[Resumo da Rodada] O dia dos defensores

Já é tradição: ontem teve jogo nos Playoffs da NBA, então hoje tem Resumo da Rodada pra gente comentar o que aconteceu! E não deixem de comparar com nosso Preview para saber o que foi diferente do esperado!

Começamos com Rockets e Thunder, o “duelo dos candidatos a MVP” e a dúvida de como cada equipe iria fazer para barrar a mega-estrela adversária. Em poucos minutos, a escolha do Rockets ficou evidente: Patrick Beverley grudado em Westbrook sempre que possível, um outro jogador de perímetro pronto pra dobrar em qualquer infiltração e o garrafão inteiro se amontoando para ficar entre Westbrook e a cesta. O resultado foi que Westbrook rapidinho percebeu que André Roberson estaria completamente livre para arremessar no perímetro toda vez que recebesse a bola. A pegadinha? André teve 17% de aproveitamento em bolas de três pontos em jogos da temporada fora de casa, como era o caso do jogo de ontem. Ainda assim, Westbrook teve que confiar em seus companheiros e nos seus arremessos de fora porque o Rockets resolveu priorizar o garrafão e não dar espaço nenhum para infiltrar.

Quando André Roberson acertou seus 3 primeiros arremessos de três pontos, parecia que ia dar tudo errado para o time da casa. Mas a longo prazo, valeu a pena: Roberson hesitou em todas as bolas, voltou a errar no quarto decisivo (terminou com 4 de 6 arremessos de três pontos), Westbrook ficou visivelmente desconfortável e o time não entrou num ritmo de ataque a partir do segundo quarto. Parte da responsabilidade foi também do trabalho de rebotes primoroso do Rockets, que colocou seus pivôs para protegerem o garrafão nos rebotes defensivos e atacar agressivamente os rebotes de ataque, forçando o Thunder a ter que lutar pelos rebotes ao invés de poder correr para o contra-ataque loucamente como gostam de fazer. Foi praticamente o Rockets e Thunder do Mundo Bizarro, com o Rockets tendo o dobro de rebotes ofensivos e de pontos de segunda chance do que o Thunder – e não conseguindo acertar suas bolas de três pontos, o oposto do que esperávamos para a partida.

E quando Westbrook conseguiu forçar um contra-ataque, infiltrar agressivamente e tentar impor seu jogo fisicamente, lá estava um insano Patrick Beverley pra enlouquecê-lo. Rolou de tudo: Beverley cavou faltas de ataque, roubou 2 bolas e perseguiu Westbrook até contra o CORTA-LUZ DA MORTE™ de Steven Adams.

O mais legal foi o Beverley ter MORRIDO na jogada e depois voltado dos mortos em plena Páscoa batendo no peito e fazendo sinal de joinha. Pra completar a partida fantástica, ainda pegou 10 rebotes (já que os pivôs do Rockets estavam ocupados com os pivôs gigantes do Thunder) e ainda acertou 4 bolas de três rumo aos 21 pontos, recorde dele em Playoffs. Detalhe: acertar as bolas de três pontos deixou ele PIRADO, num ponto em que ele não conseguia parar de TESTAR SUA MANDÍBULA.

A atuação do armador foi tão absurda que ele virou “trending topic” no Twitter, mesmo que todo mundo tenha escrito o nome do coitado ERRADO:

Do outro lado da quadra, o Thunder optou por deixar sempre alguém na frente de James Harden o tempo todo, mas não podia de jeito nenhum deixar espaço para os outros arremessadores do Rockets. Então em todo corta-luz, o Thunder trocava a marcação para alguém continuar no mano-a-mano com o armador. O resultado foi desastroso para a equipe de Oklahoma: o Rockets metodicamente colocou o Barba (37 pontos, 9 assistências) contra os pivôs do Thunder, de modo que ele pudesse arremessar livremente após alguns dribles em cima de Steven Adams ou então infiltrar em cima da PÉSSIMA defesa de Enes Kanter. Olha que dó do Kanter chegando a virar DE COSTAS para o Harden no meio de um drible:

Kanter não conseguiu defender Harden no perímetro e ao tentar cobrir as infiltrações de Beverley, deixou Capela livre para três enterradas seguidas. Na terceira, deu pra ver na transmissão o técnico do Thunder, Billy Donovan, dizendo claramente “não dá pra usar o Kanter”.

