[Resumo da Rodada] A Chuva

Vitórias fáceis em cima de um dos melhores Spurs que já vimos. Vitória, nas Finais do Oeste, na casa do Golden State, o time com mais vitórias numa temporada regular da história. Liderança de 3 a 2 na série em cima do Warriors, podendo fechar em Oklahoma. Um estilo de jogo que quebrou as principais armas do adversário, derrotando o Warriors até em sua maior zona de conforto, o small ball. Variações táticas que fizeram o Warriors ser incapaz de impor um ritmo ou prever o adversário, usando ora dois pivôs, ora pivô nenhum. Uma defesa impecável que fez o melhor ataque da NBA parecer lento e displicente, e que dominou os rebotes. Vitória nos 3 primeiros quartos do derradeiro Jogo 6 em casa, com uma atuação defensiva fantástica e um ataque eficiente e desperdiçando pouco a bola. Entrando no quarto período, levando todo esse histórico em consideração, apostar contra o Thunder seria um absurdo. Sua trajetória nesses Playoffs, que nos ensinou a mudar nossa percepção da equipe e reconsiderar suas principais falhas e limitações, não permitia qualquer percepção que não fosse a vitória certa e a viagem para as Finais da NBA contra o Cleveland Cavaliers.

Não se trata apenas de uma percepção subjetiva: a análise estatística, que leva em consideração a pontuação do jogo, o tempo restante e o histórico das equipes cravou a chance de vitória do Thunder a 5 minutos do fim em NOVENTA POR CENTO.

Naquele momento o Thunder vencia por 7 pontos. A maior vantagem da equipe na partida foi de 13, mas passou a maior parte do jogo em menos de 10 – ainda que parecesse UMA CENTENA. Vendo o poder defensivo do Thunder, a quantidade de rebotes ofensivos conquistados e a dificuldade de Stephen Curry sendo marcado especialmente por Kevin Durant, a sensação era de que o Warriors perdia o jogo por DÚZIAS de pontos, mas o placar estava sempre ali sem esticar demais. Entrar no quarto período perdendo por apenas 8 pontos era uma vitória simbólica enorme para o Warriors, mas parecia monstruosamente longe da vitória real.

Contra todo esse cenário, Stephen Curry foi até Klay Thompson antes do início do último quarto e anunciou: “Esse é o seu momento. Dê um show na quadra e divirta-se”. Cinco bolas de três pontos de Klay Thompson depois, recorde individual de bolas de três num jogo de Playoff quebrado, a volta da defesa sufocante do Warriors e dos erros do Thunder, e o que tínhamos contrariava todas as previsões: na noite de segunda-feira, veremos um Jogo 7.

Até o último período, o Thunder estava mostrando o motivo de ter deixado o Spurs pra trás e ter chegado a liderar a série contra o Warriors por 3 a 1. Russell Westbrook tem a incrível capacidade de transformar qualquer rebote em contra-ataque, pegando a defesa desprevenida e deixando o time adversário paranoico, porque qualquer erro, qualquer rebote perdido, vira uma bandeja do outro lado. No segundo quarto, Stephen Curry – líder em aproveitamento de lances livres na temporada regular, com 90.8% – errou DOIS lances livres seguidos, e o último virou cesta para o Thunder em menos de 4 segundos:

 

Steven Adams dominou mais uma vez os rebotes de ataque, destruindo o ritmo de ataque do Warriors, e dessa vez também pressionando Andrew Bogut, cavando faltas e punindo a defesa adversária com um pick-and-roll curto toda vez que havia ameaça de dobra em Durant ou Westbrook. Uma dessas punições foi essa enterrada em cima de Draymond Green que atingiu 7 graus na escala Richter:

