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Quando vimos Greg Oden ser draftado aos 19 anos, sabíamos pelas rugas em seu rosto que ele na verdade tinha uns 82 anos e iria se aposentar em breve. Se ele durasse alguns anos, seria o bastante para o time forrado de pirralhos do Blazers amadurecer um pouco e tentar ganhar um ou dois anéis de campeão. Nem seria necessário ele ser um grande jogador, bastaria que ele quebrasse um bom galho, principalmente defensivamente, e ele já seria capaz de se aposentar tendo feito parte de um time memorável, de garotos que se tornaram homens, um processo de renovação que levou o Blazers do fedor completo à real disputa por um título.
O que ninguém esperava é que, na verdade, o Oden fosse o “Jimmy Bolha“. O mundo aqui fora é muito perigoso para ele, que precisa permanecer toda sua vida fechado dentro de uma bolha para tentar se manter saudável. No mundo exterior ele tem poucas chances de sobreviver, só se ferra – e atravessa o país causando um monte de confusões.
O histórico de lesões do Oden comprova essa teoria. No seu único ano de basquete universitário, jogou o tempo inteiro com uma lesão na mão direita que o obrigava a arremessar lances livres com a canhota. Muita gente achou que isso foi benéfico para o próprio Oden, porque mostrou como ele era capaz de jogar muitíssimo bem ainda que lesionado, além de fazer propaganda do seu talento com as duas mãos. Mas após ser draftado com a primeira escolha do draft, Greg Oden contundiu o joelho ao tentar (olha que bizarro!) levantar do seu sofá, ainda em casa. Tem gente que jura de pé junto que ele na verdade se machucou dançando “Dance Dance Revolution” num daqueles tapetes de dança, o que eu prefiro acreditar porque é menos ridículo do que se arrebentar saindo do sofá, parece coisa do Eddy Curry, que corre o risco de romper um tendão tentando ir ao banheiro depois de tantos anos comendo lasanha na cama.
A cirurgia para reparar o joelho tirou o Oden de toda a sua temporada de novato, mas muita gente também achou que no fundo foi uma coisa boa: o time aprendeu a jogar sem ele, amadureceu bastante, conseguiu ser levado a sério, e passou a esperar o Oden numa boa, que assim conseguiu voltar com menos pressão e tendo que jogar menos minutos. A situação também mostrou o caráter do jovem pivô, que pediu desculpas às lagrimas para seu técnico e para o dono do Blazers por deixar o time na mão antes sequer de poder entrar em quadra. Satisfeitos com a mostra de dedicação do rapaz, confiaram plenamente que ele voltaria com toda vontade possível.
E voltou. Mas perdeu 20 jogos na sua temporada de estreia com mais uma lesão no joelho. Ao invés de questionarem se o produto era paraguaio, no entanto, passaram a se preocupar com o excesso de faltas cometidas quando ele de fato estava em quadra. Toda vez que um chinês vota no Yao Ming para o All-Star, o Greg Oden comete uma falta – o que significa que ele acaba passando a maior parte do seu tempo no banco de reservas. Se analizássemos a carreira do Oden num daqueles gráficos pizza, O Eddy Curry comeria esse gráfico, mas antes disso perceberíamos que o Oden passou a maior parte do tempo contundido e a outra maior parte no banco por excesso de faltas. A menor fatia da pizza, que não daria nem pra encher o buraquinho do dente, representaria o tempo que ele jogou basquete pra valer – minutos raros mas que mostram, realmente, que o talento do Oden é real. Quando está em jogo e não acerta ninguém com uma cotovelada acidental, desiquilibra o jogo defensivamente. No ataque, é habilidoso com as duas mãos e finaliza com força no garrafão.