A primeira partida entre as duas equipes foi uma vitória tática colossal para o Rockets e mostrou que o principal especialista em defesa da equipe pode muito bem ser a estrela da série. Pode ter certeza de que a próxima vez que Westbrook (6 arremessos certos em 23 tentativas e 9 turnovers) se olhar no espelho, vai achar que está sendo seguido por Beverley:


Da mesma maneira que Patrick Beverley foi a estrela inesperada em Houston, Draymond Green brilhou na primeira partida entre Warriors e Blazers. A princípio parecia que o Blazers seria capaz de jogar de igual para igual com os ex-campeões, principalmente graças à atuação fora de série de CJ McCollum. Contra marcação basicamente individual, McCollum forçou infiltrações, derrubou defensores, converteu arremessos desequilibrados e bolas com uma só mão em transição por cima dos marcadores. Foram 27 pontos só no primeiro tempo e quando a defesa do Warriors resolveu reagir de acordo, tentando manter um jogador em sua cobertura, Damian Lillard começou a tentar arremessos nesse espaço que estava sobrando, mesmo que eles fossem BEM LONGE da linha de três pontos, para forçar a defesa a cobri-lo. Quando o primeiro tempo terminou empatado entre as duas equipes, a sensação era estranha: por um lado, os dois armadores do Blazers pareciam imparáveis; por outro, a atuação épica dos dois não foi suficiente para terminar na frente do placar em um dia perfeitamente COMUM para o Warriors.

Depois de mais um terceiro quarto empatado, com Lillard sendo obrigado a forçar mais arremessos difíceis sob marcação de Iguodala com o Warriors usando Draymond Green quase exclusivamente em McCollum, parecia que se o jogo chegasse ao final naquele mesmo grau de emparelhamento, um dos dois armadores da equipe de Portland poderia conseguir um arremesso decisivo e escapar com a vitória. Mas aí a defesa do Warriors, movida a Draymond Green, simplesmente foi demais para o Blazers lidar. Primeiro teve esse toco surreal em Noah Vonleh, com direito a TESTE DE MANDÍBULA no estilo do Beverley:

Depois teve esse toco no Lillard vindo na cobertura, com direito a “não, não” do Mutombo que depois virou um aceno de náufrago rumo a aviões, talvez por medo de tomar uma falta técnica:

E aí de repente já estava todo mundo gritando, pulando e tremilicando enquanto Draymond Green tinha 5 tocos, 3 roubos de bola, 12 rebotes, 9 assistências, 3 bolas de três pontos em 4 tentativas, 19 pontos e seu time fez 15 pontos a mais do que tomou enquanto ele esteve em quadra. Curry (29 pontos) e Durant (32 pontos) tiveram boas partidas, mas foi Draymond Green quem se certificou de que 34 pontos para Damian Lillard e QUARENTA E UM pontos para CJ McCollum não seriam suficientes para uma vitória do Blazers porque no momento em que mais importa o aro está fechado. Difícil imaginar que o Blazers terá outra partida como essa em que sua dupla de armadores somará 75 pontos, e o pior é admitir que nem isso é o bastante. E agora?


Wizards e Hawks até teve trombadas e gritaria no estilo de Beverley e Draymond Green, foi um jogo físico e brigado, mas também foi a princípio uma das partidas mais FEIAS que já vi numa pós-temporada. O Wizards estava decidido a jogar com mais velocidade e intensidade do que o rival, correndo para o ataque, perseguindo todo mundo na defesa, infiltrando mesmo quando NÃO FAZIA SENTIDO e se jogando em todas as bolas, rolando no chão quenem criança. O problema é que essa intensidade não é exatamente eficiente, produtiva e muito menos VISUALMENTE AGRADÁVEL. Do outro lado, o Hawks passou o primeiro quarto rodando a bola sem conseguir criar espaços contra uma defesa exageradamente ativa do Wizards e, sem ter muito mais o que inventar, se resignou a forçar arremessos tolos de três pontos e a dar a bola para Paul Millsap forçar infiltrações na marra para cavar faltas.

Isso levou o Hawks a ter 21 desperdícios de bola na partida – mais do que assistências, que foram apenas 18! Mas o Wizards não foi muito melhor porque ninguém conseguia acertar um mísero arremesso: foram 8 arremessos convertidos em 28 tentativas de três pontos. Some a isso o fato de que o Hawks bateu QUARENTA lances livres e dá pra imaginar o motivo dos meus olhos terem SANGRADO nessa partida.

E isso porque nem mencionei que o primeiro tempo foi provavelmente o pior que eu já vi Dwight Howard jogar em sua carreira. Em 15 minutos acertou apenas um de 5 arremessos tentados, tomou 2 tocos, errou todas as movimentações ofensivas e defensivas, foi ignorado pelos seus companheiros até quando fez corta-luz e o Hawks tomou 11 pontos a mais do que fez enquanto ele esteve em quadra, número que ele conseguiu dobrar até o fim do jogo. Sem ele, com Ilyasova e Mike Muscala, o Hawks se saiu muito melhor simplesmente porque os dois estavam dispostos a se jogar nas bolas e não transformavam tudo que tocavam em cocô (o famoso TOQUE DE MERDAS™).

