🔒Para sair do fundo do poço

A gente já sabe que primeira semana de temporada não é lugar de conclusões. E o asterisco vale em dobro para aqueles times que há anos indicam uma mesma tendência: não vale a pena se desesperar com começo ruim de time que sabemos que é bom nem se animar demais com começo bom de time acostumado em fazer chorar. O que tirar então da primeira semana do Phoenix Suns, o saco de pancadas das últimas temporadas, a piada pronta da NBA, que começou 2019-20 com duas vitórias convincentes e duas derrotas apertadíssimas, decididas na última posse de bola, para dois dos grandes favoritos do campeonato?

O Suns massacrou o rival de divisão Sacramento Kings e foi o primeiro (e até agora único) time a bater o Los Angeles Clippers de Kawhi Leonard. As derrotas vieram nas mãos do Denver Nuggets em uma disputada prorrogação que o Suns disputou com desfalques e do Utah Jazz, vencida por Donovan Mitchell numa cesta no segundo final. Depois de tantos anos de fracasso seríamos muito ingênuos de achar que esse time é pra valer?

Mais do que os meros resultados, impressiona o desempenho. Nos últimos anos o Suns sempre passava a impressão de um ataque improvisado ou que ao menos se tornava improvisado após alguns minutos de frustração. A defesa era pior ainda, com pouca experiência, comunicação e vontade, que diminuía semana após semana enquanto o time despencava rapidamente na tabela do Oeste. Era, em resumo, um time caótico e sem identidade que jogava a bola na mão de Devin Booker e rezava.

As coisas deram um pequeno sinal de mudança já no fim da temporada passada, quando o Suns trocou por Tyler Johnson e Kelly Oubre Jr. Depois de perder DEZESSETE JOGOS SEGUIDOS entre Janeiro e Fevereiro, o time reagiu com seu novo elenco e venceu 8 dos seus últimos 19 jogos. Não é muito, mas para o PIOR TIME do Oeste e que entrava em quadra com desgosto foi incrível ver esforço real e algumas boas partidas. Vitórias sobre LA Lakers, Golden State Warriors e Milwaukee Bucks coroaram essa esperança de renascimento.

Os dois novos jogadores são ainda jovens, mas com alguma rodagem e estavam babando por algum protagonismo. Tyler Johnson entrava e saía do Miami Heat e sua rotação de milhares de jogadores coadjuvantes, enquanto Kelly Oubre Jr. estava atrás de John Wall e Bradley Beal no mar de lama que o Washington Wizards se tornou na temporada passada. Era um cara que estava prestes a renovar seu contrato e só sonhava com a chance de mostrar serviço para brilhar e faturar. O time começou a jogar melhor, vencer algumas partidas e o clima no vestiário, segundo relatos da imprensa local, melhorou muito com o sangue novo. Até apelido o time ganhou: Valley Boyz, em referência ao Valley of the Sun, região onde se encontra a cidade de Phoenix e que ajudou a batizar a franquia. Criar alguma coesão é um passo difícil e importante num grupo tão derrotado:

O Draft do Phoenix Suns foi muito confuso, o General Manager James Johnson resolveu descer da posição 6 para a 11 e aí pegar Cameron Johnson, que todos esperavam ser uma escolha de SEGUNDA RODADA. Conseguir Dario Saric pelo downgrade foi interessante, mas ver Tyler Herro e PJ Washington brilhando no começo da temporada mostram como o time parece ter se precipitado na sua escolha por Johnson. De qualquer forma, saíram com dois caras que sabem jogar e o resto da offseason foi bem coerente.

Eles finalmente atacaram o problema da falta de um armador com Ricky Rubio, que foi MVP e campeão da Copa do Mundo durante as férias da NBA, renovaram com Kelly Oubre Jr. e decidiram trocar Josh Jackson, que foi só uma grande dor de cabeça na sua curta passagem pelo Suns. Ao lado de Dragan Bender, Alex Len e Marqueese Chriss, outros que já deram o fora, são provas vivas de que só ter escolhas altas no Draft não resolve nada. Por fim o time agiu de acordo com seu discurso de quem quer resultados rápidos e fez questão de trazer veteranos e coadjuvantes de qualidade: além do citado Saric, Aron Baynes veio do Boston Celtics e eles ainda resolveram resgatar o bom Frank Kaminsky, que perigava ficar sem time após começo de carreira decepcionante pelo Charlotte Hornets.

