O que aprender com Victor Oladipo

Ao fim da temporada 2011-12, o Orlando Magic entrou oficialmente em processo de reconstrução, encarando um futuro sem Dwight Howard pela primeira vez em quase uma década. Como de costume, portanto, toda nova escolha de draft a partir de então era vista como uma chance de encontrar uma nova estrela, um jogador capaz de oferecer um futuro promissor para a franquia. Naquele ano o Magic escolheu Andrew Nicholson, um ala de força que teve médias de quase 8 pontos e 3 rebotes como calouro. Em sua segunda temporada, regrediu: suas médias de aproveitamento de arremessos despencaram junto com sua produção ofensiva, que não chegou aos 6 pontos de média. A partir dali o Magic simplesmente desistiu de Nicholson: seus minutos desapareceram, seu contrato não foi renovado e após breve passagem por outras duas franquias, foi parar na China. Virou um mero rodapé no hall de más escolhas que o Orlando Magic acumulou ao longo dos anos.

Em 2013 foi a vez do Magic escolher Victor Oladipo com a segunda escolha do draft. As expectativas do time e dos torcedores eram gigantes, ansiosos por um novo rosto que pudesse representar a franquia e funcionar como base para o futuro. Oladipo rapidamente assumiu esse papel graças a duas coisas: sua disposição incansável para os treinamentos e sua disposição para trabalhar com a comunidade e acolher os torcedores. Virou um favorito dos fãs por estar sempre presente fora das quadras e por jogar com muita intensidade dentro delas. O problema é que sua produção nunca esteve a par do que se esperava: seus 13 pontos por jogo como novato não deixaram ninguém de queixo caído, mesmo tendo a oportunidade rara de passar mais de 30 minutos por jogo em quadra. Jogar híbrido, nem armador principal e nem armador arremessador, recebeu carta branca para armar o jogo do Magic em tempo integral e produzir tudo que pudesse sem nenhum compromisso com a vitória – mesmo plano que permitiu que um Kevin Durant cru de tudo passasse dos 20 pontos por jogo em seu primeiro ano de NBA. Mas com míseras 4 assistências por jogo e incontáveis erros de decisão, parecia não estar tirando proveito da ocasião. Na temporada seguinte, com a chegada do armador de ofício Eldrid Payton, teve menos responsabilidade de armar e mais chances de se preocupar em simplesmente pontuar. Sua média de pontos saltou para 17 por jogo, ainda muito aquém do que o Magic esperava. Em sua terceira temporada como profissional, aquele momento em que se espera que os jogadores finalmente desabrochem – e que rende tantos prêmios de “Jogador que Mais Evoluiu na Temporada” – teve visível regressão, seus números encolheram e sua capacidade de jogar ao lado de Elfrid Payton passou a ser seriamente questionada. O que não se questionava, claro, era seu comprometimento com os treinos: passou incontáveis horas a mais nos ginásios ao lado de Payton tentando construir uma química que parecia lhes faltar. Admirado no vestiário por companheiros de equipe e por toda a comissão técnica, sua produção numérica parecia ser secundária. Até que foi enviado para o OKC Thunder em troca de Serge Ibaka, jogador em clara reta descendente mas que supostamente traria uma proteção de aro que o Magic tanto ansiava. Oladipo durou menos tempo em Orlando do que Andrew Nicholson, a nota de rodapé que joga no basquete chinês.

Em Oklahoma foi recebido com ainda mais esperanças do que no Magic em seu ano inicial: os torcedores precisavam que Oladipo finalmente se tornasse aquela estrela que faltava para ajudar Russell Westbrook nos Playoffs. Sua temporada foi uma reprodução daquilo que já se conhecia do jogador, com a adição de uma pós-temporada sofrível que nada acrescentou aos sonhos da equipe de atingir as Finais da Conferência Oeste. Quanto mais se espera de Oladipo, maior a decepção. Talvez por isso, para seu quinto ano de NBA, Oladipo escolheu uma ida ao Indiana Pacers: uma volta aos seus tempos de universidade no estado, mas também um time com poucas pretensões. Talvez por lá pudessem esperar menos dele – até que, quando ninguém lhe esperasse mais nada, Andrew Nicholson pudesse lhe aceitar de braços abertos na liga de basquete chinesa.


