[Resumo da Rodada] O ‘jogo do dentista’

Quem achou que o “jogo do dente” de Isaiah Thomas foi impressionante, com 33 pontos e 9 assistências na partida em que teve seu dente arrancado ainda no primeiro período, é porque não viu o “jogo do dentista” de ontem, a partida de Isaiah Thomas após passar 4 horas num dentista no dia do jogo – e outras 6 horas em cirurgia dentária no dia anterior. Foi, se talvez não a melhor, a mais importante e impressionante partida da carreira do armador.

Mas como é comum para a estrela do Celtics, Isaiah guardou o que seu jogo tem de melhor para os minutos finais da partida. Ele foi o segundo colocado na temporada regular em pontos marcados em momentos de clutch (dois minutos finais das partidas, mais prorrogação, quando nenhum time possui uma vantagem de mais de 5 pontos). Seus 5.1 pontos de média nesses minutos cruciais ficaram atrás apenas dos 6.2 de Russell Westbrook, com a vantagem de que Isaiah tem um aproveitamento muito superior ao armador do Thunder: foram 48% de aproveitamento nos arremessos nessas situações ao longo da temporada, com 40% nas bolas de três pontos.

Só que mais uma vez parecia que o Celtics sequer iria chegar no quarto período com chances reais de se aproveitar do poder de decisão de Isaiah. Pela segunda vez consecutiva, o Wizards entrou em quadra parecendo um time de GIGANTES, muito maiores, mais rápidos e mais fortes do que a equipe de Boston. Nem Amir Johnson, dessa vez titular, conseguiu alterar a situação: sua falta de mobilidade parecia apenas criar corredores livres para John Wall infiltrar. Toda vez que o Celtics cometia um desperdício de bola (e foram 10 nos primeiros 12 minutos de jogo), lá estava Wall puxando contra-ataques fulminantes que não recebiam qualquer tipo de contestação. Só no primeiro quarto foram QUARENTA E DOIS PONTOS para o Wizards, 19 deles marcados por John Wall – fora as 6 assistências que ele também deu no período. Preocupado em fechar o garrafão nas infiltrações, o Celtics deixou que John Wall arremessasse à vontade na transição e se arrependeu amargamente conforme o armador acertava não apenas bolas de meia distância, mas também arremessos de três pontos.

O jogo só não foi perdido ali porque o Celtics estava acertando seus arremessos: Isaiah Thomas se aproveitou do fato de que o Wizards dobrava nele em todo corta-luz por apenas um segundo antes de cada defensor voltar para seu posicionamento pretendido e passou a esperar a movimentação defensiva do Wizards para infiltrar e arremessar em cima dos defensores em movimento, acionando Al Horford no garrafão quando contestado. Os 15 pontos de Thomas – mais da metade dos 29 do seu time no período – impediram que a diferença no placar ficasse irrecuperável.

Para o segundo quarto, o Celtics abriu mão do tamanho – chega uma hora em que você tem que admitir que o Wizards é simplesmente mais forte fisicamente do que você – e apostou numa defesa baixa, agressiva e sufocante. Vimos o mesmo quinteto defensivo do Jogo 1 assumir o fardo de reverter o placar, com Marcus Smart marcando múltiplas posições e apenas Isaiah Thomas sendo escondido na zona morta. Não restam dúvidas de que o Celtics melhorou nessas condições, mas o excesso de desperdícios de bola no ataque continuou alimentando o Wizards no segundo tempo. Um par de bolas de três pontos depois, o time de Washington já parecia estar no comando do jogo com uma vantagem de 14 pontos no placar.

A defesa agressiva e física do Celtics para compensar a falta de tamanho incita o Wizards a jogar ainda mais fisicamente, para impor seu tamanho. O resultado é que a série parece muitas vezes filme de pancadaria da Sessão da Tarde. No Jogo 1 tivemos o dente de Isaiah e a lesão de Markieff Morris ao pisar no pé de Al Horford. Nesse Jogo 2, antes do jogo sequer começar já estava rolando treta: como prometido, Markieff foi PERGUNTAR para Al Horford, pouco antes do tapinha inicial, se o pivô do Celtics havia colocado o pé de propósito. Os dois já entraram na partida batendo boca. Mais tarde, Isaiah Thomas tomou um capote que amoleceu o dente que ele havia acabado de restaurar, mesmo usando um protetor dentário. E no terceiro quarto, Isaiah e Otto Porter Jr. se deram uma cabeçada que acabou tirando o ala do Wizards de quadra com um nariz quebrado que jorrava mais sangue do que episódio dos Cavaleiros do Zodíaco.

No quarto período, todo mundo com o sangue quente e a água batendo na bunda do Celtics, chegou o momento de Isaiah Thomas pensar em todas aquelas horas horríveis no dentista e descontar tudo em quadra. Secou os desperdícios de bola, atacou a cesta, cavou faltas, converteu bolas de três pontos e acionou com precisão os companheiros quando a defesa do Wizards colapsava dentro do garrafão tentando pará-lo. A dois minutos do fim do jogo, uma bola de três de Isaiah seguida por um passe para uma bola de três de Terry Rozier empataram o jogo. Desesperado, o Wizards já estava trocando a marcação em toda corta-luz de Isaiah Thomas. Quando ficou frente-a-frente com Markieff Morris, deu um crossover daqueles que o adversário esquece até o nome da mãe e cravou o arremesso da virada, com direito a encarada enquanto voltava pra defesa:

O Wizards retomou a liderança no minuto final com uma bola de três pontos de Otto Porter, ainda meio sem nariz, mas Isaiah empatou imediatamente com dois lances livres. O Wizards teve a última posse de bola para vencer o jogo, mas a defesa do Celtics, fechando o caminho para a cesta, forçou um John Wall visivelmente cansado a um arremesso desequilibrado de longa distância que não cairia nem nos seus melhores dias. Era hora de prorrogação.