Foi assim que, para a temporada de agora, todo mundo ficou esperando que ele aprendesse a cometer menos faltas, não que fosse mais saudável. A lesão na mão ajudou sua ambidestria, a lesão no joelho ajudou o time a amadurecer, a segunda lesão no joelho lhe deu tempo para se acostumar melhor com os critérios de falta da NBA. Quando se trata do Greg Oden, parece que se cair um piano na cabeça dele vão dizer que foi bom para melhorar seu ouvido musical. Uma hora alguém vai acabar percebendo que ele não precisa de um bom treinador, precisa é de um bom plano de saúde (e de um creminho anti-rugas, vai).
Nessa temporada, fiquei bem confuso a respeito de seu amadurecimento defensivo. Em algumas partidas, mostrou ter sacado direitinho que na NBA é mais importante atrapalhar o arremesso do que gerar contato de verdade, principalmente quando se é um novato e todos os juízes do planeta vão preferir marcar uma falta em você quando o Kobe se aproxima de um raio de dois quilômetros de uma cesta. Contra o Houston, por exemplo, vi o Oden dominar o garrafão defensivo e obrigar a equipe inteira a ficar arremessando de três, como se todo mundo do Rockets fosse o Rasheed Wallace e tivesse fobia de chegar perto do aro. Mas em outros jogos, vi o Oden parecer o mesmo fedelho afoito de sempre, indo atrás do toco, do contato, todo estabanado e ingênuo, com cara de quem acreditaria que o filho da Mari Alexandre é dele mesmo. As atuações foram bem mistas, sem um critério que pudesse indicar evolução. Ofensivamente, no entanto, pude notar uma melhora constante, uma noção cada vez melhor de posicionamento. O problema é que, como qualquer ser humano mamífero e bípede, ele depende um tanto de ritmo: quando consegue passar vários minutos em quadra, vai participando do ataque e produz mais e mais, mas quando sai de quadra rapidamente por cometer faltas em excesso, não consegue acertar arremessos nem que a vaca tussa.
Mas não deu pra acompanhar essa saga do Greg Oden aprendendo a não matar os jogadores adversários de porrada por muito tempo, afinal ele está fora de sua bolha e portanto fadado a virar farofa. Contra o Houston (parece que eles já se enfrentaram umas oito vezes nessa temporada, já enjoei de ver o Blazers jogar), o Oden se contundiu mais uma vez. Em notícia igualmente chocante, a Vivi Fernandes não é virgem.
Como dá pra ver no vídeo, o contato com o Aaron Brooks foi mínimo. Já vi mais contato físico do que isso em partida de tênis, quando duas tenistas trocam beijinhos depois da partida. Mas a queda desiquilibrada do Oden foi o bastante para o joelho virar poeira outra vez, ele ter que apelar para a faca de novo, e perder essa temporada inteira. É a terceira lesão nos joelhos em três anos, e a segunda vez que ele perde a temporada toda. No maior esquema “tente outra vez”, é bem claro que ele vai tentar dar uma de Ronaldo e voltar mais uma vez, e mais uma vez, e mais uma vez, até que perceba que não precisa se esforçar tanto e se contente em jogar bem gordo. Novamente chorando, Greg Oden pediu perdão para seu técnico e até para Brandon Roy, quando foi visitado pela estrela do Blazers. A reação de todo mundo é a mesma: essas coisas acontecem, não tem como prever, e portanto não faz sentido se desculpar. O Oden é um cara legal, preocupado, esforçado, suou as pitangas para recuperar a forma física nas últimas férias, e vai fazer tudo de novo. A torcida reconhece o esforço e sabe que essas coisas são aleatórias, simples acaso. Com ele ainda no chão, esperando a chegada da maca, os torcedores que lotavam o ginásio de Portland começaram a gritar seu nome.