Por fim, o time contratou o técnico Monty Williams, que levou o New Orleans Pelicans aos Playoffs em 2015 antes de ser surpreendentemente demitido. Nas últimas temporadas ele foi assistente do OKC Thunder e do Philadelphia 76ers e muitos especulavam quando ele finalmente teria uma nova chance de ser técnico principal.

Embora todos esses sejam bons nomes, não era garantia de sucesso. Quem acompanha o Phoenix Suns sabe que talento e experiência já foram tentados antes: o time já teve Eric Bledsoe, Goran Dragic e Isaiah Thomas e não tirou NADA deles, nem boas trocas. Já trouxe Tyson Chandler para ser o líder veterano que mostra para a molecada como ser profissional e o cara implorou para ir embora. E na temporada passada eles também trouxeram sangue novo no banco, o técnico Igor Kokoskov, que vinha de um período de sucesso como assistente do Utah Jazz e cheio de novas ideias para organizar o time e não deu em nada.

O Phoenix Suns vive uma crise que já dura diversos técnicos, jogadores e General Managers. Desde aquela temporada em que pegaram todos de surpresa e quase se classificaram para os Playoffs com um time jovem liderado por Goran Dragic, o time só tropeça sozinho. Lembram de Eric Bledsoe implorando por troca NO TWITTER? Diversos jogadores agradecendo aos céus quando deixaram a franquia e o técnico Earl Watson sendo demitido após míseros TRÊS JOGOS em 2017? Em 2018 foi a vez do General Manager Ryan McDonough ser chutado uma semana antes da temporada começar. E nem vamos nos aprofundar na história da CABRA (e seu cocô) sendo deixada no escritório de McDonough por Robert Sarver. A história veio à tona em uma das matérias mais comentadas do ano passado, quando Kevin Arnovitz escreveu na ESPN sobre os bastidores do “desfuncional Phoneix Suns”.

Mas ignorando a história recente e analisando só a quadra, é possível ter algum otimismo com esse começo de ano do time. Já me chamou a primeira cesta do time na temporada. Ricky Rubio se mexe sem a bola para dar opção de passe para Devin Booker. Ele recebe e então poderia ter arremessado, passado para Saric, tentado DeAndre Ayton no meio do garrafão ou até devolvido para Booker, mas viu espaço para uma bandeja e guardou os pontos. Desde quando esse time se mexe sem a bola e tem diversas opções na mesma jogada?

E olhem que gracinha essa jogada que o técnico Monty Williams tem chamado para Devin Booker: é um Horns (Chifre, no nosso léxico basqueteiro) que envolve o próprio Booker e um jogador de garrafão, DeAndre Ayton, Dario Saric ou Aron Baynes, na linha do lance-livre. O pivô faz um bloqueio para Booker, que recebe a bola com espaço, em movimento, e pode arremessar, atacar a cesta ou acionar o grandalhão. Vemos abaixo como um defensor é obrigado a impedir o arremesso de Booker enquanto o outro já está em posição de desvantagem para impedir o pivô de ficar embaixo da cesta. Em um dos lances até aparece uma ajuda do outro lado, mas ela chega tarde e ainda deixa Oubre Jr. livre para um possível arremesso de 3 pontos:

Muitos pontos também para a evolução individual dos jogadores, em especial Kelly Oubre Jr. Ele está com 35% de acerto nas bolas de 3 pontos, infiltrando mais do que nunca na sua carreira, cobrando mais lances-livres e se tornou o principal defensor do perímetro do time, sendo o responsável por marcar as estrelas rivais e saindo de quadra com saldo positivo nos duelos. São dois roubos de bola por jogo e muitos arremessos contestados:

O bom arremesso de Oubre (e até de Tyler Johnson em alguns lances) e a presença de Ricky Rubio, um organizador e passador que libera Devin Booker para atuar sem a bola, possibilita jogadas como essa abaixo. Dois bloqueios acontecendo ao mesmo tempo, dois jogadores preparados para receber a bola e o armador espanhol podendo usar sua experiência e passe para saber que direção seguir:

Vale também elogiar Dario Saric, um dos maiores CURINGAS desta temporada. Ele executa funções de criação de jogadas, de marcar pivô adversário, de pegar rebote, de pick-and-roll, de tudo que se pode imaginar. E tem ido muito bem. E Frank Kaminsky finalmente se tornou o jogador que imaginávamos quando ele brilhava no basquete universitário: não é o mais talentoso, mas sabe arremessar, finalizar e briga por tudo. Sempre legal ver uma carreira sendo reerguida.

