>Pai rico, pai pobre

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“Essa cidade é pequena demais para nós dois”, aí os dois foram embora.

Comentamos bastante aqui sobre a saída do Jerry Sloan do Jazz. O técnico já teve desentendimentos com inúmeros jogadores durante sua longa carreira, bateu cabeça com o Deron Williams nos últimos meses, e dessa vez resolveu dar o fora, estava cansado. Não acho, de verdade, que o Deron tenha feito algo tão horripilante a ponto de tirar do time um técnico que passou metade da sua vida discutindo com armadores, mas a torcida de Utah não concorda comigo. Nas três partidas sem Jerry Sloan, três derrotas para o Jazz, Deron Williams foi bastante vaiado pelos torcedores. Defendemos aqui que o Sloan passou tempo demais no comando do time, sempre nesse limbo em que o time vai para os playoffs mas não tem chance de títulos, e de que era hora de mudar. Por mais difícil que seja, todos os torcedores precisam entender que o objetivo é ganhar títulos e que, volta e meia, é preciso abortar um time bom simplesmente porque ele não será bom o bastante.

Aparentemente, o Jazz estava realmente disposto a mudar as coisas. Negociou silenciosamente possíveis cenários de troca pelo Deron Williams ainda enquanto ele batia cabeça com o Jerry Sloan. Após a saída do técnico, no entanto, as negociações não pararam. Até que, sem nenhum aviso, Deron acabou de ser mandado para o Nets em troca de Devin Harris e Derrick Favors, além de duas escolhas de primeira rodada (uma do Nets, outra do Warriors) e 3 milhões de verdinhas. Definitivamente a negociação já está rolando há muito tempo, apenas aguardando que o Carmelo não fosse para o Nets (aliás, leia tudo sobre a troca do Carmelo para o Knicks em nosso post aqui), mas ninguém sabia dela. Não é legal que o mundo da boataria seja a maior perda de tempo do planeta?

Como todas as trocas do Jazz, temos sempre que levar em conta primeiro os motivos financeiros. O Jazz é o time que mandou Ronnie Brewer e Eric Maynor em trocas por nada apenas para liberar espaço salarial porque Utah é um mercado pequeno e limitado. O contrato do Deron Williams era de gordos 14 milhões, e seria de 16 milhões na temporada que vem, última do seu contrato. No meio desse ano, Deron seria liberado para assinar uma extensão se quisesse, e os boatos já começaram a aparecer de que ele não assinaria a extensão para manter aberta a possibilidade de jogar no Knicks, com Carmelo e Amar’e, caso o Jazz não tivesse chances de título até lá. Bem, o time não tinha muitas chances antes com Sloan e Carlos Boozer, está caindo pela tabela sem os dois e tem problemas financeiros, limitando muito as possibilidades de contratações. Na cabeça dos engravatados do Jazz, o Deron ganharia 16 milhões na temporada que vem (aquela que pode ser encurtada por uma greve e que vai piorar a situação financeira das franquias) apenas para sair da equipe na temporada seguinte, em troca de nada – ou forçando mais uma dessas trocas absurdas, como a do Carmelo. Caso o Deron ficasse no time, os engravatados precisariam decidir se vale a pena extender um contrato e pagar quase 20 milhões de dólares num mercado minúsculo para o armador de um time que, com novo técnico e sem padrão de jogo, precisa pensar em algum tipo de reconstrução. Pensando no bolso, na provável greve da temporada que vem, na situação do Carmelo e em perder uma estrela para o Knicks, o Jazz resolveu fazer a troca agora. Aproveitou as negociações provindas do desentimento do Sloan com o armador, aproveitou que o Nets estava disposto a abrir mão de muita coisa para não sair de mãos vazias depois de perder Carmelo, e aproveitou que a saida do Jerry Sloan é uma boa hora para reconstruir a equipe e pensar na pirralhada. Pirralhada barata, de preferência. Com o contrato de 17 milhões do Kirilenko, que vira farofa ao fim dessa temporada, e escolhas de draft do Nets e do Warriors, o Jazz pode respirar em paz com dinheiro nos bolsos e crianças para criar. O time não vai ser relevante por um bom tempo, mas vai ser uma reconstrução divertida de acompanhar.