Enes Kanter voltou a ser utilizado contra o time reserva do Warriors, se aproveitando da ausência de Bogut e Draymond Green, e punindo Marreese Speights improvisado como pivô do segundo escalão. Ibaka teve excelente partida defensiva, protegendo Adams na defesa de cobertura e não deixando que o Warriors atacasse a cesta com a facilidade do Jogo 6. Andre Roberson jogou ainda mais agressivo do que no resto da série, fazendo cortes para a cesta ao invés de dormir na zona morta, gerando bandejas nas costas da defesa do Warriors, rebotes de ataque e um melhor espaçamento para os arremessos de meia distância de Durant e Westbrook ao invés de abrir caminho para as infiltrações forçadas da dupla. Isso contribuiu para que Westbrook tivesse 11 assistências e apenas um desperdício de bola em meados do terceiro período, depois de um primeiro tempo em que nem ele e nem Durant perderam a bola uma única vez. Mesmo não tendo um aproveitamento grande nos arremessos, o Thunder acabou o primeiro tempo com 30 pontos feitos dentro do garrafão, usando rebotes de ataque, cortes secos, infiltrações e contra-ataques. Depois de alguns arremessos certos de Stephen Curry, Kevin Durant assumiu sua marcação e forçou o armador a infiltrar, inviabilizando seus arremessos saindo de corta-luz ou via drible, por cima da defesa. Em outros momentos, Durant defendeu Curry na cobertura, exigindo que o armador desse um arremesso contestado ou passasse a bola dentro do garrafão, algo que o Warriors faz com frequência e que o Thunder, melhor do que ninguém, sabe transformar em roubos e contra-ataque.

 

Os grandes trunfos do Warriors no Jogo 6 foram bastante minimizados por respostas inteligentes do Thunder: Roberson e Westbrook passaram mais tempo no garrafão, atrapalhando os rebotes de defesa de Bogut, e o time jogou mais alto para dominar o garrafão contra Speights e os reservas do Warriors. Tirando um ou outro erro de marcação na transição defensiva – que eventualmente deixou o Westbrook louco gritando com seus companheiros – o Thunder fez tudo aquilo que deveríamos esperar para a vitória.

Mas depois de acertar uma única bola de três pontos no primeiro quarto, Klay Thompson CHOVEU bolas de três no restante do jogo. Foram outras DEZ, várias delas dentro do plano tático do Warriors para o jogo, várias feitas de pura necessidade graças à forte defesa do Thunder, e várias COMPLETAMENTE IDIOTAS, bolas de três que ninguém em sã consciência deveria arremessar. Acho que vale a gente assistir à CHUVA e comentar uma a uma as onze bolas de três de Klay Thompson:

Bola 1: um corta-luz de Bogut força Steven Adams a contestar o perímetro, chegando atrasado. Esse é o plano para tirar o garrafão do Thunder de perto do aro, mas que muitas vezes é frustrado porque Durant consegue se esticar e alcançar o arremesso, ou simplesmente porque as bolas não caem.

Bola 2: mais um corta-luz do Bogut, mais uma jogada com Klay Thompson sendo marcado por Steven Adams. É que dessa vez Roberson luta contra o corta-luz e quase chega na bola, forçando Klay a dar um passo para o lado e tornando o arremesso mais difícil.

Bola 3: uma bola que o Warriors faz com frequência, com Curry acionando Klay perto da zona-morta, mas Durant é tão INCRÍVEL na defesa do Curry que Dion Waiters não precisa se preocupar em cobrir uma infiltração, ficando no cangote do Klay Thompson o tempo inteiro. É por isso que ao receber a bola, Klay não sabe se dá o arremesso ou não, hesita um pouco, e por fim tenta o arremesso mesmo contestado. Não dava pro Thunder ter defendido melhor do que isso.

Bola 4: arremesso de três pontos clássico do Warriors em contra-ataque, mas ao invés de ficar na zona morta, Klay Thompson fica na diagonal com Andre Iguodala na zona-morta, o que atrai Serge Ibaka por tempo suficiente para o arremesso. A maior parte da responsabilidade por Klay sobrar livre é que Curry recebe marcação dupla correndo no contra-ataque, por medo de que ele arremesse do meio da quadra.

Bola 5: um arremesso rápido em cima de Andre Roberson, quando o Thunder achava que o arremesso sairia do Curry no corta-luz. Ainda assim, a defesa do Thunder é muito boa e o arremesso é contestado.

Bola 6: um arremesso em cima do Russell Westbrook, que levou um segundo a mais para se decidir sobre a troca de marcação no corta-luz, com um passe do Bogut no garrafão. Westbrook até está perto e isso força Klay Thompson a arremessar rápido, mas é um raro arremesso não contestado.

Bola 7: aqui Klay Thompson já está quente, muito quente, e só correr para fora do garrafão recebendo marcação simples é suficiente para ele achar que tem espaço para arremessar. Dion Waiters leva meio segundo para saber se houve troca de marcação na cobertura para que ele possa sair no Thompson, mas chega a tempo de contestar o arremesso.

Bola 8: uma bola muito parecida com a anterior, com troca de marcação do Thunder, em que Durant está lá para contestar o arremesso meio segundo tarde demais. Nesse ponto, dar uma distância mínima para Klay Thompson já é espaço demais.

