[Resumo da Rodada] Quando o impossível parece banal

Um Jogo 7 nas Finais da Oeste é um presente raro para os fãs de basquete: a última vez que isso aconteceu foi em 2002, quase 15 anos atrás. Ter o Warriors nessa situação depois de quebrar o recorde de vitórias numa temporada, e o Thunder depois de eliminar o Spurs com pompa e liderar as Finais de Conferência por 3 a 1 só tornaram esse presente ainda mais especial. Se Jogos 7 já são naturalmente imprevisíveis, o duelo de ontem tinha tudo para ser uma verdadeira terra de ninguém: ao longo da série vimos o Thunder atropelar jogos mas também perder uma larga vantagem nos 5 minutos finais; quintetos mais baixos ora dominarem, ora serem dominados por formações mais altas; estrelas decidirem mas também jogadores dos mais secundários mudando todo o confronto. Dava pra esperar qualquer coisa da partida de ontem, vitória de qualquer lado e nem mesmo lavadas seriam recebidas com estranheza. Como a partida se desenrolou então? Talvez a maior das surpresas: ao menos no primeiro tempo, não tivemos surpresa nenhuma.

O Jogo 7 seguiu praticamente à risca o mesmo roteiro do Jogo 6: OKC Thunder dominando na defesa, errando pouquíssimas transições, com má pontaria nos arremessos mas compensando com rebotes de ataque, Steven Adams controlando o garrafão, Andre Roberson mais próximo ao aro para ajudar nos rebotes ofensivos e Russell Westbrook transformando qualquer erro do Warriors em pontos de contra-ataque. Andrew Bogut mais uma vez não conseguiu jogar, atrapalhado pela atenção exclusiva de Adams no garrafão, e Draymond Green manteve seu modo “trem descarrilhado” exagerando no ritmo dos contra-ataques e não conseguindo pontuar apesar da negligência da defesa contra ele. Mais uma vez a diferença no placar – que chegou a 13 pontos ainda no primeiro tempo – parecia de 130 pontos e a torcida do Warriors, que começou fazendo justiça à fama de mais barulhenta da NBA, ficou apreensiva com a nítida desvantagem da equipe. Quando Stephen Curry fez um contra-ataque improvável no estouro do cronômetro do segundo quarto para diminuir a vantagem para apenas 6 pontos, parecia impossível que os times estivessem tão próximos no placar. Ainda assim, o desconforto para a equipe da casa era grande: nesse mesmo ritmo, teríamos certamente Thunder nas Finais da NBA, salvo alguma CHUVA de bolas de três de Klay Thompson, que parecia não estar em condições de repetir o feito.

Quando o segundo tempo começou, a reação parecia ainda mais impossível porque o Warriors dava sinais de que iria se desmantelar a qualquer momento frente à defesa do Thunder. Separei duas jogadas do Warriors abaixo no começo do terceiro quarto, precisando mudar a dinâmica do jogo, que encontraram a PAREDE defensiva do Thunder.

Na primeira o contra-ataque do Warriors não dá certo porque Durant e Ibaka já estão ocupando o garrafão, então a jogada precisa recomeçar. Bogut faz um corta-luz para que Curry consiga receber a bola no perímetro, mas Ibaka está na cobertura e Andre Roberson consegue se recuperar do corta-luz, de modo que os dois se aproximam para contestar o arremesso.

 

Curry, espero, passa entre os dois e ataca a cesta, mas pra variar lá está Kevin Durant para bloquear a infiltração – Curry se lembra muito bem do Durant depois do toco HUMILHANTE que levou no Jogo 6 em jogada parecida. Dessa vez, Curry se livra da bola com Iguodala embaixo da cesta, mas nesse ponto Ibaka já se recuperou e está lá para contestar Iguodala. Ele é forçado a desistir do arremesso, passa de novo para Curry na zona-morta e lá está Andre Roberson, que também se recuperou para contestar o arremesso de Stephen Curry que não chega SEQUER NO ARO. Não só a rotação defensiva do Thunder é perfeita como também o time tem jogadores fortes, rápidos e capazes de correr de uma cobertura para a outra, como é o caso de Ibaka e Roberson na jogada. É desesperador de ver.

