[Resumo da Rodada] Força nos números

As primeiras posses de bola da partida já mostraram qual era o plano de jogo de cada equipe: Draymond Green deu o primeiro arremesso de três pontos da noite completamente livre, fruto de um Cavs preocupado em caçar Stephen Curry e Klay Thompson através de todo corta-luz e ainda garantir os rebotes no garrafão; do outro lado, Kevin Love acertou a primeira bola de três pontos em cima do próprio Draymond Green, mostrando o comprometimento do Cavs em torná-lo relevante no ataque para disfarçar seus notórios problemas defensivos. Poucos segundos depois, Love não conseguiu impedir que Bogut recebesse uma bola quase embaixo da cesta para um arremesso fácil. Compensou pontuando do outro lado. Num jogo em que as limitações das duas equipes são amplamente conhecidas, com um Cavs exposto inúmeras vezes na temporada regular e um Warriors desnudado pelo Thunder, a tônica é ver quem consegue compensar melhor as deficiências e quais ajustes táticos podem expor ainda mais o adversário. Nesse nível não é mais possível esperar que as equipes joguem um basquete perfeito: a graça está, pelo contrário, em como as imperfeições serão trabalhadas e camufladas ao longo da série.

Contra a defesa espetacular do Thunder, vimos o Warriors colocar Klay Thompson e Stephen Curry para arremessar do perímetro em cima dos jogadores de garrafão adversários, mais lentos e com dificuldade para contestar cada bola. No Cavs, Kevin Love parece o alvo óbvio para sofrer arremessos na cabeça, graças à sua dificuldade na defesa e sua presença frequente na marcação de perímetro. Além dele, Tristan Thompson tem baixa velocidade lateral e Kyrie Irving tem problemas para contestar arremessos. Explorar esses três jogadores, fundamentais para o esquema tático do Cavs, é essencial para tornar o jogo um cabo de guerra: expostos na defesa mas necessários no ataque, o Cavs precisa decidir onde colocá-los em quadra e quando é melhor deixá-los no banco. Por isso, não foi surpresa nenhuma quando Klay Thompson forçou um arremesso na transição, mais de um passo para trás da linha de três pontos, em cima de Kyrie Irving. A bola não entrou, mas ela mostra um plano de jogo e coloca medo no Cavs a cada vez que a dupla de jogadores se encontrar.

A escolha do Cavs para lidar com esses problemas defensivos foi bastante interessante. Pra começar, Tristan Thompson não foi marcar o perímetro em nenhuma troca defensiva, ficando sempre entre a linha de três pontos e o garrafão, bloqueando o caminho para a cesta de eventuais infiltrações, mesmo que os arremessadores do Warriors ganhassem com isso alguns segundos a mais para arremessar. Além disso, Kyrie Irving foi sendo escondido na defesa em jogadores fora da bola: quando marcou Stephen Curry, foi apenas porque no primeiro corta-luz teríamos LeBron James fazendo a mudança e Irving assumindo outro jogador livre, em geral Harrison Barnes. E por fim, Kevin Love FOI PRA LUTA e marcou o perímetro com agressividade, colocando o seu corpo o mais perto possível dos arremessadores do Warriors, para forçá-los a contornar Love e darem de cara com Tristan Thompson ou LeBron James na cobertura.

Vejam no vídeo abaixo como Love assume Curry depois do corta-luz, marca o armador de perto e consegue desviar a bola, forçando Curry a recomeçar a jogada na quadra de defesa. É que Love se EMPOLGA e tenta roubar a bola pulando no chão, o que permite a Curry voltar para o ataque sem marcação.

LeBron deixa Draymond Green livre para se posicionar no caminho de Curry, permitindo a Green arremessar – o que certamente não é ideal, mas dentre os males que o Warriors aflige aos adversários, é certamente o menos pior. É que Green acaba passando a bola e dando uma ponte-aérea para Bogut porque é esperto. A jogada pode até ter dado errado para o Cavs, mas a defesa do Love foi a melhor coisa que se pode fazer em trocas no perímetro contra Curry e Klay Thompson.

Do outro lado, Kevin Love teve facilidade em pontuar em cima dos defensores menores, tanto dentro quanto fora do garrafão, e já nos primeiros minutos de jogo começou a receber uma “defesa sanduíche”.