Bola 9: falha defensiva do Russell Westbrook, que não acompanhou a rotação depois do rebote de ataque e Klay tem o bloqueio do Bogut para criar muito, muito espaço para o arremesso.

Bola 10: marcado de perto por Westbrook, dois passos pra trás da linha de três pontos, de frente para o aro, QUEM RAIOS arremessaria essa bola? Ela não faz absolutamente nenhum sentido, mas é o que costuma se chamar na NBA de “heat check”, uma bola “teste” que você arremessa para saber se tudo que você tacar para cima vai acabar entrando na cesta contra todas as leis da física e o bom senso. O fato de que essa bola entrou é um banho de água fria na defesa do Thunder que tem sido excelente na maior parte dos outros arremessos, um atestado de que às vezes você faz tudo certo, mas dá tudo errado.

Bola 11: uma bola que muitos criticam no Warriors, herança do Suns de Mike D’Antoni, e que parece um arremesso de três forçado ou aleatório mas NÃO É. No contra-ataque, Klay Thompson corre para a linha de três enquanto a defesa do Thunder, toda trocada, precisa defender o caminho para a cesta. Arremessando rápido, Klay tem mais tempo – e uma marcação mais atrapalhada – do que provavelmente teria trabalhando uma jogada mais cuidadosa ao longo de 24 segundos, e ainda tem a vantagem de que a confusão defensiva aumenta as chances do Warriors de um eventual rebote de ataque. Durant tenta contestar o arremesso, mas ele precisa correr do garrafão para o perímetro e, claro, não dá tempo.

O antigo recorde de bolas de três nos Playoffs eram nove, então Klay o deixou para trás com folga. Cinco delas foram só no quarto período, com a única bola errada dele vindo no minuto final, quando o Warriors já havia virado o placar e vencia por 3 pontos. Por um tempo, foi A Chuva de Klay Thompson que manteve seu time no jogo, aproveitando-se do fato de que as bolas de períemtro do Thunder não caíram. Ao todo, o Thunder acertou 3 de 23 bolas de três, enquanto só Klay Thompson converteu 11 de 18 – com mais uma ajudinha de Curry, Draymond Green e Harrison Barnes, foram 21 convertidas para o Warriors em 44 tentativas. Mas no final do jogo – AQUELES últimos 5 minutos que despencaram as chances de vitória do Thunder de 90% para ZERO – tivemos A Chuva acompanhada por aquela enxurrada defensiva que o Warriors ficou tão famoso por impor aos seus adversários na hora de fechar jogos.

Na temporada regular, o Warriors entrou várias vezes no terceiro ou quarto períodos vencendo por poucos pontos ou até mesmo atrás no placar, para então emplacar uma defesa SUFOCANTE e levar a vantagem para a casa dos 20 em poucos minutos. Essa defesa, em geral praticada pelo temível “Quinteto da Morte”, intercepta passes, força desperdícios, troca em todo corta-luz, faz parecer que há espaço no garrafão para então surgir alguém correndo e bloquear assistências ou infiltrações no meio. Contra o Thunder não havíamos visto ainda essa defesa funcionar, mas com Stephen Curry, Klay Thompson, Andre Iguodala, Harrison Barnes e Draymond Greem, o Warriors resolveu colocar sua formação baixa em teste mais uma vez. O Thunder, bem sucedido na série usando uma formação igualmente baixa para encarar o quinteto diminuto rival, resolveu colocar Ibaka como pivô e bater de frente.

É cena de filme de samurai: o combate final, embaixo de chuva (de bolas de três pontos do Klay Thompson, claro), e os dois oponentes quem se sai melhor na lendária técnica (do small ball basquetebolístico). Apenas um sairá vivo. Mas com o peso dA Chuva e a primeira liderança do Warriors no placar, a formação baixa do Thunder teve que encarar uma adversidade que não encarou na série até agora. Na temporada regular, vimos a equipe de Oklahoma ter muitas dificuldades para encerrar partidas, tudo porque há pouca movimentação ofensiva e muitos desperdícios de bola, fatais nos minutos cruciais. Mas nesses Playoffs, o time parecia ter mais variação, uma defesa que compensava os erros e construiu vantagens que tornaram os minutos finais desnecessários. Na noite de ontem, os velhos hábitos voltaram à tona: o Thunder teve dificuldade para fechar os últimos minutos, o ataque pareceu estagnado, e o small ball do Warriors finalmente venceu seu gêmeo maligno na primeira situação de conforto que encontrou nessa série, vendo o medo do adversário e fazendo-o cometer turnovers sem parar. Depois de Westbrook e Durant terem cometido apenas 1 desperdício no primeiro tempo, acabaram o jogo com 8 – SEIS deles nos últimos três minutos, QUATRO deles só nas mãos de Westbrook nos 1:40 min finais do jogo.