Só que alegria de torcedor do Suns não dura muito. Logo após a estreia fenomenal contra o Sacramento Kings a NBA anunciou que iria suspender o pivô DeAndre Ayton por 25 jogos. Ele foi pego com um diurético, produto normalmente utilizado para mascarar uso de substâncias ilegais, em um exame antidoping. O jogador pediu desculpas e disse ter ingerido o diurético sem sabe. O Suns afirmou que está “desapontado pelas ações de DeAndre Ayton” e que ele “não agiu conforme os princípios estabelecidos pelo time”. A resposta do time no jogo seguinte, uma vitória sobre o poderoso LA Clippers, foi exemplar, com Aron Baynes e o curinga Dario Saric gastando tempo na posição de Ayton, mas não dá pra negar que é uma perda grande para o time. Um dos desafios de Monty Williams era envolver mais o pivô, primeira escolha do Draft 2018, e ele dava sinais de conseguir isso em lances como a ponte aérea que mostramos acima. Agora tudo será interrompido por mais de um quarto da temporada regular.

O legal de ver uma possível renascença do Phoenix Suns vai além da diversão de ver finalmente Devin Booker disputando jogos que valem alguma coisa ou de ver Ricky Rubio sendo reconhecido. Há o valor de ver os ciclos da NBA funcionando: o time se tornou um exemplo de visão e gestão no meio da década passada, foi essencial para revolucionar taticamente a liga com Mike D’Antoni e Steve Nash e até foi pioneiro na área de tratamento médico de jogadores. Para usar a terminologia do atual dono do Golden State Warriors, o Suns já foi o time “anos-luz à frente de todos” no passado, mas o azar, a pressa e a incompetência arruinaram tudo.

Robert Sarver, o dono que revitalizou o time ao adquiri-lo em 2004, se tornou o cara mais criticado da liga e luta agora para reaver algum do prestígio perdido. É a chance do time mostrar que não há poço que não possa ser escalado com algumas boas contratações, um All-Star, um elenco que quer jogar junto, um bom técnico e alguns golpes de sorte.

Há um alerta, porém. E o próprio Phoenix Suns viu ele bem de perto na sua estreia: o Suns precisa se consertar internamente para não virar o novo Sacramento Kings. Dono da maior sequência atual da NBA de anos fora dos Playoffs, o Kings deu sinais de recuperação há alguns anos quando o técnico Mike Malone finalmente se tornou o primeiro a realmente conseguir se conectar com a estrela DeMarcus Cousins. Após algumas derrotas totalmente previsíveis, porém, Malone foi demitido. Vamos alguns anos no futuro e chegamos em 2018, quando o Kings se tornou um dos times mais divertidos de toda a NBA e quase beliscou uma vaga na pós-temporada. Veloz, envolvente e dinâmico, o time do técnico Dave Joerger foi o queridinho do League Pass na temporada passada. Resultado? Treinador demitido de novo, dizem que por divergências internas com o General Manager Vlade Divac.

O time contratou para seu lugar Luke Walton, que vinha de um tempo de sofrimento no Los Angeles Lakers e que já começa sua nova vida com QUATRO DERROTAS SEGUIDAS, duas delas por mais de 20 pontos de diferença. O time parece sem ânimo, sem vontade e tem um desempenho típico daqueles elencos de Brasileirão que perdem só para derrubar o treinador. Na lista de dores de cabeça coloquem a novela da renovação de Buddy Hield, um suposto arrependimento pelo contrato dado a Harrison Barnes, Bogdan Bogdanovic frustrado por não ter recebido uma extensão e a dispensa surpreendente de Willie Caulley-Stein no começo da offseason. É como se o Sacramento Kings sabotasse o seu próprio desenvolvimento.

Ainda é começo de temporada e as coisas podem voltar a se alinhar de novo em pouco tempo, mas o Sacramento Kings não tem o benefício da dúvida. O Phoenix Suns também não tem, mas vive um valioso e breve momento de otimismo, é hora de fugir do fundo do poço enquanto há tempo.

Torcedor do Lakers e defensor de 87,4% das estatísticas.

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