Na outra jogada, Klay Thompson é DOMINADO pela defesa individual de Andre Roberson enquanto, lá em cima da tela, Steven Adams e Ibaka não deixam de jeito nenhum Andrew Bogut deixar o garrafão para fazer um corta-luz e ajudar Klay. Vejam como tanto Ibaka quanto Adams colocam o corpo em Bogut e prendem ele numa posição completamente inútil em quadra, até mesmo para o rebote. Curry aparece para salvar Klay Thompson, mas marcado por Kevin Durant – como foi a regra durante o jogo inteiro – não consegue sequer tocar na bola, graças aos braços gigantescos do seu marcador.

 

Frente a uma defesa dessas, o que fazer? Basicamente, o plano desde o começo do jogo para o Warriors foi usar corta-luz atrás de corta-luz para colocar os arremessadores da equipe contra os jogadores de garrafão menos atléticos do Thunder. Pense na primeira jogada que vimos lá em cima, com Bogut fazendo um corta-luz para deixar Curry livre de Andre Roberson para poder receber a bola. Se Roberson for o responsável por correr atrás de Curry, o armador do Warriors terá tempo demais para arremessar. A solução do Thunder é fazer a troca de marcação em cada corta-luz, de modo que quem cobre Curry na jogada é Serge Ibaka. O Warriors, então, tentou fazer o corta-luz o máximo possível com Steven Adams para que o pivô fosse obrigado a, com sua velocidade lateral limitada, contestar arremessos de três pontos no perímetro. Se o Warriors estava vivo no jogo no terceiro período, perdendo por apenas 10 pontos, foi porque a tática salvou o ataque da equipe da aniquilação total.

Logo no começo do jogo, Bogut forçou Westbrook para longe de Curry, sobrando para Adams marcá-lo. O resultado foi Stephen Curry dando um arremesso forçado, um passo para trás da linha de três pontos, apenas para provar a estratégia: se o pivô sobrar no perímetro, vai tomar arremessos na cabeça.

 

Em jogos anteriores, a estratégia do Warriors em bolas assim foi atacar o pivô com dribles, tentado uma infiltração, mas a defesa de cobertura do Thunder é tão boa que eventualmente Durant ou Ibaka conseguiam um toco por trás e estragavam tudo. Os arremessos de três em cima de Adams, pelo contrário, não podem ser contestados. Um minuto depois da jogada acima, foi a vez de Bogut deixar Klay Thompson marcado por Steven Adams para um arremesso por cima do pivô.

 

Vejam que ainda assim o arremesso é contestado, mas é a melhor oportunidade de arremesso que o Thunder permite ao Warriors e é preciso usá-la. Quando a oportunidade não surge ou quando os arremessos não caem, o Warriors não tem outra solução contra essa defesa do Thunder, que fica melhor a cada jogo.

No terceiro quarto, quando parecia que o Thunder iria sufocar o Warriors defensivamente e deslanchar no jogo, criando uma vantagem no placar suficiente para garantir a vitória, o plano de atacar os pivôs do Thunder no perímetro começou a dar MUITO certo. Numa sequência de 5 bolas de três seguidas em cima de Steven Adams e Serge Ibaka, o Warriors não apenas tirou a diferença no placar como também assumiu a liderança em definitivo. A pressão de tomar tantas bolas de três fez com que o Thunder passasse a forçar bolas tontas no ataque, especialmente arremessos de três pontos de Russell Westbrook na corrida, em cima da defesa do Warriors, o que é uma péssima ideia. No final do terceiro período, o ataque do Thunder já estava emocionalmente desequilibrado e a vitória do Warriors já parecia certa. Foram cinco bolas que inverteram por completo a dinâmica do jogo. Vamos a elas?