 

Pelo Pacers, Victor Oladipo acabou de terminar a sequência de 13 vitórias consecutivas do Cavs. Na partida seguinte, com seu time perdendo por 19 pontos para o Denver Nuggets, Oladipo marcou 47 pontos rumo a uma incrível vitória na prorrogação. Oladipo dominou a partida: converteu 6 bolas de 3 pontos, bateu 11 lances livres, pegou 7 rebotes, deu 6 assistências e ainda roubou 2 bolas. Encerrou assim uma série de 3 jogos seguidos com mais de 33 pontos.

Todos os números de Oladipo mostram uma melhora incrível: seu aproveitamento nas bolas de três pontos saltou de 36% no ano com Westbrook para assustadores 44% no Pacers; seus pontos por jogo foram de 16 para quase 25; com mais de 5 lances livres tentados por jogo, mais do que dobrou sua média pelo Thunder. E tudo com menos minutos de quadra. Mais impressionante até do que os números é a confiança que Oladipo está mostrando com a bola nas mãos, armando o jogo, atacando a cesta, assumindo a responsabilidade no final dos jogos. Vê-lo trombando no garrafão, cavando contato e convertendo bandejas acrobáticas quase me faz esquecer do Oladipo que, contra o meu Rockets, passou 3 jogos seguidos sem cobrar um único lance livre.

A mudança passa até pela aparência: em pouco menos de um mês de treinos depois que assinou com o Indiana Pacers, Oladipo perdeu quase 5 quilos e ganhou uma quantidade absurda de massa muscular:

[image style=”” name=”on” link=”” target=”off” caption=”Vem, monstro!”]http://bolapresa.com.br/wp-content/uploads/2017/12/Oladipo.jpg[/image]

Seu técnico em Indiana, Nate McMillan, diz que nunca passou tanto tempo estudando vídeos junto de um jogador como com Oladipo, já que o jogador quer muito aprender e não cansa de se dedicar. Oladipo agradece o apoio, dizendo que McMillan “acredita nele”, dá valor para sua dedicação e recompensa ele com a liberdade de tomar decisões em quadra tanto no ataque quanto na defesa. Cada vez mais Oladipo arremessa na hora certa – sua melhora de aproveitamento não vem de uma reconstrução radical de mecânica, mas de uma melhor leitura de jogo que pune os defensores que temem lhe dar espaço para infiltrar, parte essencial da transformação do Pacers no time com o segundo melhor aproveitamento nos arremessos de três pontos da NBA. Na defesa, sua leitura e antecipações também vem dando resultado: 1/5 dos pontos de Oladipo vem de roubos de bola e dos contra-ataques que eles geram. Não é nenhum absurdo dizer que o Pacers estará nos Playoffs e nem que Oladipo deverá jogar o All-Star Game pela Conferência Leste. De repente, quando a gente menos esperava, Victor Oladipo finalmente chegou. O problema é que o Magic já havia desistido dois anos antes.


 

Na terceira temporada como profissional, ainda pelo Orlando Magic, Oladipo teve um começo muito complicado: passou os dois primeiros meses acertando apenas 28% dos seus arremessos de três pontos. Essa incapacidade de converter as bolas de longa distância lhe comeu espaço para infiltração, o que lhe levava a cometer muitos desperdícios especialmente no final dos jogos, quando as defesas estavam mais focadas nele. Seu então técnico Scott Skiles chegou a dizer que ele poderia estar facilmente no “Melhor Time de Defesa da Temporada”, mas que seu caso foi ignorado graças aos erros eventuais de troca de marcação que ele cometia em momentos decisivos. Quando todo mundo estava esperando que ele fosse uma grande estrela que salvaria o Magic do horror, acertar 28% dos arremessos ou errar trocas defensivas importantes é inaceitável. Quando você vê o erro na sua frente, destruindo aquele sonho maluco de um jogador perfeito, é fácil ficar decepcionado e trocar o alvo dos sonhos para um jogador jovem qualquer, que ainda não fez coisa alguma e que, portanto, ainda não errou. Quanto pior era a terceira temporada de Oladipo, mais a torcida do Magic se encantava pela hipótese distante de Mario Hezonja – que a gente ainda nem sabe se é um jogador de basquete de verdade.