Na briga pra ver quem erra menos, o Hawks terminou o primeiro tempo 3 pontos à frente do placar. Mas no terceiro quarto John Wall finalmente acordou, tanto no ataque (que é o que se espera dele) quanto na defesa (que é o “desafio individual” que John Wall tem da equipe técnica), incluindo esse toco absurdo aqui:

Em 11 minutos no terceiro período, John Wall fez 15 pontos e mais 4 assistências em jogadas individuais, infiltrações improváveis e arremessos de três pontos contestados, que lhe renderam até o gesto de “sei lá o que está acontecendo” do Jordan. Dá pra ver tudo aqui nessa coletânea de melhores momentos:

Com 32 pontos e 14 assistências, Wall até nos fez esquecer de quão ruim foi o banco do Wizards, e colocou o time em uma outra marcha, um novo grau de intensidade suficiente para depois do jogo Paul Millsap reclamar que o Hawks havia jogado basquete enquanto o Wizards havia lutado MMA. De verdade, isso diz muito mais sobre o estilo preguiçoso de jogo do Hawks do que sobre os árbitros ou sobre a intensidade do Wizards, que foi alta mas nada absurda. A equipe de Atlanta vai ter que voltar para a série mais disposta a se sujar – o que provavelmente só vai deixar tudo ainda mais difícil de assistir. Já sei qual série não ver pra quando eu tiver que ir ao mercado.


O jogo restante foi o mais difícil de ver, não por ter sido mal jogado, mas por estar mergulhado num clima verdadeiramente triste. Isaiah Thomas perdeu sua irmã num acidente de carro fatal apenas um dia antes da partida contra o Bulls, de modo que ele estava verdadeiramente arrasado e sequer teve tempo hábil para estabelecer o luto.

Jogadores e comissão técnica correram para dar suporte ao armador, dando-lhe a escolha de participar ou não da partida inaugural contra o Bulls. Isaiah escolheu participar mas estava nitidamente baqueado: vê-lo se aquecendo com os olhos inchados ou chorando no minuto de silêncio em homenagem à sua irmã foi uma experiência difícil de assistir. Basquete é a mais importante das coisas desimportantes, mas perder um ente querido de maneira tão súbita, tão trágica e com apenas 22 anos é algo verdadeiramente importante, algo que precisa ser elaborado e ressignificado da melhor maneira possível. Entendo que o basquete pode ser uma fuga momentânea, como já foi para mim e para tantos de nossos leitores que compartilharam conosco experiências nesse sentido, mas uma perda tão brutal vasa por todos os lados para dentro desse ambiente de “fantasia” do basquete. Não apenas Isaiah Thomas como todos os seus companheiros e até mesmo os torcedores, que criam vínculos intensos com seus ídolos, estavam abalados demais para que o jogo pudesse prosseguir em sua normalidade.

Tendo dito isso, Isaiah Thomas foi sensacional: 33 pontos, 10 arremessos certos em 18 tentativas, 5 rebotes, 6 assistências e toda a velocidade e agressividade de que o time precisava. A parte mais doída é que não foi suficiente: Jae Crowder teve muito espaço mas não conseguiu converter seus arremessos, o banco do Celtics não conseguiu contribuir e tirando Isaiah Thomas, que converteu 10, os outros jogadores da equipe somaram míseros 3 lances livres convertidos. Ninguém conseguiu infiltrar, cavar faltas, forçar contatos, nada.

Enquanto isso o Bulls foi construindo seu espaço justamente na base do contato: pegando 20 rebotes ofensivos, convertendo mais lances livres e simplesmente compensando a quantidade VERGONHOSA de arremessos errados de todos os lugares da quadra, incluindo Wade errando uma enterrada completamente sozinho e Mirotic acertando apenas um de 10 arremessos tentados.

No último quarto, ter Robin Lopez e Bobby Portis para limpar o aro enquanto Jimmy Butler (30 pontos) marcava Isaiah Thomas e convertia arremessos difíceis acabou sendo suficiente contra um Celtics que não soube fazer nada que não passasse pelas mãos de seu armador principal.

Mas no fundo a derrota não importa. Se Isaiah Thomas fez questão de jogar a partida – algo que ainda não se sabe se ele fará novamente no próximo confronto entre as duas equipes – não foi pela vitória, mas pela sensação de que o mundo do basquete é uma família disposta a consolá-lo. A reação da torcida de Boston ao armador foi das coisas mais bonitas que já vimos no esporte. Fiquemos com essa imagem para lembrar que na vida o placar não importa:

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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