira nos bastidores.
Números:
O Bobcats é o time que menos marca pontos por jogo, com 91,2. Ainda precisa de muita melhora, mas lembro que o Pistons campeão de 2004 com o mesmo Larry Brown tinha apenas o 18° melhor ataque da NBA.
A defesa daquele Pistons era a segunda melhor da NBA, o Bobcats de hoje tem a 9° melhor defesa.
Em pontos sofridos em contra-ataque, o Bobcats sobe para a quinta colocação, são apenas 10,4 pontos sofridos em contra-ataque por jogo. O líder é o Pistons com 9,9.
A maior deficiência do Bobcats está dentro do garrafão, é apenas a 11ª melhor defesa quando se conta apenas pontos tomados no garrafão, que são 37,1 por jogo.