Bola número 1:

 

Olha que legal o Ibaka marcando Stephen Curry por trás no meio da quadra, para impedir um arremesso absurdo, e só saindo de lá quando Andre Roberson já estabeleceu uma defesa sólida na frente do armador. Depois disso, Draymond Green faz o corta-luz, Ibaka passa a marcar Curry, e um drible para o lado é suficiente para que Ibaka não seja capaz de alcançar mais a bola. A diferença cai para 5 pontos.

Bola número 2:

 

Festus Ezeli bloqueia o caminho de Andre Roberson, Steven Adams é forçado a marcar Klay Thompson e bloqueia muito bem o caminho para a cesta. Mas um passo para trás e uma batidinha de bola são suficientes para Klay Thompson arremessar de três pontos e converter. A diferença no placar cai para 4 pontos.

Bola número 3:

 

Olha que fantástica a marcação de Durant em Stephen Curry. Ele tapa todos os espaços, não permite infiltração, Curry não é doido de tentar arremessar por cima, e ainda consegue dar um cutucão na bola e forçar Curry a recomeçar a jogada. Mas eventualmente Curry infiltra e, embora não tenha ângulo nenhum para um arremesso de qualidade, Serge Ibaka segue a orientação tática e sai para a defesa na cobertura. Isso permite a Curry acionar Andre Iguodala quase na zona morta. O Thunder é um absurdo em termos atléticos e Ibaka quase se recupera na bola, mas não chega a tempo. A diferença cai para 3 pontos.

Bola número 4:

 

Curry recebe três marcadores na jogada. O original era Russell Westbrook, mas Kevin Durant passa a marcá-lo depois do corta-luz indireto de Draymond Green. Um segundo corta-luz, dessa vez de Festus Ezeli, tira Durant da jogada e coloca Steven Adams em cima de Curry. Vejam que Draymond Green está sendo marcado por Westbrook e pede a bola para explorar a situação, mas assim que Curry dá um drible pra cima de Adams, Green já começa a se posicionar para o rebote. Isso é plano de jogo, amigos. Um drible para o lado cria o espaço necessário para o arremesso de Curry, que empata o jogo.

Bola número 5:

 

Ezeli faz um corta-luz no meio do contra-ataque para tirar Russell Westbrook da marcação e forçar Adams a defender Curry. Isso só acontece num contra-ataque graças ao MEDO de que Curry arremesse antes de chegar na linha de três pontos. Curry vai parar na zona morta, e ao invés de ter Klay Thompson lhe fazendo um novo corta-luz como ele SEMPRE faz nessa situação, Klay simplesmente dá o fora dali para não tiram Adams de Curry. Novamente, um drible para o lado é suficiente para que Adams não consiga alcançar o arremesso, ele é rápido mas sua velocidade lateral deixa a desejar. Essa bola coloca o Warriors três pontos à frente no placar. A partir dali, o Thunder nunca mais encosta no placar. Quando o quarto terminou, isso aqui havia acontecido:

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O Thunder tentou, depois disso, mudar a defesa em cima do Curry, sem sucesso. No final do terceiro quarto, passaram a dobrar a marcação nele. O resultado foi que ele encontrou jogadores livres para pontuar. Um exemplo: marcado por Kanter e Westbrook, Curry acha Varejão livre, que dá um CROSSOVER no coitado do Kanter que está em movimento voltando da dobra de marcação e pontua lindamente. Varejão é Brasil na Libertadores, amigos!