É bom saber que os engravatados, os jogadores, os torcedores, seus técnicos, todo mundo apoia o garoto, admira sua dedicação e esforço, sua vontade de estar saudável, e entende que basta estar vivo para que merdas aconteçam. Mas quanto tempo mais esse Blazers pode se dar ao luxo de ficar dependendo de sorte ou azar? O elenco montado é simplesmente profundo e talentoso demais, e nessa temporada já foi bastante complicado tentar arrumar minutos – e dinheiro – para todo mundo. O jovem Jarryd Bayless, por exemplo, acabou perdendo na disputa do palitinho e terminou no final do banco da equipe, jogando apenas os minutos finais dos jogos já decididos. Rudy Fernandez já reclamou de seu papel na equipe publicamente, assim como o Travis Outlaw, que sempre quer arremessar mais. Martell Webster acabou de voltar de contusão e recuperou seu espaço no time. Andre Miller veio do Sixers querendo ser titular, e de tanto chorar até conseguiu a vaga e um pirulito de groselha, mas a alegria não durou muito e ele já voltou pro banco. O que veremos, em breve, é essa quantidade surreal de talento exigindo mais tempo de quadra, mais arremessos, vaga de titular, e contratos maiores e mais gordos. A reconstrução do Blazers foi excelente, exemplo pra qualquer time do planeta, mas o número de anos que dá pra segurar todo mundo junto é limitado. Quando a equipe dá sinais de que vai crescer e brigar com os grandes, é preciso uma subida vertiginosa que prove para todos que se trata de um projeto de verdade, com chances de título, e que merece que todo mundo se mantenha modesto com relação a minutos e a dinheiro, senão todo mundo foge achando que vai ser valorizado e receber a atenção que merece num time “de verdade”. Ou seja, basta as coisas darem errado um par de vezes e os descontentes vão debandar em busca de contratos melhores em outros lugares. Não dá pra segurar muita gente muito barata por muito tempo.
Essa temporada já foi pelo ralo. A não ser que o pó de pirlimpimpim do Houston Rockets seja emprestado para o Blazers, a equipe de Portland não vai conseguir sobreviver sem o Greg Oden, sem o Nick Batum (que fez uma cirurgia no ombro no começo da temporada) e sem o Travis Outlaw (que acabou de quebrar o pé), todos peças fundamentais da equipe. O negócio por lá anda tão ruim que até o técnico Nate McMillan rompeu um tendão num treino e vai pra mesa de cirurgia, tudo enquanto o dono da equipe luta contra o câncer. Novela mexicana das boas.
O Blazers virou rapidamente o segundo time de todo mundo, a pirralhada que qualquer um gosta de acompanhar ganhando barba na cara e chutando os traseiros dos times grandes. Mas é possível que, em breve, eles passem do ponto e comecem a desmanchar se não houver uma evolução clara no elenco e as peças fundamentais não ficarem saudáveis. O Greg Oden é um cara bacana, seria legal de ir tomar um café, ele se esforça pra burro e quando está em quadra é exatamente do que o time precisa, mas já estamos chegando no momento de olhar arrependido para o draft e pensar que, com outro jogador escolhido em seu lugar, esse Blazers já estaria chegando mais longe e aproveitando, enquanto é tempo, essa quantidade enorme de jogadores jovens e baratos. Imaginem só como seria esse time com o Brandon Roy armando para o Kevin Durant, por exemplo. Mas se o negócio for continuar apostando no garrafão, até uns jogadores mais secundários estariam fazendo um belo de um estrago: que tal Al Horford garantindo os rebotes, ou Joakim Noah dando uma força na defesa? Todos eles seriam melhores do que ver o Greg Oden fazendo um estrago no próprio joelho, né?
O Blazers começa a entrar numa corrida contra o tempo, e talvez não valha a pena contar com o Oden. Será que dá pra ganhar qualquer coisa com o Przybilla no garrafão? Em algum lugar, o Greg Oden deve estar nesse momento pedindo desculpas, que são inteiramente aceitas. Mas e daqui há 10 anos, será ele o novo Sam Bowie (o cara draftado antes do Jordan que sumiu pelo excesso de lesões)? Ou o novo Yao Ming (que dominou enquanto os osso deixaram)? Infelizmente, parece que suas lesões não permitirão que ele dure muito tempo – exatamente como a idade no seu rosto indicava. Uma carreira curta, como a vida útil desse Blazers que vemos hoje.