[image style=”” name=”on” link=”” target=”off” caption=”Sanduíche de amor”]http://bolapresa.com.br/wp-content/uploads/2016/06/Love-sanduíche.jpg[/image]

Com Curry na frente impedindo passes frontais picados e Draymond Green atrás para contestar os passes por cima, o plano de impor Kevin Love no começo do jogo foi dificultado e quem fica livre no processo é Tristan Thompson, que não possui um arremesso decente de meia distância e nem passa a bola bem de dentro do garrafão. O Warriors desafiou o pivô do Cavs a fazer algo sozinho, o que não aconteceu. Esse sanduíche se tornou uma marcação dupla descarada quando Love passou a receber a bola no perímetro, forçando o jogador a acionar seus companheiros ou chutar por cima de marcação fechada.

Enquanto tudo isso acontecia, o Warriors conseguiu algum ritmo com Harrison Barnes batendo para dentro do garrafão em cima de Kyrie Irving, que virou alvo na defesa já que Love fez bom trabalho defensivo. O Cavs, do outro lado, conseguiu se manter perto no placar com LeBron James infiltrando, se aproveitando do espaço que Love criou ao receber marcação dupla. Lembram que Stephen Curry arremessava na cara de Steven Adams toda vez que era marcado pelo pivô no perímetro? É muito divertido ver como LeBron, ao ser marcado por Andrew Bogut, tem a reação oposta: bate pra dentro e encara a trombada.

No vídeo acima, ao tentar infiltrar, LeBron encontra Bogut, atrai o pivô para fora do garrafão e depois parte para cima dele, errando a cesta mas gerando um rebote de ataque fácil para Tristan Thompson. Foram 8 pontos para LeBron James em situações similares no primeiro quarto, e se o Cavs perdeu o período por 4 pontos foi apenas porque errou muitas transições defensivas, especialmente com Tristan Thompson tomando algumas bolas nas costas por se preocupar demais com a cobertura de alguém no perímetro.

No segundo quarto, o Warriors optou por não colocar todos os seus reservas de uma vez, ao contrário do que vimos acontecer contra o Thunder. O banco foi acompanhado ora por Stephen Curry, ora por Draymond Green, de modo a manter o espaçamento da quadra e a armação funcionando. Do outro lado, Kevin Love e LeBron James também acompanharam os reservas do Cavs, para tentar manter o ritmo. Vejam no vídeo abaixo como o simples fato de LeBron estar do lado de Love confunde a marcação dupla do Warriors: a ordem é dobrar em Love, mas LeBron está infiltrando demais, de modo que Draymond Green ameaça, ameaça e por fim desiste, permitindo que Love arremesse por cima de Harrison Barnes:

Como Curry foi perseguido o tempo inteiro por LeBron James – podem esperar um post especial para os assinantes até domingo só com uma análise tática dessa perseguição muito doida – tivemos três resultados bizarros. O primeiro foi que Stephen Curry teve dificuldade demais de arremessar e de infiltrar, tendo provavelmente sua partida mais difícil desses Playoffs e tendo pouco impacto direto no jogo. O segundo foi que as rotações defensivas do Cavs, que precisaram se ajustar para que LeBron sempre terminasse as séries de corta-luz ainda em Curry, errou DEMAIS, fazendo com que várias vezes Curry sobrasse com dois defensores, fazendo com que alguém do Warriors ficasse livre por uns segundos para cestas fáceis. E o terceiro resultado foi que o Warriors se saiu melhor por longos períodos de tempo sem Curry em quadra, ou com ele abrindo mão da armação e dos arremessos. Shaun Livingston veio do banco de reservas e simplesmente arremessou POR CIMA da marcação do Cavs, porque ele é surrealmente longo, fazendo trocentos arremessos de média distância e jogando de costas pra cesta. Leandrinho, pouco marcado, aproveitou para arremessar da zona morta ou bater para dentro contra a defesa do Cavs em movimento. O brasileiro chegou a marcar 7 pontos seguidos no segundo quarto, forçando o Cavs a colocar todos os titulares antes do que o planejado. Mas como o banco estava dando conta, bagunçando o plano defensivo do Cavs, e Andre Iguodala conseguiu tornar a vida de Love e LeBron um inferno, os titulares do Warriors jogaram bem menos do que estão acostumados: Curry, perseguido, jogou 35 minutos na partida (incluindo uns minutos de garbage time, quando o jogo não valia mais nada); Klay Thompson, sofrendo com a defesa do Cavs e errando alguns arremessos bem livres, não jogou sequer 25 minutos.