Com um minuto faltando no relógio do quarto período, tanto John Wall quanto Isaiah Thomas haviam marcado 40 pontos cada. Era um duelo épico, incrível, memorável, vale assistir os melhores momentos:

Mas o armador do Wizards, que jogou 47 minutos na partida, simplesmente se esgotou, enquanto Isaiah colocava o jogo no bolso. Foram 20 pontos para o armador do Celtics só no quarto período – e mais 9 na prorrogação, rumo a 53 pontos. Surreal.

Errando todos os arremessos que deu nos últimos 6 minutos de jogo, incluindo prorrogação, e tendo a bola roubada por Avery Bradley num drible banal no meio da quadra numa jogada crucial do tempo extra, John Wall acabou o jogo com aqueles mesmos 40 pontos – e mais uma derrota na série.

Isaiah Thomas teve o jogo da sua vida e contou com apoio considerável do resto da equipe, especialmente no setor defensivo e em arremessos cruciais, fosse para empatar o jogo no quarto período, fosse para diminuir a distância naquele primeiro quarto que parecia perdido. Enquanto isso, John Wall se sentiu bastante sozinho: Bradley Beal, bem marcado e com menos espaço para bolas de meia distância, acertou apenas uma das 9 bolas de três pontos que tentou e cometeu turnovers que impulsionaram o ataque do Celtics, especialmente no quarto período. Em Washington, o time não pode ser novamente o espetáculo de um homem só – afinal, o espetáculo de um homem só do outro lado parece mais eficiente, especialmente depois de ir ao dentista.


Na outra conferência, tivemos a primeira partida das semi-finais entre Golden State Warriors e Utah Jazz. O Warriors, que eliminou o Blazers em apenas 4 partidas enquanto o Jazz precisou de uma vitória no Jogo 7 contra o Clippers, passou OITO dias parado esperando por esse confronto. Se o descanso certamente é bem-vindo, especialmente no corpo combalido de atletas profissionais, por outro lado sempre reascende aquela velha história de que descansar seus jogadores demais quebra o “ritmo” da equipe e tira o foco necessário.

Mas assim que o jogo começou, ficou claro que o medo era infundado: o Warriors acelerou o ritmo de jogo a um ponto tal que qualquer rebote, em qualquer lugar da quadra, virava contra-ataque. Até jogadores “menores” do elenco, como Ian Clark, eram capazes de correr pra dentro do garrafão adversário enquanto a defesa do Jazz se atrapalhava inteira para acompanhar. Nos 30 minutos em que esteve em quadra, Klay Thompson praticamente não foi marcado em transição porque a defesa do Jazz não conseguia encontrá-lo no perímetro, preocupado com a imensidão de jogadores do Warriors correndo, cortando e infiltrando.

O Jazz resolveu apostar todas as suas fichas em Rudy Gobert, torcendo para que seu tamanho e poder defensivo atrapalhassem as infiltrações do Warriors e gerassem alguns rebotes de ataque, mas sua incapacidade de acelerar para defender em transição tornou a noite do Jazz um pesadelo. Jogando pouco em meia quadra, tomando decisões rápidas e se aproveitando da confusão defensiva, o Warriors cometeu apenas QUATRO desperdícios de bola no primeiro tempo e TRÊS no segundo, negando ao Jazz quaisquer chances de pontos de contra-ataque. O Jazz teve que jogar em meia quadra, com seu ataque metódico, lento e cadenciado, e que dá tempo para o Warriors tomar todas as decisões certas de rotação e cobertura. Gordon Hayward foi terrivelmente sufocado pela defesa; Gobert recebeu marcação forte e muitas vezes dupla; o resto do elenco foi desafiado a arremessar de fora e em velocidade, com uma defesa na cobertura surgindo sempre no horizonte. Se o placar nunca deslanchou, com o Jazz mantendo os quartos consideravelmente parelhos e a diferença no placar sempre na casa dos 10 pontos, foi porque a equipe de Utah conseguiu usar bem sua movimentação de bola e acertar os arremessos que conseguiu criar, especialmente com Gobert mostrando inusitada capacidade de passar a bola para o perímetro. Mas esses arremessos bons não aconteceram na quantidade necessária e, com exceção do ritmo aceleradíssimo na transição, o Warriors não precisou suar muito para manter a diferença conquistada ainda no primeiro quarto.

Ninguém no Jazz marcou mais de 13 pontos – marca de Gobert, cestinha da equipe – porque não existe caminho fácil e recorrente para a cesta, todos os arremessos devem ser trabalhados, criados e conquistados. Enquanto isso, Gobert, a grande força defensiva do Jazz – e possível “Melhor Jogador Defensivo” da temporada – se tornou um caminho fácil para o Warriors pontuar quando era levado para o perímetro em qualquer troca defensiva. O que Stephen Curry fez com ele na linha de três pontos é de chorar na calçada:

Olé, olé, olé

Não é à toa que desde o começo do jogo não dava pra saber se o técnico do Jazz, Quin Snyder, estava chamando jogadas do seu time ou se estava PEDINDO UM GORÓ, pra ver se esquecia esse desastre:

“Me dá um mé, por favor”

O Jazz até pode fazer melhor do que isso nos jogos futuros, mas o problema é que O WARRIORS TAMBÉM PODE. Não há pra onde correr. Fujam para as colinas!

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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