O primeiro sinal da INUNDAÇÃO defensiva que AFOGOU o Thunder foi a três minutos do fim, quando Durant forçou caminho em cima de Iguodala, que fez uma marcação impecável, e recebeu marcação dupla de Stephen Curry, precisando abrir mão do arremesso e passar a bola para o garrafão – algo que o small ball do Warriors pune interceptando sempre. O resultado disso é uma bola de três pontos livre de Stephen Curry:

 

O segundo sinal foi Westbrook tendo que forçar uma infiltração contra Iguodala porque não tem NINGUÉM se mexendo no ataque, e Iggy defende tão bem que Westbrook se desequilibra, vira de costas, tem a bola roubada quando tenta criar um arremesso, e esse roubo de bola vira o passe para a décima primeira bola de três do Klay Thompson no contra-ataque, que coloca o Warriors em definitivo na frente do placar.

 

Na jogada seguinte, Durant faz um trabalho defensivo impecável na infiltração de Curry e Westbrook faz o que sabe fazer: CORRE PRA FRENTE, pra tentar pontuar no contra-ataque. O problema é que Draymond Green toca o braço do Westbrook por trás, que se atrapalha e chuta a bola pra fora. Os árbitros até recorreram ao replay para garantir que a bola havia tocado no Westbrook antes de sair, mas não é permitido que mudem de ideia sobre a falta que não marcaram. Infelizmente, a defesa faltosa do Warriors na jogada passou impune, gerando mais um turnover para Westbrook.

 

Na jogada seguinte, o Thunder tem uma chance porque Klay Thompson erra sua primeira bola de três do quarto, mas Durant tenta SE LIVRAR da bola recuperada, talvez por pânico, talvez porque Westbrook seria mais recomendado para correr para o outro lado da quadra, mas o seu passe é tão imprudente que Westbrook mal tem chance de segurar a bola, ele a toca e imediatamente Draymond Green rouba a bola por trás, no meio da corrida para a transição defensiva.

 

Ali já era o fim. Westbrook ainda errou a reposição de bola na jogada seguinte, mas ali nem um milagre resolveria. Foi só para coroar os erros do armador, e o ataque estático do Thunder, no meio daquela inundação defensiva.

O Warriors simplesmente choveu na festa do Thunder, inundou tudo, estragou os minutos finais de festa depois de sobreviver o jogo inteiro por um triz, levou na correnteza o Thunder de volta ao seus piores medos da temporada regular, enquanto consolidou seu time mais baixo como capaz de fechar jogos importantes. Com isso, teremos um Jogo 7 com o Warriors decidindo em casa, o que deveria ser – levando em conta o histórico da temporada – uma vantagem enorme para os atuais campeões. O problema é que, vendo o milagre dA Chuva de Klay Thompson, esquecemos quão absurdamente rara e difícil ela foi de acontecer. Se o Warriors depender de outro fenômeno como esses, fica difícil imaginar que o Thunder não vença o jogo. Por outro lado, é isso que Klay Thompson nos ensinou nessa partida: a acreditar no impossível. Para além de todos os clichés, esse será um Jogo 7 em que absolutamente qualquer coisa pode acontecer. Alguém ainda duvida, tanto do potencial do Thunder quanto da magia CLIMÁTICA que o Warriors pode fazer acontecer a qualquer momento?


RODADA DO DIA

Com o Cavs já classificado para as Finais da NBA, não teremos jogo nesse domingo! É hora de se preparar emocionalmente para o Jogo 7 de segunda-feira, 22h, na SporTV.


MOMENTO STAR WARS DO DIA

Depois da partida, Klay Thompson confessou uma das suas ferramentas para quebrar o recorde de bolas de três pontos num jogo de Playoffs: suas incrivelmente fantásticas e nerds MEIAS DO YODA.

Por isso parecia que o Klay Thompson não estava nem olhando para a cesta. Olhar é superestimado, o melhor é USAR A FORÇA. Não a bruta, de Russell Westbrook, mas a jedi, claro. “Vencer o Jogo 6 você deve, jovem padawan”!

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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