Para o Cavs, o jogo deve ter sido muito confuso: a defesa estava CLARAMENTE funcionando, até que em momentos cruciais algum erro dava uma cesta fácil para o Warriors. Aí a defesa voltava a funcionar MUITO BEM, até que os reservas do Warriors entravam em quadra e o desenho tático defensivo não dava conta deles. Kevin Love sofreu marcação dupla, algo que o Cavs não esperava, e com isso LeBron e Irving tiveram espaço para infiltrar, mas JR Smith não conseguiu dar um arremesso sequer até o segundo tempo graças à defesa de perímetro do Warriors, de modo que o ataque do Cavs caiu na cilada de se tornar estático, focado no mano-a-mano e nas infiltrações. E o mais bizarro para o Cavs: o contra-ataque, arma fundamental da equipe, se tornou um tiro pela culatra. Draymond Green fez um trabalho EXEMPLAR de transição defensiva para impedir as infiltrações de LeBron no contra-ataque, fosse ficando em sua frente e forçando faltas de ataque, fosse perseguindo LeBron e roubando a bola por trás. Isso forçou o Cavs a diminuir a velocidade do jogo, e LeBron passou a parar os contra-ataques no perímetro para arremessar de três pontos. Quando acertou um par dessas bolas e Kyrie Irving começou a encontrar espaço para infiltrar na marra, o Cavs até mesmo conseguiu a liderança no placar a 4 minutos do final do terceiro quarto. Méritos do Cavs que num jogo muito fora do esperado soube se aproveitar daquilo que lhe foi dado, compensando a forte defesa recebida no perímetro para bater para dentro, acionar Tristan Thompson em pontes-aéreas e conseguir alguns rebotes de ataque – além, claro, de moder na defesa. Olha a marcação em cima de Curry, após um erro no armador no contra-ataque, que gerou uma falta-e-cesta de Kevin Love do outro lado:

Mas assim que os reservas voltaram para a quadra no final do terceiro e começo do quarto período, a liderança do Cavs não resistiu. Livingston teve 20 pontos no jogo e o fato dele não jogar no perímetro e nem passar por vários corta-luz colocou a defesa do Cavs em curto-circuito. Quando ele atraiu mais atenção defensiva, Harrison Barnes continuou seu plano de infiltrar em cima do Irving. Tentando estancar o sangramento, sendo bizarramente dizimados pelos reservas, o Cavs cometeu erros bobos e tanto Kevin Love quanto LeBron James erraram bandejas fáceis. LeBron continuou arremessando bolas de 3 pontos na transição, bolas em que ele tem o seu PIOR aproveitamento, e que o Warriors comemora quando acontecem. Por fim, pra coroar o desempenho do banco de reservas, o Warriors colocou o seu “quinteto da morte” em quadra, sem pivô, e o Cavs resolveu contra-atacar com um quinteto também baixo, com apenas Kevin Love no garrafão. Resultado: o Cavs foi destroçado. Da liderança no meio do terceiro período até o jogo estar inteiramente perdido no meio do quarto período, o Cavs simplesmente não soube o que fazer: não conseguia arremessar de três pontos, não conseguia contra-atacar, não sabia defender os reservas do Warriors e parar Stephen Curry e Klay Thompson não ERA SUFICIENTE.

Ao menos na parte tática, minha sensação foi de que o Cavs fez um excelente trabalho naquilo que era mais preocupante: tirou as maiores armas ofensivas do Warriors, LeBron James deu um espetáculo de rotação defensiva, Kevin Love mostrou que não precisa ser um fardo defensivo e reagiu bem à marcação que sofreu. O problema foi que esse excelente trabalho veio ao custo de erros na defesa de transição, companheiros não acompanhando a movimentação defensiva de LeBron, e TODO UM ELENCO DE APOIO do Warriors aparecendo para jogar e acabando com o jogo. O banco de reservas do Warriors marcou QUARENTA E CINCO pontos contra apenas dez do banco do Cavs. É aquela tal de “força nos números”, uma expressão comum em inglês para aqueles zé ruelas que se sentem poderosos quando estão no meio de um bando de amigos, e que Steve Kerr usou como mote da equipe. É possível esperar que o Cavs arrume as falhas defensivas e cause muito mais sufoco nas próximas partidas? Sem dúvidas. Mas é difícil imaginar o Cavs – ou qualquer equipe da NBA nesse momento, para falar a verdade – parando TANTAS ARMAS OFENSIVAS desse elenco do Warriors. Por isso ainda acho que a solução para o Cavs é vencer lá do outro lado da quadra, pontuando com mais constância e encontrando espaço para bolas de três pontos. Será possível?


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O próximo jogo das Finais da NBA é no domingo, às 21h, na ESPN!


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O que Steve Kerr acha de perder a liderança no terceiro período em casa? KARATÊ KERR:

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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