Derrick Favors andou sendo muito criticado pelo seu começo de carreira no Nets e esteve em todas as propostas de troca que o time fez por Carmelo Anthony. Favors foi colocado em tantas propostas que não dava mais pra tentar enganar o rapaz e dizer que ele estava nos planos do Nets, ele tinha que ser trocado obrigatoriamente, não havia clima para ele ficar. Para o Jazz, foi uma boa. O rapaz é um excelente defensor, mas está tendo dificuldades de se acostumar com a NBA, comete muitas faltas e ainda não tem o físico necessário para defender em alto nível. No ataque, ainda falta muito para conseguir contribuir com regularidade. Mas dá pra ver que isso é apenas questão de tempo. Favors é um excelente reboteiro, se posiciona bem, é esforçado na defesa e não tenta demais no ataque. Em um ou dois anos, pode ser um grande jogador se tiver os minutos necessários para evoluir. Curiosamente, o Nets – mesmo fedendo e em total reconstrução – não estava disposto a lhe dar esses minutos, talvez preocupado em impressionar Carmelo ou em fugir do pior recorde do Leste de novo. No Jazz, Favors vai bater cabeça com Al Jefferson e Paul Millsap, mas talvez funcione se ele for reserva dos dois jogadores (e o Okur for mandando pra rua, como se cogita), assim como acontecia com o trio Boozer, Okur e Millsap. Na pior das hipóteses, o Jazz tem agora três jogadores de garrafão jovens, talentosos e com potencial pra burro para fazer alguma troca. A única certeza é que o Favors fica: por estar no contrato de novato, ele é o mais barato.

A única coisa estranha para o Jazz nessa troca é colocar a armação do time nas mãos do Devin Harris. Ele tem mais 3 anos de contrato, ganha mais de 8 milhões nas três temporadas, e está longe de ser um líder como Deron. É um dos armadores mais rápidos da NBA, chuta traseiros, mas sua ênfase é em pontuar – e se machucar. Como os grandalhões do Jazz vão reagir a um armador menos disposto a fazer os pick-and-rolls, marca registrada do time por décadas? Será preciso uma mudança completa no esquema tático, mas talvez funcione. Al Jefferson e Millsap mostraram nessa temporada, ao contrário do que se pensava, que rendem muito melhor embaixo da cesta do que nos arremessos de média distância como fazia Carlos Boozer. Talvez as infiltrações de Harris abram espaço para Millsap e Al jogarem bem próximos ao aro, finalizando de frente para a cesta, mas será uma mudança drástica de um esquema de jogo que está em vigor há uns 20 anos. Ou seja, finalmente o Jazz vai ser um time realmente diferente, com um armador muito distinto de todos os outros que jogaram sob comando do Jerry Sloan. Pode demorar, mas as mudanças vão fazer bem para a equipe e as trocas forçam o time a se repensar por completo, evitando o risco de que a mudança de técnico fosse apenas aparente, com o mesmo modelo tático sendo mantido pelo técnico substituto. Por um lado foi um modo de se obrigar a arriscar, a tentar algo novo. Por outro, foi uma mudança bastante controlada e medrosa de quem não quer ficar se preocupando com finanças nos próximos anos.