Da mesma maneira, os torcedores esperavam tanto que Oladipo tivesse finalmente seu ano mágico que sequer eram capazes de olhar para a realidade – com Russell Westbrook quebrando um recorde histórico ao finalizar QUARENTA E UM PORCENTO das jogadas do seu time, como qualquer outro jogador poderia encontrar as oportunidades, o ritmo, o conforto para produzir?

Victor Oladipo talvez não consiga manter seus 44% de aproveitamento nas bolas de três pontos, o que talvez lhe cause problemas nas infiltrações e despenque seus números. Talvez seu novo estilo de jogo, mais agressivo e combativo, cobre um preço alto em seu físico. Talvez o Pacers, arrumadinho mas não exatamente exalando talento, não consiga sustentar a atual quinta colocação no Leste – talvez não sustente sequer uma vaga nos Playoffs, com times como Knicks, Magic e Heat ainda tentando uma vaga na pós-temporada. Mas nada disso muda o fato de que fomos totalmente injustos com Oladipo em suas primeiras quatro temporadas de basquete profissional. É muito fácil ver a involução dos números, a repetição de padrões danosos para o estilo do jogador, e decretar que não há muita esperança. Em parte porque não conhecemos a situação dos bastidores – os relatos do comprometimento impecável de Oladipo só estão vindo à tona agora, quando o jogador finalmente teve sucesso. Mas em parte também porque esquecemos como o ambiente, o estilo de jogo e a PACIÊNCIA das pessoas envolvidas pode comprometer a evolução e o desenvolvimento de um jogador.

No Magic completamente caótico de Scott Skiles, Oladipo precisava treinar individualmente com Payton sem uma garantia sobre quem seria armador, qual seria sua função no time, com diretrizes sobre seu papel na armação mudando semanalmente. No Thunder de Westbrook, uma estrela com 41% de jogadas finalizadas (nem Kobe Bryant em 2005 ou Michael Jordan em 1986, suas versões mais dominantes, ultrapassaram os 39%) inviabilizou qualquer chance de Oladipo ter um papel minimamente relevante, um planejamento tático, uma função delimitada. Foi preciso o metódico McMillan, no Pacers-super-arrumadinho, para que Oladipo pudesse saber o que se espera dele, preparar o corpo de acordo e ganhar a confiança e o espaço de que precisava.

Certamente nem todos os jogadores desabrocham quando recebem uma chance, mas precisamos pensar na quantidade de jogadores que foram descartados muito antes disso, enfiados em situações desfavoráveis, arremessados 30 minutos por jogo num papel que não sabiam desempenhar, ou afundados num banco de reservas frente ao primeiro sinal de retrocesso porque a realidade não alcançou as expectativas da melhora média de uma terceira temporada. Para cada Oladipo que finalmente encontrou a situação ideal temos um Andrew Nicholson na China, e por pouco Oladipo também não se viu forçado a mudar de continente. Que o sucesso dele seja o lembrete vivo de que precisamos aprender a esperar ao invés de já preparar o velório de cada um desses jovens talentos que não vemos alcançar nossos sonhos absurdos e nossos padrões estatísticos. Especialmente para times que precisam pensar a longo prazo, como o Orlando Magic, a paciência é uma ferramente fundamental para evitar que o talento seja todo dispensado em nome de uma pressa histérica – apenas para ver esses jogadores dando certo depois em outros ambientes, mais humanos e melhor estruturados.

 

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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