 

No quarto período, o Thunder tentou evitar as trocas no corta-luz e torcer para que os defensores do Thunder vencessem o espaço na marra para evitar arremessos do Curry. Na jogada abaixo, a execução é quase perfeita: Westbrook não deixa Steven Adams sair no Curry porque corre como um louco depois de tomar DOIS corta-luzes (um do Iguodala, outro do Ezeli) e a marcação só troca quando Durant chega para assumir a defesa. Mas nesse ponto, Stephen Curry está QUENTE, confiante, com o Warriors na frente do placar, e aí nem a defesa excepcional do Durant é suficiente para pará-lo.

 

Curry finge uma infiltração na direita, dá um passo para trás na esquerda, cria um mínimo de espaço e leva a vantagem no placar para 7 pontos. Durant até tentou colocar o Thunder de volta no jogo com uma bola de três pontos, mas a defesa do Warriors foi eficiente em colocar a bola nas mãos de Westbrook no perímetro ou deixar Dion Waiters livre para arremessar. Os dois tiveram um aproveitamento muito ruim do perímetro (somaram 2 acertos em 11 tentativas) enquanto Curry e Klay Thompson estavam fazendo a festa dos três pontos em cima dos jogadores de garrafão do Thunder. Klay, que errou os primeiro SETE arremessos que deu no jogo, terminou a partida com 6 bolas de três pontos convertidas; Curry terminou com 7, somando 36 pontos. Os dois quebraram, com facilidade, o recorde de bolas de três pontos convertidas numa série de 7 jogos nos Playoffs, que era de 28: Klay teve 30, Curry teve 32.

Dois jogadores quebrarem AO MESMO TEMPO esse recorde parece impossível. Enfrentar uma defesa como a do Thunder e de repente vencer o jogo com 5 bolas de três pontos seguidas no terceiro período parece impossível. Estar perdendo uma Final de Conferência por 3 a 1 e virar, vencendo dois jogos seguidos apenas no segundo tempo parece impossível. Mas o Golden State Warriors, aquele que quebrou o impossível recorde de vitórias numa temporada, faz tudo parecer banal. É fácil bocejar com tantos recordes quebrados, com tantas marcas conquistadas, com tantas bolas de três pontos entrando no aro. O trabalho minucioso para ESCOLHER os confrontos para Curry e Thompson passa quase despercebido. Nos acostumamos com a capacidade do Warriors de tornar o impossível possível. Nesse momento, é preciso resistir ao impulso de agir com normalidade: esse Warriors merece reconhecimento pelo que colocou em prática ontem. Colocará seu legado à prova em mais uma Final da NBA.


RODADA DO DIA

As Finais da NBA começam apenas quinta-feira, com Cleveland Cavaliers @ Golden State Warriors às 22h na ESPN.


REAÇÕES DO DIA

É claro que a NBA inteira reagiu à vitória do Warriors na noite de ontem, mas duas reações merecem atenção especial. Uma foi do Reggie Jackson, ex-armador reserva do Thunder, alfinetando a ex-equipe com a magia da ausência de palavras:

A outra foi do COMPLETAMENTE FORA DA REALIDADE Joel Embiid, do Sixers, que afirmou que é hora de recrutar Kevin Durant para jogar por lá:

Durant deve decidir se fica ou sai do Thunder para a próxima temporada, mas dificilmente deverá abrir mão da chance de renovar com o Thunder por mais um ano e fazer uso do aumento do teto salarial depois disso para conseguir um contrato ainda maior com o Thunder ou qualquer outra equipe que lhe der na telha.


SORTEIO DO MÊS

Acreditam que no mês passado nós conseguimos sortear uma camiseta do Kobe Bryant para um torcedor do… CELTICS?! Pois é, mas ele aceitou o MANTO e decidiu dar de presente para um amigo de bom gosto. A foto deve chegar em breve!

Enquanto isso fizemos hoje (aos 45 do segundo) o sorteio da camiseta do mês de maio para os assinantes do Bola Presa que pagam R$20 ou mais. E o vencedor é… uma vencedorA: a Gabriela Castro vai levar uma linda camiseta vermelha do Portland Trail Blazers.

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Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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