O Nets, por sua vez, só se preocupa é justamente com os próximos anos. Desde que comprou o time, o milionário russo Mikhail Prokhorov não fez outra coisa além de tentar garantir que o Nets tivesse estrelas relevantes ao se mudar para o Brooklyn daqui a 2 anos. A primeira intenção era ter Carmelo Anthony e o time tentou dar as calças por ele, o único jogador intocável era o Brook Lopez, porque pivôs são raros mesmo que o talento dele de pegar rebotes tenha sido roubado pelos Monstars do Space Jam. Como o Knicks fez de tudo para tirar o Carmelo do Nets e conseguiu porque, no fundo, o Carmelo queria mesmo era jogar com Amar’e, o milionário russo foi tentar outra estrela. O Deron Williams foi uma excelente oportunidade de mandar todas as escolhas de draft e o Derrick Favors que o Nets estava juntando há meses para o Carmelo. Parando pra pensar, o Nets provavelmente seria mais inteligente se mantivesse as escolhas e reconstruísse esse time aos poucos, mas é tudo uma questão de mercado. O time precisa chegar com alguma estrela no Brooklyn para vender ingressos e camisetas, mesmo que não tenha chances de titulo. A reconstrução foi agora colocada um pouco de lado em nome de Deron Williams, tantas vezes ovacionado como um dos melhores armadores da liga. O Favors era novinho e cheio de potencial, seria uma ótima para o futuro, mas Deron e Brook Lopez devem fazer uma dupla mais eficiente desde o primeiro dia – e devem vender mais ingressos e criar barulho, agitação, interesse. É claro que o Deron não ficou feliz em ir para o Nets, ele tinha esperanças de ir longe com o Jazz, adorava Utah por ser um lugar calmo e poder se dedicar à família, e estava flertando com a ideia de ir para o Knicks jogar com os amiguinhos. Agora vai para o primo pobre de New York jogar por um time de merda sem nenhuma chance de playoff nem no Leste, parece castigo! Mas esse descontentamento vai durar pouco: Mikhail não poupou esforços por uma estrela até agora, voou para a casa do LeBron para tentar convencê-lo, se encontrou com o Carmelo e fez trocentas promessas, e agora fará tudo de novo pelo Deron. O milionário vai prometer um elenco de apoio, vai pagar as taxas por extrapolar o teto salarial, vai convencer gente a ir jogar lá usando o nome do Deron, vai fazer campanhas de marketing violentas e tornar o Deron um dos jogadores mais famosos da NBA. O armador vai sair de um time que se livrava de gente boa porque não podia pagar e vai cair num lugar em que todo mundo vai querer jogar porque dinheiro não é um problema. Vai ser ovacionado como um dos maiores da NBA porque todas as oportunidades lhe serão dadas e todas as câmeras estarão apontadas. É outra realidade, e não há vontade de vida calma que vá resistir a isso. Deron agora vai poder fazer o que quiser com os jogadores que quiser,sem bater boca com o Jerry Sloan ou se preocupar com elenco de apoio e finanças. O Nets paparicou o primeiro jogador importante, que era o mais difícil. Agora vai atrás dos outros, nos próximos dois anos, mas deve ser tudo muito mais fácil – nos mesmos moldes de Celtics, Heat e Knicks.

A primeira parte da construção do elenco de apoio em volta do Deron Williams veio hoje mesmo. O Nets mandou o contrato expirante do Troy Murphy e uma escolha de draft de segunda rodada em troca de outros dois contratos expirantes: Dan Gadzuric e Brandan Wright. O primeiro é um pivô reserva para quebrar um galho na defesa, até melhor do que muita gente pensa porque comete poucas faltas e tem bom tempo de bola nos tocos. O segundo, Brandan Wright, pode jogar nas duas posições de ala e foi draftado com muita expectativa, mas ficou preso como refém do maluco do Don Nelson. Mesmo com a saída do técnico, o ala não teve minutos, se contundiu o tempo inteiro, mas ainda se espera que ele possa brilhar com a situação certa e os minutos necessários. Com a saída do Favors, o titular ao lado de Brook Lopez deve ser o Kris Humphries, que passou a jogar muito bem desde que começou a dar uns amassos na Kim Kardashian (vai ver o talento roubado do Brook Lopez foi pra ele). Mas o time precisa de um reserva, e Brandan Wright vai ter esses minutos à disposição para tentar mostrar alguma evolução, qualquer que seja. Já é um começo e garante que o time não fique muito esburacado com a chegada do Deron Williams. Para o Warriors, apenas foi uma questão de abrir espaço salarial se livrando de gente pouco usada, devem até mesmo mandar o Troy Murphy embora antes dele sequer pisar no ginásio.

Essas trocas foram uma boa demonstração de como funcionam os pequenos e os grandes mercados da NBA. O Nets, que se aproxima cada vez mais de um grande mercado em New York, só precisa de uma estrela para então começar a assinar cheques, pagar taxas e montar um bom elenco ao seu redor com veteranos e mais estrelas querendo ganhar títulos. É o que tenta também o Knicks com Carmelo, e o Nets se esforça para não ficar muito atrás da franquia vizinha. Já o Jazz precisa constantemente monitorar os gastos, cortar jogadores e salários, e agora finalmente aceita uma mudança grande para tentar criar um time competitivo e mais barato. Mas, por um tempo, vai ser hora de focar na pirralhada e nas escolhas de draft, e esperar a crise e a ameaça de greve ir embora. Numa liga movida pelo dinheiro, na hora da crise econômica apenas alguns times podem respirar tranquilos. Os outros precisam humildemente ficar um pouco de escanteio.

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